Acórdão nº 02P576 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Maio de 2002 (caso NULL)
Magistrado Responsável | LOURENÇO MARTINS |
Data da Resolução | 22 de Maio de 2002 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça:I 1. No P.º comum n.º 92/99 (nuipc 21347/96.3TDLSB), da 8ª Vara do Tribunal Criminal do Círculo de Lisboa, mediante acusação do Ministério Público, foram submetidos a julgamento: A, divorciado, gerente comercial, nascido a 6 de Outubro de 1938, natural da freguesia de S. Sebastião da Pedreira, concelho e distrito de Lisboa, filho de ...... e de ......o, residente na Rua ......, Vivenda ...., Areia, Cascais, e actualmente recluso no Estabelecimento Prisional de Caxias; e B, viúva, gerente comercial, nascida a 26 de Julho de 1930, natural da freguesia de Macinhata de Seixa, concelho de Oliveira de Azeméis, distrito de Aveiro, filha de ...... e de ......., residente na Estrada ......., Dona Maria, Almargem do Bispo, imputando-se-lhes, em co-autoria material, um crime de burla qualificada, pp. pelos artigos 313º e 314º do Código Penal, na redacção do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro; ao primeiro arguido, ainda, a autoria material de um crime de burla agravada pp. pelos artigos 313º e 314º, alínea e), ambos do Código Penal, na redacção originária. C, e D, em representação da sociedade E, deduziram pedido de indemnização civil contra ambos os arguidos e contra a sociedade por quotas "F," no montante de 9450000 escudos (nove milhões quatrocentos cinquenta mil escudos). A final, por acórdão de 7 de Dezembro de 2001, o Colectivo deliberou: a) Condenar o arguido A por co-autoria do crime de burla agravada, na pena de 6 (seis) anos de prisão, pelo regime do Código Penal de 1995, desta pena perdoando 1 (um) ano de prisão nos termos do artigo 8º da Lei n.º 23/91, de 4 de Julho, e 1 (um) ano de prisão nos termos da Lei n.º 15/94, de 11 de Maio; Pela autoria material do crime de burla agravada, a pena de 3 (três) anos de prisão pelo CPenal de 1995, e cumulando com a pena remanescente, na pena única de 6 (seis) anos de prisão, da qual declarou perdoado 1 (um) ano de prisão nos termos do artº. 1º, nºs 1 e 4, sob condição dos artigos 4º e 5º da Lei 29/99, de 12 de Maio. b) Condenar a arguida B por co-autoria material de um crime de burla agravada, pp. pelos artigos. 217º e 218º, n.º 2, alínea a), ambos do Código Penal, na redacção do Dec-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, na pena de 3 (três) anos de prisão; suspender a execução desta pena pelo período de 3 (três) anos; c) Condenar os arguidos no pagamento de 5250000 escudos (cinco milhões duzentos cinquenta mil escudos) de indemnização à A - Comercialização, acrescida de juros legais vencidos e vincendos. 2. Não se conformando com a decisão dela interpõe recurso o arguido, A, no qual, após aperfeiçoamento, apresenta as seguintes conclusões: "1° O arguido não cometeu o crime de burla agravada, pelo qual foi condenado, nos termos dos artigos 217° e 218° n° 2 alínea a) do CP. 2° Não estão preenchidos os elementos objectivos e subjectivos daquelas normas incriminatórias. 3° O arguido não pode ser responsável pelo facto dos Assistentes terem sido despejados. 4° A conduta enganosa que se encontra no cerne do tipo criminal da burla, pode ou não ser preenchida por um comportamento omissivo, 5° no entanto, mesmo que se aceite como boa a tese que admite a chamada "burla por omissão" a punibilidade da conduta encontra-se sempre subordinada à norma do n° 2 do artigo 10° do CP, isto é o facto só é punível se sobre o omitente impender um dever jurídico de evitar o resultado típico, 6° Ora o arguido desconhecia que existia pendente uma acção de despejo, pelo menos até à outorga da escritura em 07/03/1990, 7° Por outro lado os processos decorriam em Tribunais diferentes, ou seja Tribunal de Trabalho e Palácio da Justiça. 8° Foram os próprios Assistentes quem depositaram pessoalmente na Caixa Geral de Depósitos, as guias correspondentes ao preço exarado na escritura, 9° Vindo depois de outorgarem escritura compensar o arguido pelos trabalhos realizados no imóvel. 10° Processo n° 92/99 da 2° secção Nestes autos não foi inquirida a testemunha H, que podia certamente ter contribuído para a descoberta da verdade, pelo menos nesta parte podia afirmar ou infirmar a versão do arguido, apesar de requerido o seu depoimento, não foi admitido. 11° O Arguido foi encarregado pelo gerente da queixosa para resolver o litígio pendente entre aquela testemunha e a entidade patronal. 12° A demonstrar a boa fé do arguido está a devolução dos dois cheques de 220.000$00, cada, quando os podia ter levantado. 13° Nesta parte também não cometeu o crime de burla em foi condenado. Termos em que deverá ser revogado o douto acórdão, devendo o arguido ser absolvido da prática do crime de burla agravada em que foi condenado e absolvido também do pedido de indemnização civil em que foi condenado". Responderam o Digno Magistrado do Ministério Público e os demandantes civis. Diz, em síntese, o Ministério Público: "1- Como questão prévia, entende-se que o recurso deve ser rejeitado nos termos do art. 420º, n° 1, CPP, quer porque as conclusões são uma cópia quase integral da motivação, em vez de resumo do pedido, quer porque, quanto à medida da pena (impugnada, aliás, de modo vago) não respeita o art. 412° n° 2 al. c) do diploma; 2- A não se entender assim, deve ser negado provimento ao recurso, porquanto o recorrente se limita a valorar de modo diverso a qualificação juridico-criminal dada pelo tribunal colectivo, excluindo a existência de crime, sendo que os factos provados integram o requisito objectivo e subjectivo do(s) crime(s) de burla, devendo ser mantido o acórdão". Por seu lado, dizem os demandantes civis: "1. Foram os factos dados como provados pelo Mmo. Tribunal a quo com inteira fundamentação, com suficiência bastante de provas prestadas, sem qualquer contradição na fundamentação nem entre esta e a decisão, e sem qualquer erro, notório ou sequer menos visível, na apreciação da prova, pelo que o recurso em causa se deve restringir ao reexame da matéria de direito sendo portanto inadmissível o reexame da matéria de facto, nos termos do disposto nos art°s 432° d), 434° e 410º do C.P.P. 2. Atendendo à matéria de facto provada, foi a solução de direito, e em consequência a parte condenatória da douta sentença recorrida, a melhor e mais ajustada, e nela nos louvamos, pelo que deve a mesma ser confirmada". 3. Já neste Supremo Tribunal, convidado o recorrente a aperfeiçoar a sua petição, veio a fazê-lo em termos que foram aceites. Colheram-se os vistos legais. Procedeu-se à audiência a que se refere o artigo 423º do Código de Processo Penal, com observância do formalismo respectivo, tendo sido produzidas alegações orais. A Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta entendeu que a matéria de facto se encontra consolidada, e demonstrada a prática dos crimes de burla agravada pelos quais o recorrente foi condenado; dado o lapso de tempo decorrido, admitiria alguma redução na pena aplicada. A Ex.ma Advogada da demandante cível entende, ao contrário, não haver fundamento para rever a pena, salientando o comportamento não colaborante e a postura de indiferença do recorrente, no processo. O Ex.mo Advogado da recorrida (co-arguida) B defendeu que a demandante cível não foi enganada pelos arguidos, antes actuou com falta de diligência, pelo que os arguidos devem ser absolvidos. O Ex.mo Advogado oficioso do recorrente remeteu para a motivação do recurso. Cumpre ponderar e decidir.II Discutida a causa, ficou provada a seguinte matéria de facto(transcrição): "1º. Relativa à Acusação. No procº. N.º 61/98 da 1ªSecção: Os arguidos A e B são sócios gerentes da firma F, com sede na Rua Engº. ......., em Lisboa, que tem por objecto social leilões judiciais e particulares, tendo como principal actividade a venda por negociação particular de bens ordenada por tribunais. Nos autos de execução para pagamento de quantia certa n.º 49/85 que correram termos na 1ª Secção do 5º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa, em que era exequente H, e executado I, foi ordenada e efectuada em 13 de Maio de 1986 a penhora dos bens descriminados no auto de fls. 160 a 163, designadamente a verba n.º 23 relativa ao direito de trespasse e arrendamento das instalações da oficina e escritório, sitas na Rua ......, cave esquerda e r/c direito, em Lisboa. Por despacho proferido nos referidos autos a 12 de Outubro de 1988 a firma "F - L.da", legalmente representada pelos arguidos, foi encarregada de proceder à venda dos bens penhorados nos respectivos autos, e designadamente a verba n.º 23 do auto de fls., 160 a 163, venda essa a processar-se por negociação particular, e tendo-se fixado logo o preço mínimo do louvado, ou seja, o preço mínimo de 2000000 escudos (dois milhões de escudos), cfr. auto de penhora a fls. 162vº. Tendo por força do referido despacho (constante de fls. 208) ficado os arguidos...
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