Acórdão nº 048590 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Dezembro de 1995
Magistrado Responsável | CASTRO RIBEIRO |
Data da Resolução | 13 de Dezembro de 1995 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. No Tribunal de Círculo de Bragança, em processo comum, e mediante acusação e pedido cível deduzidos pelo Digno Magistrado do Ministério Público, respondeu A, por lhe ser atribuída a autoria de um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido pelo artigo 21 n. 1 do Decreto-Lei n. 15/93, de outro de homicídio qualificado na forma tentada previsto e punido pelos artigos 131, 132 ns. 1 e 2 alíneas h) e i), 22, 23 e 74 n. 1 alínea a) do Código Penal (na redacção anterior ao Decreto-Lei 48/95, e de que serão os demais indicados sem diversa origem), e ainda do crime de detenção de arma proibida previsto e punido pelo artigo 260, e lhe ser exigida uma indemnização de 131190 escudos com juros, a pagar ao Estado, em ressarcimento de prejuízos patrimoniais resultantes daquela tentativa de homicídio e de que saiu vítima o agente da P.S.P B. 2. Na sua oportuna contestação e ao referir-se à prova o arguido indicou como testemunhas, além de outras, o "subscritor do despacho de folha 16", o "subscritor do despacho de folha 105" e "C, intendente da P.S.P.", e como peritos, o "Dr. D, Director do I.M.L. do Porto, a inquirir por carta precatória", "E, id. folha 133" e "Perito de Lofoscopia da P.J. de Chaves (folha 159)". Em douto despacho de folha 224, o Meritíssimo Juiz decidiu quanto às referenciadas provas: não admitiu, como testemunhas os indicados subscritores dos despachos de folhas 16 e 105, por serem Dignos Delegados do Procurador da República que intervieram nos autos a título exclusivamente profissional, dirigindo a investigação e deduzindo a acusação; no concernente à testemunha C, que é o Comandante da P.S.P. em Bragança, remeteu para a audiência a decisão sobre se existe ou não algum obstáculo a que preste depoimento; e quanto ao Director do I.M.L. do Porto e peritos da P.J. (ditos E e o de Lofoscopia), por não virem indicados os factos sobre que haviam de depor, indeferiu o requerido; por último, e entendendo que "a matéria atinente ao indeferimento, maxime, a requerida audição dos Dignos Delegados do Procurador da República, corporiza incidente anómalo, estranho ao normal desenvolvimento da lide", decidiu o Sr. Juiz condenar o arguido na multa de 2 UCs. Notificado desse despacho, o arguido A veio indicar os factos sobre que deveria depor o Dr D e insistiu pela expedição da deprecada, o que foi deferido em folha 228 (e concretizado em folha 282); e do mesmo despacho interpôs recurso, em folha 232, cuja motivação e em suma concluiu assim: os Senhores Delegados arrolados como testemunhas, não serão chamados a decidir, mas a pronunciarem-se, sem poder de decisão, sobre factos concretos; não pode ser declarado impedido de depor como testemunha um elemento do M.P. que não tenha pessoal e previamente requerido tal impedimento, justificando as razões do mesmo; nessa parte, violou a decisão recorrida os artigos 40 e 54 do Código de Processo Penal (C.P.P.); não pode tomar-se uma decisão no processo, sem a fundamentar de facto e de direito; ao não se ter feito tal, quanto à audição do Comandante da P.S.P., violou a decisão o artigo 97 n. 4 do Código de Processo Penal; não tem a parte que indicar, previamente, a matéria sobre a qual hão-de depor os peritos arrolados e que serão, normalmente, ouvidos em audiência de julgamento; violou-se o artigo 318 do Código de Processo Penal; não é conduta anómala o exercício de um direito, tendo sido violados os artigos 32 da CRP, 523 do Código de Processo Penal e 208 n. 1 alínea b) do C.C.J.; assim, deve ser determinado, não só que os Senhores Delegados prestem depoimento, como testemunhas, como que o mesmo aconteça com o Sr. Comandante da P.S.P., devendo ainda determinar-se que os peritos constantes dos ns. 2, 3 e 4 de folha 222 sejam notificados para estarem presentes à audiência de julgamento. Respondeu o Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público, a pugnar pela sem razão do recorrente. 3. Tendo-se decidido que o predito recurso apenas subiria com o que viesse a ser interposto da decisão final (cfr. douto acórdão de folhas 32 e seguintes, do apenso), prosseguiram os autos seus regulares termos para julgamento. Feito este e proferido o acórdão de folhas 308 e seguintes, aí decidiu o Colectivo, na inteira procedência da acusação e do pedido civil, condenar o arguido como segue: a) por autoria dos referidos crimes de: - tráfico de estupefacientes, em 7 anos de prisão, - homicídio qualificado na forma tentada, em 8 anos de prisão, - e de detenção de arma proibida, em 1 ano de prisão; - em cúmulo jurídico dessas três penas parcelares, na pena unitária de 14 (catorze) anos de prisão; b) a pagar ao Estado - Comando Distrital da P.S.P. em Bragança, a quantia indemnizatória de 131190 escudos acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa legal; c) ainda nas adequadas tributações. Mais uma vez inconformado, desse acórdão interpôs recurso o arguido Agostinho; ao motivá-lo e em suma, concluiu: existe uma questão prévia à análise do acórdão, que impedirá, na sua procedência, à ponderação deste; os factos articulados, na matéria apurada e no que ao homicídio concerne, não são subsumíveis ao crime qualificado, mas simples; as penas concretas, visto o disposto no artigo 72, deveriam ser fixadas, respectivamente, em 5,5 e meio ano, e o cúmulo jurídico, face ao artigo 78, em pena nunca superior a sete anos; a decisão recorrida violou os artigos 72 e 78, pelo que deve ser revogada nos termos sobreditos. Respondeu o Ilustre Magistrado do Ministério Público no sentido de que o recurso não merece provimento. Subidos os autos a este Supremo Tribunal e colhidos os vistos, teve lugar a audiência em que se observou o adequado formalismo. Cumpre decidir. 4. Por evidente razão de ordem lógica, começaremos por apreciar o primeiro dos interpostos recursos, na medida em que a sua eventual procedência poderia prejudicar o conhecimento do segundo; e dizemos, poderia, dado que, numa genérica apreciação das diversas questões suscitadas pelo recorrente, na sua discordância quanto ao douto despacho de folha 224, desde já se adianta não podermos conceder-lhe razão. 5. Arrolou o arguido, como suas testemunhas de defesa, os subscritores dos despachos proferidos em folhas 16 e 105, que ele próprio reconhece serem Dignos Delegados do Procurador da República; aliás, o segundo deles foi quem mandou deduzir a acusação e pedido civil de folhas 196 verso e seguintes, sendo que ambos intervieram activamente na fase de inquérito (cfr. artigos 262 e seguintes do Código de Processo Penal). Ora, salvo o merecido respeito, a indicação desses dois Magistrados como testemunhas de defesa, sem mais - nomeadamente sem prévio requerimento visando obter o impedimento deles, como M.P. no processo (cfr. artigos 54, 41 n. 2 e 39 n. 1 alínea d) do Código de Processo Penal) - afigura-se-nos absurda, por isso que era susceptível provocar a caricata e aberrante situação hipotizada na douta resposta à motivação do recurso em apreço: em audiência de julgamento, com intervenção de algum daqueles Magistrados a representar o M.P., teríamos que ele se repartiria, por um lado, na sua veste profissional e da sua bancada, a inquirir as testemunhas e assumindo as demais obrigações do cargo, e por outro, como testemunha, ele próprio, a descer à respectiva cadeira como vulgar cidadão para aí depor, pela defesa, contra a acusação que, funcionalmente e ainda que segundo critérios de objectividade, lhe competia sustentar no julgamento! Claro que não faz qualquer sentido, pretender o recorrente que aos Dignos Delegados competiria requererem, previamente, um suposto seu impedimento de deporem como testemunhas, com base nos invocados artigos 40 e 45 do Código de Processo Penal; o que eles podiam, era declarar o seu impedimento de exercerem funções do M.P. no...
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