Acórdão nº 05S1963 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Fevereiro de 2006

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 22 de Setembro de 2000, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, A intentou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra B, S. A., pedindo que se declare ilícito o seu despedimento e que a ré seja condenada a pagar-lhe: (i) todas as remunerações em atraso, designadamente o subsídio de pequeno-almoço e almoço, desde 6 de Abril até 4 de Agosto de 2000, inclusive, no montante de 1.500$00/dia, no valor total de 184.500$500; (ii) todas as remunerações que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença, no montante de 753.188$00 por mês, acrescidas de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal; (iii) a indemnização de 5.272.316$00, correspondente a sete anos de antiguidade, à razão de 753.188$00 por cada ano ou fracção de antiguidade, acrescida do que se verificar devido à data da sentença por acréscimo da antiguidade, caso venha a optar pela indemnização; (iv) juros de mora legais vencidos e vincendos.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, na parte relevante para o conhecimento do objecto do recurso, concluiu «pela existência de justa causa para o despedimento», julgando a acção improcedente e absolvendo a ré do pedido.

  1. Apelou, sem êxito, o autor que, em recurso de revista, pede que o despedimento seja considerado sem justa causa ao abrigo das seguintes conclusões: -O Tribunal da Relação considerou adequada a sanção de despedimento com justa causa [tendo] por fundamento a «chegada de um contentor de carne da Nova Zelândia antes da data prevista», o que implicaria a não execução do trabalho do autor de forma diligente e eficiente, não obstante a existência de um documento em que está escrito pelo Director-Geral, «Concordo com a proposta»; -Considerou-se, também, no acórdão recorrido que o recorrente no seu recurso invocou factos não alegados anteriormente, designadamente as conclusões referidas nas alíneas F), G), H), I), J), P), Q), R), S), T), AA) e AB) da apelação do recorrente, sendo que as mesmas assentam em documentos (e também em factos considerados provados, cf. AA) constantes dos autos, não constituindo matéria nova, como entendeu o Tribunal da Relação, pelo que deveriam ter sido devidamente valorados na decisão do tribunal recorrido; -Ao decidir desta forma o acórdão recorrido não fez justiça; - O acórdão recorrido viola os artigos 659.° e 668.° do Código de Processo Civil, aplicáveis aos acórdãos da Relação por força dos artigos 713.º, n.º 2, e 716.º do mesmo Código, que determinam a especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, de forma a conhecer-se o raciocínio cognoscitivo do julgador, e também não fez a subsunção dos factos provados ao regime jurídico aplicável ao caso; -O acórdão recorrido decidiu com violação da lei substantiva aplicável ao caso sub judice, já que o despedimento com justa causa implica que se verifique um comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho -é o que dispunha o então artigo 9.°, n.º 1, do DL n.º 64-A/89 de 27 de Fevereiro, actualmente regulado pelo artigo 396.º do Código do Trabalho; - Também, para que se verifique a impossibilidade da manutenção da relação de trabalho, deverá esta ser valorada perante o condicionalismo da empresa, e não ser objectivamente possível aplicar à conduta do trabalhador sanção menos grave.

    Em contra-alegações, a recorrida veio defender a confirmação do julgado.

    Neste Supremo Tribunal, a Ex.ma Procuradora-Geral-Adjunta pronunciou-se no sentido de ser negada a revista, parecer que, notificado às partes, não suscitou qualquer resposta.

  2. No caso vertente, sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da pertinente alegação (artigos 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), as questões suscitadas são as seguintes: -Nulidade do acórdão recorrido; -Existência ou não de justa causa para o despedimento do autor.

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

    II 1.

    O tribunal recorrido deu como provada a seguinte matéria de facto: 1) O autor foi admitido ao serviço da ré em 3 de Janeiro de 1994; 2) À data do despedimento tinha a categoria profissional de director de aprovisionamento; 3) Ultimamente auferia a quantia mensal ilíquida de 753.188$00, sendo 602.550$00 de salário mensal e 150.638$00, a título de isenção de horário de trabalho; 4) Acrescido de subsídio de refeição para pequeno-almoço e almoço, em espécie; 5) O autor auferiu prémios de produção; 6) A ré pagava ao autor um seguro de vida e de saúde; 7) Com base no despacho de 6 de Abril de 2000, foi decidido instaurar contra o autor um processo disciplinar, com intenção de proceder ao seu despedimento; 8) Na sequência da instauração do processo disciplinar, foi o autor suspenso preventivamente, em 6 de Abril de 2000; 9) Na mesma data, a ré emitiu faxes para todos os fornecedores nacionais e estrangeiros, comunicando que o arguido se encontrava suspenso; 10) No âmbito do desempenho das funções do autor na ré, como director de aprovisionamento e custos, não lhe foi feita por esta reparo/observação em relação ao seu desempenho profissional, até 1999; 11) A ré atribuiu ao autor, em 19 de Fevereiro de 1999, um prémio consistente em 210.000$00 para utilizar em viagens; 12) Em 16.2 e 20.2.2000, tal como nos anos anteriores, o autor deslocou-se à IFCA, em Nice, para em representação da ré, contactar fornecedores, na companhia do Presidente do Conselho de Administração e do Director de Produção; 13) Quando saiu da ré, em 6.4.2000, o autor dirigiu-se ao seu gabinete acompanhado de um segurança e do Dr. C, tendo-lhe sido retirado o cartão da empresa, o cartão do aeroporto e os cartões de visita profissionais; 14) O autor foi despedido pela ré nos termos da decisão final e relatório recebida pelo autor em 4 de Agosto de 2000; 15) Até 1995, o autor era responsável pelo armazém de matérias-primas; 16) Com carta datada de 8.8.2000, a ré remeteu ao autor um cheque no montante de 1.333.664$00, a título de pagamento de todas as retribuições vencidas até 4 de Agosto, conforme documento de fls. 339; 17) Os prémios de produção atribuídos pela ré ao autor estavam condicionados e dependentes do respectivo desempenho e produtividade demonstrados no exercício imediatamente anterior àquele em que os mesmos eram atribuídos; 18) Ao autor foi atribuído, por duas vezes, o prémio de produção; 19) A ré desenvolve a sua actividade na área de catering; 20) Fornece refeições e presta serviços no Aeroporto de Lisboa; 21) Detendo uma quota de mercado de cerca de 80%; 22) Sendo responsável por fornecer 19 das 31 companhias de aviação que operam no Aeroporto de Lisboa; 23) Servindo em média cerca de 12000 refeições diárias; 24) Em 29.3.2000, o Director de Produção, Sr. D, forneceu ao autor toda a informação necessária, especificando o tipo de refeições, número de pessoas, por respectivos menus, para elaborar a proposta a apresentar ao cliente TAP para o evento «TAP CHALLENGER 2000», a realizar-se em Campo Maior; 25) O autor efectuou o custeio de menus de um número de refeições, não considerando os números que constavam da informação do Director de Produção; 26) O autor no cálculo dos custos acrescentou 2%; 27) Percentagem usada pela ré para evitar a depreciação inflacionária para contratos de fornecimento; 28) Se não fosse detectada a aposição da percentagem de 2%, a proposta a apresentar à cliente seria mais elevada, num montante de 3.212.295$00; 29) É ao director-geral que compete definir o factor de inflação para cada cliente e o respectivo «Mark up» [factor de multiplicação]; 30) O autor, em 4.2.2000, elaborou o custeio dos doces «Yes» com uma tabela de preços que tinha reflectido um «Mark up» de 1,3 em vez do «Mark up» correcto de 2,5768 que lhe foi transmitido por instruções do director-geral em 28.10.99; 31) O erro a não ser detectado e rectificado [por lapso, escreveu-se ratificado] poderia ter provocado uma redução na facturação anual de 16.000 contos; 32) Detectado o erro, a ré enviou um fax ao cliente TAP a pedir desculpas e a solicitar a alteração da tabela de preços elaborada pelo autor; 33) Entre 3.3.2000 e 30.3.2000, foi retida...

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