Acórdão nº 2493/08.9PCCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelBR
Data da Resolução17 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

* I – Relatório.

1.1.

D.

já identificado nos autos, foi submetido a julgamento porquanto acusado pelo Ministério Público da prática indiciária de factualidade integradora da autoria material consumada de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º 1.º do Código Penal.

J, também melhor identificado, deduziu pedido de indemnização cível peticionando a condenação do mesmo arguido na quantia de € 758,50, isto para ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais por si próprio sofridos em consequência da assacada conduta delitiva.

Por seu turno, os Hospitais da Universidade de Coimbra formularam pedido de reembolso das despesas mantidas em assistência para com o mencionado demandante, por virtude da actuação em causa, fixando o respectivo valor em € 143,50.

Realizado o contraditório, mostra-se proferida sentença determinando, ao ora relevante: - Condenar o arguido pela prática do crime imputado, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), o que perfaz o valor total de € 960,00 (novecentos e sessenta euros).

- Julgar procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelo demandante e, em consequência, condenar o demandado a solver-lhe o montante de € 758,50, sendo que sobre a quantia de 58,50, acrescem juros de mora, à taxa de 4%, contados desde a notificação para contestar o PIC, até efectivo e integral pagamento.

- Julgar procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelos Hospitais da Universidade de Coimbra e, em consequência, condenar o demandado a pagar-lhes o montante de € 143,50 (cento e quarenta e três euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa de 4%, contados desde a notificação para contestar o PIC até efectivo e integral pagamento.

1.2. Irresignado com o sentenciado, o arguido interpôs recurso, extraindo da respectiva motivação a formulação das conclusões seguintes: 1.2.1. Mostram-se incorrectamente julgados, pois que relativamente a eles não foi feita, em audiência, a produção de qualquer prova válida, os factos considerados como provados na decisão recorrida, sob os n.ºs 2, 3 e 4 (por lapso manifesto escreveu 17, 18 e 19).

1.2.2. Decisão que é consequência de uma construção aparentemente lógico dedutiva completamente desfasada da factualidade apurada.

1.2.3. Pelo que incorreu na violação, entre outros, aos artigos 32.º, n.º 2 da Lei Fundamental; 127.º; 340.º e 374.º, n.º 2, estes todos do Código de Processo Penal.

1.2.4. Padece igualmente a decisão recorrida do vício de insuficiência da decisão da matéria de facto provada, a que alude o artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do indicado diploma adjectivo.

1.2.5. A prova produzida nos presentes autos impunha ao Tribunal a quo uma decisão oposta àquela que sufragou, isto atentando-se em que o recorrente não praticou o crime pelo qual vinha acusado e acabou condenado.

1.2.6. O Tribunal a quo apenas valorou a parte que lhe interessava para suportar a condenação do arguido, sendo deste modo irrelevantes os factos que atribuíram à sua conduta o agir em legitima defesa, pois que se encontrava “agarrado” pelo ofendido.

1.2.7. Pelo que devia o Tribunal sindicado tomar uma decisão oposta à que resulta da sentença recorrida, tendo em conta que o recorrente agiu em legítima defesa, ou num contexto que não foi possível determinar em sede de julgamento.

1.2.8. O resultado da acção típica verificado, não foi de modo algum determinado pelo arguido.

1.2.9. Os elementos do tipo legal de crime não se encontram totalmente preenchidos, pelo que o Tribunal a quo fez uma subsunção errada dos factos ao crime de ofensa à integridade física simples.

1.2.10. A condenação do arguido, parte erradamente do pressuposto de que o mesmo desferiu “duas vezes (!)” o copo na cabeça do ofendido, pondo o Tribunal de lado todo o circunstancialismo que levou a que tanto o arguido como o ofendido sofressem lesões recíprocas, por causa da conduta de ambos.

1.2.11. Dúvidas não existem em como estamos perante a violação do princípio in dúbio pro reo, segundo o qual o juiz deve decidir sobre toda a matéria que não seja afectada pela dúvida, e como ficou demonstrado nos autos, pela prova testemunhal, os factos que na sentença foram considerados provados, sofrem irremediavelmente de insuficiência probatória.

1.2.12. Nos presentes autos não ficou só provado que o recorrente não cometeu o crime por que acabou condenado, como foi criada uma claríssima dúvida quanto aos factos pelos quais vinha acusado, impondo-se, assim, a respectiva absolvição.

Terminou pedindo a revogação do decidido.

1.3. Notificado para, querendo, o fazer, respondeu o Ministério Público sustentando a manutenção do sentenciado.

1.4. Admitido o recurso, foram os autos remetidos a esta instância.

1.5. Aqui, a Ex.ma Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer conducente a idêntico improvimento da oposição.

Cumpriu-se com o disciplinado pelo artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

No exame preliminar a que alude o n.º 6 do mesmo inciso, consignou-se nada obstar ao conhecimento de meritis.

Não sendo caso de se decidir, por forma sumária; porque não se mostrando requerida a realização de audiência e, por inexistirem quaisquer provas a dever renovadas, determinou-se o prosseguimento do recurso, com recolha dos vistos devidos, o que sucedeu, bem como submissão á presente conferência.

Cabe, então, ponderar e decidir.

*II – Fundamentação de facto.

2.1. A sentença recorrida teve por provados os factos seguintes: 1. No dia 23 de…. de 2008, pelas 16.30 horas, o queixoso e o arguido encontravam-se nas imediações do Café …, na Rua …, área da cidade e comarca de Coimbra, tendo o primeiro advertido o arguido que não podia sair do café com o copo de vidro na mão.

  1. O arguido, em reacção ao que lhe foi dito, desferiu uma pancada com o copo que tinha na mão no sobrolho direito de J causando-lhe um corte.

  2. Após desferiu outra pancada com o copo no queixoso atingindo-o na nuca, onde lhe provocou outro golpe.

  3. O copo utilizado pelo arguido acabou por se partir, provocando ferimentos também no arguido.

  4. Com tal conduta, J sofreu um ferimento na região perieto-occipital esquerda, com 8 centímetros de comprimento e um ferimento na região supraciliar e pálpebra superior direitas, medindo 2,5 centímetros de comprimento, que lhe determinaram 10 dias de doença, sem incapacidade para o trabalho.

  5. O arguido agiu livre, voluntária e conscientemente, com intenção de agredir fisicamente o queixoso.

  6. O arguido sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.

  7. Por força dos ferimentos referidos em 3., J precisou de receber assistência hospital nos Serviços de Urgência dos Hospitais da Universidade de Coimbra, pela qual pagou € 8,50 de taxa de atendimento.

  8. No momento referido em 1. J vestia uma camisa de marca GAS, no valor de € 50,00 que ficou rasgada com os estilhaços do copo.

  9. O demandante sentiu frustração e dor por força dos ferimentos que sofreu.

  10. Por causa dos ferimentos, J viu-se obrigado a rapar o cabelo que usava comprido.

  11. Os encargos da assistência prestada a J em 23 de…. de 2008, pelo Serviço de Urgência dos Hospitais da Universidade de Coimbra, originada pelos ferimentos apresentados em consequência de agressão praticada por D, ascenderam a € 143,50.

  12. No certificado de registo criminal do arguido nada consta.

  13. O arguido é licenciado em história e estuda turismo e defesa do património.

  14. Vive com a mãe, que é empregada doméstica e o sustenta.

  15. Vivem em casa própria.

2.2. A mesma peça processual e no que concerne agora a factos não provados, consigna: Não se provaram outros factos com interesse para a boa decisão da causa, nomeadamente que:

  1. O demandante sofreu stress, medo e humilhação.

  2. Depois de ter sido advertido pelo queixoso, o arguido colocou-se de costas para o mesmo.

  3. O queixoso agarrou violentamente o arguido por trás, nomeadamente o pescoço, forçando-o com uma das mãos a devolver-lhe o copo.

  4. Os colegas do arguido tentaram afastar o arguido do ofendido, que se encontrava praticamente imobilizado por este.

  5. Com a força que o queixoso fez para retirar o copo da mão do arguido, o vidro partiu-se.

2.3. Por último, é do teor que...

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