Acórdão nº 05B2578 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Outubro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelARAÚJO BARROS
Data da Resolução20 de Outubro de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" e mulher B intentaram, no Tribunal Judicial do Cartaxo, acção ordinária contra C e mulher D, pedindo que seja declarado como integrando o domínio público do Município de Azambuja a parcela respeitante ao antigo troço de estrada municipal identificada na petição.

Alegaram, para tanto e em síntese, que: - são donos de dois prédios urbanos que adquiriram por compra, e que os réus, por sua vez, também são donos de um outro prédio rústico, de sorte que tanto os prédios dos autores, como o prédio rústico dos réus confinam com um antigo troço da Estrada Municipal que liga a Póvoa de Manique à sede da freguesia de Vila Nova de S. Pedro; - o autor marido requereu à Câmara Municipal de Azambuja licença para abrir uma porta no seu prédio, a qual daria para o dito troço da estrada, por se afigurar que, especialmente na época das vindimas, existe necessidade de melhorar os acessos ao prédio, tendo em vista a serventia para carga e descarga das uvas dos tractores, que vão levar os cachos colhidos às instalações da adega; - o pedido da licença foi reprovado, por deliberação camarária, com o fundamento da ausência de autorização dos réus para a abertura de tal porta, com fundamento de que a dita parcela de terreno respeitante àquele troço da antiga estrada passou a integrar o prédio dos réus; - os autores não aceitam tal alegação camarária, pois entendem que tal troço se mantém como integrando o domínio público do Município da Azambuja, pois permite o acesso aos prédios dos autores e de outro, encontra-se parcialmente asfaltado e sempre foi utilizado, mormente nas vindimas, quer pelos autores, quer pelos anteriores proprietários para a eles acederem, possuindo leito próprio, demarcado no solo, com 75 m de comprimento e 7 de largura, sendo ladeado por postes de suporte de electricidade, etc.; - não obstante a Câmara de Azambuja referir em parecer subscrito pelo Chefe de Divisão que tal troço deixou de ser estrada, há muitos anos, nenhuma deliberação camarária foi invocada como fundamento do alegado acto translativo de propriedade, designadamente desafectando-a do domínio público municipal e não tendo havido tal acto administrativo de desafectação, nem tendo os réus praticado actos susceptíveis de o integrar no respectivo domínio, a parcela de terreno está integrado no domínio público do Município de Azambuja; - sendo de considerar o seu interesse em agir, já tal se reflecte na relação jurídica concreta, qual seja a dos autores obterem a competente licença administrativa para a abertura da porta no seu prédio.

Os réus contestaram, defendendo-se por excepção e por impugnação, começando, em primeiro lugar por invocar a ilegitimidade activa dos autores, pois estes pedem que o Tribunal declare como integrando o domínio público do Município de Azambuja a referida parcela de terreno, quando o Município referido nem sequer é parte na acção e, por conseguinte, nada reivindica para o seu domínio.

Louvam-se, para tanto, no Acórdão da Relação do Porto de 19/01/82, que sentenciou no sentido de que os particulares não têm legitimidade para, em nome individual, pedir a declaração da pública dominialidade de um caminho e, além do mais, invocam uma permuta havida entre eles, ora réus, e a Câmara Municipal da Azambuja, que teria consistido em, atendendo ao traçado pretendido para a construção da nova estrada, o Município ter precisado de terreno para tal construção, pelo que propôs aos ora réus a permuta de um terreno pertencente ao antigo troço da estrada municipal e ainda outro pedaço de terreno, em troca do que cederam, facto que ocorreu verbalmente há mais de 45 anos, pelo que os réus têm estado na posse do referido terreno, publica e pacificamente.

Findos os articulados, foi proferido saneador-sentença em que foi julgada improcedente a excepção da ilegitimidade activa e, considerando estar-se perante o exercício de uma acção popular, o Tribunal a quo entendeu faltar o requisito previsto no art. 369º, nº 3, do Código Administrativo, que dispõe que as acções referidas nesse artigo só podem ser intentadas quando o corpo administrativo as não tiver proposto nos três meses posteriores à entrega de uma exposição circunstanciada acerca do direito que se pretende fazer valer e dos meios probatórios que se dispõe para o tornar efectivo. E, em face de tal falta, julgou improcedente a acção e absolveu os réus do pedido.

Inconformados com tal decisão, apelaram os réus, sem êxito embora porquanto o Tribunal da Relação de Évora, em acórdão de 3 de Março de 2005, julgou improcedente a apelação, confirmando, se bem que por razões diferentes, a sentença recorrida.

Interpuseram, então, os réus recurso de revista, pugnando pela anulação do acórdão recorrido e pela procedência da acção, ou, em alternativa, pela baixa dos autos a fim de serem supridas as nulidades processuais cometidas.

Em contra-alegações defenderam os recorridos a bondade do julgado.

Verificados os pressupostos de validade e de regularidade da instância, corridos os vistos, cumpre decidir.

Nas alegações do recurso formularam os recorrentes as seguintes conclusões (sendo, em princípio, pelo seu teor que se delimitam as questões a apreciar - arts. 690º, nº 1 e 684º, nº 3, do C.Proc.Civil): 1. Prevê a LAP no seu art. 1º, n° 2, a defesa do domínio público autárquico por banda dos particulares.

  1. A acção popular cível é meio idóneo para providenciar à tutela do referido interesse, pois esta tanto comporta a defesa dos interesses difusos, como ainda dos chamados interesses individuais homogéneos.

  2. Porquanto esta confere aos cidadãos um alargamento da legitimidade activa, a qual é independente da sua relação com o bem ou interesse especifico na causa.

  3. Por conseguinte, o facto dos autores terem interesse pessoal e directo na declaração de integração da parcela de terreno, respeitante ao troço de estrada municipal, no domínio público autárquico, não descarta o recurso a essa especial providência.

  4. A desafectação de troço de estrada municipal, por haver a mesma mudado de leito, não significa tácito abandono do mesmo, e que assim possa ser apropriado por particular.

  5. O referido acto pressupõe a existência de acto administrativo expresso que reconheça tal desafectação, mesmo que tácita, a fim de operar a transferência do domínio público para o privado da pessoa colectiva pública, sob pena de saírem frustradas as regras que tornam insusceptível de serem usucapidas as coisas públicas.

  6. Sendo nulo o acto proferido pelo Sr. Presidente da Câmara alegadamente recognitivo da não integração do citado troço no domínio público da autarquia, porquanto tal declaração somente cabe ser efectuada pelos tribunais comuns.

  7. O accionamento da referida espécie não tem como seu pressuposto a necessidade de se suscitar perante a autarquia local competente de exposição circunstanciada e de aguardar o prazo de pronúncia sobre a mesma, como dispunha o revogado art. 369º do CA.

  8. Podendo a acção popular cível assumir qualquer das formas previstas no CPC, designadamente no seu art. 4º, onde se incluem as de simples apreciação.

  9. Por conseguinte, impunha-se a observância do especial regime contido no art. 15º da LAP sobre a citação dos titulares dos interesses por ela pretendidos tutelar, o que, a não ter sucedido, constitui vício que inquina de nulidade todo o processado - arts. 195°, al. a) e 202°, ambos do CPC.

  10. Por outro lado, o acórdão recorrido padece do vício de nulidade, porquanto conheceu de questões de que não podia conhecer, como é o da operada qualificação da acção instaurada pelos recorrentes como acção popular cível.

  11. Porquanto, tal questão foi a mesma objecto de apreciação no saneador-sentença, da qual...

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