Acórdão nº 08P3172 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelMAIA COSTA
Data da Resolução05 de Novembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO AA, cidadão brasileiro, foi condenado em 27.3.2006 na 4ª Vara Criminal de Lisboa, como autor material de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º do DL nº 15/93, de 22-1, na pena de 4 anos de prisão, acrescida da pena acessória de expulsão do território nacional por 5 anos.

Após a publicação da Lei nº 48/2007, de 29-8, que introduziu no Código de Processo Penal (CPP) o art. 371º-A, o arguido veio requerer, ao abrigo dessa disposição, a reabertura da audiência, tendo em vista a aplicação da lei penal mais favorável, designadamente, a nova redacção do n° l do art. 50° do Código Penal (CP), resultante da Lei nº 59/2007, de 4-9.

Por acórdão de 11.3.2008, a 4ª Vara Criminal manteve a pena de 4 anos de prisão, mas suspendeu-a por período idêntico, revogando simultaneamente a pena acessória de expulsão.

Desta decisão interpôs o Ministério Público (MP) recurso para a Relação de Lisboa, que, por acórdão de 3.7.2008, lhe concedeu total provimento, revogando a suspensão da pena de prisão e confirmando a condenação do arguido na pena acessória de expulsão.

É desta decisão que vem interposto o presente recurso pelo arguido, que conclui assim a sua motivação: 1. Deve ser mantido o douto acórdão, ou seja, que a pena de prisão em que havia sido condenado - 4 (quatro) anos, deve ser suspensa na sua execução, uma vez que no caso sub judice, se verificam preenchidos os requisitos do art. 50.°, n.° l do Código Penal.

  1. O recorrente é um mero "correio de droga" (uma das mais lamentáveis instrumentalizações dos pobres deste mundo, coisificando essas pessoas, tratando-as como descartáveis "embalagens" de transporte ao serviço de um qualquer grande traficante); 3. deverão os tribunais evitar que essa degradação se some depois a outra de eleger esses infelizes como "exemplos" de punição criminal, na intenção de prevenir futuros casos semelhantes, pretensão que se afigura, além do mais, de resultados sempre muito discutíveis; 4. beneficia o arguido de muito apreciável circunstancialismo atenuativo, já que: "... mormente a ausência de antecedentes criminais do arguido, o facto de se encontrar ao tempo dos factos socialmente enquadrado do ponto de vista laboral e familiar (ainda que em situação de carência económica), a confissão que prestou e o arrependimento que manifestou"; 5. finalmente, já cumpriu mais de dois anos de prisão, pois a sua detenção ocorreu a 3/11/2005.

  2. Não se vê pois como negar aqui a formulação de "...um juízo de prognose favorável, ... de que a censura expressa na condenação e a ameaça da execução da pena de prisão aplicada são suficientes para afastar os arguidos de uma opção desvaliosa em termos criminais e para o futuro..." pois existem "... factos concretos que apont(am), de forma clara, para uma forte probabilidade de inflexão em termos de vida, reformulando os critérios de vida, reformulando os critérios de vontade de teor negativo e renegando a prática de actos ilícitos", cfr. Ac. STJ, de 09-04-08 (doc. SJ20080409001133, site do STJ, relator Santos Cabral).

  3. No caso concreto, estando provado que o recorrente praticou os factos por necessidade económica e por estar perturbado, pois, estava desempregado e em processo de divórcio, tendo ficado sem alojamento, tem um filho de quatro anos de idade, é primário e confessou na íntegra os factos praticados e está arrependido, o que revela favoravelmente em termos de personalidade, poderia o Tribunal "a quo" fazer um juízo de prognose favorável e concluir que, quanto ao recorrente, a simples censura do facto e a ameaça da prisão, realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, que são, como se sabe, e é lembrado pelo Ac. STJ de 18.10.2007 (processo n.° 2311/07-5) a tutela dos bens jurídicos e a reinserção social do condenado.

  4. Acresce, por outro lado, que por muito relevantes que sejam as razões de prevenção geral, dada a gravidade social do crime de tráfico estupefacientes, e a eventual facilitação do tráfico e do próprio consumo de drogas, as mesmas não podem sobrepor-se às acima referidas finalidades da punição.

  5. Entender de outra forma, pressupõe afastar liminarmente a possibilidade de suspensão da execução da pena nos crimes de tráfico de estupefacientes, interpretação com a qual não se pode concordar e sobretudo, não se pode retirar de qualquer norma do Código Penal, seja na actual, seja na versão anterior.

  6. A suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que for considerada mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos formais e materiais", cfr. Ac. STJ, de 05-11-03 (doc. SJ200311050032993), relator Henriques Gaspar.

  7. Atentas as circunstâncias do crime, tendo em consideração a personalidade do recorrente, a confissão, o arrependimento e a primariedade do recorrente; as suas condições sócio-económicas e o efeito dissuasor que teve certamente a prisão já sofrida, é possível fazer...

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