Acórdão nº 06P2046 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Julho de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelSIMAS SANTOS
Data da Resolução13 de Julho de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. O Tribunal Colectivo de Idanha-a-Nova, por acórdão de 17.12.2003, condenou: - O arguido JC como autor de 1 crime de homicídio tentado dos art.ºs 131.º, 22.º e 72.º do C. Penal na pena de 3 anos de prisão suspensa por 5 anos; - Os arguidos DMBI, PMBI e MBI, cada um deles, como co-autores de 1 crime de ameaça do pelo art. 153.º, n.ºs 1 e 2 do C. Penal na pena de 170 dias de multa; de 1 crime de injúria do 181.º, n.º 1 do C. Penal, na pena de 60 dias de multa, e, em cúmulo jurídico dessas penas: - O arguido DMBI na pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de 2,50 euros; - O arguido PMBI na pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros; - O arguido MBI na pena única de 200 dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros.

    - O arguido JC a pagar a PMBI a quantia de € 34.473,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de 7% ao ano, desde 19.03.2002 até 30.04.2003 e à taxa anual de 4% desde 01.05.2003 até efectivo e integral pagamento; - O arguidos DMBI, PMBI e MBI, solidariamente, no pagamento ao arguido JC a quantia de € 1.319,83; Mais decidiu: - Absolver o arguido JC da acusação da autoria de 1 crime de ameaça do art. 153.º, n.ºs 1 e 2 do CP e de 1 crime de injúria do art. 181.º, n.º 1 do mesmo diploma.

    - Declarar extinto, por falta de legitimidade processual do Ministério Público, o procedimento pelo crime de dano do art. 212.º, n.º 1 do C. Penal, de que os arguidos DMBI, PMBI e MBI estavam acusados.

    - Declarar perdido a favor do Estado a arma de fogo e os cartuchos melhor descritos a fls. 224.

    O arguido e assistente PMBI recorreu para a Relação de Coimbra, suscitando questões referentes à matéria de facto, à matéria de direito: dolo directo do arguido JC, repartição de culpa entre os arguidos, aplicação da atenuação especial da pena e dupla atenuação especial da pena, suspensão da pena do arguido JC, valoração dos danos não patrimoniais, dos danos resultantes da perda de capacidade de ganho do recorrente e dos danos patrimoniais resultantes das despesas com viagens para tratamento, bem como redução da indemnização arbitrada ao arguido JC.

    Aquele Tribunal Superior, por acórdão de 22.6.2006, negou provimento ao recurso atinente à parte crime, e confirmou a sentença recorrida, mas concedeu parcial provimento ao recurso do recorrente enquanto demandante e condenou o arguido/demandado JC a pagar ao recorrente a indemnização de € 30.000,00 a título danos futuros, perda da capacidade de ganho, o que implica que o total da indemnização já liquidada se fixe em € 45.993,00 em vez do montante de € 34.743,00 fixado na sentença, e ainda, no que se liquidar em execução de sentença até ao montante peticionado a este título, relativamente aos montantes gastos com deslocações aos Hospitais de Castelo Branco e Coimbra para receber tratamento médico, confirmando-se, em tudo o mais a sentença recorrida.

    Ainda inconformado, essencialmente quanto às questões da medida da pena aplicada ao arguido JC e respectiva suspensão e quanto à indemnização que lhe foi atribuída, recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça o mesmo arguido e assistente PMBI.

    Respondeu o Ministério Público junto do Tribunal recorrido, quanto à medida da pena, pronunciando-se pela manutenção do julgado.

    Respondeu igualmente o arguido JC que se pronunciou pelo improvimento do recurso.

    Distribuídos os autos neste Tribunal a 29.5.2006, teve vista o Ministério Público que promoveu a realização de audiência.

    Colhidos os vistos legais, teve lugar a audiência. Em alegações orais, o Ministério Público sublinhou que a decisão recorrida não fizera uso da dupla atenuação, referiu que o dolo eventual não pode deixar se ter por provado face ao que consta do n.º 13 da matéria de facto. Quanto à medida da pena e sua suspensão, mostrou a sua concordância face aos factos provados que a justificam plenamente, pois que se está perante uma vindicta provada em que uma família procurou tirar desforço de JC, provocando-lhe justificadamente medo e inquietação, estado de espírito em que agiu. A defesa remeteu para a resposta à motivação.

    Cumpre, assim, conhecer e decidir.

    2.1.

    E conhecendo.

    É a seguinte a factualidade apurada pela 1.ª Instância e mantida pela Relação: Factos provados: 1. No dia 22 de Agosto de 2000, pelas 14,00 horas, o arguido JC denunciou à GNR de Monsanto que o arguido MBI andava a vender bilhas de gás e sacos de farinha sem dispor das necessárias guias.

  2. Nessa sequência, a GNR de Monsanto procedeu à fiscalização da carrinha e mercadorias nesta transportadas, propriedade do arguido MBI, mas sem que nada de ilegal tivesse sido apurado.

  3. Informado por Isabel Maria Antunes Lopes que a GNR procedia a essa fiscalização, o arguido PMBI dirigiu-se para os lados do cemitério de Monsanto, local onde esperava encontrar o seu pai e irmão, respectivamente, os arguidos MBI e DMBI e onde efectivamente os encontrou.

  4. Após terem conversado sobre o que se havia passado, os arguidos MBI e DMBI entraram na carrinha e seguiram por aquela localidade, o que igualmente fez o arguido PMBI, num outro veículo, logo atrás da carrinha.

  5. Ao passarem junto da residência do arguido JC, junto ao Largo da Igreja, naquela localidade de Monsanto, no concelho e comarca de Idanha-a-Nova, cerca das 15,30 horas, envolveram-se em discussão com o arguido JC, que se encontrava no rés-do-chão da residência de Maria Augusta Pereira, local onde tinha um pequeno armazém de produtos que comercializa.

  6. A certa altura, os arguidos DMBI, PMBI e MBI, em conjunto e dirigindo-se ao arguido JC, afirmaram: "Anda cá para fora que é desta que te vamos matar".

  7. Tais expressões, ditas de forma convincente, fizeram com que se instalasse no arguido JC um clima de medo e instabilidade, com receio de que concretizassem o que ameaçavam fazer.

  8. Acto contínuo, os arguidos MBI, DMBI e PMBI, já munidos com um pau, um "pé de cabra" de ferro e uma moca de madeira, respectivamente, dirigiram-se àquele armazém e, ao depararem-se com a porta fechada, começaram a bater nesta, partindo os vidros que a compunham e apelidando o JC de "cabrão" e "filha da puta".

  9. Quando Maria Augusta Pereira se opunha a que os arguidos MBI, DMBI e PMBI continuassem a bater na porta da casa de que é proprietária, o arguido PMBI, em voz alta, disse que ia ao carro buscar uma arma e acabava já com aquilo.

  10. Logo de seguida, o arguido JC saiu repentinamente daquele armazém e, atravessando a rua, entrou na sua residência.

  11. Nessa sequência, um dos arguidos MBI, DMBI ou PMBI passou a bater na porta da casa de residência do JC, após o que este, visivelmente transtornado e assustado pelo que se estava a passar, assomou a essa porta com uma espingarda de caça, de marca "Maroccini", número 85403, calibre 12, e a uma distância do arguido PMBI não inferior a três metros e não superior a cinco metros, disparou um projéctil, bala de zagalote, calibre 12, que atingiu aquele arguido PMBI no ombro direito, causando-lhe uma ferida perfurante nesse ombro, com orifício de entrada, na face anterior, com cerca de 3 cms, e orifício de saída na face posterior, com cerca de 10 cms.

  12. Como consequência directa e necessária do disparo, o arguido PMBI sofreu fractura esquirulante da clavícula direita, com perda de substância óssea, na união do terço externo com os dois terços internos, o que provocou alterações francas da região escapular direita, mantendo-se múltiplos fragmentos ósseos na espessura das partes moles como consequência de disrupção da integridade óssea da omoplata e da clavícula direita, pequeno enfisema sub-cutâneo na fossa supra-cavicular homolateral e um espassamento dos planos musculares regionais, o que demandou um período de 71 dias de doença, todos com incapacidade para o trabalho.

  13. Ao efectuar o disparo da forma descrita, o arguido JC previu que, como consequência da sua acção, o projéctil pudesse atingir o arguido PMBI e até tirar-lhe a vida, consequência esta com a qual se conformou.

  14. Apercebendo-se do estado em que ficou o arguido PMBI após o disparo, o arguido JC baixou a espingarda e nada mais fez, apesar de dispor de outra bala de zagalote.

  15. Os arguidos DMBI, PMBI e MBI, com as atitudes e expressões já acima descritas, agiram com a intenção de provocar receio e inquietação ao arguido JC, o que conseguiram.

  16. Sabiam os mesmos arguidos que a porta onde os vidros foram partidos pertencia a Maria Augusta Pereira e que, com a sua conduta, a estragavam.

  17. Ao chamarem "cabrão" e "filho da puta" ao arguido JC, os arguidos DMBI, PMBI e MBI tinham a intenção de o ofender na sua honra e consideração.

  18. Agiram todos os arguidos de modo voluntário, livre e consciente.

  19. O arguido JC é comerciante e industrial de canalizações de água; aufere, pelo menos, o rendimento mensal de 300 euros; a sua esposa trabalha por conta de outrem, auferindo o vencimento mensal de 335 euros; o casal vive em casa própria e tem uma filha de 20 anos de idade, que frequenta um curso de informática, auferindo 150 euros por mês.

  20. O arguido DMBI trabalha habitualmente para o arguido MBI, seu pai, tendo iniciado o cumprimento do serviço militar em Novembro último; o pai dá-lhe o dinheiro de que necessita para as suas despesas pessoais.

  21. O arguido PMBI é funcionário da Câmara Municipal de Idanha-a-Nova, auferindo o vencimento líquido mensal de 543,95 euros.

  22. O arguido MBI é comerciante e canalizador por conta própria; aufere, pelo menos, o rendimento mensal € 300 euros; cultiva a suas terras, colhendo por isso batatas, couves e azeitona para consumo próprio.

  23. Nenhum dos arguidos tem averbado no seu registo criminal condenação pela prática de factos ilícitos criminais.

  24. Os arguidos DMBI, PMBI e MBI são habitualmente pessoas educadas e pacíficas.

  25. O arguido JC é pessoa séria e trabalhadora, sofrendo da doença da diabetes.

    Pedidos de indemnização: 26. O arguido JC pagou a taxa de justiça de Esc. 14.000$00 para ser constituído na qualidade de assistente; ficou envergonhado e humilhado por os arguidos DMBI, PMBI e Inácio o apelidarem com as...

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