Acórdão nº 0346713 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Fevereiro de 2005 (caso NULL)

Data09 Fevereiro 2005
ÓrgãoCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Criminal da Relação do Porto: I - Relatório: I - 1.) B....., com os demais sinais dos autos, apresentou queixa contra incertos, invocando para tanto os factos que abaixo se resumem: - O Grupo B1..... é um dos maiores grupos empresariais portugueses, sendo personificado pelo denunciante; - A sociedade "C....., S.A." apresentou, junto do Tribunal de....., um procedimento cautelar contra a sociedade "E....., SA", peticionando a suspensão de efeitos de uma escritura pública de aquisição de acções levada a efeito após a conclusão de um processo de aquisição ao abrigo do disposto no art. 490.º do Código das Sociedades Comerciais.

- Nessa providência cautelar, a sociedade requerente alegou que o lançamento do mecanismo aquisitivo das participações teve como principal finalidade aniquilar o denominado Grupo F1....., o mais directo concorrente do Grupo B1..... no negócio da cortiça, ao fazer extinguir a garantia de financiamentos bancários a que tais títulos estavam adstritos.

- A sociedade requerente do procedimento cautelar imputou tal comportamento à família B2..... e, por via disso, ao denunciante.

- As declarações proferidas pela sociedade C....., SA junto do referido Tribunal põem em causa a imagem e credibilidade do participante, bem como os métodos usados nas empresas por ele geridas.

- As expressões usadas ofendem a honra e consideração do queixoso/assistente.

Que na sua óptica preencheriam os elementos típicos constitutivos dos crimes de injúrias com publicidade por escrito (p. e p. nos art.ºs 181.º, 182.º e 183.º) e difamação (p. e p. no art. 180.º, todos do Código Penal).

Foi igualmente apresentada queixa, pelo mesmo B..... e pela sociedade "E....., SA" contra "C....., S.A.", alegando-se, no essencial, a mesma factualidade supra referida, mas acrescentando-se que: - O alegado na referida providência cautelar é manifestamente ofensivo da reputação económica do 1.º participante, enquanto membro da família B2....., bem como da 2.ª participante, Ré no processo judicial, pondo em perigo interesses pecuniários.

- As instituições de crédito podem considerar que o participante deixou de merecer fé e crédito e, como tal, podem dificultar a concessão de crédito.

- Os agentes económicos que se relacionam com os participantes irão reduzir a confiança que neles depositam.

No entendimento dos queixosos, a sociedade denunciada teria, assim, cometido o crime de ofensa à reputação económica p.p. pelo art. 41.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro.

*I - 2.) O Ministério Público a fls. 574 e segts. dos autos, proferiu despacho de arquivamento quanto ao crime de ofensa à reputação económica, com base nos seguintes fundamentos: - O crime em apreço visa proteger tão somente interesses pecuniários; - Exige-se um dolo específico - falsidade dos factos divulgados; - Não está demonstrado que a sociedade denunciada tenha divulgado factos prejudiciais à reputação económica dos assistentes por forma adequada a causar-lhe prejuízos materiais ou a colocar em perigo interesses patrimoniais deles; - E muito menos que os arguidos tivessem actuado com consciência da falsidade dos factos alegados na referida petição do procedimento cautelar.

- Expressões similares são muitas vezes utilizada pelas partes em processos judiciais, sendo que as peças processuais não se destinam a ser divulgadas.

I - 3.) A fls. 588 e segts. foi deduzida acusação particular, pelo queixoso/assistente B..... contra F....., H..... e I....., na qual, reproduzindo os factos já constantes da queixa, mas alegando que as imputações foram feitas duas vezes (na providência cautelar e na acção ordinária subsequente), pelo que foram imputados aos mesmos a prática, por cada um deles, de dois crimes de injúrias com publicidade por escrito p.p. pelo art. 181.º, 182.º e 183.º e dois crimes de difamação p.p. pelo art. 180.º, todos do Cód. Penal.

I - 4.) Os Arguidos F....., H..... e I..... vieram então requerer a abertura de instrução, por não se conformarem com a acusação particular contra eles deduzida pelo Assistente B..... e acompanhada parcialmente pelo Ministério Público.

Por sua vez o assistente B..... e a "E....., S.A." vieram requerer também a abertura de instrução, relativamente aos factos sobre os quais foi proferido despacho de arquivamento pelo Ministério Público.

*I - 5.) No termo da instrução a que se procedeu, a Exmª. Sra. Juiz de Instrução, depois de inquiridas todas as testemunhas arroladas pelos Assistentes, decidiu, por despacho proferido em 26 de Junho de 2003, não pronunciar os arguidos F....., H....., I..... e C....., SA, pelos crimes pelos quais vinham acusados e pelo crime que era imputado à C....., SA no requerimento de abertura de instrução.

*II - 1.) É desse despacho, mas apenas na parte que decidiu não pronunciar o arguido F....., no que respeita aos crimes de difamação e a arguida "C....., S.A." pelo crime de ofensa à reputação económica, que os Assistentes B..... e "E....., S.A." ora recorrem para esta Relação, formulando, no termo da sua motivação, as seguintes conclusões: "1 - Considerou o Tribunal não se encontrar verificado o tipo de crime de difamação, na medida em que estariam preenchidas as causas de exclusão da ilicitude, previstas no n.º 2 do Artigo 180.º do Código Penal.

2 - Antes da análise das causas de exclusão da ilicitude é necessário apurar se os factos imputados e os juízos formulados sobre os Recorrentes são ofensivos da sua honra e consideração, como exige o Artigo 180.º, n.º 1 do Código Penal.

3 - Da mera leitura dos articulados em causa nos presentes autos, decorre que as expressões nestes utilizadas afectam o carácter, a lealdade, a rectidão moral dos Recorrentes, bem como o seu bom nome e crédito perante o público em geral.

4 - Posto isto, não se podem considerar preenchidas as causas de exclusão da ilicitude previstas no n.º 2 do Artigo 180.º do Código Penal, como pretende o Tribunal Arguido.

5 - O Tribunal entende terem sido as declarações sub iudice proferidas para a realização de interesses legítimos, 6 - Na medida em que foram proferidas no âmbito de um pleito judicial em que para a boa defesa da causa, por vezes, é necessário produzir determinadas afirmações.

7 - Na verdade, entendem os Recorrentes que, para além de uma óbvia falta de moderação, existiu uma clara desnecessidade nos meios utilizados para a justa defesa da causa.

8 - Estas afirmações destinaram-se apenas a atingir negativamente os Recorrentes, 9 - Sendo que grande parte das mesmas foram dirigidas à Família B2..... e ao 1.º Recorrente, que nem sequer eram parte em qualquer dos processos desencadeados pelos Arguidos.

10 - Não se encontra, assim, preenchida a causa de exclusão de ilicitude, prevista no n.º 2, alínea a) do Artigo 180.º do Código Penal.

11 - Entende, ainda, o Tribunal que está também verificada a condição prevista na alínea b) do n.º 2 do Artigo 180.º do Código Penal.

12 - Segundo o Despacho recorrido, não há razões para se considerar que o ora Arguido não esteja convencido da veracidade do por si alegado.

13 - Funda esta conclusão nos depoimentos prestados em sede de instrução e em dois relatórios que conferem às acções um valor muito superior ao que por elas foi oferecido.

14 - Entendem os Recorrentes que estes elementos de prova, não permitem retirar esta ilação.

15 - Em primeiro lugar, não se entende quais sejam os argumentos que se têm por razoáveis, prestados pelas testemunhas ou pelo Arguido.

16 - Em segundo lugar, os relatórios referidos não conseguem fazer prova da veracidade das afirmações do Arguido que, ademais, não se limitam ao facto de às acções ter sido, alegadamente, oferecido um preço inferior valor que estas teriam na realidade.

17 - Acresce que, não basta ao Arguido estar convencido da veracidade das suas alegações.

18 - O Arguido teria que ter fundamento sério para reputar as mesmas afirmações como verdadeiras, o que não se consegue retirar dos autos.

19 - A conduta em apreço tem, assim, que se considerar ilícita, não se verificando as condições cumulativas do n.º 2 do Artigo 180.º do Código Penal para estar excluída a ilicitude da mesma.

20 - Quanto à autoria do crime e à existência de concurso real, entende o Tribunal que é desnecessária a sua análise, remetendo, no entanto, para o que nessa sede é alegado no Requerimento de Abertura de Instrução do Arguido.

21 - Entendem os Recorrentes que o Arguido é autor dos dois crimes de difamação, na medida em que teve que instruir o seu advogado quanto aos factos e respectivos juízos de valor formulados.

22 - Agiu o Arguido com o dolo próprio da autoria, na medida em que quis que estas afirmações fossem reproduzidas e conformou-se com elas.

23 - Ainda que não o tivesse feito anteriormente, teria sempre que se ter conformado posteriormente à propositura da providência cautelar em causa.

24 - Como tal, tendo já conhecimento do alegado nessa providência, permitiu que o mesmo fosse reproduzido na petição inicial da acção principal.

25 - O Arguido é autor dos crimes de difamação que se entende serem dois crimes, em concurso real.

26 - Refere o Arguido no Requerimento de Abertura de Instrução para o qual o Despacho em apreço remete, que a providência cautelar se integra na acção principal e por isso só teria existido uma conduta criminosa.

27 - Entende o Recorrente que, existindo duas acções autonomizáveis e distintas, em dois momentos temporalmente diferenciados, está-se perante um concurso homogéneo de dois crimes de difamação, nos termos do Artigo 30.º do Código Penal.

28 - Encontram-se, assim, verificados todos os pressupostos da prática de dois crimes de difamação, previsto no Artigo 180.º do Código Penal.

29 - Considerou, também, o Despacho de Não Pronúncia sob recurso, não estarem preenchidos os elementos constitutivos do crime de ofensa à reputação económica, previsto no Artigo 31.º do Decreto - Lei n.º 28/84 de 20 de Janeiro.

30 - Considera o Tribunal que não existiu divulgação dos factos, na medida em que estes foram...

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