Acórdão nº 00514/08.4BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelDr
Data da Resolução01 de Outubro de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO M…, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Penafiel, datada de 07.09.2009, que julgou totalmente improcedente a acção administrativa especial pela mesma movida contra MINISTÉRIO DAS FINANÇAS E DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA e o absolveu dos pedidos.

Formula a recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 69 e segs.

- paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

1 - O caso «sub judice» consubstancia um pedido de aposentação voluntária antecipada, deduzido pela recorrente no ano de 2003, ao abrigo do disposto no artigo 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei 116/85, de 19 de Abril, assente no facto da mesma possuir, à data da formulação do atinente requerimento, 36 anos de serviço e não se verificar qualquer inconveniente para o serviço.

2 - Não obstante o carácter discricionário que caracteriza a apreciação do requisito «não se verificar qualquer inconveniente para o serviço», o decisor administrativo não pode prescindir da avaliação da situação funcional da recorrente, designadamente, da categoria profissional que a recorrente possui, da actividade que desenvolve no Serviço da Repartição de Finanças de Penafiel, onde se encontra integrada e das necessidades de recursos humanos que aquela Repartição ou, mesmo, a respectiva Direcção Distrital, enfrentam no seu labor diário e, neste preciso enquadramento, de que forma ou em que medida é que a aposentação da recorrente é susceptível de causar prejuízo a essa Repartição de Finanças ou à respectiva Direcção Distrital.

3 - Desvinculação Administrativa e discricionariedade não significam desvinculação perante o Direito.

4 - Nestes domínios, a respectiva actividade é materialmente e funcionalmente jurídica: visa aplicação do direito ao caso concreto, na procura da melhor solução orientada pelo fim da norma e regulada por uma racionalidade jurídica, em obediência aos Princípios da Legalidade, da Igualdade, da Imparcialidade, da Proporcionalidade, da Justiça e da Boa Fé e tendo em consideração dos Direitos, Liberdades e Garantias dos cidadãos administrados.

5 - Representando o exercício da discricionariedade um raciocínio a partir da situação concreta para as opções de actuação legalmente conferidas e um teste de adequação da actuação concretamente escolhida em relação aos traços da situação concreta seleccionados como relevantes à luz do interesse publico prosseguido, é curial que importa averiguar se, no caso concreto, existem circunstâncias que imponham diferente ponderação dos interesses envolvidos, o que implica sempre a formulação de juízos de prognose, ou seja, estimativas acerca da evolução futura de situações de vida.

6 - A decisão de indeferimento do pedido de aposentação da recorrente, assenta única e exclusivamente numa minuta ou informação estereotipada, tipo formula «passe-partout», que foi justamente elaborada pela Direcção de Serviços de Gestão dos Recursos Humanos da DGCI, para integrar a totalidade de processos de aposentação idênticos ao da recorrente.

7 - Nessa decisão, a situação profissional concreta da recorrente, o funcionamento dos serviços da Repartição de Finanças de Santo Tirso e as atinentes necessidades no que tange a recursos humanos, são totalmente descurados, o que vale dizer que, para a recorrida e para o Tribunal «a quo», o estado de carência de inspectores tributários, de meros funcionários ou auxiliares administrativos, se situam no mesmo patamar, não cumprindo qualquer distinção entre ambos e que essas necessidades sejam sentidas da mesma maneira e acuidade, a nível local ou regional, ou seja, tudo se passa da mesma forma, na Repartição de Finanças de Boticas, na Repartição de Finanças de Castro Verde, na Repartição de Finanças da Ilha do Pico ou no 3.º Bairro Fiscal de Lisboa, o que é lógico que não acontece, à luz das mais elementares regras de experiência.

8 - A auto-limitação ou auto-vinculação não é ilegal, desde que a administração não prescinda da apreciação casuística ou da ponderação específica das situações, assim continuando a gozar da faculdade de deferir ou indeferir total ou parcialmente os pedidos face às circunstâncias concretas de cada caso.

9 - Não se discute a legitimidade e competência da Exmo. Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais para proferir aquela decisão final de indeferimento da pretensão da recorrente; o que se questiona, como se disse e se repete, é que essa decisão prescinda por completo concreta situação funcional da recorrente, como funcionária dos Serviços de Finanças de Santo Tirso e sem arrimo numa decisão do seu imediato superior hierárquico, que não se opôs ao pedido formulado pela recorrente ou qualquer outra entidade conhecedora da situação concreta da mesma e daqueles serviços.

10 - O aludido Decreto-Lei 116/85, de 19 de Abril tem por objectivo permitir o descongestionamento selectivo da administração pública e o rejuvenescimento dos seus quadros, na linha, aliás, do Decreto-Lei n.º 41/84, de 3 de Fevereiro.

11 - A aceitar-se o entendimento propugnado pela recorrida e aceite na sentença recorrida, estaríamos em condições de permitir ao Ministério das Finanças, a seu belo prazer e sem dar cavaco a ninguém - passe a expressão -, esvaziar o conteúdo de um Decreto-Lei ou, pelo menos, a sua efectividade prática, uma vez que define «a priori», de uma forma abstracta e universal para todos os funcionários que integram o quadro do seu pessoal, a existência de prejuízo para o serviço, face a qualquer pedido de aposentação que lhe seja endereçado neste termos, 12 - Diríamos, mesmo, como que revogando tacitamente uma Lei em sentido material, ao tornar impossível a sua aplicação prática, como se viu, abrindo as portas à enunciação de meros juízos conclusivos ou de valor, sem precisar qualquer facto real e concreto referente à situação individual em abordagem e, neste tipo de casos, sem a enunciação a factualidade de onde se extraia a conclusão de que a aposentação da recorrente, é susceptível e em que medida de causar prejuízo aos respectivos serviços.

13 - Encontram-se preenchidos, «in casu», os dois requisitos de que a Lei faz depender o deferimento do pedido de aposentação à recorrente, ou seja, da mesma possuir, à data da formulação do atinente requerimento, 36 anos de serviço e não se verificar qualquer inconveniente para o serviço, pelo a presente acção não poderia deixar de proceder, como se pede e se espera.

Ao tomar nada disso em consideração, a decisão recorrida violou, entre outros, o disposto no artigo 266.º, n.º2 da Constituição da Republica Portuguesa, artigo 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei 116/85, de 19 de Abril, artigos 3.º, 4.º do Código de Procedimento Administrativo e artigo 9.º do Código Civil. Daí que tenha de ser substituída por outra que julgue procedente a presente acção, com as devidas e legais consequências …”.

O R., aqui recorrido, apresentou contra-alegações (cfr. fls. 86 e segs.

), nas quais pugna pela manutenção do julgado sem, todavia, haver formulado conclusões.

O Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA veio apresentar parecer/pronúncia no sentido da total improcedência do recurso jurisdicional (cfr. fls. 96 a 98), parecer esse que objecto de contraditório mereceu resposta discordante da A. (cfr. fls. 101 e segs.

).

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objecto do recurso se ache delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A todos do CPC “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA, o tribunal de recurso em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a sentença recorrida, porquanto ainda que declare nula a sentença decide “sempre o objecto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se na situação vertente a decisão judicial recorrida ao julgar totalmente improcedente a acção administrativa especial o fez com incorrecta interpretação e aplicação do art. 01.º, n.º 1 do DL n.º 116/85, de 19.04, 266.º, n.º 2 da CRP, 03.º e 04.º do CPA e 09.º do CC [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

  2. FUNDAMENTOS 3.1.

    DE FACTO Da decisão recorrida resultaram provados os seguintes factos: I) Em 02.09.2003, a A. solicitou a sua aposentação «ao abrigo do DL n.º 116/85, de 19/04» (cfr. fls. 08 e 09 dos autos); II) Em 13.02.2007, na Direcção de Serviços de Gestão dos Recursos Humanos da DGCI foi elaborada a Informação n.º 30/07, com o seguinte teor (por excertos): «… 5. Em 08.02.07 … foi remetida a esta Direcção de Serviços a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel para que se procedesse à execução do Acórdão que ordena ao Departamento onde a funcionária prestava serviço que informe o processo de aposentação, designadamente quanto à inexistência de prejuízo para o serviço sem aplicação dos critérios e requisitos do Despacho n.º 867/03/MEF, submetendo-o depois a despacho do membro do Governo competente.

  3. O DL n.º 116/85, de 19/04, estabelecia que os funcionários e agentes, independentemente da carreira em que estavam integrados, podiam aposentar-se com direito à pensão completa, sem necessidade de apresentação à Junta Médica e desde que não houvesse prejuízo para o serviço, qualquer que fosse a sua idade, quando reunissem 36 anos de serviço.

  4. No âmbito de aplicação deste diploma, a...

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