Acórdão nº 2440/2006-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 06 de Abril de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO GOMES
Data da Resolução06 de Abril de 2006
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 3ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa 1.

RELATÓRIO 1.1.

A., B. e C.

, identificados nos autos, Arguidos no Processo n° 1684/02.0PCSNT, cuja instrução corre os seus termos no 3.° Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Sintra, suscitaram o incidente de recusa, relativamente ao Mmº Juiz que preside à instrução Dr. ..., nos termos dos artigos 43° a 45° do Código de Processo Penal, alegando que: «1.Nos autos acima identificados, e pelo presente despacho de 10 de Fevereiro (cfr. doc. n°1 que se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais), veio o Exmº Senhor Juiz de Instrução decidir que no debate instrutório realizado em 30 de Janeiro de 2006 ocorreu uma irregularidade, que se pretende agora vir sanar, dando sem efeito aquele debate e designando data para novo debate instrutório.

  1. Em face deste despacho, e por força do processado anteriormente nos autos supra identificados, os Arguidos, ora requerentes, consideram que existem motivos sérios para questionar a imparcialidade do Exmº Senhor Juiz de Instrução, por força, não das suas características pessoais (em relação às quais nada têm a apontar), mas por se verificar uma pré-compreensão das matérias em discussão que, no caso concreto e na presente fase processual, não garante uma decisão livre e justa da causa.

  2. Entende a Jurisprudência que pretendendo-se contestar a imparcialidade do julgador, o caminho processualmente indicado é o requerimento de recusa do juiz, previsto no artigo 43º do CPP.

  3. Os Arguidos vêm assim lançar mão do incidente, excepcional, da recusa, previsto no artigo 43°, do CPP, por ser esta a única alternativa legalmente prevista para garantir que a decisão da presente causa se rege pelos princípios da verdade, da imparcialidade e da justiça.

    Vejamos então, 5. Nos presentes autos, vêm os Arguidos acusados da prática, em concurso aparente e co-autoria, de um crime de infracção de regras de construção, dano em instalações e perturbação de serviços, p. e p. pelo art. 277°, n°1, al. a) e n°2 e de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148°, n°1, ambos do Código Penal ("CP") - cfr. doc. n°2 que se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

  4. Inconformados, os Arguidos requereram a abertura da instrução, invocando em primeiro lugar a nulidade da acusação, em segundo lugar a inconstitucionalidade da norma do art. 277°, n°1, alínea a), do CP e, por fim, a falta de verificação dos elementos do tipo penal que lhes era imputado.

  5. Realizado o debate, foi - de imediato - proferida a decisão instrutória, na qual se pronunciaram os Arguidos pela prática, em co-autoria e em concurso efectivo, de um crime p. e p. pelo art. 277°, n°1, al. a) e n°2 e de um crime p. e p. pelo art. 148°, nº 1, ambos do CP - cfr. doc. n°3 que se junta e se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

  6. Face a esta decisão instrutória, os Arguidos, ora requerentes, invocaram, no próprio acto e, posteriormente, em requerimentos autónomos, vícios que inquinam o despacho de pronúncia, bem como o processado anterior - cfr. docs. n°4 e 5 que se juntam e se dão por reproduzidos para todos os efeitos legais.

  7. Antes de mais, para justificar a existência de motivos sérios que fazem desconfiar da imparcialidade do Exmº Senhor juiz de Instrução, é necessário fazer referência aos termos em que se processou o debate instrutório e em que foi proferido o despacho de pronúncia dos Arguidos, ora requerentes.

  8. Em primeiro lugar, entendeu o Exmº Senhor Juiz de Instrução que dos actos de instrução tinha resultado uma alteração dos factos descritos na acusação, relativamente aos Arguidos L... e A ..., 11. Matéria esta que não foi expressamente tratada no despacho de 10 de Fevereiro, o que já motivou um requerimento pedindo a sua aclaração (e, caso se esclareça que aquele despacho não se reporta a esta questão, requerendo que seja igualmente proferida decisão sobre esta matéria).

  9. Note-se que, não obstante considerarem os Arguidos, ora requerentes, que esta alteração é substancial (com todas as consequências legais), o Exmº Senhor Juiz de Instrução entendeu que esta era uma alteração não substancial de factos.

  10. Nesses termos, lançou mão do regime disposto no artigo 303°, n°1 do CPP, que determina que, quando se verifique a ocorrência de uma alteração, o juiz de instrução "interroga o arguido sobre ela sempre que possível e concede-lhe, a requerimento, um prazo para preparação da defesa não superior a oito dias, com o consequente adiamento do debate, se necessário".

  11. Sucede porém que esta remissão para o mecanismo do artigo 303°, n°1 do CPP ocorreu em momento subsequente à leitura da decisão instrutória, o que significa que o Exmº Senhor Juiz de Instrução chegou, efectivamente, a redigir a decisão instrutória (despacho de pronúncia) e chegou também a tornar pública esta decisão, através da sua leitura, 15. Significando igualmente que a invocação do artigo 303°, n°1 do CPP mais não traduziu do que um aparente cumprimento (meramente formal) do direito de defesa que assiste aos Arguidos.

  12. O Exmº Senhor Juiz de Instrução não só deixou de garantir o exercício pleno e eficaz da defesa dos Arguidos, o que constitui uma irregularidade processual, como também, e para o que releva na presente sede, formulou uma pré-compreensão sobre esta matéria (no momento da prolação do despacho de pronúncia) e, acima de tudo, revelou publicamente (no momento da leitura da decisão) essa mesma pré-compreensão.

  13. A qual, por conseguinte, não lhe permite vir a analisar e decidir novamente esta mesma questão com um juízo verdadeiramente livre e imparcial.

  14. Isso significa que, mesmo que venha a ser dada oportunidade aos Arguidos para apresentarem a sua defesa nesta matéria, nos termos previstos no artigo 303°, n°1 do CPP (conforme foi já requerido), a pré-compreensão sobre esta questão demonstrada pelo Exmº Senhor Juiz de Instrução, nos termos supra expostos, tenderá a tornar, uma vez mais, meramente formal (para não dizer irrelevante) o exercício deste direito dos Arguidos.

  15. E o mesmo sucede, mutatis mutantis, no que se refere à alteração da imputação em matéria de concurso, a qual é, efectivamente, objecto de análise no despacho de 10 de Fevereiro e que vem (expressamente) motivar a realização de novo debate instrutório.

  16. Com efeito, a decisão instrutória veio surpreender os Arguidos com a pronúncia pela prática dos crimes supra mencionados em concurso efectivo quando estes vinham acusados da sua prática em concurso aparente, alteração com consequências muito significativas, designadamente pela agravação do regime jurídico aplicável, e cuja nulidade/irregularidade foi de imediato invocada pelos Arguidos.

  17. Pelo presente despacho de 10 de Fevereiro, veio o Exmº Senhor Juiz de Instrução decidir que aquela alteração, que qualifica como não substancial, deveria ter sido comunicada aos Arguidos nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 303°, n°1 do CPP o que, não se tendo verificado, consubstancia uma irregularidade que se pretende agora sanar, dando-se sem efeito o debate instrutório de 30 de Janeiro e designando-se data para novo debate.

  18. Sucede porém que, também aqui, a apresentação da defesa dos Arguidos não será mais que uma...

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