Acórdão nº 234/07.7TTMAI.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução17 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. Ressalvadas as limitações constantes do artigo 414.º, n.º 1, parte final, e n.º 2, do Código do Trabalho de 2003, a empregadora, por si ou através de instrutor que tenha nomeado, está obrigada a realizar as diligências probatórias requeridas pelo arguido na resposta à nota de culpa, sendo que a não realização de tais diligências, se não for devidamente fundamentada, determina a invalidade do procedimento disciplinar e, consequentemente, a ilicitude do despedimento, nos termos do artigo 430.º, n.os 1 e 2, alínea b), daquele Código.

  1. O procedimento disciplinar que a empregadora moveu contra o trabalhador — e que culminou com a aplicação da sanção de despedimento, com fundamento em justa causa — é de reputar inválido por violação do princípio do contraditório, no caso consubstanciada pela falta de inquirição de três das testemunhas arroladas pelo trabalhador na resposta à nota de culpa.

  2. A junção ao procedimento disciplinar de uma cópia da resposta à nota de culpa que cada uma das três testemunhas não inquiridas apresentou no respectivo procedimento disciplinar não substitui a sua inquirição.

    Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

    Em 17 de Abril de 2007, no Tribunal do Trabalho da Maia, secção única, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra … – CORPORAÇÃO BB, S. A., pedindo que fosse declarada a ilicitude do seu despedimento e, em consequência, a condenação da ré a reintegrá-lo ao seu serviço «ou, conforme opção, pagar-lhe a indemnização de antiguidade de € 26.078,00», bem como a pagar-lhe as retribuições vencidas desde a data do ilícito despedimento e as vincendas até ao trânsito em julgado da sentença, sendo que já se encontram vencidas prestações no valor de € 1.917,50, e a quantia de € 2.500, a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos, tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal em vigor, devidos até integral adimplemento.

    Em suma, alegou que foi admitido ao serviço da ré, em 1 de Junho de 1990, para, sob a sua autoridade e direcção, desempenhar funções de chefia nível III e que, em 16 de Março de 2007, foi despedido ilicitamente, quer por invalidade do procedimento disciplinar, quer por inexistência de justa causa para o efeito.

    A ré contestou, sustentando a validade do procedimento disciplinar, bem como a existência da justa causa de despedimento invocada.

    O autor respondeu, concluindo como na petição inicial.

    Realizado o julgamento, com gravação da prova, e tendo o autor declarado optar por uma indemnização em substituição da reintegração, foi proferida sentença que, considerando verificar-se a invalidade do procedimento disciplinar, declarou a ilicitude do despedimento do autor e condenou a ré a pagar-lhe (i) a indemnização prevista no artigo 439.º do Código do Trabalho, equivalente a um mês de retribuição base por cada ano ou fracção, no valor de € 26.078 (€ 1.534 x 17), (ii) as retribuições, que este deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão final, a liquidar a final, (iii) a quantia de € 2.500, a título de indemnização por danos não patrimoniais, (iv) e juros de mora sobre as aludidas quantias, à taxa legal, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.

  3. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, impugnando a decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto e sustentando a validade do procedimento disciplinar, a existência de justa causa para o despedimento e, também, que a condenação nos salários intercalares devia limitar-se aos vencidos até Maio de 2007, data em que o autor recomeçou a trabalhar, sendo que o Tribunal da Relação do Porto julgou parcialmente procedente a apelação, alterando a resposta ao quesito 2.º da Base Instrutória [facto provado 28)] e deduzindo aos salários intercalares, «as importâncias obtidas pelo A. com a cessação do contrato e que o mesmo não receberia se não fosse o despedimento, sendo, em 28.05.2009, no montante já liquido de € 22.343,04, e as demais que se vencerem desde tal data e até ao trânsito da decisão final, a liquidar oportunamente», mantendo, no mais, a decisão recorrida.

    É contra esta decisão do Tribunal da Relação do Porto que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, em que alinha as seguintes conclusões: «1) A decisão recorrida considerou procedente a presente acção, condenando a Ré pela ilicitude do despedimento do Apelado, em virtude da declaração de nulidade do processo disciplinar, tendo esta origem na violação do direito de defesa do trabalhador--arguido em sede de processo disciplinar; 2) A dita violação teria tido a sua causa no facto de a Apelante apenas ter ouvido 3 das 6 testemunhas arroladas pelo Apelante na sua resposta à nota de culpa, sem prestar qualquer justificação para o facto; 3) A Apelante entende ter efectivamente ouvido todas as testemunhas indicadas, e por isso não estava obrigada a justificar qualquer omissão; 4) A Apelante acusou o Apelado da prática de determinados actos, mas sempre em associação ou comparticipação com o seus colegas de secção, cuj[o] depoimento foi pedido por aquele, tendo a apelante sempre feito menção a tal associação ao longo do processo disciplinar alegando de forma circunstanciada os factos que em conjunto praticaram ou permitiram que fossem praticados; 5) A sentença considerou provado que: “(...) 13. A Ré/arguente apenas procedeu, no âmbito das diligências probatórias requeridas pelo Autor/arguido, à inquirição das três (3) primeiras testemunhas por este arroladas (sublinhado nosso) [não foi, porém, aposto qualquer sublinhado]; 14. A Ré instaurou procedimentos disciplinares aos colegas de secção do Autor, CC, DD e EE; 15. Foi junto aos autos de processo disciplinar o relato dos factos relevantes por parte [de] CC, DD e EE, sob a forma escrita de defesa apresentada por cada um, conforme indicado pelo então arguido; (...)” 6) Acresce que é claro que a matéria objecto de todos os processos disciplinares era praticamente reproduzida como não poderia deixar de ser em face da comparticipação em causa — vide a este propósito as notas de culpa e respectivas defesas lavradas nos processos das testemunhas em causa! 7) Em cada um dos ditos processos disciplinares, o respectivo arguido juntou resposta à nota de culpa, apresentando a sua versão dos factos objecto dos processos; 8) Os interesses e defesas de cada um daqueles arguidos/testemunhas eram em tudo coincidentes e idênticos; 9) A Apelante fez juntar ao processo disciplinar do Apelado as respostas de cada um dos seus colegas de secção cujo depoimento havia sido requerido, considerando que aqueles escritos constituíam um depoimento testemunhal bastante, não as tendo inquirido pessoalmente; 10) A gestão do processo disciplinar cabe claramente à entidade empregadora, garantindo os princípios do inquisitório, do contraditório quando seja imposto por lei, ou quando se mostre adequado, da simplificação formal, da celeridade e economia processual; 11) Pode, portanto, a entidade patronal gerir a prática de actos ao longo do processo disciplinar, seja, quanto à sua prática ou omissão — caso em este último em que deverá fundamentar a decisão de omitir algum acto —, seja quanto à forma ou formalidades a que a prática do acto deverá obedecer, sem que a sua substância material seja posta em causa; 12) O PROF. ALBERTO DOS REIS, in Código de Processo Civil Anotado IV, pág. 327, diz claramente que “a nossa lei assenta no pressuposto de que a função da testemunha é simplesmente narrar factos”; 13) Como o PROF. ANTUNES VARELA, in Manual De Processo Civil, pág. 609, Coimbra Editora, diz que a prova testemunhal “constitui assim uma declaração de ciência (...)”; 14) Testemunha, será assim uma pessoa estranha àquele concreto processo...

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