Acórdão nº 6607/09.3TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução01 de Julho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I C e A intentaram acção declarativa com processo ordinário contra SOMAGUE, BCP, MOTA-ENGIL, SPIE - S.B.M.S. - PROLONGAMENTO DA LINHA VERMELHA DO METROPOLITANO, A.C.E. e M, pedindo a condenação solidária destes dois RR. A a pagarem: - ao primeiro Autor, as quantias de € 78.207,50 e € 100.000,00 a título de indemnização por danos patrimoniais [despesas médicas, medicamentosas, assistência de terceira pessoa, transporte e perda da expectativa de evolução profissional] e não patrimoniais, acrescidas de juros de mora vencidos desde a citação e até integral pagamento; - à segunda Autora, a quantia de € 50.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação e até integral pagamento, tudo decorrente do acidente de trabalho que descrevem, de que foi vítima o 1º Autor, casado com a 2ª Autora, o qual imputam à culpa de ambos os Réus, por violação de normas de segurança e omissão de formação.

A primeira Ré contestou, arguindo a excepção dilatória da incompetência material do Tribunal, por se estar em face de um acidente de trabalho, e as excepções peremptórias da caducidade do direito de acção, da prescrição dos créditos invocados pelo primeiro Autor, e da sua extinção pelo pagamento, e impugnando a factualidade alegada, por não ter violado qualquer norma de segurança, devendo-se o acidente a incúria do próprio Autor o segundo Réu foi citado regulamente, mas não contestou.

Os Autores responderam às excepções deduzidas pronunciando-se pela sua improcedência.

No despacho saneador foi decidido que o Tribunal era materialmente incompetente para conhecer dos pedidos que o primeiro Autor formulou contra o primeiro Réu e, como consequência, nesta parte, absolveu este da instância, ficando prejudicado o conhecimento das demais excepções deduzidas.

A final foi produzida sentença a julgar a acção improcedente, absolvendo os Réus do pedido.

Inconformados com o assim decidido, os Autores interpuseram recurso de Apelação, a qual foi julgada parcialmente procedente e em consequência: - Procedeu-se à alteração da matéria de facto respeitante aos quesitos 1.°, 2.°, 4.° a 11.°, 58.°, 65.°, 66.°, 72.°, 74.°, 75.° e 76.°, mantendo-se as respostas negativas dos demais quesitos cujas respostas estavam impugnadas; - Julgou-se parcialmente procedente a Apelação quanto ao pedido de danos patrimoniais formulado pelo primeiro Autor contra o segundo Réu, condenando este último a pagar àquele a quantia de € 20.000,00, absolvendo-se este Réu do demais peticionado; - Julgou-se procedente a Apelação relativamente ao pedido de condenação, a título de danos não patrimoniais, formulado pelo primeiro Autor contra o 2º Réu, condenando-se este último a pagar àquele a quantia de € 100.000,00; - Julgou-se procedente a Apelação relativamente ao pedido de condenação, a título de danos não patrimoniais, formulado pela segunda Autora contra os primeiro e segundos Réus, condenando-se solidariamente os mesmos a pagar àquela a quantia de € 50.000,00; - Condenaram-se ambos os Réus nos juros de mora que se vencessem sobre cada uma das quantias em que foram condenados, desde a data da presente decisão e até integral pagamento.

Inconformada a Ré SOMAGUE, BCP, MOTA-ENGIL, SPIE - S.B.M.S. - PROLONGAMENTO DA LINHA VERMELHA DO METROPOLITANO, A.C.E, vem recorrer, agora de Revista, apresentando as seguintes conclusões: - O presente recurso vem interposto do acórdão proferido pelo Tribunal a quo no qual foi julgada parcialmente procedente a Apelação apresentada pelos Autores, e, em consequência, foi a ora Recorrente, solidariamente condenada com o segundo Réu, no pedido formulado pela Autora de pagamento de uma indemnização no montante de EUR 50.000,00, a título de danos não patrimoniais.

- A presente revista incide sobre as seguintes questões de direito constantes da fundamentação de direito do acórdão recorrido: a (alegada) responsabilidade extracontratual do Recorrente pelos danos sofridos pela Recorrida e a determinação do montante de compensação por danos não patrimoniais à luz do n.º 1 do art. 496.º e das demais normas legais aplicáveis à determinação deste tipo de compensação.

- A decisão do Tribunal a quo incorre na violação do art. 500.º do CC., já que a norma aplicada pelo Tribunal a quo não é aplicável ao caso em concreto, pois não se verificam os pressupostos de facto de aplicação da norma referida, desde logo os que fundamentam uma relação de comissão entre o segundo Réu e o Recorrente.

- Da relação de factos provados não consta a menção a qualquer relação contratual entre o Recorrente e o segundo Réu e, na verdade, o segundo Réu não tinha, nem tem, qualquer relação laboral, de prestação de serviços ou outra idêntica, que pudesse consubstanciar uma relação de comissão para efeitos do art. 500.º do CC com o Recorrente.

- O segundo Réu era, ao tempo da prática dos factos sub iudicio, trabalhador da Mota-Engil, um subempreiteiro do Recorrente, e encontrava-se a exercer funções na obra em causa como trabalhador da Mota-Engil, funções em cujo exercício terá ocorrido o acidente que é causa desta ação (cfr. documentos a fls. 205 e 206 dos autos (documentos emitidos pela Mota-Engil com menção ao segundo Réu como seu trabalhador) e a fls 210 a 213 dos autos, dos quais resulta que o segundo Réu não é trabalhador do Recorrente, nem estava ao seu serviço.

- Também não deve ser imputada ao Recorrente responsabilidade extracontratual pelos factos que são objeto desta ação, os factos em causa não foram praticados pelo Recorrente e não competia a este dever de vigilância sobre a atividade levada a cabo pelo segundo Réu.

- Decisão em contrário incorreria na violação das normas previstas no art. 483.º do CC e no n.º 2 do art. 293.° do CC.

- Sendo a atividade em causa exercida pelo 2.º R. e a entidade patronal do 2.º R. a Mota-Engil, uma subempreiteira do Recorrente, não pode ser imputada ao Recorrente a prática dos factos em causa, seja para efeitos do art. 483.º do CC, seja para efeitos do n.º2 do art. 493.º do CC, que apenas se aplica a «quem causar danos a outrem no exercício de uma atividade», isto é, ao próprio agente (no caso o segundo Réu e a respetiva entidade patronal).

- Como bem decidiu o Tribunal a quo, o dever de vigilância que - hipoteticamente - pudesse ter lugar relativamente ao exercício da atividade de que foi causa o acidente pelo 20 R. incumbia à entidade patronal, ou seja, a Mota-Engil, a que pertencia também a máquina manobrada pelo segundo Réu na atividade de betonagem em causa e que emitiu a ficha com instruções específicas de segurança da máquina (cfr. fls 201 e 203 dos autos).

- Para além disso, a atividade levada a cabo pelo segundo Réu exige uma formação e conhecimentos técnicos específicos e estamos perante uma atividade de elevado grau de autonomia técnica e com regras de segurança específicas.

- Não era expectável que o segundo Réu incumprisse as regras de segurança; para além disso, era o manobrador que reunia os conhecimentos e valências necessárias para executar a atividade; a ele cabia controlar a atividade, saber as suas consequências e prever os próximos passos de cada operação e possíveis efeitos.

- Recorrente não tinha, nem tem, o conhecimento e o domínio técnicos da atividade necessários para dar instruções ao segundo Réu sobre como operar a manobradora e quais os cuidados a ter especificamente nessa operação.

- O segundo Réu não estava sob a autoridade técnica do Recorrente, nem podia sequer dar-lhe instruções de como executar a tarefa da qual decorreu o acidente.

- O Recorrente era o empreiteiro geral da obra e o segundo Réu não lhe devia subordinação técnica.

- Decidiu o Tribunal a quo condenar a pagar à Recorrida uma indemnização no valor de EUR 50.000,00 por danos não patrimoniais, ao abrigo dos arts. 483.° e 496.°, nº1 do CC.

- Entende o Recorrente que o Tribunal a quo aplicou erradamente os arts. 483.º e 496.º, nº1 e 3 e 494.º, todos do CC no que respeita à fixação e à determinação do montante da indemnização equitativa.

- Da decisão recorrida decorre que não foram ponderados os critérios de fixação da indemnização equitativa que têm vindo a ser determinados pela jurisprudência e doutrina no preenchimento do n.º3 do art. 496.º do CC, tais como a possibilidade de reversão da situação clínica do primeiro Autor, em especial de infertilidade e incapacidade sexual, a gravidade dos concretos danos e a sua análise comparativa com a jurisprudência existente - e dominante - sobre a indemnização de danos não patrimoniais e o respetivo montante, tanto para a decisão de atribuir uma indemnização, como para a fixação do respetivo montante.

- Deveria o Tribunal a quo ter decidido a não fixação de qualquer indemnização, ou pelo menos a sua redução significativa, determinada ao abrigo do critério da equidade, com apreciação de todos os critérios anteriormente referidos e os pressupostos de facto efetivamente provados nesta ação, que nunca deveria ser superior a EUR 25.000.

- Deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência (i) ser revogado o acórdão recorrido no que respeita à procedência da Apelação relativamente ao pedido de condenação formulado pela Recorrida contra o Recorrente de pagamento de uma indemnização no montante de EUR 50.000,00, a título de danos não patrimoniais, confirmando-se a decisão proferida em Primeira Instância, que absolveu integralmente o Recorrente do pedido; ou (ii) Subsidiariamente, reduzir o montante de indemnização a título de danos não patrimoniais imputável ao Recorrente para o montante de vinte e cinco mil euros.

Nas contra alegações os Autores pugnam pela manutenção do julgado.

II Põem-se como problemas a resolver no âmbito deste recurso de Revista os de saber: i) se sobre a Recorrente impende o dever de indemnizar a Autora; ii) no caso afirmativo se há lugar à redução do montante indemnizatório.

As instâncias declararam como assentes os seguintes factos: - O 1º R. foi...

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