Acórdão nº 048495 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Dezembro de 1996 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelLOPES ROCHA
Data da Resolução18 de Dezembro de 1996
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1 - Na 3. Vara Criminal do Círculo do Porto responderam: - A, casado, subinspector da Polícia Judiciária, natural de Freixo de Numão, Vila Nova de Foz Coa, residente em Vila Nova de Gaia; - B, solteiro, agente da mesma Polícia, natural de Coimbra e residente no, Porto; - C, casado, também agente da mesma Polícia, natural de Miragaia e residente em, São Mamede Infesta; e - D, casado, igualmente agente daquela Polícia, natural de Lourosa e residente em São João de Ver - Feira, acusados pelo Ministério Público da prática, em co-autoria, de um crime de sequestro previsto e punido no artigo 160, n. 2, alíneas b) e g) do Código Penal. Pelo acórdão de 28 de Abril de 1995 (folhas 293 - 314 dos autos) foi a acusação julgada improcedente, por não provada e, consequentemente absolvidos os arguidos. Não se conformaram com a decisão o Ministério Público e o assistente E. Motivando o seu recurso disse o Ministério Público em conclusão: 1.1. O Tribunal a quo interpretou mal o artigo 17, n. 2, do Código Penal, ao entender que o erro sobre a legalidade da conduta dos arguidos não lhes era censurável. 1.2. Verifica-se, assim, a existência do elemento intelectual do dolo necessário a que se refere o artigo 14, n. 2, do mesmo Código e é elevado o grau de ilicitude, olhando às agressões físicas praticadas na pessoa do ofendido e ao bem jurídico violado, a liberdade ambulatória deste. 1.3. Os arguidos primários, com bom comportamento anterior e posterior à prática das infracções, tem prestado bom serviço à sua corporação. 1.4. A medida da pena, tendo em conta todas as circunstâncias indicadas e previstas no artigo 72 do Código Penal, deve ser fixada no mínimo. 1.5. Olhando à personalidade dos agentes e demais circunstâncias previstas no artigo 48, n. 2, do Código Penal, deve a pena de cada um ser suspensa pelo prazo de 2 anos. 1.6. Os arguidos, como resulta do que foi dito, devem ser condenados pela prática do crime de sequestro previsto e punido pelo artigo 16, n. 2, alíneas b) e g) na pena já indicada, 2 anos, suspensa por igual período de tempo. 1.7. Absolvendo e não condenando os arguidos nos termos expostos, o Tribunal violou o disposto no artigo 17, n. 2, 14, n. 2 e artigo 160, n. 2, alíneas b) e g), todos do Código Penal. E concluiu, como segue, a sua motivação o assistente: 1.8. Os arguidos sabiam bem que não sendo o Assistente suspeito de crime algum, não o poderiam levar contra a sua vontade, agredindo-o fisicamente e detendo-o, privando-o da sua liberdade de se determinar. 1.9. Sabiam ainda bem que a sua conduta era ilícita, mas quiseram exibir o seu poder e, sabendo que privavam o Assistente da sua liberdade e ofendiam a sua integridade física, admitiram tais resultados como consequência da sua acção. 1.10. Ao absolver os arguidos, o douto Acórdão recorrido violou as normas dos artigos 14/2, 16/1 e 17/1, todos do Código Penal. 1.11. E feriu os mais elementares sentimentos de justiça dos cidadãos. 1.12. Por outro lado, ao sustentar a decisão em depoimento não sujeito ao contraditório, violou a norma do artigo 348/4 do Código de Processo Penal, com as legais consequências. 1.13. Os factos provados consubstanciam todos os elementos típicos, objectivos e subjectivos, do crime de sequestro de que os arguidos vinham acusados. 1.14. Tipo-de-ilícito que os arguidos praticaram em co-autoria e com dolo necessário, ferindo a liberdade de determinação do ofendido e a sua integridade física. 2 - Responderam os arguidos pela forma seguinte: 2.1. O C, em conclusão: 2.1.1. Dão-se por verificados todos os pressupostos que levaram à tomada da decisão recorrida, com os quais se concorda em absoluto, termos em que deve ser confirmada. 2.2. O A, o B e o D: 2.2.1. Dados os factos provados e não provados tanto basta para considerar correcta a absolvição quanto ao crime de sequestro cuja prática lhes fora imputada e, correlativamente, para opinar a certeza da denegação de provimento aos recursos em causa. 3 - Admitidos os recursos, sucessivamente pelos despachos de folhas 324 e 339 dos autos, subiram a este Supremo Tribunal onde foi dada vista ao Ministério Público, nos termos do artigo 416 do Código de Processo Penal, pronunciando-se a Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta pela inexistência de circunstâncias que obstem ao conhecimento dos recursos. Efectuou-se o exame preliminar, no qual se verificou serem eles os próprios, interpostos e motivados em tempo, recebidos no efeito e com o regime de subida adequados e a ausência de circunstâncias obstaculizantes do seu conhecimento, bem como a legitimidade dos recorrentes, seguindo-se os vistos legais. Realizada a audiência, cumpre apreciar e decidir. 4 - Como é jurisprudência uniforme e pacífica deste Supremo, o âmbito do recurso penal é dado pelas conclusões da motivação do recorrente, sem prejuízo do conhecimento oficioso de vícios ou nulidades insanáveis (Cfr., por todos e por último, neste sentido, o acórdão de 10 de Julho de 1996, proferido no Processo n. 48657). Deste modo, as questões litigiosas a decidir, emergente das referidas conclusões, são as seguintes: 1. Foi a decisão recorrida fundada em depoimento não sujeito ao contraditório, com violação do disposto no artigo 348 do Código de Processo Penal, com as legais consequências? (Este meio de impugnação foi deduzido unicamente pelo Assistente). 2. Ao entender que o erro sobre a legalidade da conduta dos arguidos não lhes era censurável violou o acórdão recorrido, por erro de interpretação, o artigo 17, n. 2, do Código Penal? 3. Em caso de resposta afirmativa à questão anterior e, por terem agido com dolo necessário, devem eles ser condenados como co-autores de um crime de sequestro previsto e punido pelo artigo 160, n. 2, alíneas b) e g), do mesmo Código? 4. Consequentemente, a pena a aplicar deve fixar-se em 2 anos de prisão, todavia suspensa na sua execução pelo período de 2 anos, ponderadas as circunstâncias provadas em seu favor? 5. É a seguinte a matéria de facto considerada provada no acórdão impugnado: 5.1. No dia 18 de Janeiro de 1992, por volta das 22 horas, os arguidos encontravam-se no Restaurante ... em Vila Nova de Gaia, por ordem de um seu superior hierárquico, a fim de ali contactarem F, arguido num processo em investigação nos Serviços da P.J. em ... . 5.2. Aí acabaram por ter conhecimento pela queixosa daquele processo que o aqui ofendido E, devidamente identificado a folha 8, tinha conhecimento dos factos ali em investigação. 5.3. Por esse facto abordaram o ofendido ao qual convidaram a acompanhá-los e a entrar no carro daquela Polícia que se encontrava junto ao referido restaurante, para ser levado às mencionadas instalações, a fim de ali prestar declarações como testemunha. 5.4. O ofendido ofereceu resistência, e já na rua antes de entrar para aquela viatura foi agredido a soco e pontapé e à força agarrado pelos braços, foi introduzido contra a sua vontade na viatura da Polícia Judiciária, que ali se encontrava. 5.5. Ainda contra a sua vontade, foi levado para as instalações da P.J. em ..., e aí esteve detido durante algum tempo, onde depois foi ouvido como testemunha naquele processo, ainda nessa noite. 5.6. Os arguidos agiram voluntariamente. 5.7. Os factos descritos nos autos foram desencadeados pela G num telefonema que esta fez para o arguido C, a qual pedia a este que fossem retiradas umas fotografias que o F possuía e que haviam sido tiradas à G, quando esta se encontrava semi-nua no quarto da sua casa, numa altura em que ela e o F viviam maritalmente. 5.8. O processo que atrás se falou e no qual era arguido o F, é o que corresponde ao n. 243.230/91 da 2. Secção da 1. Brigada da P.J., que estava a cargo do arguido C e no qual era queixosa a G. 5.9. O auto de denúncia encontra-se junto aos autos a folhas 12 e 13, cujo teor se dá por reproduzido para os devidos efeitos. 5.10. O F pretenderia, para melhor se perceber o circunstancialismo que rodeou os factos em análise, fazer chantagem com a G, usando as ditas fotografias, como forma de a pressionar para ambos voltarem a viver maritalmente, após terem rompido tal relacionamento. 5.11. A presença dos arguidos e da G no dia, hora e local a que se reportam os factos destes autos, foi uma estratégia montada por estes para apanhar o F. 5.12. Os arguidos não conheciam fisicamente o F. 5.13. A diligência para encontrar o F foi ordenada pelo Senhor Inspector H. 5.14. O ofendido E acompanhava o F ao mencionado restaurante, e ambos desconheciam a existência de agentes da P.J., ora arguidos, naquele local. 5.15. No dia 18 de Janeiro de 1992 era um sábado e havia baile no restaurante ... . 5.16. Na mesa do citado restaurante reservada em nome do F, estava sentada a G. 5.17. Quando aqueles chegaram, estranharam ver a G sentada na mesa que haviam reservado, pelo que o F não se sentou e dirigiu-se ao bar do restaurante. 5.18. Nessa altura a G levantou-se da mesa onde estava sentada (a reservada ao ofendido E e F, e dirigiu-se ao local onde se encontrava o F, com o objectivo de identificar este aos arguidos. 5.19. O E, ofendido nestes autos, ficou sózinho na mesa, sem saber o que se estava a passar com a G e com o F, pois não os conseguia ver. 5.20. Nessa altura o G foi levado para o exterior do restaurante pelos arguidos e metido, algemado, no carro da P.J. 5.21. O arguido, rectius, o ofendido já conhecia a G dos bailes e ainda pelo facto de esta ter vivido maritalmente, durante algum tempo, com o seu amigo F. 5.22. Pouco depois, o ofendido viu a G que se dirigia à mesa onde este se encontrava, para ali buscar um casaco, e perguntou-lhe pelo F, tendo esta respondido: "Vai ver, o teu amigo está a ser levado pela P.J.". 5.23. O ofendido levantou-se da mesa e dirigiu-se ao carro da P.J. onde se encontrava o F e começou a fazer perguntas aos arguidos sobre o assunto, para perceber a razão pela qual o F estava a ser detido. 5.24. Nessa altura, um dos arguidos perguntou à G que já estava no local, se o...

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