Acórdão nº 03B659 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Setembro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução25 de Setembro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça RELATÓRIOInstaurada pelo "Banco A" execução para pagamento de quantia certa, com processo na forma ordinária, inicialmente no Tribunal Cível do Porto, depois a prosseguir termos pelo Tribunal Judicial de Águeda, contra B e mulher C, vieram estes deduzir embargos de executado, que pretendem procedentes, alegando fundamentalmente que o documento dado à execução teve apenas em vista interromper os prazos prescricionais dos direitos cambiários emergentes da subscrição de livranças, não constituindo, só por si, título executivo. Após contestação, na qual o embargado reafirma a exequibilidade do documento dado à execução, foi proferido despacho saneador/sentença, onde, considerando-se não constituir o documento em causa título executivo, bem como prescrita a acção cambiária, se julgaram os embargos procedentes e extinta a execução. Inconformado recorreu o banco embargado, com êxito, porquanto o Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdão de 1 de Outubro de 2002, concedeu provimento ao agravo (era apelação), julgando os embargos improcedentes com o consequente prosseguimento da execução. Interpuseram, então, os embargantes recurso de revista, pugnando pela revogação do acórdão recorrido e por que se julguem procedentes os embargos deduzidos, com todas as demais consequências legais. Contra-alegando defende o recorrido a manutenção do julgado. Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.CONCLUSÕESOs recorrentes findaram as respectivas alegações formulando as conclusões seguintes (e é, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. As disposições contidas nos artigos 46º a 51º do Código do Processo Civil que atribuem natureza de título executivo e força executiva a determinados documentos não revestem natureza meramente adjectiva ou processual, mas natureza substantiva, não obstante se encontrarem integradas no Código do Processo Civil, pelo que a natureza de título executivo ou não, a atribuição ou não de força executiva a um documento tem que reger-se pela lei vigente à data da subscrição do documento. 2. Em 8 de Abril de 1985, data da subscrição do documento junto como doc. nº 1 com a petição inicial da execução embargada como constituindo título executivo que lhe serve de base, os escritos particulares que, não sendo letras, livranças ou cheques, contivessem obrigação de pagamento de quantias determinadas só constituíam título executivo se a assinatura do devedor estivesse reconhecida por notário, devendo este reconhecimento ser presencial se o montante em causa exceder a alçada do tribunal da comarca até à entrada em vigor da nova redacção dada ao artigo 51º do Código do Processo Civil pelo Dec.lei nº 242/85, de 9 de Julho, altura em que este montante passou a ser o que exceda a alçada da Relação. 3. A nova redacção dada aos artigos 46º a 55º do Código do Processo Civil pelo Dec.lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro, com a redacção que lhe foi dada pelo Dec.lei nº 180/96 de 15 de Setembro, que entrou em vigor em 1 de Janeiro de 1997, é inaplicável aos documentos subscritos na vigência da redacção anterior daqueles preceitos legais, pelo que, mesmo que porventura o doc. nº 1 contivesse a obrigação de pagamento de quantia determinada, jamais o mesmo constituiria título executivo por isso se ter que aferir pela lei em vigor à data da sua subscrição (08/04/1985). 4. O documento em causa foi subscrito pelos executados/embargantes apenas enquanto avalistas das livranças nele discriminadas e após a subscrição do mesmo documento pela subscritora das livranças, "D - Mobiliário Metálico, L.da". 5. No referido documento não é assumida a obrigação do pagamento de qualquer quantia autónoma da obrigação de pagamento dos montantes das livranças nele discriminadas, antes nele se declarando apenas reconhecer a obrigação de pagamento dos montantes das livranças para além do prazo prescricional destas que, conforme o disposto nos artigos 70º e 71º da LULL e 325º do Código Civil, se considera por ele interrompido. 6. Com a declaração feita naquele documento os seus subscritores, entre os quais se encontram os executados ora recorrentes, "consideram interrompido, conforme o disposto nos artigos 70º e 71º da LULL e 325º do Código Civil, o prazo prescricional legal da obrigação de pagar as ditas livranças já vencidas e abaixo discriminadas, renunciando a todo o prazo ou direito que possa limitar, restringir ou anular os direitos desse banco decorrentes do mesmo título de crédito". 7. No citado documento os ora recorrentes não reconhecem uma obrigação pecuniária concreta com autonomia face às livranças, já que não se obrigam a pagar ou reconhecem a obrigação de pagar uma quantia certa e determinada diversa daquelas que estavam obrigados a pagar por força das livranças, mas apenas se limitam a reconhecer a obrigação de pagar ao exequente as livranças que nela discriminam, e esclarecem que o fazem para interrupção do prazo prescricional legal dos direitos decorrentes daquelas livranças. 8. Não há, por isso, qualquer autonomia daquele documento face às livranças nele discriminadas, nem há nele a assunção de qualquer obrigação pecuniária concreta autónoma das obrigações pecuniárias emergentes das ditas livranças, mas nele apenas se faz o reconhecimento das obrigações pecuniárias decorrentes ou emergentes das livranças para além do seu prazo prescricional e para efeitos da interrupção deste por efeito desse reconhecimento. 9. O único direito de crédito do exequente contra os ora executados, que são meros avalistas das livranças de que o exequente era portador e nessa qualidade de avalistas subscritores do documento interruptor do prazo de prescrição das livranças, é tão só o direito emergente das livranças, direito esse que é o único cuja existência é reconhecida pelos executados no documento que serve de base à presente execução e com cuja subscrição apenas se iniciou um novo prazo prescricional daquele direito e não emergiu qualquer novo direito de crédito distinto e autónomo dos decorrentes das livranças. 10. O acórdão recorrido, pelo facto de considerar de aplicação imediata as alterações de fundo da natureza dos títulos executivos introduzidos após a subscrição do documento que serve de base à execução, limitou-se a apreciar se o dito documento reveste ou não as características de título executivo à luz do disposto na redacção actual do artigo 46º do CPC, e nem sequer se debruçou, nem apreciou a questão suscitada pelos ora recorrentes nas suas alegações da não autonomia do documento que serviu de base à execução em relação às livranças nele mencionadas e da consequente não existência de qualquer direito de crédito do exequente sobre os executados autónomo e distinto dos direitos de crédito emergentes das livranças cuja existência emergisse ou decorresse daquele documento. 11. Incorreu, assim, o acórdão recorrido em omissão de pronúncia sobre uma questão suscitada pelos ora recorrentes e, por via disso, na nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 668º do CPC, por remissão do disposto no artigo 716º do mesmo Código. 12. E esse único direito de crédito do exequente sobre os executados, que é o emergente das livranças, não obstante a subscrição do documento interruptor da prescrição que serve de base à presente execução, encontra-se prescrito, pelo menos, desde pelo menos 01/01/90, como se refere doutamente na douta sentença da 1ª instância, pelo que tal documento jamais poderia servir de base a uma execução autónoma das que foram já instaurados pelo exequente com base nas livranças (execução nº 3397/86 da 1ª Secção do 2º Juízo de Águeda e nº 323/97 do 3º Juízo de Águeda). 13. Para além disso, o acórdão recorrido violou o disposto nos artigos 70º, 71º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, 12º, 236º e 325º do Código Civil e 46º, al. e) e 51º (este na redacção anterior à vigente) do CPC.MATÉRIA DE FACTOEncontra-se adquirida no processo a seguinte matéria fáctica: i) - o exequente é portador legítimo de uma declaração subscrita pelos executados em 09/04/85 e dirigida àquele, com o seguinte teor: "Com vista a evitar que V. Exas. promovam remessa a tribunal das livranças já vencidas e abaixo discriminadas, que se encontram em vosso poder por não terem sido liquidadas, vimos por este meio reconhecer formalmente a obrigação de pagar as ditas livranças e o direito que a V. Exas. assiste de as accionar fora do prazo prescricional legal, que para todos os efeitos consideramos interrompido, conforme o disposto nos arts. 70º e 71º da LULL e 325º do CC, renunciando também, por este meio, a todo o prazo que possa limitar, restringir ou anular os direitos desse Banco decorrentes dos mesmos títulos de crédito" (segue-se uma relação de 12 livranças subscritas por D e avalizadas pelos executados, com os respectivos valores e datas de vencimento, que se encontra a fls. 6 da execução apensa); ii) - essa relação é a seguinte: livrança de 1.750.000$00, vencida em 30/08/82; livrança de 1.000.000$00, vencida em 30/08/82; livrança de 1.200.000$00, vencida em 30/08/82; livrança de 300.000$00, vencida em 15/09/82; livrança de 2.000.000$00, vencida em 30/10/82; livrança de 133.000$00, vencida em 02/11/82; livrança de 140.000$00, vencida em 26/11/82; livrança de 300.000$00, vencida em 15/12/82; livrança de 133.000$00, vencida em 02/02/83; livrança de 140.000$00, vencida em 26/02/83; livrança de 300.000$00, vencida em 15/03/83; livrança de 134.000$00, vencida em 02/05/83; iii) - o requerimento executivo dos autos apensos deu entrada no tribunal, no dia 09/11/99 e os executados foram citados em 07/01/2000 (marido) e 14/03/2000 (mulher); iv) - as livranças supra aludidas já serviram de título à execução ordinária nº 3397/86, da 1ª secção, 2º juízo, deste tribunal, em que o exequente e os executados destes autos também o eram naqueles, instaurada em...

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