Acórdão nº 97P1550 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Março de 1998 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelMARIANO PEREIRA
Data da Resolução18 de Março de 1998
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Sob acusação do Ministério Público, foi julgado em Tribunal Colectivo e processo comum, no Círculo Judicial de Oliveira de Azeméis, o arguido: - A, solteiro, calceteiro, filho de B e de C, nascido em 10 de Maio de 1972, em Oliveira de Azeméis e residente em Alto do Moinho, Macinhata de Seixa, Oliveira de Azeméis, a quem era imputado, em autoria material e concurso real; - dois crimes de falsificação de documento previsto e punido no artigo 256 n. 1 alínea a) e 3 do Código Penal; um crime de contrabando de circulação previsto e punido nos artigos 22 n. 1 e 24 n. 1 do R.J.I.F.A. aprovado pelo Decreto-Lei n. 376-A/89 de 25 de Outubro; uma contra-ordenação prevista e punida no artigo 121 ns. 1 e 6 do Código da Estrada e uma contra-ordenação prevista e punida nos artigos 1 n. 1 e 34 n. 1 do Decreto-Lei n. 522/85 de 31 de Dezembro. Após julgamento, foi decidido: - condenar o arguido pela prática, em co-autoria material e concurso real, de dois crimes de falsificação de documento previsto e punido pelo artigo 256 n. 1 alínea a) do Código Penal na pena de 12 meses de prisão (para cada um dos crimes) e de um crime de contrabando de circulação previsto e punido no R.J.I.F.A. 22 n. 1 e 24 n. 1 na pena de 45 dias de multa à razão diária de 1000 escudos. Em cúmulo jurídico, na pena única de 20 meses de prisão e 45 dias de multa à taxa diária de 1000 escudos, tendo-lhe sido suspensa a execução da pena pelo período de dois anos. Foi ainda condenado pela prática de uma contra-ordenação prevista e punida no Código da Estrada artigo 121 ns. 1 e 6 na coima de 40000 escudos e pela prática de uma contra-ordenação prevista e punida no Decreto-Lei n. 522/85 de 31 de Dezembro artigos 1 n. 1 e 34 n. 1 na coima de 30000 escudos. Foi declarado perdido a favor do Estado o veículo automóvel apreendido. Inconformado com o decidido, interpôs recurso o Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal "a quo". Motivando, doutamente, o recurso, conclui: 1- Não são coincidentes os conceitos de documento no âmbito do direito civil e no âmbito do direito penal, sendo que a impossibilidade de utilizar neste último o conceito consagrado naquele primeiro determinou a inserção no Código Penal de um preceito, o da alínea a) do artigo 255 consagrando uma definição de documento para efeitos penais. 2- Assim, enquanto no direito civil documento é o objecto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou representar uma pessoa, coisa, ou facto" - artigo 362 do Código Civil - no direito penal é a declaração corporizada num escrito a que é equiparável o social materialmente feito, dado ou posto uma coisa para provar um facto juridicamente relevante (artigo 255 do Código Penal). 3- Significa isto que, para efeitos penais, o documento não é propriamente o meio ou suporte material onde está incorporada a declaração (papel, fita magnética, disco, chapa, tábua, etc) mas a própria declaração. 4- O autor do documento é o emitente de declaração, ou seja a pessoa ou entidade a quem cabe a "paternidade" do pensamento documental independentemente de lhe caber ou não proceder à incorporação da declaração no respectivo suporte material. 5- Donde resulta que, relativamente às chapas de matrícula de veículos no âmbito penal, o documento não é a chapa propriamente dita enquanto meio ou suporte material em que está incorporada a declaração, mas a própria declaração, ou seja a sequência de letras e algarismos que constitui a matrícula. 6- O autor de tal documento é a entidade a quem compete emitir a declaração, ou seja nos termos do n. 2 do artigo 44 e do n. 1 do artigo 45 ambos do Código da Estrada anterior, ou do artigo 11 do Decreto-Lei n. 190/94 a Direcção-Geral de Viação competente e isto independentemente de ser ou não essa entidade a proceder à incorporação da declaração no suporte material adequado. 7- Trata-se assim de documento autêntico, ou seja de uma declaração emitida com as formalidades legais, por uma autoridade pública, nos limites da sua competência (artigo 363 n. 2 do Código Civil). 8- Por isso, o arguido ao apôr por duas vezes num veículo automóvel matrículas que ele sabia não pertencerem àquele veículo, mas a outros e fazendo-o com intenção de prejudicar o Estado e de se furtar à actuação das autoridades fiscalizadoras do trânsito praticou dois crimes do artigo 256 n. 1 alínea a) e n. 3 do Código Penal e não apenas do n. 1 alínea a). 9- Por isso devia ter sido condenado não na pena de 12 meses de prisão por cada um desses delitos, mas na de 20 meses de prisão, havendo de corresponder-lhe, em cúmulo jurídico, a pena única de 30 meses de prisão. 10- Decidindo como decidiu o tribunal "a quo" violou o referido n. 3 do mencionado artigo 256 e o artigo 255 alínea a) ambos do Código Penal, conjugados com o n. 2 do artigo 363 do Código Civil e com o n. 3 do artigo 11 do Decreto-Lei 190/94. Pede seja dado provimento ao recurso. Não houve resposta. Teve lugar a audiência oral e nela a Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta defendeu a posição perfilhada pelo seu Colega na 1. instância. Houve mudança de relator (cfr. acta). Cumpre decidir. Factos provados na instância: - O arguido é possuidor do veículo ligeiro de passageiros de oito lugares da marca "Peugeot 504" de cor verde com o n. de série 3155369, quadro 504 F11 e motor n. X 3155369 X, examinado a folha 14, de proveniência alemã, cuja matrícula originária se desconhece, no valor de 50000 escudos. - Em data indeterminada entre princípios de Agosto de 1996 e 25 de Setembro de 1996, em local indeterminado, o arguido apôs no referido veículo nos locais próprios, a matrícula CN-19-36 que para tanto havia mandado fazer pertencente a um veículo ligeiro misto de marca "Mini", modelo "Van" propriedade de Fernando Neves Pinheiro. - Com tal matrícula aposta no veículo o arguido conduzi-o na via pública até ser interceptado pela G.N.R. em 25 de Setembro de 1996 em Ul, Oliveira de Azeméis. - Também no mesmo período de princípios de Agosto de 1996 a 25 de Setembro de 1996, em data e local indeterminados, o arguido havia aposto no mesmo veículo, nos locais próprios, a matrícula CV-05-07 pertencente ao veículo ligeiro da marca "Fiat", modelo "127" de D, pintado pela sua própria mão, assim tendo circulado com o referido veículo na via pública. - O arguido, bem sabendo que as matrículas que apôs no veículo não eram verdadeiras, teve o propósito de prejudicar o Estado e de se furtar à actuação das autoridades fiscalizadoras do trânsito e dessa forma obter para si benefícios ilegítimos. - O arguido detinha em circulação no território nacional o referido veículo, sua propriedade, sem que possuísse qualquer documento comprovativo de que havia sido legalmente importado através das alfândegas, sem que...

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