Acórdão nº 96P1219 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Outubro de 1997 (caso None)

Data01 Outubro 1997
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - No Tribunal Judicial de Tavira, perante o tribunal colectivo, foi submetido a julgamento o arguido A, casado, comerciante, nascido a 17 de Junho de 1938, residente na Rua ..., Tavira. Havia sido acusado pelo Ministério Público da prática de um crime de fraude fiscal, previsto e punido pelo artigo 23, ns. 1, alínea a), 2 alíneas a) e d) e 3, alínea a) do Decreto-Lei n. 20-A/90, de 15 de Janeiro, mas por factos anteriores à publicação deste diploma legal. O arguido requereu a abertura da instrução, articulando factos e suscitando várias questões, nomeadamente imputando à acusação ofensa do princípio da legalidade estabelecido nos artigos 1 do Código Penal e 18, n. 3 da Constituição da República, bem como desrespeito pelo estabelecido no artigo 2 do Decreto-Lei n. 20-A/90. Após debate instrutório, o Excelentíssimo Juiz de Instrução julgou improcedentes as questões suscitadas e pronunciou o arguido como autor do crime de fraude fiscal acusado, portanto previsto e punido no artigo 23, ns. 1, alínea a), 2, alíneas a) e d) e 3, alínea a) do Decreto-Lei n. 20-A/90, de 15 de Janeiro. No que diz respeito à invocada ofensa do princípio da legalidade, justificou o Excelentíssimo Juiz a sua decisão frisando que os factos que na acusação haviam sido imputados ao arguido como constituindo o aludido crime de fraude fiscal já estavam previstos e punidos pelo artigo 1, alínea a) do Decreto-Lei n. 619/76, de 27 de Julho, sendo-lhes aplicável, conforme artigo 2 desse diploma, pena de prisão até 12 meses, havendo, por isso, necessidade de recorrer ao disposto no artigo 2, n. 4 do Código Penal e 29, n. 4 da Constituição da República Portuguesa e aplicar o regime mais favorável, ou seja o do Decreto-Lei 20-A/90, na sua primitiva redacção, que previa para o crime apenas pena de multa. Desse despacho, na medida em que havia desatendido as pretensões do arguido suscitadas no início do debate instrutório, interpôs o arguido recurso para o Tribunal da Relação, mas tal recurso veio a ficar deserto por falta de pagamento da devida taxa. 2. - Remetidos os autos ao tribunal, para julgamento, o Excelentíssimo Juiz mandou autuar como processo comum perante o tribunal singular, mas que depois os autos lhe fossem conclusos, o que foi cumprido, lavrando então o mesmo Excelentíssimo Magistrado despacho com o seguinte conteúdo sintetizado: Os factos que a pronúncia atribui ao arguido, a fabricação de uma factura, pretensamente passada por uma sociedade fictícia, são aptos a integrar a previsão dos artigos 313 e 314, alínea c) do Código Penal de 1982. Se o tribunal de julgamento está vinculado aos factos que são apresentados, já não está sujeito à qualificação que lhes seja atribuída. Na eventualidade de concurso ideal de normas, o artigo 23 do Decreto-Lei 20-A/90, há-de ceder perante norma penal que puna mais severamente a conduta: caso do artigo 314 do Código Penal por efeito de relação de consumpção. Sendo caso de concurso ideal será caso de cumulação de punições, se os interesses jurídicos forem diversos - artigo 13 do Decreto-Lei n. 20-A/90. De qualquer modo, os factos trazidos pela pronúncia são aptos a preencher a previsão do artigo 314 do Código Penal, pelo que o julgamento cabe ao tribunal colectivo. Em consequência, ordenou-se a autuação como processo comum perante o tribunal colectivo e a sua remessa ao Meritíssimo Juiz, do Círculo Judicial tendo este designado dia para julgamento. 2.1. - Voltando os autos ao Excelentíssimo Juiz do processo, foi lavrado despacho de saneamento (artigo 311 do Código de Processo Penal) em que se deu conta de não existirem questões prévias ou incidentais a impedir o conhecimento da causa, acrescentando-se depois: "Recebo a pronúncia contra A deduzida a folhas 160 verso, 161 e 162 dos autos, pelos factos aí descritos e com a qualificação resultante da convolação de folhas 204. Para julgamento, o dia designado. Notifique as testemunhas e cumpra o disposto no artigo 313 do Código de Processo Penal". 2.2. - O arguido foi notificado desse despacho através da Polícia da Segurança Pública em 16 de Janeiro de 1995 e, no prazo legal de sete dias, então vigente, apresentou a sua contestação, defendendo-se por excepção e por impugnação, tendo por base a incriminação da pronúncia e acusação e invocando a prescrição do procedimento criminal, a fundamentar a qual alegou: "Com efeito, o crime imputado ao réu ter-se-á consumado em 31 de Julho de 1989, data em que este terá apresentado na Repartição de Finanças de Tavira a declaração de modelo 2. O réu foi notificado pessoalmente da decisão instrutória, nos termos da qual foi pronunciado pela prática de um crime previsto e punido nos termos do artigo 23, ns. 1, alínea a), 2, alíneas a) e d) e 3, alínea a) do Decreto-Lei n. 20-A/90, de 15 de Janeiro, em 5 de Agosto de 1994 (...). O artigo 15 do Decreto-Lei n. 20-A/90, determina que o procedimento criminal por crime fiscal extingue-se por efeito de prescrição, logo que sobre a prática do mesmo sejam decorridos cinco anos (...). Ora, entre a data em que eventualmente terá sido praticado o crime imputado ao arguido, 31 de Julho de 1989, e a data em que o arguido foi pessoalmente notificado do despacho de pronúncia, 5 de Agosto de 1994, já decorreram mais de cinco anos. É pois manifesto que o procedimento criminal se extingue pelo decurso da prescrição". 2.3. - Por fax, entrado no tribunal em 3 de Fevereiro de 1995, o arguido veio arguir irregularidade processual, arguição que substanciou na seguinte argumentação: "No despacho que recebeu a pronúncia, consta o seguinte: "Recebe a pronúncia (...) e com a qualificação resultante de convolação de folha 204. O despacho de folha 204 não foi notificado ao réu. No dia 31 de Janeiro de 1995 (data da tomada de termos de identidade ao arguido), ao consultar o processo, o réu apercebeu-se que o despacho em causa havia alterado a qualificação dos factos de que era acusado, passando a considerar os mesmos como integrando a prática de um crime de burla agravada, previsto e punido nos termos dos artigos 313 e 314 do Código de Processo Penal. Tal facto era aliás absolutamente inimaginável, uma vez que não obstante a referência à convolação constante do despacho que recebeu a pronúncia, sempre houve a convicção de que a mesma se tinha eventualmente operado no âmbito do Regime Jurídico das Infracções Fiscais não Aduaneiras. A não notificação do despacho de folhas 204 impediu pois que o réu tomasse conhecimento pleno e efectivo dos termos em que foi recebida a pronúncia, induzindo-o em erro e impedindo-o de poder apresentar a sua defesa nos temos que considerasse convenientes (...). Aliás, é de todo incompreensível, em termos processuais, porque é que o despacho de folhas 204 não foi proferido no âmbito do despacho que recebeu a pronúncia deduzida contra o réu. Nos termos dos artigos 118, n. 2 e 123 do Código de Processo Penal constituísse irregularidades do processo os actos contrários a lei que esta não cominar com a nulidade. A não notificação ao réu do despacho de folha 204, quando este foi notificado da pronúncia e do despacho que a recebeu, viola os seguintes preceitos legais: artigo 61, artigo 111, n. 1, alínea c), artigos 113, n. 5, 311 e 313 do Código de Processo Penal e ainda o artigo 32, n. 1 da Constituição da República Portuguesa. A irregularidade em causa, pela sua gravidade, afecta definitivamente a validade do acto de notificação do despacho de pronúncia e do despacho que a recebeu, praticado em 15 de Janeiro de 1995, tornando-o inválido. Nestes termos (...) requer-se que seja declarada a invalidade do acto referido (...) bem como de todos os actos subsequentes praticados no processo". 2.4. - Conclusos os autos ao Excelentíssimo Juiz, foi lavrado despacho de indeferimento, destacando-se a seguinte fundamentação: "(...) A pronúncia foi recebida integralmente. Os factos atribuídos ao arguido entendeu-se que eram aptos a preencher a previsão do artigo 314 do Código Penal, burla agravada, motivo pelo qual o processo foi autuado para julgamento em tribunal colectivo. Não se contesta que a notificação não tenha sido efectuada de forma perfeita. Também o despacho de folhas 204 havia de ser comunicado ao arguido. É todavia seguro que em nada foram prejudicados os seus direitos de defesa. A defesa é relativa aos factos imputados e não à qualificação jurídica que deles se faz. E é certo que esta não é definitiva nem se impõe ao julgador. Este não está vinculado à classificação da matéria de facto de quem recebe a pronúncia. Evita-se deste modo, ao receber os factos como aptos a integrar a burla agravada, que o tribunal singular após a instrução da causa, venha a declarar-se incompetente caso entenda que a infracção imputada não é afinal, como entendeu a pronúncia, mas do artigo 314 alínea c) do Código Penal, com o consequente dispendio de esforço e de tempo (...). No caso não há que proceder à reparação de qualquer irregularidade, artigo 123, n. 2 do Código de Processo Penal, uma vez que o arguido desde 31 de Janeiro de 1995 sabe da qualificação que foi dada à conduta que lhe é atribuída, não havendo pois necessidade de nova notificação do despacho que recebeu a pronúncia, com a qualificação dada pelo despacho de folha 204". 2.5. - Com tal decisão se não conformou o arguido, que dela interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, recebido depois para subir diferidamente e no efeito meramente devolutivo e no devido tempo motivado. 3. - Seguindo o processo para audiência de julgamento, decidiu o tribunal colectivo: 3.1. - Julgar o arguido autor material, em concurso real, de três crimes: a) - um crime de falsificação previsto e punido pelo artigo 228, n. 1, alínea c) do Código Penal de 1982 e actualmente pelo artigo 256, n. 1, alínea c) do Código Penal de 1995; b) - um crime de burla agravada previsto e punido pelos artigos 313 e 314, alínea c) do Código Penal de 1982 e actualmente previsto e punido pelos artigos 217, n. 1 e...

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