Acórdão nº 0323/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelJORGE DE SOUSA
Data da Resolução21 de Setembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A… instaurou contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES acção administrativa especial de condenação à prática de acto devido, pedindo a condenação da R. a «deferir o pedido de aposentação/jubilação apresentado pelo A.

».

O Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgou procedente a acção, condenando a R. a «deferir o pedido de aposentação/jubilação apresentado pelo A.

».

A R. interpôs recurso de apelação para o Tribunal Central Administrativo Sul que negou provimento ao recurso, por acórdão de 14-1-2010.

Do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul foi interposto o presente recurso excepcional de revista, que foi admitido pela formação prevista no art. 150.º, n.º 5, do CPTA, em acórdão de 28-4-2010.

A Recorrente apresentou alegações com as seguintes conclusões: 1.ª O presente recurso de revista deverá ser admitido uma vez que se pretende determinar se “a alteração introduzida pelo artigo 3.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro é aplicável ou não ao regime de jubilação/aposentação dos Magistrados Judiciais, o que evidencia especial relevância jurídica da dita questão. Por outro lado, também se patenteia o relevo social da questão em análise, podendo interessar a um número alargado de outros casos, ao mesmo tempo que as situações subjacentes à aplicação da questionada norma assumem uma particular relevância comunitária, por se reportarem a uma matéria sensível, como é a atinente ao estatuto sócio profissional de um determinado grupo profissional, pondo em causa uma mudança de paradigma, quanto ao regime de reforma/jubilação, o que tudo reclama a intervenção deste STA, no âmbito do recurso de revista” (cfr. Acórdão de apreciação preliminar do STA, proferido no Recurso n.º 8/10, de 20 de Janeiro de 2010, em tudo idêntico ao presente processo).

  1. O que está em causa, como sempre esteve, é a interpretação da norma prevista no artigo 67.º, n.º 1, do Estatuto dos Magistrados Judiciais que remete para o n.º 1 do artigo 37.º, 11.º 1, do Estatuto da Aposentação, designadamente saber se aquela remissão tem um carácter dinâmico ou estático. É esta a questão interpretativa suscitada pela CGA que carece de solução e não uma pretensa aplicação, por via de integração, do Decreto-lei n.º 229/2005, de 29.12, ao Estatuto dos Magistrados Judiciais, coisa que nunca sucedeu.

  2. Os fundamentos e as condições da aposentação/jubilação dos magistrados judiciais correspondem, como sempre corresponderam, ponto por ponto, aos previstos no EA para a generalidade dos subscritores da função pública — cfr. artigo 63.º da Lei n.º 85/77, de 13 de Dezembro; artigo 67.º da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho; e artigo 37.º, n.º 1, do EA, na redacção do Decreto-lei n.º 498/72, de 9 de Dezembro, e, posteriormente, do Decreto-lei n.º 191-A/79, de 25 de Junho.

  3. Dito de outro modo, a idade legal de aposentação e o tempo de serviço exigidos como condições de aposentação voluntária não antecipada jamais constituíram um desvio do regime de aposentação/jubilação dos magistrados em relação ao que se prevê no Estatuto da Aposentação.

  4. A alteração da idade legal de aposentação e do tempo de serviço exigidos para a generalidade dos subscritores da CGA, nos termos do artigo 37.º, n.º 1, do EA, produzidos pelas Leis n.º 60/2005 e 11/2008, não consubstanciam modificações substanciais que afrontem ou coloquem em causa as garantias constitucionalmente consagradas do exercício da actividade jurisdicional, designadamente os princípios da independência, da inamovibilidade e da irresponsabilidade.

  5. Razão pela qual a remissão expressa do artigo 67.º, n.º 1, do EMJ para o artigo 37.º do EA, é feita para a redacção em vigor em cada momento (remissão dinâmica) e não para uma outra qualquer cristalizada no tempo (remissão estática).

  6. Acresce que a incorporação com cristalização da anterior redacção do n.º 1 do artigo 37.º do EA — 60 anos de idade e 36 anos de tempo de serviço para aposentação voluntária - no n.º 1 do art.º 67.º EMJ, como pretende a sentença recorrida, impediria que os magistrados pudessem usufruir das actuais condições de aposentação/jubilação voluntária produzidas com a Lei n.º 11/2008, de 20 de Fevereiro, que deu nova redacção ao artigo 3.º da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, pelas quais bastam, por exemplo, em 2008, 65 anos de idade e 15 anos de serviço ou, em alternativa, 61 anos e 6 meses de idade e 33 anos de serviço.

  7. O Decreto-Lei n.º 229/2005, de 29 de Dezembro, que procedeu à revisão dos regimes que consagram desvios às regras previstas no Estatuto da Aposentação em matéria de tempo de serviço, idade de aposentação, fórmula de cálculo e actualização das pensões, para determinados grupos de subscritores da Caixa Geral de Aposentações, por forma a compatibilizá-los com a convergência do regime de protecção social da função pública ao regime geral da segurança social no que respeita às condições de aposentação não se aplica aos magistrados judiciais.

  8. Do âmbito desse diploma (e não doutro) foram excluídos os magistrados, desde logo, por uma razão de carácter formal: não se pode operar a aproximação ou a convergência do «desvio» relativo à aposentação/jubilação dos magistrados ao regime geral de segurança social por este instrumento legislativo, mas por Lei, mediante alteração do próprio EMJ.

  9. Insiste-se: a alínea d) do n.º 2 do artigo 1.0 do Decreto-Lei n.º 229/2005, de 29 de Dezembro, excluiu os magistrados do âmbito de aplicação deste diploma e não da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro.

  10. O «desvio» do regime de aposentação/jubilação dos magistrados judiciais, não se encontra, nem nunca se encontrou, na idade ou no tempo de serviço exigível para a aposentação, antes se consubstancia no cálculo e actualização das pensões, justificadamente mais favorável do que aquele que se encontra(va) estabelecido no Estatuto da Aposentação para a generalidade dos subscritores da CGA, em nome do relevo, do estatuto especialmente prestigiado que a nobre função jurisdicional indubitavelmente merece, e das garantias constitucionais que o seu exercício exige (como a independência e imparcialidade).

  11. Com efeito, a jurisprudência, partindo especialmente do disposto nos n.º s 2 e 4 do artigo 68.º do EMJ, determinou que as pensões dos magistrados jubilados por limite de idade, incapacidade ou nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 37.º do Estatuto da Aposentação (quer no que diz respeito ao cálculo, quer à sua actualização), encontram-se indexadas às remunerações ou vencimentos ilíquidos dos magistrados de categoria e escalão correspondentes no activo.

  12. Razão pela qual não é aplicada ao cálculo das pensões dos magistrados judiciais a fórmula prevista no Decreto-Lei n.º 286/93, de 20 de Agosto, nem as novas regras de cálculo de pensão, previstas sucessivamente na Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, e na Lei n.º 52/2007, de 31 de Agosto, que aplicam as regras de cálculo das pensões do regime geral de segurança social à generalidade dos subscritores da CGA.

  13. O cálculo das pensões dos magistrados jubilados é efectuado com base na remuneração ilíquida auferida pelo interessado à data do acto ou momento determinante da aposentação, nos termos do artigo 43.º do EA e na proporção do tempo de serviço correspondente à carreira completa que tenham nessa data, ou seja, o montante da pensão de aposentação/jubilação por limite de idade ou voluntária não antecipada sem fundamento em incapacidade é — como sempre foi - directamente proporcional ao tempo de serviço prestado, com o limite máximo de anos de serviço em vigor à data do acto determinante.

  14. No caso sub judice, no ano em que recorrido requereu a aposentação não possuía ainda a idade legal para se poder aposentar/jubilar voluntária e não antecipadamente.

  15. A interpretação segundo a qual a remissão do artigo 67.º, n.º 1, do EMJ para o artigo 37.º, n.º 1, do EA, tem carácter dinâmico, com recurso aos elementos de interpretação jurídica previstos no artigo 9.º do Código Civil, não configura uma situação de usurpação de poder.

  16. Pelo exposto, violou o Acórdão recorrido o disposto nos artigos 67.º, n.º 1, do EMJ, e 370 do EA, na redacção actual, pelo que deverá ser revogada, com as legais consequências.

Termos em que, com o suprimento de V.’s Ex.’s deve o presente recurso de revista ser admitido, e, a final, ser julgado procedente, com as legais consequências.

O Autor contra-alegou, concluindo da seguinte forma: 1. A questão central que se discute nos presentes autos gira em torno de saber qual o regime jurídico que rege a aposentação/jubilação dos Magistrados Judiciais, após a entrada em vigor da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro; 2. O argumento decisivo para a não aplicação da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, aos Magistrados Judiciais decorre, necessariamente da especificidade do seu Estatuto; 3. Com efeito, os Magistrados Judiciais integram uma categoria profissional que goza de especialidades no que toca a esta matéria, especialidades de regime que desde sempre encontraram a sua justificação na natureza das funções que a própria CRP comete aos Tribunais, como órgãos de soberania; 4. O princípio da unicidade estatutária impõe, segundo jurisprudência do Tribunal Constitucional, que qualquer alteração ao estatuto (quer formal, quer material — através da alteração de normas para as quais remete) tenha que ser feita pela Assembleia da República, em sede da sua reserva absoluta - art. 164.º, aI. m), da CRP; 5. Ora, tendo a Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro, sido aprovada no âmbito sua reserva relativa da AR, significa que o regime jurídico introduzido por aquele diploma só poderia valer para os Magistrados Judiciais depois de remissão expressa para si do respectivo Estatuto; 6. Pode até acontecer que, em sede de revisão do EMJ, venha a ser acolhido o regime da Lei n.º 60/2005, de 29 de Dezembro. No entanto, realce-se, a questão central é que tem de ser o EMJ, ou uma norma emitida pela AR em matéria de reserva...

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