Acórdão nº 83/10.5TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Janeiro de 2013
Magistrado Responsável | ANTÓNIO JOAQUIM PIÇARRA |
Data da Resolução | 22 de Janeiro de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório I – No dia 13 de Janeiro de 2010, AAe BB, residentes em Lisboa, propuseram acção declarativa com processo ordinário contra o “Instituto de Segurança Social-IP, Centro Nacional de Pensões”, a “Caixa Geral de Aposentações” e a “Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, IP”, alegando, em resumo, que: No dia … de … de … faleceu CC, no estado de divorciado, o qual, à data do óbito era pensionista do Centro Nacional de Pensões e beneficiário da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo.
À data da sua morte, o falecido CC e a autora viviam, em condições análogas às dos cônjuges, como tal sendo considerados pelas pessoas das suas relações.
Essa situação iniciada em 1980 prolongou-se, de forma ininterrupta, até à morte daquele, tendo do seu relacionamento nascido o autor que é filho de ambos.
A herança do falecido CC não possui bens que permitam prestar alimentos aos autores, não usufruindo os autores de rendimentos que permitam satisfazer as suas necessidades alimentares, sendo que o autor se encontra a estudar, não havendo também familiares dos autores que estejam em condições de lhes prestar alimentos.
Com tais fundamentos, concluíram por formular os pedidos seguintes: 1. declarar-se que a autora viveu com o falecido CC em condições análogas às dos cônjuges desde 1980, de forma ininterrupta até à sua morte, ocorrida em Fevereiro de 2009; 2. declarar-se que a autora precisa de alimentos para poder prover à sua subsistência, encontrando-se nas condições previstas no artigo 2020o do Código Civil; 3. declarar-se que a herança deixada por CC, falecido no estado de divorciado, não tem bens suficientes para que a autora possa dela exigir alimentos para a sua subsistência; 4. declarar-se que inexistem quaisquer pessoas a quem a autora possa exigir alimentos, designadamente cônjuge, ex-cônjuge, ascendentes, descendentes ou irmãos aos quais possa exigir alimentos nos termos do artigo 2009º do Código Civil; 5. declarar-se e reconhecer-se à autora a qualidade de titular do subsídio por morte decorrente do falecimento do seu companheiro CC; 6. declarar-se e reconhecer-se a ambos os autores a qualidade de herdeiros hábeis do falecido CC e titulares da pensão de sobrevivência devida desde 1 de Março de 2009 na sequência da morte do, respectivamente, companheiro e pai da autora e do autor. As rés apresentaram contestações autónomas, tendo a Caixa Geral de Aposentações e o Instituto de Segurança Social, IP impugnado a generalidade dos factos alegados, por não serem do seu conhecimento, enquanto a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, IP impugnou expressamente a existência de união de facto entre a autora e o falecido CC, à data da morte deste, pugnando pela absolvição do pedido. O processo seguiu seus termos e, a final, foi proferida sentença a considerar o autor parte ilegítima e, relativamente à autora, julgou a acção improcedente, absolvendo as rés do pedido.
Os autores apelaram, com parcial êxito, tendo a Relação de Lisboa confirmado a ilegitimidade do autor, mas revogado a sentença da 1ª instância, declarando que a autora viveu em união de facto com o falecido CC desde 1980 até à morte deste, ocorrida em Fevereiro de 2009, de forma ininterrupta, e que tem direito às prestações sociais (subsídio por morte e pensão de sobrevivência) por morte de CC previstas no artigo 3º alínea e) da Lei 7/2001, de 11 de Maio na redacção da Lei 23/2010, de 30 de Agosto, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2011.
Agora inconformada, interpôs a Caixa Geral de Aposentações recurso de revista[1], finalizando a sua alegação, com as seguintes conclusões: 1. O acórdão recorrido é nulo, nos termos do disposto no artigo 668.°, n.° 1, alínea e), do CPC, sendo que as duas questões que se submetem à apreciação deste Supremo Tribunal são as de saber: · se apesar da natureza deste tipo de acções - que, de acordo com a jurisprudência uniforme nesta matéria, são acções de simples apreciação, em que está unicamente em causa o reconhecimento de uma situação de união de facto - os Tribunais podem ir além dessa declaração de estado/qualidade das pessoas e definir, desde logo, que a instituição de segurança social está obrigada, a partir de 2011-01-01, ao pagamento das prestações sociais por morte, a coberto de uma a aplicação directa do artigo 6.° da Lei n.° 23/2010, de 30 de Agosto.
· se a aplicação do novo regime legal vertido na Lei n.° 23/2010, de 30 de Agosto (cuja possibilidade de extensão a óbitos ocorridos antes da sua entrada em vigor a CGA não contesta) pode ser decidida pelo Tribunal independentemente de manifestação de vontade dos autores.
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Quanto à primeira questão, e tendo as acções como a vertente natureza declarativa, de simples apreciação (cfr., a título exemplificativo, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2006-10-19, processo n.° 3580/06-1, de 2007-12-04, processo n.° 07A4119 e de 2008-02-07, processo n.° 07A4789), considera a CGA que jamais o Tribunal a quo poderia determinar no acórdão recorrido que a A. "...tem direito às prestações sociais (...) com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2011", mas tão só reconhecer-lhe a qualidade de companheira, conferindo-lhe, assim, uma qualidade jurídica equivalente à dos cônjuges que lhe permita habilitar-se a apresentar à Instituição de segurança social um pedido de prestações por morte do de cujus.
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Uma coisa é saber se a Autora reúne as condições legais para que lhe seja atribuída a qualidade de companheira, a fim de, uma vez empossada dessa qualidade, poder apresentar à Instituição de segurança social um pedido de prestações por morte do de cujus, e outra, muito diferente, é a de saber se terá direito a elas, desde quando e com que valor, matéria que competirá à R. posteriormente analisar no âmbito do competente processo administrativo.
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Também por isso - entrando agora já na segunda questão -, considera a CGA que a decisão recorrida é ilegal em virtude de ter fixado como data de inicio do pagamento daquelas prestações, a data de 2011-01-01 (por aplicação directa do art.° 6.° da Lei n.° 23/2010, de 30 de Agosto).
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A CGA defende, de harmonia, aliás, com a jurisprudência uniforme Supremo Tribunal de Justiça, que o regime procedimental inovatoriamente previsto na Lei n.° 23/2010 pode, de facto, ser aplicado às situações emergentes de óbitos ocorridos em data anterior ao seu início de vigência. Porém, com o devido respeito, e não obstante a Apelada poder prevalecer-se do disposto na Lei n.° 23/2010, para efeitos de protecção da união de facto, a verdade é que o mero reconhecimento da existência daquela situação não configura, de imediato, o direito a uma qualquer prestação prevista no Estatuto das Pensões de Sobrevivência.
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Com a Lei n.° 23/2010, de 30 de Agosto, que alterou a Lei n.° 7/2001, de 11 de Maio, o legislador promoveu ou pretendeu desjudicializar os processos de atribuição de prestações por morte, optando por administrativisar o respectivo procedimento, determinando no artigo 2.°-A da Lei n.° 7/2001, de 11 de Maio, sob a epígrafe prova da união de facto, que "7 - Na falta de disposição legai ou regulamentar que exija prova documental específica, a união de facto prova-se por qualquer...
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