Acórdão nº 2655/04.8TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Maio de 2010

Data20 Maio 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: ORDENADA A BAIXA DO PROCESSO Sumário : - As contradições na matéria de facto só relevam, em sede de recurso de revista, quando inviabilizem a solução jurídica do pleito.

- A contradição entre factos não provados e factos provados não merece, em regra, relevância, por não determinar colisão entre respostas positivas e negativas, pois que estas últimas nenhum juízo permitem formular sobre os factos indagados, tudo se passando como se o mesmos não existissem ou não tivessem sido alegados.

- Apesar disso, a contradição poderá existir, excepcionalmente, se as respostas negativas não acolheram facto que constitui ou integra antecedente lógico necessário de resposta afirmativa.

- Assim, se as respostas negativas tinham conteúdo sobreponível ao da resposta positiva, impor-se-ia, necessariamente, na medida do concurso dessa sobreponibilidade, a inerente coincidência ou harmonia nas respostas, sob pena de contradição.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - “... – Actividades Eléctricas Associadas, S.A.” instaurou contra “S... – Sociedade Fornecedora de Máquinas Industriais, Lda.” acção declarativa pedindo que a R. fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 78 991,67, acrescida dos juros de mora sobre as quantias de € 29 767,12, desde 15 de Dezembro de 2001, e de € 24 861,73, desde Maio de 2001.

Para tanto, alegou, em síntese, que celebrou com a R. um contrato de subempreitada para a execução da instalação eléctrica na obra de remodelação e modernização das Estações Elevatórias do Aravil e Ladoeiro, pelo preço de 68 080 740$00, que fora adjudicada à R. pelo Instituto de Hidráulica, Engenharia Rural e Ambiente. No decurso dos trabalhos, a Ré suspendeu-os relativamente à estação de Aravil, o que tornou impossível a sua conclusão no prazo contratado e a inerente prorrogação efectiva do estaleiro, com o que a A. sofreu custos, no valor de 20.472,96€, que a R. não pagou; a revisão de preços, em consequência do atraso nos trabalhos, em cerca de doze meses, no valor de 5 100 660$00, não foi paga; a Ré também não devolveu as retenções contratuais, no valor de 24.861,73€, quando o deveria ter feito com a recepção provisória da empreitada, ocorrida em Maio de 2001.

A R. contestou e requereu a intervenção acessória do Instituto de Desenvolvimento Rural e Hidráulica, que foi admitida.

Alegou a Ré que os atrasos foram imputáveis à A., que o contrato não previa a revisão de preços, que são preços firmes, e que as retenções contratuais apenas serão de devolver com a recepção definitiva da empreitada, que ainda não se efectuou. Concluiu pela improcedência da acção.

A final, foi proferida sentença, que, julgando a acção parcialmente procedente, condenou a R. a pagar à A. as quantias de € 24.861,73, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 1 de Maio de 2006 até integral pagamento, e de € 25.441,98, acrescida de IVA, e de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento, e absolveu a R. do restante pedido.

Apelaram ambas as Partes.

A Relação negou procedência ao recurso da Autora, mas atendeu parcialmente a pretensão da Ré, que viu limitada a sua condenação ao pagamento à Autora da quantia de 24.861,73€, acrescida dos juros de mora.

Interpõe agora a Autora recurso de revista em que pede a condenação da Ré a pagar à Autora (i) uma indemnização pelos custos extraordinários com o prolongamento do estaleiro até ao valor de 20.472,96€ mais IVA, a liquidar em momento ulterior, nos termos do art. 661°, nº 2 do CPC, ou, se assim não se entender, fixando uma indemnização equitativa nos termos do art. 566°, n° 2 do CC, bem como, (ii) a título de revisão de preços, o valor de 25.441,98€ acrescido dos juros comerciais vencidos desde 14 de Dezembro de 2001 e dos que se vencerem até pagamento.

Fundamentando as suas pretensões verteu nas “conclusões” que se transcrevem: INDEMNIZAÇÃO PELOS CUSTOS EXTRAORDINÁRIOS COM O PROLONGAMENTO DO ESTALEIRO.

A - Não é verdade que não tenha ficado demonstrado o dano: ficou demonstrado, como resulta sobretudo dos pontos de facto 9., 38. e 39., a existência de um dano concreto e claramente identificado quanto ao objecto (custos com o prolongamento do estaleiro da Autora naquela obra concreta durante seis semanas).

B - Apenas não ficou demonstrada a respectiva quantificação, tendo em conta a manutenção da decisão proferida em primeira instância de julgar como não provados os factos levados à base instrutória sob os números 4° a 22°,24° e 25°.

C - Não se pode fazer equivaler a concretização do dano à respectiva quantificação, sob pena de se retirar toda a utilidade a preceitos como o artigo 661°, n° 2 do Código de Processo Civil, ou os artigos 566°, n° 3 e 569°, parte inicial, do Código Civil.

D - A circunstância de ter ficado demonstrada a existência do dano, mas não o seu valor, apenas implica que a Ré seja condenada naquilo que vier a ser liquidado, conforme dispõe o artigo 661°, n° 2 do Código de Processo Civil, conclusão que sai reforçada pela constatação de que a lei dispensa até o demandante da indemnização de a quantificar (cfr. art. 569°, primeira parte do Código Civil).

E - Ou, caso assim não se entendesse, sempre deveria o Tribunal fixar equitativamente um valor indemnizatório, nos termos do art. 566°, n° 3 do Código Civil.

F - No caso em apreço, o dano verificado não é imputável à Autora, antes foi causado pela suspensão dos trabalhos ordenada pela Ré e pelo Dono da Obra, referida nos factos 12., 13. e 69.

G - É o que resulta expressamente dos factos 20., 22., 23., 24 e 36.(…).

H - Os factos 50. a 57. não têm a virtualidade de invalidar o que foi dito, nem põem em causa que as seis semanas de prolongamento de estaleiro, com as despesas inerentes, não foram imputáveis à Autora (…).

I - O facto de a suspensão dos trabalhos ter afectado apenas uma parte dos trabalhos previstos na encomenda à A (facto 50.), em nada contradiz a versão da própria Autora. O relevante é que a Autora não pôde concluir os seus trabalhos por causa da referida suspensão.

J - O facto 51. não contém senão generalidades (…).

L - O facto 52. não permite infirmar a conclusão de que a Autora não foi responsável pela suspensão da obra, e por esta só ter podido ser retomada muito depois do termo do prazo contratual.

M - O atraso de 9 meses no Ladoeiro (facto 53.) não permite, também, nenhuma censura à Autora (…).

N - Quanto às reclamações da Ré (facto 54.), a verdade é que cada um reclama o que quer (…).

O - O facto 55., que afirma que a Autora não concluiu os seus trabalhos no prazo suplementar de seis semanas que lhe foi dado, é frontalmente contrário ao facto 36., que afirma precisamente o oposto - isto é, que a Autora concluiu os seus trabalhos dentro das seis semanas previstas - sendo certo que foi este último o facto primeiramente dado como provado, pelo que o facto 55. deveria pura e simplesmente ser dado como não escrito.

P - De qualquer forma, mesmo que fosse verdade que a Autora não concluiu os seus trabalhos dentro das referidas seis semanas (o que não se concede), não se vê em que é que isso impediria a procedência do seu pedido, pois que esta se limita a pedir ressarcimento por seis semanas de estaleiro, não mais.

Q - O facto 56, mais uma vez, é contraditório com o facto 36, apenas se compreendendo como referindo-se a correcções nos trabalhos eléctricos que, por sua natureza, só deveriam ter sido realizadas já depois de o sistema ser funcionado durante algum tempo.

R - De qualquer forma, mesmo que fosse correcto que os trabalhos da Autora tivessem terminado apenas em Julho de 2001, nada nisso infirmaria que as seis semanas suplementares necessárias foram devidas a causas alheias à Autora, sendo certo que esta nunca pediu mais do que o custo da manutenção do estaleiro durante essas seis semanas (…).

S - Também o facto 10., na parte em que refere a cláusula contratual segundo a qual "será assegurado pela ... o ajustamento dos seus trabalhos ao da construção civil e às possibilidades de progressão da S... e seus demais subempreiteiros", em nada impede o direito da Autora à indemnização, não só (i) porque o dever de ajustamento daí resultante apenas vale durante o prazo contratual, que já há muito havia sido ultrapassado, como (ii) porque nada nessa cláusula afasta o ressarcimento do subempreiteiro pelas despesas acrescidas e inesperadas que lhe advenham do tempo de estaleiro não previsto contratualmente, como ainda (iii) porque uma qualquer intenção de afastamento contratual do direito a esse ressarcimento sempre seria ilegal e nulo, por contrariar a norma expressa do Código Civil que prevê a compensação pelo acréscimo de despesas (art. 1216° do Código Civil), a qual não pode deixar de considerar-se imperativa, sendo, como é, manifestação do princípio do equilíbrio contratual entre as partes.

T - Donde se conclui que a necessidade de prolongamento do estaleiro durante seis semanas não foi imputável à Autora, ora Recorrente, pelo que esta tem todo o direito a ser ressarcida pelas despesas extraordinárias geradas por tal prolongamento, sob pena de violação do art. 1216°, nº 2 do Código Civil, e dos princípios do equilíbrio contratual, da boa fé contratual e do não locupletamento à custa alheia.

REVISÃO DE PREÇOS.

U - Dos factos 26. a 29. resulta que: - ocorreu um acordo celebrado por escrito (troca de declarações - proposta/contraproposta/aceitação) todas exaradas em documentos escritos; - relativo à revisão de preços (a qual, como já de disse, não se confunde com o problema dos custos extraordinários pelo prolongamento do estaleiro, ainda que ambos representem valores acrescidos em virtude da suspensão e adiamento da possibilidade de conclusão da obra); - pelo qual a Ré se comprometeu a pagar à Autora uma quantia absolutamente certa e líquida (5.100.660$00, ou seja 25.441,98 €), mediante a emissão imediata de uma factura que, como todas as restantes, seria pagável a 60 dias.

V - Dos factos 45. a 49. só os dois...

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