Acórdão nº 04B1291 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 2004 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução06 de Maio de 2004
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" e mulher B intentaram, no Tribunal Judicial de Braga, acção declarativa, com processo ordinário, contra C, D e E, pedindo que seja declarado nulo o contrato celebrado entre autores e réus e estes condenados a devolver aos autores, nos termos do art. 289º do Código Civil, a quantia de 1.500.000$00, acrescida de juros legais, contados desde 29/12/97, que se cifram em 551.050$00, assim como os juros que se vencerem até integral pagamento; e que sejam ainda os réus condenados a pagar-lhes a quantia de 1.500.000$00, a título de mais valias e benfeitorias feitas na casa daqueles, acrescida de juros à taxa de 7% ao ano contados desde a citação e até integral e efectivo pagamento. Alegaram, para tanto, essencialmente que: - em 29/12/97, autores e réus assinaram um documento a que denominaram de contrato promessa de compra e venda, nos termos do qual os réus declararam ser donos e legítimos possuidores de uma fracção autónoma "E", correspondente a uma habitação do tipo T4, com uma arrecadação na cave para arrumos, do prédio em regime de propriedade horizontal, sito na Rua Magalhães Lima, nº ..., em Braga, mais declarando prometer vender aos autores (ou a quem estes indicassem, até 15 dias antes da escritura), a referida fracção, tendo os autores declarado prometer comprá-la, pelo preço de 11.000.000$00; - acontece que o denominado contrato promessa não tem as assinaturas reconhecidas, nem certificação da licença de utilização ou de construção, o que implica a sua nulidade; - fizeram benfeitorias no imóvel em causa, designadamente repararam fendas nos tectos e paredes, com respectiva pintura, repararam todos os estores e substituíram as respectivas correias, substituíram todos os interruptores e tomadas, reparando previamente toda a instalação eléctrica que estava em curto-circuito, emassaram, poliram e envernizaram de novo as madeiras das portas e rodapés e ainda substituíram alguns mosaicos e azulejos partidos, benfeitorias essas com o valor de 500.000$00, que beneficiaram o imóvel em valor superior a 1.000.000$00. Contestaram os réus, deduzindo defesa por impugnação e invocando a excepção do caso julgado, alegando que a questão relativa ao pedido de benfeitorias foi já decidido em acção intentada naquele tribunal, por sentença que já não admite recurso ordinário, existindo entre ambas as acções a tríplice identidade de sujeitos, pedido e causa de pedir. E em reconvenção pediram a condenação dos autores a entregar-lhes os objectos retirados da fracção ou a proceder ao seu pagamento, no montante de 500.000$00. Foi proferido despacho saneador em que: a) - se julgou inadmissível a reconvenção, que não foi admitida; b) - se julgou e declarou verificada a existência da excepção dilatória do caso julgado quanto ao pedido de mais valias e benfeitorias na parte em que ele se fundamenta nas obras referidas nos artigos 27º a 30º da petição inicial, e, em consequência, se absolveu, quanto a ele, e nessa parte, os réus da instância; c) - conhecendo-se, parcialmente, do mérito da causa, julgou-se improcedente a acção quanto ao pedido formulado no ponto primeiro do inicial petitório (pedido de declaração de nulidade do contrato celebrado entre autores e réus e condenação destes a pagarem aos autores a quantia de 1.500.000$00, acrescida de juros legais contados desde 29/12/97) e, em consequência, dele se absolveu os réus. Da decisão, na parte em que decidiu do caso julgado e conheceu parcialmente do mérito da causa, recorreram os autores, tendo o recurso sido recebido como de agravo no respeitante ao caso julgado e de apelação quanto ao demais. Conhecendo dos recursos, o Tribunal da Relação de Guimarães, em acórdão de 24 de Setembro de 2003, julgou improcedentes o agravo e a apelação, confirmando as decisões recorridas. Interpuseram, desta feita, os mesmos autores recurso de revista, pretendendo a revogação do acórdão recorrido, julgando-se a acção procedente por provada no que toca à declaração de nulidade do contrato promessa de compra e venda incluso nos autos, e julgado procedente o agravo devendo a acção baixar à 1ª Instância para julgamento da questão das benfeitorias. Em contra-alegações defenderam os recorridos a confirmação do acórdão impugnado. Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, colhidos os vistos legais, cumpre decidir. Os recorrentes findaram as respectivas alegações formulando as conclusões seguintes (e é, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar no âmbito do recurso - arts. 690º, nº. 1 e 684º, nº. 3, do C.Proc.Civil): 1. Os recorrentes pediram a declaração de nulidade do contrato promessa de compra e venda em virtude de no mesmo se não encontrar certificada a licença de utilização, nos termos do art. 410º, nº. 3, do Código Civil. 2. Para sanar o vício os recorridos vieram juntar aos autos um documento a que chamaram Licença de Utilização cuja fotocópia foi emitida pela Câmara Municipal de Braga, e que os recorrentes em devido tempo impugnaram dizendo tratar-se de um documento falso, ou no mínimo, nulo, por não estar preenchido nem assinado pelo Presidente da Câmara. 3. No Acórdão da Relação ora recorrido fez-se constar que a fracção dispunha de Licença de Utilização e que os apelantes nas alegações tinham alegado uma questão nova, o que, salvo o devido respeito, os recorrentes não entendem. 4. O facto, só por si, de o documento não ter sido emitido pelo Presidente da Câmara, ou por outrem por delegação de poderes deste, torna o documento no mínimo nulo, como se alegou (e, mesmo, inexistente), já que o órgão previsto na lei para emitir a Licença de Utilização, não é a Câmara Municipal, mas o seu Presidente. 5. Assim, tanto a decisão de 1ª Instância, como a do Tribunal da Relação violam o disposto no art. 26º do Dec. lei nº. 445/91 de 20/11 e no art. 26º do Dec. lei nº. 250/94 de 15/10, pelo que, não se encontrando sanado o vício do contrato promessa, este deve ser declarado nulo. 6. Considerou o acórdão da Relação que, quanto à falta do reconhecimento presencial das assinaturas, o contrato não devia ser declarado nulo, porque tal pedido dos autores seria um abuso de direito, na medida em que no mesmo se fez inserir uma cláusula em que os outorgantes prescindiam do reconhecimento notarial das assinaturas, em virtude de o contrato ter sido assinado na sua presença, e que renunciavam à invocação desse facto. 7. Alegaram os autores em recurso que a sentença de 1ª Instância apreciou erradamente o teor e alcance de tal cláusula, já que aí não consta que renunciavam à invocação da nulidade prevista no art. 410º, nº. 3, mas à invocação de tal facto - que as assinaturas tinham sido feitas na sua presença. 8. O Acórdão ora recorrido, salvo o devido respeito, esquecendo este argumento, considera que não estão em causa, neste aspecto, interesses de ordem pública, pelo que deveria funcionar o instituto do abuso de direito, impedindo a declaração de nulidade. 9. Consideram os recorrentes que, por terem subscrito o contrato, apesar do constante nessa cláusula, isso apenas lhes imputa uma parte diminuta da culpa, na medida em que alegaram que foram os recorridos que arranjaram quem fizesse o contrato, o que estes não impugnaram. 10. Por tais motivos, logo em 1ª instância alegaram os autores que o teor e alcance da cláusula apenas permitia imputar culpas a todos os outorgantes e que a única consequência seria que, por as culpas se neutralizarem, todos poderiam pedir a nulidade do contrato. 11. Consideram os recorrentes que a norma prevista no art. 410º, nº. 3, é de ordem pública de protecção ou ordem pública social e que com os requisitos formais nela exigidos o legislador teve em vista proteger os promitentes-compradores, considerando estes a parte mais débil, e a ponderação das partes sobre a precisão e proficiência das suas declarações negociais. 12. Consideram ainda os recorrentes que a figura do abuso de direito apenas pode ser invocada quando não estiverem em causa interesses de ordem pública, e, mesmo que assim se não entendesse, sempre em casos excepcionais em que quem pretendesse afastar a declaração de nulidade, neste caso os recorridos, sempre teria de alegar e provar cumulativamente os seguintes requisitos: 1 - terem os recorridos confiado que adquiriram uma posição jurídica pelo negócio; 2 - que a declaração de nulidade lhes provocariam danos vultosos, irreversíveis e irremovíveis através de outros meios jurídicos; 3 - poder a situação ser...

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