Acórdão nº 9333/07.4TBVNG-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução07 de Outubro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADO PROVIMENTO Sumário : I) - Pretende a reclamante, que, não tendo intervindo na acção declarativa onde se decidiu que os recorridos-exequentes gozavam do direito de retenção sobre a fracção predial de que eram promitentes-compradores, por mor do incumprimento do contrato-promessa de compra e venda por parte do promitente-vendedor, que essa sentença por não fazer quanto a si caso julgado não a vincula, devendo outra decisão – no caso a sentença proferida na reclamação de créditos – decidir pela prevalência do seu crédito hipotecário sobre aquele direito de retenção.

II) – Constitui regra que o caso julgado tem eficácia inter-partes, já que na acção declarativa a decisão visa, em princípio, regular o conflito de interesses entre quem intervém como parte, daí que o conceito de legitimidade activa e passiva tenha implícita essa consideração – arts. 26º e 27º do Código de Processo Civil.

III) – No caso em apreço, não se verifica a tríplice identidade a que alude o art.498º do Código de Processo Civil, pelo que a conclusão a extrair é que a sentença invocada como título executivo não constitui caso julgado em relação à recorrente CGD, nem directamente a vincula – artigos 497º, nº 1, 498º, nºs 1 e 2, 671º, nº1, do Código de Processo Civil.

IV) – Esta consideração não esgota o enquadramento jurídico que a questão decidenda postula, porque, pese embora o facto da recorrente não ser parte, [por via de regra o caso julgado apenas tem efeitos inter-partes, repete-se], outros, titulares de relações jurídicas que contendem com decisões onde não intervieram, podem ser afectados jurídica ou economicamente, pelo que importa ponderar outro conceito, o de terceiro.

  1. – São diversos os conceitos de parte e de terceiro.

    Partes são os titulares dos direitos pleiteados que intervêm em acção ou execução judiciais e que ficam vinculados à decisão judicial aí transitada em julgado, e terceiros são quaisquer outros estranhos a esse conflito.

    VI) – O caso julgado pode afectar terceiros, sendo então de fazer a destrinça entre terceiros juridicamente dependentes e terceiros juridicamente indiferentes.

    VII) - No caso em apreço, a sentença proferida em 14.4.2005, pela 2ª Vara Mista do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Gaia, processo onde a CGD não interveio, reconheceu aos Autores/exequentes o direito de retenção sobre a fracção predial prometida vender, que veio a ser penhorada, e sobre a qual a recorrente dispõe de duas hipotecas voluntárias para garantia do seu crédito, contende com a consistência jurídica da sua posição de credor privilegiado, desde logo, porque nos termos dos arts. 442º, 755º, nº1, f) e 759º, nº2, do Código Civil o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca ainda que esta tenha sido registada anteriormente.

    VIII) – Sendo certo que a sentença não põe em causa – nem podia, sob pena de nulidade – o direito da CGD, enquanto credora hipotecária, direito que nem sequer foi discutido na acção declarativa, o certo é que tal sentença não pode ser indiferente à recorrente do ponto em que a graduação afecta a consistência jurídica da sua garantia real em confronto com aqueloutra mais forte que é o direito de retenção conferido ao promitente-comprador-exequente que obteve a “traditio”, pela sentença exequenda.

    IX) – A CGD ao reclamar o seu crédito não impugnou a existência do direito de retenção e podia e devia fazê-lo nos termos dos art. 866º, nºs 2, 3, e do Código de Processo Civil, na redacção do DL.38/2003, de 8 de Março, e, sobretudo, nos termos do art. 816º, nº5, a contrario.

  2. - Na reclamação de créditos, o credor reclamante, não abrangido pelo caso julgado, que reconheceu a terceiro um direito real que afecta juridicamente o seu direito provido também de garantia real, tem o ónus de impugnar essa garantia, sob pena de não o fazendo ela persistir incólume.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Por apenso aos autos de Execução para Pagamento de Quantia Certa instaurados pelos exequentes: AA e BB, pendentes no Juízo de Execução do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Gaia contra os executados: CC e DD.

    A Caixa ..., S.A. reclamou, em 15.5.2007, um crédito no montante de €18.898,16, acrescido de juros, crédito esse garantido por hipoteca sobre a fracção penhorada.

    Foram notificados os executados e o exequente, não tendo sido deduzida impugnação.

    Foi proferida sentença (fls. 110 e 111) que reconheceu os créditos, graduando-os do seguinte modo: - Em primeiro lugar, o crédito reclamado.

    - Em segundo, o crédito exequendo.

    Inconformados, os exequentes interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que, por Acórdão de 9.3.2010 – fls. 211 a 219 – julgou a apelação procedente, revogando a sentença recorrida e graduando os créditos, para serem pagos pelo valor da referida fracção penhorada, do seguinte modo: Em primeiro lugar, o crédito exequendo.

    Em segundo, o crédito reclamado pela C….

    Inconformada, a reclamante C... recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça e, alegando, formulou as seguintes conclusões: I – Do estatuído nos arts. 671º,nº1, e 498º, nº2, do Código de Processo Civil, resulta que a sentença que reconheceu o alegado direito de retenção só tem força de caso julgado entre as partes presentes naquela acção.

    II – Assim sendo, não é oponível à ora recorrente.

    III – Consequentemente, o crédito da ora recorrente, em virtude da hipoteca de que beneficia, deveria ter sido graduado com prevalência sobre o crédito exequendo.

    IV – Ao não decidir assim, o acórdão de que se recorre violou o estatuído nos arts. 671º,nº1, e 498°, nº2, do Código de Processo Civil, e, reflexamente, o disposto no art. 686º, nºl, do Código Civil.

    Sem prescindir, e para o caso de assim não se entender: V – Atento o disposto no nº4 do art. 866º do Código de Processo Civil, a impugnação de créditos, tem por fundamento quaisquer causas que extinguem ou modificam a obrigação, ou impedem a sua existência.

    VI – Logo, o que se discute em sede de impugnação de créditos é apenas a dívida em si, nunca as respectivas garantias.

    VII – Pelo que nunca à ora recorrente seria lícito discutir o direito de retenção, no apenso de reclamação de créditos, e em sede de impugnação.

    VIII – Assim sendo, o único meio processual em que o poderia ter feito, seria na acção em que se discutiu o direito de retenção, e para a qual, como já se disse, não foi citada nem a sua intervenção suscitada.

    IX – Nesta conformidade, e não sendo a sentença que declarou o alegado direito retenção oponível à ora recorrente, o crédito da ora recorrente deveria ter sido graduado em primeiro lugar, de acordo com a prioridade que a respectiva hipoteca lhe confere.

    Por fim, ainda sem prescindir, e para o caso de assim não se entender: XX – Considerando-se que seria no apenso de reclamação de créditos que a ora recorrente deveria ter impugnado o alegado...

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