Acórdão nº 0116/10 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2010

Magistrado ResponsávelCASIMIRO GONÇALVES
Data da Resolução19 de Maio de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. A..., recorre da sentença que, proferida pelo TT de Lisboa, julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra o acto de liquidação, pela Câmara Municipal de Lisboa, da taxa de publicidade reportada ao 2º T/2007, no montante de 3.275,40 Euros, pela emissão de licença para afixação de telas publicitárias.

1.2. A recorrente remata as alegações do recurso formulando as Conclusões seguintes: I - A recorrente é uma sociedade comercial que se dedica à prestação de serviços na área da publicidade e de marketing, concepção e produção de artes gráficas, projectos, consultoria e representações.

II - No âmbito dessa sua actividade, a Recorrente, faz exploração comercial de publicidade, designadamente, através da afixação de suportes publicitários em empenas cegas ou fachadas laterais de edificações particulares sedeadas na cidade de Lisboa.

III - A mencionada forma de exploração de publicidade está sujeita ao regime previsto na Lei nº 97/88, de 17.08, alterado pela Lei nº 23/2000, de 23.08, o qual estabelece que a afixação de mensagens publicitárias de natureza comercial, encontra-se, sujeita às regras gerais sobre publicidade, estando dependente de licenciamento prévio a conferir pelas câmaras municipais, para salvaguarda do equilíbrio urbano e ambiental.

IV – A Recorrente com vista à obtenção do licenciamento necessário para o exercício da sua actividade comercial, apresentou junto do Departamento de Gestão de Espaços Públicos da Câmara Municipal de Lisboa, um pedido de licenciamento necessário para a colocação de uma tela publicitária que foi afixada na edificação sita na Av. dos Estados Unidos da América, nº 110, em Lisboa.

V - Tendo sido proferido competente despacho de deferimento do pedido de licenciamento formulado pela recorrente, para a afixação do suporte publicitário.

VI - Em virtude do deferimento do pedido de licenciamento, da colocação de telas em espaços de domínio exclusivamente privado, a Recorrente procedeu ao levantamento da licença, e consequentemente, à liquidação das taxas respectivas.

VII - Em 07.08.2007, a Recorrida remeteu à Recorrente, a factura nº 520000064815, emitida em 01.08.2007, para pagamento de dotações orçamentais, no montante total de € 3.272,40 e com data limite de pagamento designada para o dia 2007.08.31.

VIII - A Recorrida liquidou as mencionadas dotações no montante total de € 3.272,40, contudo, a Recorrente considera que a obrigação pecuniária subjacente é ilegal e inconstitucional, pelo que não lhe é exigível.

IX - Pois, apesar de a Recorrida designar, o tributo de taxa, o mesmo, não é susceptível de se enquadrar no mencionado tipo tributário, já que tem o carácter de um verdadeiro imposto, sendo assim ilegal a sua criação, face ao estatuído no art. 165°, nº 1, al. i) da CRP.

X - Com efeito, a supra referida quantia liquidada, não tem carácter de taxa, mas sim de imposto, já que, no âmbito do respectivo licenciamento não se verificou qualquer contrapartida prestada pela Recorrida à Recorrente, ou tão pouco a remoção de qualquer obstáculo jurídico.

XI - Ora, a taxa exigida pela Recorrida, pela afixação de publicidade em prédios particulares, sem que se prove qualquer contrapartida prestada pelo município ao sujeito passivo, deve ser qualificada como imposto face à Constituição.

XII - A Sentença da 1ª Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa, proferida em 30.06.2008, no âmbito do Processo nº 175/07, veio estabelecer que as taxas são prestações pecuniárias devidas por uma prestação especial – actuação oficial ou actividades assimiláveis – da Administração, ou pela utilização de instalações de locais públicos.

XIII - Nos termos da supra mencionada sentença, o que distingue a taxa do imposto é a sua ligação com uma contraprestação determinável das instituições jurídico-públicas.

XIV - Ora, no caso em apreço não se verifica a existência desse vínculo porque: a. não foi feita utilização de anúncios num espaço público; b. não foi prestada qualquer contrapartida por parte da Câmara que, como assinala, por exemplo o AC. TC. N° 313/92 de 6 de Outubro (Proc. 435/91), e reafirma o AC. TC. 453/03 de 14 de Outubro (Proc. 410/03), mesmo nas hipóteses em que a actividade dos particulares sofre uma limitação, aqueloutra actividade estadual, consistente na retirada do obstáculo à mencionada limitação mediante o pagamento de um tributo, é visto pela doutrina como uma imposição de uma taxa somente desde que tal retirada se traduza na dação de possibilidade de utilização de um bem público ou semi-público.

XV - Não havendo qualquer oneração especial de um serviço público, nem qualquer utilização de um bem público ou semi-público, dado que o local pertence a particulares, terá de se considerar o tributo em causa como um imposto.

XVI - Na verdade estabelece o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 34/04, de 14 de Janeiro, proferido no âmbito do Proc. 33/03, que “trata-se, assim (a orientação jurisprudencial no sentido da inconstitucionalidade orgânica das ditas “taxas de publicidade”), jurisprudência constante, e, aliás, quase unânime deste Tribunal, (...), que cumpre reiterar nos presentes autos, pois não se deparam argumentos susceptíveis de alterar o decidido – não sendo este o caso, designadamente, da ideia de que o anunciante, ao afixar a publicidade em fachadas de prédios, de sua propriedade ou devidamente autorizado pelo proprietário, estaria a fazer uma utilização ou “ocupação” do “espaço público” ou de qualquer bem semi-público, como o ambiente. Como se afirmou nesse Acórdão nº 437/03, não se divisa no caso de qualquer contrapartida específica, na utilização de um bem semi-público, para a remuneração periódica da mera permanência do reclamo e friso em questão”.

XVII - Também reforçando este entendimento, de qualificação deste tipo de tributos como imposto e retirando daí as inevitáveis consequências do ponto de vista da constitucionalidade, vide por exemplo o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19.02.2003, proferido no âmbito do Proc. 01930/02, “I – Os tributos denominados “taxas” cobrados pela Câmara Municipal de Lisboa relativamente à instalação de reclamos em prédios urbanos são, à face da Constituição, de qualificar como impostos. II – Como assim, a sua criação através de diploma não legislativo e não emitido pela Assembleia da República ou pelo Governo devidamente credenciado viola o preceituado nos artigos 106°, 2 e 168°, 1, i) da CRP, versão de 1982”.

XVIII - Ainda no mesmo sentido, vd. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10/12/2003 (Proc. 026820): “– As quantias cobradas ao abrigo dos artigos 3° e 16° do Regulamento de Publicidade da Câmara Municipal de Lisboa, pela colocação de reclamos luminosos em prédios pertença de particulares não são taxas, por ausência de contrapartida prestada pelo município, devendo ser vistas como impostos. II – Não tendo tais encargos sido criados por diploma emanado da Assembleia da República ou pelo Governo devidamente credenciado por aquela, devem as normas que os criaram ser consideradas organicamente inconstitucionais”.

XIX - Assim, sendo o tributo cobrado, pela instalação de mensagens publicitárias em prédios urbanos particulares, qualificado como imposto, verifica-se que o mesmo deveria estar sujeito ao princípio da legalidade de reserva de lei formal constante do artigo 165°, nº 2, alínea i) da CRP.

XX - Todavia, a possibilidade de cobrança de tributos pela instalação de mensagens publicitárias em prédio urbanos particulares, foi criada por meio de um diploma não legislativo, ferido de inconstitucionalidade, por violar os arts. 103°, n° 2 e 165°, nº 2, alínea i) da Constituição da República Portuguesa.

XXI - Com efeito, a inconstitucionalidade dos supra mencionados artigos 3° e 16° do Regulamento de Publicidade do Município de Lisboa, foi já declarada pelo Tribunal Constitucional em diversos Acórdãos, como sejam, os Acórdãos nºs 558/98, publicado no D.R. II Série, de 11/11/1998, nº 63/99, publicado no D.R. II Série, de 31/03/99, 32/2000, 346/2001 e 437/2003, publicado no D.R. II SÉRIE, de 14/02/2004.

XXII - No mesmo sentido, tem vindo a pronunciar-se o Supremo Tribunal Administrativo nos Acórdãos nºs 021278 de 22/06/99, 025815 de 14/03/2001, 01930/02 de 19/02/2003, 026820, de 12/10/2003, 01931/02, de 26/11/2003, 01931/02, de 11/04/2004, 01167/04, de 26/01/2005, 01176/04, de 18/05/2005, e 0379/06, de 15/02/2007.

XXIII - E isto, porque, conforme referido supra, nos termos do disposto do art. 165°, nº 1, al. i) da CRP, a criação de impostos é da exclusiva competência legislativa da Assembleia da República, salvo autorização ao Governo.

XXIV - Perante o exposto, conclui-se que, por via de normas manifestamente ilegais e inconstitucionais, pretende a Recorrida, locupletar-se à custa da Recorrente, exigindo-lhe o pagamento de uma elevada quantia pecuniária que sabe não lhe ser devida.

XXV - Com efeito, não pode deixar de se concluir que a respectiva imposição tem de obedecer aos ditames que pela Lei Fundamental são dirigidos aos impostos.

XXVI - Nos termos do disposto do artigo 135° do Cód. de Procedimento Administrativo, “são anuláveis os actos administrativos praticados com ofensa dos princípios ou normas jurídicas aplicáveis para cuja violação se não preveja outra sanção”.

XXVII - Assim sendo, o acto de liquidação e cobrança ora reclamado, constitui um acto afectado pelo vício da anulabilidade.

XXVIII - Assim, deverá o acto tributário reclamado ser anulado, e em consequência, ser anulada a taxa publicitária liquidada à Impugnante, através da factura nº 520000068415, por manifesta ilegalidade e inconstitucionalidade das normas que a geraram.

Termina pedindo o provimento do recurso e que seja declarada a anulação do acto tributário e administrativo de liquidação e cobrança dos tributos em causa, por manifesta inconstitucionalidade e ilegalidade das normas que os geraram.

1.3. O recorrido Município de Lisboa...

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