Acórdão nº 03P4187 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Outubro de 2003 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA GUIMARÃES
Data da Resolução16 de Outubro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1- Os acórdãos (recorrido e fundamento) em causa: O identificado A veio interpor recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, do Acórdão proferido, em 9 de Julho de 2002, pelo Tribunal da Relação de Lisboa (e transitado em julgado), no âmbito do processo 10.580/01, da 5ª Secção daquela Relação. Nesse aresto, considerou-se e decidiu-se o que passamos a certificar (cfr. Fls. 17 a 38): Acordam em conferência, os Juízes da Secção Criminal (5ª) do Tribunal da Relação de Lisboa:I1- "A" veio apresentar em 18.05.99, contra B e mulher C, e D e marido E por entender que praticaram determinados factos que consubstanciam o típico ínsito no artº. 348º, nº. 2 do Código Penal (C.P.), ou seja, o crime de desobediência qualificada e 391º do Código de Processo Civil (C.P.C.). Mais requereu a sua constituição como assistente. 2- Procedeu-se a inquérito tendo o denunciante sido admitido a intervir como assistente, por despacho judicial de 11.02.00. 3- Por despacho de 11.01.01, foi ordenado o arquivamento dos autos, nos termos do disposto no artº. 277º, nº. 2 do C.P.P., por falta de indícios suficientes da prática pelos arguidos do denunciado delito. 4- A veio requerer a abertura de instrução, solicitando a realização de determinadas inquirições, e pugnando pela pronúncia dos arguidos pelo crime de desobediência qualificada. 5- Declarada aberta a instrução foram realizadas diligências, procedendo-se a debate instrutório, tendo em 20 de Junho de 2001 sido lida a decisão instrutória que entendeu: - que o assistente carecia de legitimidade para ter sido constituído como tal, pelo que lhe era vedado requerer a abertura de instrução; - que os factos alegados na queixa traduzem-se para além de prática de um crime de desobediência, na prática de um eventual crime de dano ou de usurpação de imóvel. - E quanto a estes dois crimes não se pronuncia qualquer dos arguidos uma vez que o assistente ao ter intentado acção cível, renunciou nos termos do disposto no artº. 72º do C.P.P., à queixa pelo que se impõe a não pronúncia aliás já objecto de despacho de arquivamento do Ministério Público de 21.01.99. 6- Inconformado veio A interpor recurso desta decisão apresentando as seguintes conclusões de recurso (transcrição): 1º- O Recorrente foi admitido a intervir como Assistente no processo constituindo-se como tal quanto ao crime de desobediência qualificada. 2º- Tal foi assim pelo facto de na denúncia que deu casa ao presente processo apenas terem sido trazidos pelo Recorrente factos susceptíveis de serem enquadrados no tipo de crime de desobediência qualificada, sendo esse o crime identificado em tal denúncia. 3º- A admissão do Recorrente como Assistente pelo Meritíssimo Juiz a quo obteve o assentimento expresso do Digníssimo Procurador Adjunto do MP. 4º- O Meritíssimo Juiz do tribunal a quo que admitiu a abertura da instrução admitiu, também expressamente o Recorrente como Assistente quanto ao crime denunciado de desobediência qualificada. 5º- O Meritíssimo Juiz do tribunal a quo admitiu ainda implicitamente o recorrente a intervir nos autos como assistente, quando lhe deferiu a reclamação apresentada a fls. ... do despacho que inicialmente indeferiu parte das diligências requeridas na instrução. 6º- Admitiu ainda o Recorrente como Assistente quando lhe permite intervir no interrogatório das testemunhas apresentadas, bem como quando o admitiu a intervir na discussão da produção de prova no debate instrutório e inclusive requerer outras provas. 7º- Proferiu assim o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo despacho de admissão da instrução e do próprio Recorrente como Assistente que transitou em julgado. 8º- O trânsito em julgado de tal despacho obteve a força de caso julgado formal, com alcance a toda a fase do processo penal em que se insere. 9º- Assim o afirma o acórdão Relação de Lisboa de 1 de Outubro de 1997, publicado na CJ, tomo IV, página 147, cujo sumário é o seguinte: "A decisão que admita o assistente tem o valor de caso julgado formal subordinado à condição "rebus sic stantibus", ou seja, alterado o objecto da lide por efeito de acusação, se a relação processual de quem, até então interviera como assistente for afectada, a sua posição processual, deve ser reapreciada em conformidade com a nova situação", "... a decisão que admitiu o assistente tem valor de caso julgado formal subordinado à condição "rebus sic stantibus". Ou seja, alterado o objecto da lide com a acusação, e a relação processual de quem interviera até então como assistente for afectada, deve ser reapreciada em conformidade com a nova situação a sua posição processual". 10º- Logo, não podia o Meritíssimo Juiz a quo ter voltado a apreciar uma questão já por si apreciada, muito menos visando alterar o sentido de tal decisão. 11º- Tal acto do Meritíssimo Juiz a quo é nulo por ofender a regra da decisão com força de caso julgado formal. 12º- Com o prosseguimento da fase da instrução no presente processo foi possível ao tribunal a quo obter indícios suficientes da prática de factos susceptíveis de serem configurados pela lei como crimes, senão mesmo foi possível descobrir a verdade material dos factos. 13º- Daí que, ainda que tivesse considerado o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo que não havia caso julgado do despacho que tinha admitido o Recorrente como Assistente, devia o tribunal ter pronunciado os Arguidos uma vez que tinha sido descoberta a verdade dos factos. 14º- Recorrente apresentou queixa nos finais de 1998 quanto a factos susceptíveis de enquadrarem o crime de dano e de usurpação de imóvel pp nos artigos 212º, 213º e 215º do CP. 15º- Os factos denunciados nessa queixa que correu seus termos junto do Ministério Público do Tribunal Judicial de Mafra sob o nº. 289/98.3GDMFR-A foram praticados antes da entrada em tribunal dessa queixa, bem como da providência cautelar não especificada para que os Arguidos se abstivessem de causar danos ao Recorrente. 16º- Os factos que integraram a denúncia do crime de desobediência que está na base deste processo foram praticados após a decretação e notificação aos Arguidos da providência supra referida. 17º- Na sequência da decretação da providência cautelar foi o Recorrente legalmente obrigado a propor a respectiva acção principal, nos termos do artigo 389º do C.P.C.. 18º- Essa acção civil foi proposta ainda antes da prática pelos Arguidos dos factos que danificaram o património do Recorrente e que levaram à denúncia que está na base do presente processo. 19º- Tais factos encontram-se em parte confessados pelos Arguidos nos autos de declarações do inquérito. 20º- Tais factos constam dos depoimentos das testemunhas que foram ouvidas na fase da instrução. 21º- Assim não podia nem o Digníssimo Procurador Adjunto do MP, nem o Meritíssimo Juiz a quo considerar que com a proposição da acção principal, desistiu o Recorrente do seu direito de queixa quanto ao crime de dano e usurpação de imóvel. 22º- Tal argumento não serve nem para sustentar a desistência da queixa que deu azo ao processo crime com o nº. 289/98.3GDMFR-A, nem quanto aos factos praticados posteriormente à decretação da providência. 23º- No primeiro caso porque o Recorrente propôs a acção no cumprimento de um dever legal - obrigação - não propôs essa acção previamente à apresentação da queixa, nem o pretendeu fazer com intenção de desistir do procedimento criminal. 24º- A interpretação que se faça do nº. 2 do artigo 72º do CPP em sentido contrário ao supra referido, de modo a abranger na sua previsão a desistência de queixa por efeito de proposição de uma acção civil em consequência da decretação de uma providência cautelar é inconstitucional por ofensa do acesso ao direito do Recorrente, artigo 20º da CRP. 25º- Relativamente aos factos praticados pelos Arguidos posteriormente à decretação da providência cautelar, não pode considerar-se que tenha havido desistência de queixa por efeito da proposição da acção civil (instância principal) uma vez que a acção foi proposta antes da ocorrência de tais factos pelo que não foram os mesmos nela contemplados. 26º- Querendo ser coerente, a decisão do Meritíssimo Juiz do tribunal a quo, com a posição que tomou face aos factos denunciados pelo Recorrente, devia o mesmo ter pronunciado os Arguidos quanto aos crimes de dano e usurpação de imóvel atendendo por um lado, ao testemunho que recebeu dos factos que lhe podiam subsumir e por outro ao facto de considerar que a decisão de arquivamento tomada pelo MP não faz caso julgado formal (estando numa fase processual distinta - inquérito/instrução). 27º- Mas, muito mais longe poderia ter ido o tribunal a quo, é que se considerava o Meritíssimo Juiz a quo que estavam alegados factos na denúncia e queixa do Recorrente que se podiam levar à pronúncia pelo crime de dano, tal só podia ser pelo crime de dano qualificado, atento o valor elevado do património destruído, veja-se o artigo 17º da denúncia apresentada em 18 de Maio de 1999. 28º- Sendo esse um crime de natureza pública não dependia de queixa, não podendo o respectivo processo ser arquivado pelo MP com base no argumento da desistência de queixa. 29º- O facto de um crime ser de natureza pública por não depender de queixa ou de acusação particular, não implica que o interesse tutelado seja obrigatoriamente um interesse público. 30º- A revaloração de um ilícito de público para semi-público, não é mais do que uma mudança de gradação na sua valoração e não uma mudança qualitativa e substancial do crime, que até mantém a sua previsão igual, não devendo assim relacionar-se obrigatoriamente crime público com interesse público directo. 31º- Na providência cautelar decretada, em que os requeridos foram obrigados a não praticarem quaisquer actos de qualquer natureza que causassem ou provocassem danos na propriedade dos requerentes, o interesse tutelado é o interesse do particular violado no seu direito de propriedade, o qual é vítima do facto ilícito no caso concreto, ao qual não basta a...

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