Acórdão nº 0532157 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Outubro de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelJOSÉ FERRAZ
Data da Resolução06 de Outubro de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. No Tribunal Administrativo de Círculo de Coimbra, B........., Lda, com sede na Rua ....., nº ., freguesia de ......, Leiria, intentou acção contra o ESTADO PRTUGUÊS pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 28.579,17, acrescida dos juros desde 1997/08/22, sendo os vencidos de € 11.199,12, até efectivo pagamento, sem prejuízo da capitalização de juros a requerer oportunamente.

Fundamenta a sua pretensão em acto ilegal e culposo do Magistrado do Ministério Público, em autos de inquérito criminal, e que consistiu em ordenar, ilegal, injustificada e desnecessariamente, a destruição de todos os suínos e carcaças de suínos pertencentes à autora, e que haviam sido apreendidos pela Inspecção Geral das Actividades Económicas, o que determinou prejuízos naquele montante.

O MP, em representação do Estado contestou a acção.

Além de excepcionar a incompetência material do tribunal em que a acção foi proposta, afirma que nenhum acto ilícito e culposo foi praticado pela Magistrada do Ministério Público quando ordenou a apreensão e destruição referida, o que fez no cumprimento da lei.

E que não se verifica a existência de dano e sua conexão com o acto alegadamente ilícito da Magistrada do Ministério Público.

  1. Decidida definitivamente a incompetência do foro administrativo, por acórdão do STA, e a requerimento da autora, foi o processo remetido ao tribunal judicial de Santa Maria da Feira que, julgando-se territorialmente incompetente, reencaminhou o processo ao tribunal judicial de Vila Nova de Famalicão.

    O Mmo Juiz, nesse tribunal, afirmando a inviabilidade da pretensão da autora, por não se reunirem os pressupostos da responsabilidade civil, susceptíveis de conduzir à condenação do Estado, nomeadamente por não se estar perante acto ilícito nem existir o nexo psicológico entre o facto e a vontade da Magistrada que determinou a destruição das mercadorias, ou seja, a culpa, julgou a acção improcedente no despacho saneador.

  2. Dessa decisão, e dela discordando, apela a autora que conclui conforme se segue: "A)- Vem o presente recurso interposto da aliás douta sentença que julgou a acção improcedente e, consequentemente, absolveu o réu do pedido contra ele formulado; B)- a sentença recorrida sustenta a absolvição do recorrido por considerar que o despacho da Digmª Magistrada do Ministério Público que ordenou a inutilização dos suínos e das carcaças dos suínos apreendidos não constitui um facto ilícito nem culposo; C)- salvo o devido respeito por melhor opinião, afigura-se que a decisão ora em crise, julgando como julgou, não fez correcta interpretação e aplicação do direito atinente; D)- a questão que fundamenta o presente recurso é, pois, a seguinte: saber se o despacho emanado da Digmª Magistrada do Ministério Público que rodeou a inutilização de todos os suínos e carcaças de suínos apreendidos pela Direcção Geral das Actividades Económicas é ilícito e culposo; E)- o Decreto-Lei 48 051, de 21/11/1967, diploma que rege a responsabilidade civil extracontratual do estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio dos actos de gestão pública, enuncia que acto ilícito é aquele que viole "normas legais e regulamentares ou princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devem ser tidas em consideração" (vide artº 6º do citado diploma legal), F)- revela-se necessário para que se verifique o requisito da ilicitude, a presença nela de uma ilegalidade qualificada, ou seja, exige-se que as normas ou princípios violados revelem uma verdadeira intenção normativa de protecção dos interesses do particular (de fora ficam, pois, as ilegalidades decorrentes da violação de normas formais que regulem aspectos organizatórios, funcionais ou formais do exercício do poder, sendo relevantes para efeitos de determinação da ilicitude, as normas substantivas que definem medidas de satisfação ou o sacrifício consentido dos particulares) - em suma, a protecção de normas não pode ser reflexa ou ocasional (vide, neste sentido, Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 18/06/2003, de 05/11/2003 e 24/03/2004, todos in www.dgsi.pt); G)- dos arestos jurisprudenciais tem-se constatado que a fronteira entre a ilicitude e a culpa é, porém, demasiado ténue. E certamente pela redacção que o legislador construiu no artigo 6º do Decreto-Lei 48 051. Com efeito, lê-se, in fine, "regras de ordem técnica ou de prudência comum que devem ser tidas em consideração" - o realce é nosso; H)- mas, unanimemente tem-se enunciado que a conduta dos entes públicos é culposa quando não corresponda ao que seja exigível e esperado do agente diligente, zeloso e cumpridor que, face às normas de sentido claro e inequívoco tem o dever de interpretar de forma manifestamente acertada as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis; I)- na aliás douta decisão recorrida, sobre o requisito da ilicitude sustenta-se que no caso sub iudice que a Digmª Magistrada do Ministério Público, face aos indícios que lhe foram ostentados, não poderia deixar de tomar a atitude que tomou por ser absolutamente conforme à lei. Mais refere aquele aresto que como resulta da instrução do processo criminal, o arguidos, entre os quais a agora recorrente, aceitaram ter cometido os crimes previstos e punidos pelo artº 23º, al. a) do Decreto Lei nº 24/84, de 20/01 e 269º, nº 2 do Código Penal, já que anuíram expressamente à suspensão provisória do processo, mediante as injunções determinadas pelo Mmº Juiz de Instrução Criminal; J)- discordamos, desde já, com a posição assumida pelo ilustre juiz a quo. A presente acção sobre eventual responsabilidade civil extracontratual do Estado funda-se na decisão da Digmª Magistrada do Ministério Público que, em fase de inquérito, ordenou, ilegal, injustificada e desnecessariamente, a inutilização de todos os suínos e carcaças apreendidas pela Direcção Geral das Actividades Económicas; L)- pelo que é absolutamente irrelevante, para a apreciação da obrigação de indemnizar do Estado fundado na prática deste acto de inquérito, os trâmites ulteriores do processo delitual instaurado; M)- Mais refere a sentença recorrida que: "No entanto, a mera apreensão, face à natureza perecível dos bens apreendidos não era suficiente.

    Daí a Magistrada do Mº Pº ter ordenado simultaneamente a respectiva inutilização, o que se insere perfeitamente no âmbito das previsões das normas jurídicas constantes dos artº 185º, do C.P.P., e 47º, do D.L. nº 28/84" - o escuro é nosso; M)- atento o conceito físico de perecimento (deixar de ser ou de existir, acabar, morrer prematuramente ou fenecer), vislumbra-se que, da análise do artº 47º do Decreto-Lei nº 24/84, a noção jurídica não fica muito afastada; N)- Salvo o devido respeito por melhor opinião, cremos afoitamente que face aos indícios que foram apresentados à Digmª Magistrada do Ministério Público e analisando as disposições legais supra citadas, não lhe era lícito ordenar a inutilização dos suínos e das carcaças apreendidas; O)- com efeito, a ordem de inutilização das apreensões efectuadas, alicerçada em razões de saúde pública, estribou-se em dois motivos: o desconhecimento da origem e a possibilidade da existência da peste suína clássica; P)- no que concerne ao desconhecimento da origem, a Digmª Magistrada do Ministério Público não podia deixar de ignorar a existência dos competentes certificados sanitários comprovativo da sua origem que acompanhavam os carregamentos; Q)- e mesmo que indicada fosse a recorrente pela prática criminal ou...

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