Acórdão nº 209/07 – 6TBVCD P.1 S.1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução26 de Outubro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA À SEGUNDA RECORRENTE E NEGADA A REVISTA À PRIMEIRA RECORRENTE Sumário : 1) O utente da via não tem que contar com a negligência ou inconsideração dos outros, excepto tratando-se daqueles com notória normal imprevisibilidade de comportamento (v.g., crianças), limitações (v.g. deficientes), ou de animais não acompanhados ou sem trela.

2) O condutor de um veículo que não detém a marcha perante uma marca transversal –linha de paragem- “stop” e prossegue a mudança de direcção no cruzamento, apesar de se lhe apresentar semáforo com luz amarela intermitente e, a cerca de 50 metros, corta a linha de marcha de um veículo, que bem avistou, e se aproximava pela sua direita e com trajecto permitido por luz verde, tem culpa exclusiva no embate.

3) Ainda que o último circulasse com velocidade acima do permitido no local teria de se apurar o nexo causal naturalístico, o que é pura matéria de facto.

4) Também se inclui no âmbito da matéria de facto, da exclusiva competência das instâncias, a criação de presunção judicial conducente à conclusão de que a velocidade contribuiu para o agravamento dos danos.

5) O princípio da proibição da “reformatio in pejus” – constante do n.º 4 do artigo 684.º do Código de Processo Civil – impede que a decisão do recurso seja mais desfavorável ao recorrente do que a decisão impugnada, salvo tratando-se de responsabilidade solidária e no âmbito da solidariedade, nos termos do artigo 497.º do Código Civil.

6) Sendo a vida um valor absoluto, independentemente da idade, condição sócio-cultural, ou estado de saúde, irrelevam na fixação desta indemnização quaisquer outros elementos da vítima, que não a vida em si mesma.

7) Outros factores só poderão ser ponderados nos cômputos indemnizatórios dos danos morais próprios dos herdeiros da vítima ou do dano patrimonial mediato por eles sofrido em consequência da perda.

8) Só em acerto de tese pode ser feita uma ponderação de factores culturais, de personalidade ou etários na fixação da indemnização pelo sofrimento da vítima (dano não patrimonial próprio) nos momentos que precederam a morte, na percepção da aproximação desta, no estoicismo ou capacidade de resignação perante as dores físicas e morais.

Decisão Texto Integral: Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça AA e BB intentaram acção, com processo ordinário, contra “R...S..., SA” pedindo a condenação da Ré a pagar-lhes: à primeira, a quantia de 63.996,00 euros ; à segunda, 63.496,00 euros, acrescidas de juros desde a citação, para ressarcimento dos danos sofridos com a morte de sua mãe ocorrida em acidente de viação.

Posteriormente foi chamada a intervir a “Companhia de Seguros T..., SA” na qualidade de seguradora do outro veículo – que não aquele cujo condutor, na óptica das Autoras, deu causa ao evento – que teve intervenção no acidente.

O “Instituto de Segurança Social, IP”, através do “Centro Nacional de Pensões” pediu o reembolso de quantias pagas, a título de subsídio de funeral, no montante de 1491,00 euros.

Na 1.ª Instância a acção foi julgada parcialmente procedente e as Rés c solidariamente condenadas (na proporção da culpa dos seus segurados, respectivamente de 70% e 30%) a pagarem às Autoras 50.000,00 euros pela perda do direito à vida da vítima; a cada uma 17.500,00 euros pelo dano moral, com juros, à taxa de 4% desde a sentença; 700,00 euros e 200,00 euros, respectivamente, à 1.ª e 2.ª Autora, com aqueles juros, mas desde a citação, a título de danos patrimoniais; e 1491,00 euros ao ISS/CNP, com os juros àquela taxa, desde a notificação do pedido de reembolso.

No mais, foram as Rés absolvidas do pedido.

Todas apelaram para a Relação do Porto que confirmou integralmente o julgado.

As seguradoras pedem, agora, revista.

A Ré “R...S...” conclui assim a sua alegação: - O Acórdão refere que a conduta do XL efectuou a manobra de mudança de direcção para a esquerda sem parar no sinal “STOP” pintada no pavimento, quando o veículo HU se encontrava a cerca de 50 metros de si; - Mas não pode esquecer-se que no momento do embate, e no sentido de marcha do HU, o sinal de semáforo encontrava-se verde ao passo que para os condutores que seguindo no sentido Vila do Conde-Porto pretendessem virar à esquerda, como era o caso do XL, o semáforo estava amarelo intermitente.

- De acordo com o art.° 70 do Código da Estrada, em vigor à data dos factos, existe uma hierarquia entre as prescrições do trânsito. Isto é, há determinados sinais que prevalecem sobre outros.

- Ora, ao condutor do veículo seguro deparou-se-lhe o sinal — amarelo intermitente — que lhe impunha uma especial prudência na manobra de mudança de direcção à esquerda, só a podendo realiizar em local e para que da sua realização não resultasse perigo ou embaraço para o trânsito.

- É forçoso que se aceite que o condutor do XL, pretendendo mudar de direcção à sua esquerda, quando o sinal de semáforo se apresentava amarelo intermitente, estava, de facto, obrigado a uma especial prudência na execução dessa manobra, só podendo entrar na faixa de rodagem da esquerda da EN 13, atento o seu sentido de marcha, se e quando tivesse a certeza que podia fazer aquela manobra com segurança.

- Quer isto dizer, que em nosso entender, atenta a hierarquia de prescrições de trânsito e demais factos já referidos, o condutor do XL não tinha que parar em obediência ao sinal stop, bastando-lhe, tão somente, tomar precauções relativas à manobra que pretendia executar.

- A questão pertinente que se levanta é se pode admitir-se que, nestas circunstâncias, qualquer condutor, na posição do condutor do XL (ciente do limite de velocidade estabelecido para o local), não se convencesse de que tinha tempo de sobra para efectuar a manobra em causa.

- Na verdade, encontrando-se o veículo ...-...-HH a mais de 50 metros do entroncamento, o condutor do XL (para que o embate não tivesse ocorrido) teria de ter previsto que o mesmo circulava a cerca de 120 km/h o que não lhe era exigível.

- Bem como ao facto de o veículo seguro na Ré circular a uma velocidade seguramente não inferior a 80 km/h, sendo evidente que o embate ocorreu, forçoso é concluir, que tal velocidade foi causal da produção do acidente.

- Entendemos que o condutor do HU poderia evitar o embate se, em vez de seguir a uma velocidade não inferior a 80 km/hora (em nosso entender, seguramente superior) seguisse a uma velocidade de 50 km/hora ou menor, já que no local em apreço, a velocidade deve ser especialmente reduzida, pois na verdade, os limites previstos no art.° 27° do Código da Estrada são limites gerais de velocidade, mas não são limites absolutos, sendo-o, apenas, enquanto limites máximos de velocidade.

- Casos há, porém, em que independentemente de tais limites (máximos), o condutor deve adequar a sua condução e bem assim a velocidade a que circula às circunstâncias que encontra.

- Face a todo o exposto, somos forçados a concluir que, não fosse a velocidade claramente excessiva a que circulava o HU, com a qual o condutor do veículo seguro na ora...

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