Acórdão nº 0543630 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Junho de 2006 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelCUSTÓDIO SILVA
Data da Resolução14 de Junho de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acórdão elaborado no processo n.º 3.630/05 (4ª Secção do Tribunal da Relação de Porto)**Relatório Do despacho de 18 de Fevereiro de 2.005 consta o seguinte: "O arguido (identificado nestes autos) foi condenado, por sentença proferida e depositada a 22 de Maio de 2004 ..., entretanto transitada em julgado, na pena de 60 dias de multa, à razão diária de € 5, e na pena acessória de proibição de condução de veículos com motor durante três meses.

O condenado não entregou a licença de condução de que é titular, nem a mesma foi apreendida nestes autos, sendo que tal foi agora promovido.

Face à douta promoção que antecede, importa analisar se o facto de o condenado não ter entregue a licença de condução de que era titular ou a falta de apreensão desta à ordem destes autos obsta a que se declare extinta a dita pena acessória que lhe foi aplicada. Sobretudo se se considerar o lapso temporal entretanto decorrido desde a prolação da sentença até ao presente momento, em concatenação com o lapso temporal de inibição de conduzir em que foi condenado.

Na verdade, as penas acessórias, ou os efeitos automáticos das penas, distinguem-se dos chamados efeitos automáticos dos crimes, como, aliás, foi referido na 25ª sessão da Comissão Revisora da Parte Geral do Código Penal, referente ao Projecto de 1963 (in Actas das Sessões da Comissão Revisora do Código Penal - Parte Geral, edição da A. A. F. D. L., vol. II, págs. 96 e segs.). O autor do referido projecto afirmou, então, que « ( ... ) certos crimes podem implicar, automaticamente, certos efeitos », acrescentando que « isso ( ... ) nada tem que ver com o problema ( ... ) em ligar ou não de forma automática ( ... ) certos efeitos a determinadas penas », não hesitando em concluir que « pode-se ligar certos efeitos a certos crimes ( ... ) mas o que não se deve é ligar certos efeitos a certas penas » ( in obra citada, págs. 99/100 ), sendo o actual art. 65º, n.º 2, do C. Penal, a consagração desse pensamento.

Deste modo, toda a pena acessória tem como condição necessária, mas não suficiente, a condenação numa pena principal por força da prática de um crime, sendo sempre necessário que seja comprovado, no facto, um particular conteúdo de ilícito que justifique materialmente a aplicação em espécie da pena acessória.

Foi o Dec.-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, que, no âmbito da ampla reforma operada no Código Penal, introduziu neste diploma legal a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor.

Nos termos do art. 69º, n.º 1, do C. Penal, atenta a redacção introduzida por aquele Decreto-Lei, seria condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre um mês e um ano quem fosse punido por crime cometido no exercício daquela condução com grave violação das regras de trânsito rodoviário ou por crime cometido com utilização de veículo e cuja execução tivesse sido por este facilitada de forma relevante.

No entanto, a Lei n.º 77/2001, de 13 de Julho, alterou a redacção ao referido preceito legal, passando o mesmo a estabelecer que é condenado na proibição de conduzir veículos com motor, por um período a fixar entre três meses e três anos, quem for punido por crime previsto no art. 291º ou 292º do C. Penal ( cfr. art. 69º, n.º 1, al. a), do C. Penal ) ou por crime cometido com utilização de veículo e cuja execução tiver sido por este facilitada de forma relevante ( cfr. art. 69º, n.º 1, al. b), do C. Penal ).

Esta pena acessória encontra o seu fundamento na perigosidade do agente e destina-se a actuar psicologicamente sobre o imprudente condutor, visando, pela privação do uso do veículo ou da sua condução, influir, preventivamente, na conduta futura do infractor.

Na verdade, a proibição de conduzir veículos com motor constitui uma advertência, atendendo a razões de prevenção especial e geral, por um comportamento culposo e consideravelmente defeituoso no tráfico rodoviário, sem que, todavia, o arguido surja, no que se refere à sua personalidade, como inapto para conduzir veículos motorizados ( cfr. Jescheck, in Tratado de Derecho Penal - Parte General, 4ª edición - Traducción de José Manzanares Samaniego, Editorial Comares - Granada, 1993, pág. 71 6 ).

Assim, à dita pena não deixa de estar ligado um efeito de prevenção geral de intimidação, que não será ilegítimo porque irá actuar dentro do limite da culpa, por forma a contribuir, em medida significativa, para a emenda cívica do condutor imprudente ou leviano ( Dias, Jorge de Figueiredo, in Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 165 ).

Suscita-se frequentemente nos tribunais a questão de saber se a execução da pena acessória em causa tem início logo com o trânsito em julgado da decisão ou, antes, com a efectiva entrega ou apreensão do título de condução.

A questão parece descabida, logo em confronto com a letra da lei, da qual resulta que os efeitos respectivos se produzem a partir do trânsito da decisão ( cfr. art. 69º, n.º 2, do C. Penal ) - cfr. acórdão da Relação de Porto, de 1 de Abril de 2002, in www.dgsi.pt.

Todavia, não falta quem sustente que a concatenação daquele preceito legal com o art. 500º, n.ºs 2 a 4, do C. de Processo Penal, impõe a conclusão oposta (cfr. ac. da Relação de Guimarães, de 8 de Julho de 2002, in Colectânea de Jurisprudência, ano XXVII, t. IV, pág. 282, ac. da Relação de Coimbra, de 26 de Março de 2003, in C. J., ano XXVIII, t. II, pág. 41). Essencialmente, tal posição funda-se em que este último preceito, na medida em que disciplina a execução da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, determinando a entrega desta, e, no limite, a sua apreensão coerciva com retenção dela pelo período da dita proibição, implica, necessariamente, a consideração de tal acto como termo inicial daquela reacção criminal.

Porém, um tal modo de perspectivar o problema eleva a entrega ou apreensão do título a uma qualidade que notoriamente não têm: a condição de execução da pena (cfr. Latas, António João Casebre, in A Pena Acessória de Proibição de Conduzir, Sub Judice, n.º 17, Janeiro/Março 2000, Maio de 2001, pág. 95 ).

Acresce que, embora constasse do anteprojecto de 1987 de revisão do Código Penal a regra do desconto no período de cumprimento da proibição do prazo ‘ ( ... )...

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