Acórdão nº 05B2470 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Setembro de 2005 (caso NULL)
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 22 de Setembro de 2005 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I "A" intentou, no dia 29 de Dezembro de 2000, contra B -Companhia de Seguros SA, acção declarativa de condenação, com processo ordinário, pedindo a sua condenação a pagar-lhe 18.404.331$00 e juros moratórios à taxa legal desde a citação, por danos patrimoniais e não patrimoniais, e, quanto aos ainda não determináveis, o que viesse a liquidar-se ulteriormente, invocando lesões sofridas no acidente de viação ocorrido no dia 31 de Março de 1999 na Parada de Todeia, Parede, com o veículo automóvel matriculado sob o nº JJ, conduzido por C, a este imputável, e no contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel celebrado entre a última e D, Ldª.
A ré, contestação, afirmou desconhecer os danos invocados pelo autor e a sua extensão, aceitou a sua responsabilidade quanto aos danos patrimoniais, mas acrescentou ter-lhe pago os salários até à alta clínica, que a sua incapacidade permanente só foi de 9,75% e que ele já recebeu a quantia de 999.403$00 pela perda de capacidade de ganho em processo de acidente de trabalho e nada mais ter a receber em razão dela O autor afirmou na réplica poder reclamar indemnização superior à atribuída no âmbito do processo de acidentes de trabalho, por não haver duplicação da indemnização pelo mesmo dano.
Ampliou o pedido por duas vezes e foi-lhe concedido o apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
Realizado o julgamento, no âmbito do qual se aditou, por acordo das partes, um facto aos já assentes, foi proferida sentença no dia 1 de Julho de 2004, por via da qual a ré foi condenada a pagar ao autor € 107.620,25 e juros moratórios à taxa legal desde a citação, bem como, com o limite de € 32.584, a liquidar ulteriormente, o montante que viesse a despender ou que deixasse de auferir em virtude da realização de cirurgia plástica destinada à correcção das cicatrizes resultantes das lesões sofridas no acidente em análise e a compensação pelos danos não patrimoniais decorrentes dessa cirurgia.
Apelaram o autor e a ré, e a Relação, por acórdão proferido no dia 15 de Fevereiro de 2005, negou provimento ao recurso interposto pelo primeiro e julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela última, fixando em € 66.620,25 o montante que ela devia pagar por danos patrimoniais e não patrimoniais e juros à taxa legal desde a data do acórdão, mantendo no mais o decidido na sentença proferida pelo tribunal de 1ª instância.
Interpuseram o autor e a ré recursos de revista, a última subordinadamente, tendo o primeiro formulado, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - na fórmula matemática do cálculo devem ser considerados a data do evento - não a data da cura clínica - a idade superior de vida activa, a vida física para além daquela a progressão do recorrente na carreira, e fixar-se a indemnização por perda de capacidade de ganho no montante € 65.000; - considerando a gravidade dos danos não patrimoniais sofridos pelo recorrente e a censura ético-jurídica na base da obrigação de indemnizar, devem ser avaliados no montante de € 55.000; - não basta afirmar a actualização da compensação pelo dano não patrimonial para que deva ser considerada, e os juros moratórios relativos a indemnização por danos patrimoniais são devidos desde a data da citação; - o acórdão recorrido, ao decidir como decidiu, violou os artigos 496º, nº 2, 562º, e 496º, nº 3, 566º, nº 2 e 805º, nº 2, alínea b), do Código Civil.
B - Companhia de Seguros SA formulou, por seu turno, no recurso de revista que interpôs, em síntese, as seguintes conclusões de alegação: - a indemnização de € 35.000 relativa à incapacidade genérica configura-se como elevada, porque não ocorre em relação ao recorrido a diminuição da sua capacidade de ganho nem do seu vencimento, pelo que a mesma não deve ser superior a € 28.000; - tendo em conta o período de recuperação do recorrente e a epilepsia que lhe adveio, a compensação de € 30.000 por danos não patrimoniais é exagerada, devendo reduzir-se para o montante de € 25.000; - o acórdão recorrido infringiu os artigos 342º, nº 1, 483º, nº 1, 564º e 566º, nº 3, do Código Civil e 659º e 660º, nº 2, do Código de Processo Civil.
Respondeu B - Companhia de Seguros SA no recurso interposto por A, em síntese de alegação: - para evitar a indemnização em duplicado, o cálculo da indemnização pela perda futura de ganho deve operar no momento da alta clínica do recorrente, porque até aí foi ressarcido pela perda salarial no período de doença; - o limite da vida activa do recorrente é aos 65 anos, começando a partir daí a receber pensão de reforma, sem perda patrimonial, não podendo exigir indemnização baseada na sua esperança de vida; - a compensação por danos não patrimoniais não deve ser fixada em mais de € 25.000, que o recorrente pediu a esse título; - a Relação procedeu correctamente ao actualizar as indemnizações e ao adoptar a doutrina do acórdão de uniformização de jurisprudência nº 4/2002.
II É a seguinte a factualidade declarada provada no acórdão recorrido: 1. Representantes da ré e de D, Ldª declararam por escrito consubstanciado na apólice nº 505511228, em data anterior a 31 de Março de 1999, assumir a primeira, mediante prémio a pagar pela última, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros com o veículo automóvel matriculado sob o nº JJ.
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Antes do evento abaixo indicado o autor, nascido no dia 14 de Abril de 1981, era saudável, forte e robusto, dinâmico, com alegria de viver e gosto e apetência pela prática desportiva, jogando futebol com os amigos e competindo em torneios organizados, e nunca havia sofrido qualquer acidente ou enfermidade.
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No dia 31 de Março de 1999, pelas 15.40 horas, na Estrada A 4, na freguesia de Parada de Todeia, Paredes, sentido Paredes-Penafiel, conduzia C o veículo ligeiro de mercadorias com a matrícula nº JJ, pertencente a D, Ldª, transportando a seu lado o autor, ambos empregados daquela sociedade, desempenhando para ela a função de técnicos de manutenção.
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A via apresentava, no local mencionado sob 3, traçado rectilíneo com inclinação, a faixa de rodagem tinha a largura de 7,20 metros, avistando-se a faixa de rodagem em toda a sua largura numa extensão superior a 200 metros, e o seu piso era alcatroado e estava limpo e seco.
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Fernando Silva conduzia a viatura mencionada sob 3 no exercício da sua profissão, à ordem, com conhecimento e autorização, por conta, no interesse e sob a direcção de D, Ldª por um itinerário que esta previamente havia determinado.
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Imediatamente à frente do veículo mencionado sob 3 circulava o veículo pesado de mercadorias matriculado sob o nº QS pertencente a E, conduzido por F.
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Fernando Silva manobrou a viatura que conduzia para a sua esquerda a fim de efectuar a manobra de ultrapassagem ao veículo pesado de mercadorias mencionado sob 6 em momento em que se encontrava na faixa de rodagem esquerda uma viatura em manobra de ultrapassagem.
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Ao aperceber-se de tal facto, Fernando Silva travou e perdeu o controlo da viatura que conduzia, o que fez com que ela embatesse com a sua parte frontal direita na traseira esquerda do veículo de mercadorias mencionado sob 6 que circulava na via da direita.
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No referido embate, a roupa que o autor vestia ficou inutilizada, e após o mesmo foi transportado de ambulância para o hospital Padre Américo de Vale do Sousa, em Penafiel, apresentando uma ferida corto-contusa frontal com aparente afundamento frontal, onde lhe foram prestados os primeiros socorros, ministradas injecções e feita a lavagem cirúrgica às suas feridas e escoriações.
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Dada a gravidade do estado do autor, foi transferido para o Hospital de S. João, no Porto, onde foi internado nos serviços de cuidados intensivos, aí se mantendo durante 14 dias - até 13 de Abril de 1999 - onde foi ali sujeito a anestesias gerais, a injecções e a exames radiológicos e TACs e a lavagem cirúrgica às feridas e escoriações sofridas.
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Durante o internamento referido sob 10, esteve o autor profundamente sedado, retido no leito, ausente de qualquer sensibilidade, absolutamente inconsciente, alimentado através de sondas, e fazendo as suas necessidades para uma fralda.
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Já tinha tudo combinado para festejar o seu aniversário, no dia 14 de Abril de 1999, com convites feitos e bolos encomendados, e passou esse dia sedado.
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Durante esse período, porque o autor sofreu hemorragia subaracnodeia e contusão hemorrágica frontal direita, os líquidos hemorrágicos depositaram-se-lhe nos pulmões e na cabeça, pelo que tiveram de lhe ser aplicados drenos na parte superior da cabeça, para os retirar, havendo necessidade de lhe rapar parcialmente o cabelo e efectuar um corte.
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Devido à extracção de líquidos hemorrágicos dos pulmões, através da aposição de drenos, o autor não conseguia comunicar através da fala, só o conseguindo através de gestos.
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No dia 13 de Abril de 1999, foi o autor transferido para o serviço de neurologia e neurocirurgia do Hospital de S. João, no Porto, em virtude do traumatismo craniano que sofreu, data em que retomou a consciência, sentindo tonturas, mal estar, dores e ausência de forças para se movimentar, mantendo-se acamado...
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