Acórdão nº 3684/05.0TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2010

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução14 de Julho de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. O contrato-promessa, por si só, embora seja um acordo preparatório de outro contrato, tem natureza contratual.

2. A proposta para a celebração de um contrato tem de ser completa, precisa, firme e formalmente adequada.

3. E o contrato considera-se concluído com a aceitação, que tem de traduzir uma inequívoca e total concordância com a proposta e revestir a forma exigida para aquele.

4. A proposta de venda de um imóvel e a sua sequente aceitação, constituem duas declarações recipiendas das partes, que levarão à conclusão de um verdadeiro contrato de compra e venda e não a um contrato autónomo deste, um contrato-promessa de compra e venda. Sendo, porém, aquele contrato pelas partes gizado, nulo, se não tiver a forma legalmente prescrita.

5. Não havendo contrato celebrado, não se pode, naturalmente, falar de incumprimento.

6. Tendo a ré violado o negócio em preparação, poderá incorrer em responsabilidade civil pré-contratual, por culpa in contrahendo (art. 227.º do CC).

7. E, quando em virtude da culpa in contrahendo tiverem sido causados danos à outra parte, discute-se se a indemnização se refere ao interesse contratual negativo (ou de confiança) ou ao interesse contratual positivo (ou de cumprimento).

8. A responsabilidade pré-contratual por ruptura de negociações preparatórias actua, em princípio, nos limites do interesse negativo, podendo, porém, se tal culpa in contrahendo estiver na violação do dever de conclusão de um contrato a responsabilidade em causa tender para a cobertura do interesse positivo.

9. A obrigação de indemnizar por culpa in contrahendo, qualquer que seja o facto típico que a justifique, depende da produção de um dano e dos demais elementos constitutivos da responsabilidade civil.

10. A prova do nexo causal – sendo necessário estabelecer uma ligação positiva entre a lesão e o dano, através da previsibilidade deste em face daquela (art. 563.º do CC) - como um dos pressupostos da obrigação de indemnizar, cabe ao credor.

11. O processo de determinação do nexo de ligação do facto ao dano comporta duas fases: (i) numa, a inicial, averigua-se no plano naturalístico se certo facto concreto é ou não efectivamente condicionante de um dano; (ii) noutra, posterior, determina-se se esse facto, considerado em abstracto e em geral, é ou não apropriado a provocar tal dano.

12. A primeira das ditas fases constitui pura matéria de facto, radicando a segunda numa operação de subsunção jurídica e, como tal, pode ser fiscalizada pelo tribunal de revista.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA – Investimentos Imobiliários, S. A veio intentar acção, com processo ordinário, contra CONSTRUÇÕES BB, LDA, pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de € 5 400.000 e juros vencidos, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Alegando, para tanto, e em suma: Em Junho de 2004, no exercício da sua actividade de desenvolvimento de projectos de investimento imobiliário, entabulou negociações com a ré tendentes à aquisição de um prédio urbano, que melhor identifica, a esta pertencente.

Depois de várias reuniões e contactos, acabou por aceitar, sem condições e integralmente, a proposta da ré, tendo ficado coma certeza da concretização do negócio. Tendo desistido de um outro, alternativo, no qual, se levado por diante, obteria um lucro de € 1 950.000.

Pretendia a A. desenvolver um projecto de investimento que envolvia a realização de obras de demolição do prédio, reconstruindo outro em regime de propriedade horizontal para venda das respectivas fracções autónomas. O que era do conhecimento da ré.

Para tanto, celebrou com uma sociedade, que melhor identifica, um contrato de prestação de serviços, tendo por objecto a preparação do pedido de informação prévia, elaboração do projecto de arquitectura, projectos de especialidades e acompanhamento da respectiva execução, obrigando-se a pagar-lhe a quantia de € 290 000.

A ré recusou-se a cumprir o acordado com a autora, não tendo formalizado o mesmo através de escritura pública.

Se a A. tivesse desenvolvido o projecto em causa, teria tido um lucro não inferior a € 5 400.000.

O acordo estabelecido com a ré configura um verdadeiro contrato-promessa de compra e venda, que esta incumpriu, causando–lhe danos no montante peticionado.

Ou, pelo menos, um acordo pré-contratual, tendo a ré violado os deveres de seriedade, lealdade e honestidade, decorrentes do princípio da boa fé, devendo a ré indemnizá-la, no aludido montante, pelos lucros que teria tido, se o contrato de compra e venda se realizasse.

Sempre tendo direito a ser indemnizada pela frustração do interesse contratual negativo, abrangendo os encargos que contraiu e os lucros que deixou de obter, nos montantes de € 290 000 e € 1 950.000.

Citada a ré, veio contestar e reconvir, alegando, também em síntese: Houve, de facto, negociações entre a A. e a Ré, não passando as mesmas disso.

E se expectativas a autora criou, apenas a si se devem.

Não houve qualquer contrato-promessa de compra e venda entre as partes.

Não houve qualquer incumprimento por banda da ré.

A A., com a sua conduta, denegrindo a imagem da ré, causou-lhe danos patrimoniais indirectos, pretendendo deles ser indemnizada, com liquidação em execução.

Pediu, ainda, a condenação da autora como litigante de má fé.

Replicou a autora, mantendo a sua pretensão originária e contestando o pedido reconvencional deduzido. Impugnando os factos, que considera não sérios, atinentes ao pedido de condenação por litigância de má fé.

Foi proferido o despacho saneador, no qual, e alem do mais, se rejeitou liminarmente o pedido reconvencional formulado.

Foram fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 316 a 320 consta.

Foi proferida a sentença, que, na improcedência da acção, absolveu a ré dos pedidos.

Inconformada, veio a autora, sem êxito, interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa.

De novo irresignada, veio a autora pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - Tendo em consideração os factos provados nos autos, designadamente as declarações emitidas por ambas as partes, deve concluir-se que entre elas se concluiu um acordo que deve qualificar-se como contrato promessa, que é válido e eficaz.

  1. - Sem prescindir, da violação, pela recorrida, do dever de celebração do contrato de compra e venda para ela resultante do acordo pré-contratual final (assim como, de resto, do que resultaria do contrato promessa) que acertou com a recorrente, adveio para esta, efectivamente, um dano: o dano consistente na não celebrado do contrato devido. e consequente não entrada na esfera jurídica da autora do prédio da ré cuja transmissão desse contrato resultaria, assim como do lucro que, com ele, a preços de mercado, se poderia obter.

  2. - A celebração de um contrato com um terceiro (gabinete de arquitectura, no caso) de onde resulta a obrigação de pagar um certo montante (€ 290 000,00, no caso) - e, portanto, o aumento do passivo - constitui um dano, ainda que, circunstancialmente, esse montante não se mostre ainda pago.

Não houve contra-alegações.

Corridos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir.

Vem dado como PROVADO: 1. A Autora resulta da transformação de AA - Investimentos Imobiliários, Lda., e tem por objecto o desenvolvimento de projectos de investimento imobiliário, nos termos que constam dos docs. 1 e 2 da petição inicial que se dão por reproduzidos (al. A); 2. No exercício da sua actividade, a Autora, em Junho de 2004, entabulou com a Ré negociações tendentes à aquisição do prédio urbano situado na Rua ..................., em Lisboa, composto de rés-do-chão e 3 andares, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º 0000000000, nos termos que constam do doc. 3 da petição inicial que se dá por reproduzido (al. B); 3. A Ré, em 06 de Dezembro de 2000, através de escritura pública, adquiriu o prédio identificado no n.º 2 (al. O); 4. A Autora interessou-se pelo prédio identificado no n.º 2 para desenvolver um projecto de investimento que envolvia a realização de obras destinadas a transformá-lo em edifício de habitação e comércio (resp. ao n.º 1 da BI); 5. O projecto envolvia, além do prédio identificado no n.º 2, dois prédios vizinhos - os nºs 6 e 8 a 10 da mesma rua (n.º 3); 6. Tendo a Autora também estabelecido com os seus proprietários negociações tendentes à respectiva aquisição (n.º 4); 7. O que consta dos nºs 4 e 5 era do conhecimento da Ré (n.º 5); 8. A Autora, através de BB, seu administrador, fez chegar à Ré, em 5 de Julho de 2004, por via de telecópia, uma proposta de compra do prédio identificado no n.º 2, nos termos que constam do doc. 4 que se dá por reproduzido (al. C)); 9. Após a proposta referida no n.º 8, existiram contactos e reuniões entre a Autora e a Ré (n.º 7); 10. Nesta proposta a Autora indicou, como preço de aquisição, € 1.150.000,00, propondo-se pagar 20% no momento da assinatura do contrato promessa de compra e venda, 20% por ocasião da entrega do projecto de arquitectura na Câmara Municipal de Lisboa, 20% no momento após aprovação do referido projecto, 20% no momento de emissão do alvará de...

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