Acórdão nº 1947/08.1TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelPEREIRA RODRIGUES
Data da Resolução18 de Janeiro de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. OBJECTO DO RECURSO E QUESTÕES A SOLUCIONAR.

No Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA, reformado, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra TAP – Air Portugal, alegando, em síntese, que trabalhou para a Ré desde 1971 até à data da sua reforma, que ocorreu em 31 de Maio de 2007. Durante esse período auferiu, enquanto Despachante de Tráfego, vencimento base, horas extraordinárias e senioridades e enquanto Tripulante de Cabine, recebeu da Ré diversas quantias pagas sob a epígrafe/denominação comissões de vendas a bordo, ajudas de custo operacionais, vencimento horários PNC, ajudas de custo PN, subsídio de transporte pessoal, ajudas de custo PNC, ajudas de custo complementar PNC, ajudas de custo complementar extra, subsídio de assiduidade, subsídio de disponibilidade PNC, sendo certo que tais prestações não foram tidas em conta para cálculo da retribuição e subsídio de férias e subsídio de Natal.

Pediu a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 83.393,01, correspondente às diferenças de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, vencidos nos anos de 1972 a 2007, inclusive, acrescidos de juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, desde as datas em que se venceu cada uma das prestações até integral pagamento.

A R. contestou, arguindo a prescrição dos créditos peticionados e o abuso de direito.

Por impugnação alegou que as prestações pagas ao Autor e a que aquele se refere na sua petição inicial não são contrapartida pecuniária da prestação de trabalho e como tal não integram o conceito de retribuição.

O A. respondeu às excepções pugnando pela improcedência da invocada prescrição e do abuso de direito.

No despacho saneador foi julgada improcedente a invocada excepção da prescrição dos créditos peticionados pelo Autor.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento e foi proferida a sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência: a) condenou a Ré a pagar ao Autor o valor das diferenças de remunerações complementares pedidas e não incluídas, referentes aos montantes não incluídos na remuneração de férias e subsídio de férias, atinentes a título de Vencimento Horário PNC", "Subsídio de Assiduidade", "Subsídio de Disponibilidade PNC" e "Retribuição Especial PNC", acrescidas de juros de mora, às taxas legais em vigor em cada momento para os créditos civis, contados desde o vencimento de cada parcela e até integral e efectivo pagamento: b) condenou a Ré a pagar ao Autor o valor das diferenças de remunerações complementares pedidas e não incluídas, referentes aos montantes não incluídos no subsídio de Natal até Novembro de 2003, atinentes a Vencimento Horário PNC", "Subsídio de Assiduidade", "Subsídio de Disponibilidade PNC" e "Retribuição Especial PNC", acrescidas de juros de mora, às taxas legais em vigor em cada momento para os créditos civis, contados desde o vencimento de cada parcela e até integral e efectivo pagamento.

No demais absolveu a Ré.

Ambas as partes apelaram, mas apesar de admitido na 1ª instância, o recurso do A. foi rejeitado pela relatora por ter sido considerado interposto fora de prazo.

Tendo os autos prosseguido seus termos veio a ser proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no qual se acordou, por unanimidade, em julgar parcialmente procedente o recurso, alterando a sentença na parte em que condenou a R. a pagar ao A. as diferenças na retribuição das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal relativas a “Vencimento Horário PNC”, “Subsídio de Assiduidade” e “Retribuição Especial PNC”, absolvendo a R. dessa parte do pedido, mantendo porém a condenação na parte respeitante às diferenças relativas às mesmas prestações [das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal] referentes ao “Subsídio de Disponibilidade PNC”.

Mais uma vez inconformado, o Autor interpôs recurso de Revista da decisão do Tribunal da Relação para este STJ, apresentando doutas alegações, com as seguintes CONCLUSÕES: «PRIMEIRA - O presente recurso de REVISTA vem interposto do Acórdão de 18/05/2011 que, julgando parcialmente procedente a APELAÇÃO condenando a Ré a pagar ao Autor, Recorrente, os suplementos remuneratórios, Subsidio de Disponibilidade PNC, fazendo repercutir o valor médio dessas atribuições, nos meses de férias, subsídio de férias e subsídio de natal (este até ao ano de 2002).

Por seu lado, julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela Ré, absolvendo a Ré do pedido no que tange ao Vencimento de Horário PNC (Horas Extras), ao Subsídio de Assiduidade.

SEGUNDA - A controvérsia, em apreciação, radica, na fixação da noção de retribuição, para efeitos de determinar o valor das prestações que o trabalhador tem direito a receber, no período de férias (incluindo o respectivo subsídio) e o subsídio de Natal, (seguindo por vezes literalmente o acórdão do STJ de 23/06/2010, elaborado pelo Conselheiro Vasquez Dinis - apenas discordando na questão da periodicidade, como adiante relataremos - no que tange às questões que sejam comparáveis no presente recurso.

TERCEIRA - A retribuição, é constituída por um conjunto de valores (pecuniários ou em espécie) que a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador, como contrapartida do trabalho fornecido.

QUARTA - Como observa António Monteiro Fernandes (direito do trabalho, 13.ª edição, Almedina, 2006, pág. 4581, "a repetição (por um número significativo de vezes, que não é possível fixar a priori) do pagamento de certo valor, com identidade de título e/ou de montante, CRIA A CONVICÇÃO DA SUA CONTINUIDADE E CONDUZ A QUE O TRABALHADOR, RAZOAVELMENTE PAUTUE O SEU PADRÃO DE CONSUMO POR TAL EXPECTATIVA - UMA EXPECTATIVA QUE É JUSTAMENTE PROTEGIDA".

QUINTA - Na verdade, também na jurisprudência se acentuam as características da regularidade e da continuidade periódica das prestações, as quais devem acentuar e assumir uma natureza retributiva. Por isso, entre outros citaremos o Acórdão do STJ de 08 de Maio de 1996 (Colectânea de Jurisprudência - Acórdãos do STJ, Ano IV, Tomo IL pág. 251), no qual refere "que se integram no domínio da retribuição todos os benefícios outorgados pela entidade patronal e que se destinem a integrar o orçamento normal do trabalhador, conferindo-lhe justa expectativa da sua regularidade e continuidade periódica", (e no mesmo sentido de entre outros, estão os Ac. STJ de 17/01/2007 e o Ac. STJ de 18 de Abril de 2007 — documento SJ2007041800455741.

SEXTA - Deste modo, pode dizer-se que a retribuição, constituída por um conjunto de valores, é num primeiro momento, determinada pelo clausulado do contrato, por critérios normativos (como é o caso do salário mínimo e por princípios de igualdade salarial) e pelos usos da profissão e da empresa; e num segundo caso, a retribuição global, no sentido que exprime o padrão ou módulo de esquema remuneratório do trabalhador, engloba não só a remuneração base, como também as prestações acessórias, que preenchem os enunciados requisitos de regularidade e periodicidade SÉTIMA - E a presunção estabelecida no art° 82° n° 3 da LCT, e bem assim, no art° 249° n° 3 do CT, faz impender sobre a entidade patronal, a demonstração de que as verbas liquidadas ao trabalhador não constituem retribuição.

OITAVA - Porém, e independentemente dos critérios definidores e interpretativos da retribuição, importa que o intérprete deva ter, sempre presente, a específica razão de ser ou a função de cada particular regime jurídico ao fixar não apenas o que deve entender-se por retribuição, como também os elementos que nesse conceito imputa, designadamente para efeitos de cálculo da retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

NONA - E a este propósito, observou-se no, já citado, Acórdão do STJ de 17 de Janeiro de 2007 que: «Quando se mostra necessário encontrar um valor que constitui a base de cálculo para atribuições patrimoniais (retribuição de férias e subsídios de férias e Natal), colocadas na dependência da retribuição, a determinação de tal valor faz-se "a posteriori", — operando sobre a massa das atribuições patrimoniais consumadas pelo empregador em certo período de tempo — devendo o interprete ter presente o fim prosseguido com a respectiva norma.

Alcança-se, deste modo, "a retribuição modular" (vide Monteiro Fernandes -Direito do Trabalho, Almedina, 13ª Edição, pag. 463", no sentido de que exprime o padrão ou o módulo do esquema remuneratório do trabalhador, com referência à unidade de tempo e à diversidade das atribuições patrimoniais realizadas ou devidas.

O problema que aí se suscita e de que nos dá conta D’Antona, referindo-se à evolução da jurisprudência italiana é a de colocar cada prestação em confronto com um critério que permita dar conta da totalidade das características da retribuição como elemento essencial do contrato de trabalho.

O critério legal dos art°s 82° e sgts da LCT constituem um instrumento de resposta ao problema da determinação, "a posteriori" da retribuição modular. Todavia, tal critério não é suficiente, nem se pode aplicar com excessiva linearidade, devendo o intérprete ter sempre presente a razão de ser ou a função de cada particular regime.

Assim, como escreve Jorge Leite, para se saber quais as prestações que se integram nesse conjunto e quais as que dele se excluem, torna-se necessário saber qual o fim prosseguido pela norma respectiva.

Cada norma legal ou cláusula que institui cada prestação requer uma tarefa interpretativa a fim de lhe ser fixado o sentido, o que significa que uma atribuição patrimonial pode ter de qualificar-se como elemento de retribuição (face ao art° 82°) e não obstante merecer o reconhecimento de uma pendularidade diversa da que caracteriza os restantes elementos".

DÉCIMA - Finalmente, é de salientar que o princípio do tratamento mais favorável, consignado no art° 13° n° 1 da LCT, e com expressão na alínea c) do artigo 6º da...

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