Acórdão nº 05S2556 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Novembro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFERNANDES CADILHA
Data da Resolução29 de Novembro de 2005
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1. Relatório: "A" e B, com os sinais dos autos, intentaram separadamente acções emergentes de contrato de trabalho, que foram depois objecto de apensação, contra a C, Lda, em que peticionam o reconhecimento do direito de actualização anual do complemento do subsídio de reforma, bem como o pagamento das diferenças já vencidas relativamente aos anos de 1993 a 2001 e 1991 a 2000, respectivamente.

Alegaram que trabalharam sob as ordens e direcção da R. e que desde a sua passagem à situação de reforma não têm sido actualizado o complemento de reforma mensal em função da percentagem do aumento dos trabalhadores na R. no activo, diminuída de 1%, ao contrário do que era prática anterior reiterada da empresa, pelo menos há 10 anos consecutivos, invocando ainda que a actualização dos complementos de reforma constitui um verdadeiro uso da empresa que é fonte de direito, nos termos do artº 12º do DL 49408, pelo que estava vedado à R. alterar, de forma unilateral, esse regime.

Em 1ª instância, a acção foi julgada improcedente por se ter entendido que nas comunicações através das quais a R. regulou a atribuição dos complementos e as suas actualizações há uma manifestação expressa da vontade no sentido de proceder à actualização dos complementos apenas quando a sua situação económica o permitisse, pelo que não há que recorrer aos usos da empresa para fazer funcionar automaticamente a pretendida actualização.

Em apelação, o Tribunal da Relação confirmou a sentença recorrida e é contra esta decisão que os Autores se insurgem, mediante recurso de revista.

Na sua alegação, o Autor B, patrocinado pelo Exmo magistrado do Ministério Público, formulou as seguintes conclusões: 1.ª A Ré ao proceder à actualização do complemento de reforma atribuído ao ora recorrente, em nada violou as normas constantes, quer da lei, quer das portarias de regulamentação do trabalho, quer ainda das cláusulas das convenções colectivas.

  1. Nem a R., nem o recorrente, aquando da celebração entre eles do contrato individual de trabalho arredaram a possibilidade de se atender aos "usos" da primeira, quanto à actualização do complemento de reforma.

  2. Do mesmo modo, as partes não convencionaram que a partir de 1992, não se registaria qualquer actualização daquele complemento.

  3. A Ré desde 1978 a 1991 sempre procedeu à actualização do complemento de reforma atribuído aos seus ex-trabalhadores o que demonstra uma prática reiterada e consecutiva, por parte daquela, resultando unicamente dos usos a que alude o art. 12.º, n.º 2 da LCT.

  4. As tais actualizações tiveram lugar mesmo em anos em que a R. apresentou resultados negativos, designadamente, nos anos de 1980, 1981, 1983 e 1984.

  5. A Ré ao elaborar o "Estatuto do pensionista" expressamente reconhece (cap. I, n.º1) que o sistema de Segurança Social existente, de forma alguma dá uma resposta adequada aos seus Pensionistas, pelo que se justifica a manutenção, a título de complementaridade, das regalias sociais dos seus ex-trabalhadores.

  6. Nos termos do ponto n.º 2 daquele "Estatuto", e, dentro da mesma orientação, a Ré declarou que: "procurará ... dentro dos limites das suas capacidades financeiras, proceder à actualização das pensões ...".

  7. Ao manter hoje a atribuição dos complementos de reforma, a R. só o faz por continuar a entender que o sistema de Segurança Social se revela pouco eficaz.

  8. E esta razão é igualmente válida para a necessidade de manter a actualização daqueles complementos de reforma.

  9. No art. 18.º do "Plano de pensões de 1989", a R. estabelece a sua vontade de, no futuro, manter quer os complementos de reforma, quer as respectivas actualizações.

  10. A redacção dada ao art. 19.º do "Plano" atrás referenciado (Os montantes das pensões ... poderão ser periodicamente revistos se e na medida em que a situação da empresa o permitir) só pode ser interpretado no sentido de que essas revisões estarão sempre condicionadas ao limite inferior fixado no art. 18.º, Nunca no sentido de a Empresa não fazer actualização dos complementos, ainda que actualize as remunerações dos seus trabalhadores no activo.

  11. Existe um ex-trabalhador da R. relativamente ao qual tem sido feita actualização do complemento de reforma, conforme ordenado em decisão judicial.

O Autor A apresentou também alegação de revista sustentando nas conclusões do recurso, em suma, que a prática reiterada e ininterrupta da recorrida ao longo de treze anos, procedendo anual e sucessivamente à actualização dos complementos de reforma, gerou um uso da empresa conformador da relação laboral, constituindo fonte do direito do recorrente à actualização anual do mencionado complemento de reforma.

A Ré, ora recorrida, contra-alegou, suscitando as questões prévias da inadmissibilidade do recurso interposto pelo recorrente A, tendo em conta o valor da causa, e da inadmissibilidade da revista, neste caso, por se entender que, face ao disposto no artigo 721º, n.º 3, do Código de Processo Civil, a violação dos usos da empresa não constitui lei substantiva para efeito de constituir fundamento desse tipo de recurso. Quanto à matéria de fundo, defendeu a manutenção do julgado.

Colhidos os vistos dos Exmos juízes adjuntos, cumpre apreciar e decidir.

  1. Matéria de facto As instâncias consideraram provada a seguinte factualidade: 1) O Autor A trabalhou por conta, sob as ordens e direcção da R. e dos seus representantes desde 1 de Maio de 1972 até 1 de Fevereiro de 1992.

    2) E auferia ultimamente a remuneração mensal de 101.529$00.

    3) A Ré, desde a sua constituição em 21 de Junho de 1934, sempre teve por objecto social a produção e comercialização de malte, cerveja, refrigerantes, águas minerais e de mesa e outros produtos alimentares.

    4) O contrato de trabalho existente entre o Autor A e a Ré cessou em 1 de Fevereiro de 1992, em virtude da passagem do A. à situação de reformado por invalidez.

    5) Passando também e desde então a auferir da R. um complemento de reforma mensal, que lhe é pago através do Fundo de Pensões Central, no montante de 24.410$00.

    6) A Ré, a título de complemento de reforma, começou a pagar ao Autor A, desde Fevereiro de 1992, o valor mensal de 24.410$00, 13 meses/ ano.

    7) Desde Fevereiro de 1992 até à presente data, que a R. vem pagando ao Autor aquele valor mensal de 24.410$00, sem ter procedido posteriormente a qualquer actualização.

    8) O Autor B trabalhou por conta e sob as ordens, direcção e fiscalização da R. desde 1962.

    9) Este A. exercia inicialmente as funções de operário e posteriormente de empregado de escritório no serviço de contabilidade da R., com o nível SV 006-nível 6, a que corresponde a remuneração base de 65.450$00.

    10) O Conselho de Administração da R., em reunião extraordinária realizada em 01 de Abril de 1968, aprovou o primeiro "Regulamento de Pessoal" interno que nela vigorou, o qual foi publicado sob a forma de brochura, conhecida como o "livro amarelo".

    11) No ponto 9.6.1.dispunha "Reformas - A Empresa poderá conceder reformas ao pessoal de todas as categorias com um mínimo de 10 anos de casa de bom e comprovado serviço e com incapacidade física ou mental para o trabalho, comprovada pelos seus serviços médicos, pela aplicação da seguinte fórmula: 9.6.1.1. - sempre que o beneficiário receber da Caixa de Previdência qualquer subsídio de reforma a empresa garantirá o diferencial segundo a fórmula 9.6.1.

    9.6.1.2. - Os subsídios de reforma só serão pagos depois de cumpridas as seguintes formalidades: 1) Elaboração, pela Direcção de Pessoal, dum relatório com base em: a) documentos dos Serviços Médicos da Empresa e das Caixas de Previdência respectivas, quando as houver, comprovativos da incapacidade para o trabalho; b) relatório da Assistente Social da Empresa; c) análise, através do Cadastro, da aplicação e dedicação ao trabalho durante o tempo ao serviço da Empresa.

    2) Em cima do relatório referido em 1), aprovação e fixação do montante da reforma pelo Conselho de Administração para o Pessoal com a categoria de Chefe de Secção, equivalente ou superior, e pela Direcção de Pessoal para o restante Pessoal.

    12) A fórmula então adoptada foi a seguinte: S=VxNx0,80, 30 sendo S = subsídio de reforma, V = o vencimento da altura da reforma, e N = o número de anos de serviço, até ao máximo de 30.

    13) Quer a atribuição da pensão, quer do complemento, não constituíam um efeito automático da passagem à reforma, nem a fixação do respectivo valor dependia apenas da aplicação da mencionada fórmula. A atribuição e o valor estavam dependentes do resultado de uma apreciação casuística e discricionária.

    14) No início dos anos 70 e até 1974, generalizou-se no seio da R. a atribuição do complemento do subsídio de reforma, tornando-se o mesmo extensivo a todos os trabalhadores que passavam à situação de reformados.

    15) No final de Julho de 1974 o Conselho de Administração da R. deliberou aumentar as pensões de reforma e sobrevivência em 1.000$00 e 750$00 mensais, respectivamente e estabeleceu montantes fixos mínimos de 250$00 (reforma) e 1.500$00 (sobrevivência).

    16) Após a R. ter sido nacionalizada pelo D.L. 474/75, de 30.8, foi transformada em empresa pública pelo D.L. 531/77, de 30.12, posteriormente ratificado com emendas pela Lei 6/78 de 22.2; 17) Em Dezembro de 1979, o Conselho de Gerência da R., ao tempo empresa pública, elaborou unilateralmente, um documento intitulado o "Estatuto do Pensionista" da empresa (reforma e sobrevivência), divulgado internamente em anexo à Comunicação de Serviço nº 38/79, de 28 de Dezembro de 1979, com efeitos reportados a 01 de Outubro de 1978.

    18) No capítulo I desse "Estatuto", subordinado ao título "Política geral de atribuição de Pensões", foi consignado que: 1. É pressuposto básico da política de atribuição de pensões da Empresa, o reconhecimento de que é às instituições de Segurança Social que compete dar respostas adequadas aos problemas da terceira idade, seja pela atribuição de pensões dignas, seja proporcionando meios que...

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