Acórdão nº 03A3530 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Janeiro de 2004 (caso NULL)

Data27 Janeiro 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. 1. - "A" intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra B e C, em que pediu a condenação dos Réus a entregarem-lhe, livre e devoluto, o 2.º andar esquerdo do prédio sito na Rua 5 de Outubro, n.º ..., em Lisboa e a pagarem-lhe a indemnização de esc. 280 000$00 por cada mês ou fracção em que conservem o imóvel na sua posse, com início em 1/12/99 e termo na data da restituição do imóvel, pretensão que fundou na caducidade do contrato de arrendamento celebrado com D, que facultara a utilização do arrendado pelos RR. para nele exercerem a medicina. Na contestação única que apresentaram, os RR. pediram a absolvição dos pedidos sustentando estarem no local a exercer medicina por direito próprio, pois o contrato de arrendamento foi alterado por transacção, sendo a instalação dos RR. no andar do conhecimento da A. desde 1990 e 1995, a qual os considerou e reconheceu como locatários, ora por inclusão no contrato através da transacção, ora recebendo rendas após a morte do Dr. D. Na fase de instrução, os RR. requereram separadamente o depoimento de parte do respectivo comparte a pontos não coincidentes da base instrutória, pretensão que, por verem indeferida, impugnaram. Fixada data para julgamento, mediante aceitação da que foi proposta, na data designada para o acto o Ex.mo Advogado do R. C fez chegar ao processo um requerimento, datado do dia anterior, a pedir o adiamento da audiência, invocando só ter tido conhecimento da mesma no dia anterior por erro de agendamento provocado por erro correspondente na notificação que lhe foi feita pela Secretaria, requerimento sobre o qual recaiu decisão de indeferimento, impugnada através de recurso de agravo. A final, na parcial procedência da acção, os RR. foram condenados a restituírem o imóvel e a indemnizarem a A. no montante de € 1 246,99 por cada mês decorrido desde Dezembro de 1999, incluído, até efectiva entrega. Ambos os Réus apelaram. A Relação negou provimento aos agravos e confirmou a sentença. 1. 2. - Interpôs cada um dos Réus seu recurso de revista. 1. 2. 1. - O Réu C pede a revogação da decisão que não admitiu os depoimentos de parte, da que não determinou o adiamento da audiência por falta de advogado, da sentença e do acórdão recorrido, para o que levou às conclusões: 1. No que concerne à não admissão dos depoimentos de parte requeridos pelos Réus, a decisão recorrida está em oposição com o acórdão da Relação de Coimbra, de 13 de Outubro de 1976 e pode ser reapreciada; Os depoimentos devem ser admitidos, não só de acordo com o disposto no art. 553.º-3 CPC, como por respeito pelo direito constitucional à prova que integra o direito à acção judicial contemplado no art. 20.º da Lei Fundamental 2. Na parte que respeita ao não adiamento da audiência por falta do advogado do Recorrente, a decisão recorrida está em oposição com o acórdão da Relação de Lisboa, de 7 de Novembro de 2002; Deve determinar-se o adiamento da audiência, em consonância com o que está consignado no art. 651.º-1-d) conjugado com o n.º 5 do art. 155.º CPC, como também por força do art. 208.º da Constituição, que consagra o patrocínio forense como «elemento essencial à administração da justiça». 3. É manifesto o vício de falta de competência e mesmo de jurisdição para proferir a sentença do juiz que não seja aquele a quem foi distribuído o processo ou o juiz que o tenha vindo a substituir por decisão do Conselho Superior da Magistratura; Além de pôr em causa o princípio da independência do juiz que por qualquer outro meio venha a ser designado para a proferir, viola, também, o princípio da aleatoridade na determinação do juiz que decorre do art. 209.º CPC e contradiz o n.º 5 do art. 646.º do mesmo diploma, conjugado com o art. 658.º. pelo que a sentença da 1.ª instância deve ser revogada e substituída por outra a elaborar pelo juiz do processo e do julgamento. 4. A decisão recorrida, ao interpretar o contrato que se estabeleceu entre o falecido Dr. D, a Autora, o R. Dr. B e o Recorrente não teve em conta nem o disposto no art. 237.º C. Civil, nem as presunções referidas no ac. R.L. de 18/1/1, proferido no processo 9479/00; 5. Nem teve em devida consideração o disposto no n.º 2 do art. 1311.º C. Civil que, conjugado com os arts. 342.º a 346.º, 349.º a 351.º e 360.º, havia de constituir, a favor dos RR., pelo menos, a presunção dos factos em que estribam o seu direito ao arrendamento. A Autora, com o comportamento que assumiu a partir da data em que o Dr. D deixou de dar consultas no andar dos autos, e mesmo após a morte dele, servindo-se, inclusive, da renúncia ao arrendamento por parte da sua viúva para pôr fim ao arrendamento, está a actuar, à luz do art. 334.º C. Civil, em manifesto abuso de direito, não só por venire contra factum proprium, mas também por ter criado expectativas legítimas ao Recorrente de que este podia continuar a exercer a profissão onde, desde 1985, sempre a exerceu e se recusa, agora, sem causa legítima, a confirmá-las. 1. 2. 3. - Por sua vez, o Réu B, para pedir a revogação do acórdão e absolvição do pedido, ou a repetição do julgamento, verte nas conclusões: 1. Não admitindo no depoimento pessoal do co-réu, o Tribunal «a quo» cometeu nulidade, por violação do n.º 3 do art. 553.º CPC; Em matéria de prova deve decidir-se, em caso de dúvida, pela admissão, e não pela restrição, pois interessa ao julgador que lhe seja dado o maior número de possibilidades de conhecer a verdade - a admissão do requerido depoimento do co-réu, não obstante a apresentação de contestação comum. 2. A Relação não se pronunciou e não atribuiu qualquer valor ao documento superveniente - certidão judicial, junta em 7/10/2002 -, expressamente admitido, donde constam afirmações da testemunha E em contradição com o que depôs em audiência; Verifica-se o caso excepcional previsto no n.º 2 do art. 722.º (art. 729.º-2 CPC), devendo ser ordenada a repetição do julgamento, com vista a obter-se nova decisão da matéria de facto, liberta de contradições básicas e fundamentais; 3. O Co-réu C foi privado, ilegitimamente e por erro imputável à Secretaria, da defesa a que tinha direito, com clara violação dos arts. 651.º-1-d) e 155.º-5 CPC, como do art. 208.º CR: 4. A Recorrida, que tinha conhecimento da permanência no locado do Recorrente, e que a renda era efectivamente paga pelos médicos que exerciam clínica no andar, continuou a receber as rendas, manifestando vontade em manter estável a relação de locação relativamente aos Recorridos; A Recorrida reconheceu os Recorrentes como arrendatários, com a atitude de concordância, mantida desde 1990 até à instauração da acção, verificando a sua permanência no locado, recebendo deles rendas, mesmo já depois da morte do Dr. D, demonstrando sempre intenção de manter estável a relação de locação; 5. A decisão recorrida, ao interpretar o contrato estabelecido entre o falecido Dr. D, a Autora e os Recorrentes, não teve em conta, nem o disposto no art. 237.º C. Civil, que em caso de dúvida sobre o sentido da declaração prevalece, nos negócio onerosos, o que conduzir ao maior equilíbrio das prestações, nem as presunções a retirar da matéria, em violação da norma do art. 1038.º C. Civil; O acórdão recorrido, apenas retirando a qualificação de "inquilino", dada ao falecido, na transacção, sem enquadrar juridicamente as circunstâncias apuradas, erra face ao disposto nos arts. 236.º a 239.º C. Civil; Na interpretação dos contratos, feita nos termos do art. 236.º-1, deve atender-se a todas as circunstâncias do caso concreto, não sendo suficientes os termos do negócio ou o texto do respectivo documento; 6. Deve ampliar-se a matéria de facto, nomeadamente quanto aos arts. 16 a 18, 33 a 36, 38 e 39 da contestação, factos alegados com interesse para a interpretação do contrato ou para o conhecimento do abuso de direito e que não foram atendidos na decisão da matéria de facto; 7. Ocorreu, pelo menos, cedência válida, não precária, dos gabinetes, ao longo dos anos, por parte do Dr. D aos Recorrentes, para neles exercerem autonomamente actividade médica, tendo-se aquele demitido do uso e fruição exclusivos do andar, pelo menos em 1990; Assim não entendendo, o acórdão recorrido violou o art. 122.º do RAU; 8. A decisão recorrida viola o princípio da tutela da confiança - art. 2.º CR - e constitui abuso de direito, nos termos do art. 334.º do Cód. Civil. 1. 2. 4. - A Recorrida respondeu. Levantou a questão da insusceptibilidade de conhecimento das questões processuais da não admissão dos depoimentos de parte, do não adiamento da audiência e do juiz do julgamento/juiz da sentença, por sobre elas não ser admissível recurso do acórdão da Relação, pronunciou-se sobre a improcedência das questões objecto do recurso e pediu a condenação dos Recorrentes no pagamento de indemnização, correspondente aos honorários do seu mandatário (€ 4 165,00, com IVA incluído), como litigantes de má fé, por continuarem a insistir no reconhecimento da qualidade de inquilinos, que sabem não ter. 2. - Questões a conhecer. 2. 1. - Como do conteúdo das conclusões dos recursos decorre, há questões comuns, porque suscitadas por ambos os Recorrentes, e outras exclusivamente colocadas por cada um dos RR.. Assim, como questões comuns a ambos os recursos surgem as seguintes: 1 - Se são admissíveis os requeridos depoimentos dos compartes; 2 - Se deveria ter-se determinado o adiamento da audiência por falta do Mandatário do R. C; 3 - Se os Recorrentes detêm a posição de arrendatários, ora por lhes advir do contrato, ora por via de reconhecimento posterior pela Recorrida; 4 - Se houve cessão da posição contratual de arrendatário aos RR., válida e eficaz; e, 5 - Se a actuação da Autora configura abuso de direito. Às questões referidas, o R. C acrescenta a de saber: 6 - Se há falta de jurisdição ou competência do juiz que proferiu a sentença e suas consequências. Das conclusões do R. B constam mais duas: 7 - Se deve...

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