Acórdão nº 047421 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Junho de 2004

Data02 Junho 2004
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1541_01,Supremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo : A... interpôs neste Supremo Tribunal recurso contencioso de anulação do despacho conjunto do Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas e do Sr. Secretário de Estado do Tesouro e Finanças, de 15/9/00 e 17/10/00, respectivamente, que lhe atribuiu a indemnização devida pela extracção e comercialização pelo Estado dos produtos florestais (cortiça) dos seus prédios rústicos denominados "...", "..." e "..." durante a sua ocupação no período de intervenção da Reforma Agrária entre 2/10/75 e 2/10/89, alegando a sua ilegalidade, a qual decorria da seguinte ordem de razões : - por um lado, de se ter desrespeitado o princípio constitucional que ordena que na fixação de uma indemnização por expropriação se deve procurar atribuir uma justa compensação e que, sendo assim, a mesma deve ser fixada de acordo com o valor real e corrente dos bens expropriados; - deste modo, e sendo a Portaria 197-A/95, de 17/3, omissa sobre a forma de actualização, deveria recorrer-se à analogia e adoptar os critérios inscritos na Lei 80/77 e no DL 199/88 (na redacção que foi dada pelos DL.s 199/91 e 38/95) - por outro lado, de se não ter actualizado o valor indemnizatório atribuído para os valores que lhe correspondiam em 1994/1995.

O Sr. Ministro da Agricultura respondeu para sustentar que o despacho recorrido não tinha incorrido nas ilegalidades que lhe eram apontadas.

Por douto acórdão da Secção de 5/11/02 foi negado provimento ao recurso e mantido o acto recorrido.

Inconformada, a Recorrente agravou para este Tribunal tendo rematado as suas alegações com a formulação das seguintes conclusões : 1. A indemnização a que se referem os autos, é devida pela privação temporária de prédios rústicos, Decreto-Lei 199/88, de 31/05, pelo que nada tendo a ver com as indemnizações pela perda definitiva do património previstas na Lei 80/77, de 26/10.

  1. Neste processo, e em concreto, está em causa a indemnização devida pela cortiça extraída e arrecadada pelo Estado paga à recorrente pelo valor histórico da data da comercialização de 76, 77, 78, 79, 84, 85 e 86.

  2. O cálculo da indemnização pela perda do rendimento florestal é efectuado nos termos das leis especiais das indemnizações da Reforma Agrária com a actualização prevista no art. 7.º n.º 1 da Lei 199/88, e não segundo as regras previstas em direito como para a indemnização por lucros cessantes.

  3. A entidade recorrida, sempre pagou em dinheiro os valores das cortiças, logo após a devolução dos prédios, Despacho Ministerial de 18/07/79 publicado no D.R. IIª Série de 24/07/79 e Despacho Ministerial de 04/05/83.

  4. O D.L. 312/85 determina no art. 6.º, n.ºs 2 e 3, a entrega do valor da cortiça em dinheiro logo que tenha sido entregue a reserva ou se proceda à desocupação do prédio tal como o Despacho Ministerial 101/89, de 25/10/89, publicado no D.R., I Série, de 09/11/89.

  5. A cortiça de 76, 77, 78 e 79, cujo valor foi arrecadado pelo Estado, integra o conceito de fruto pendente para efeitos de indemnização, arts. 212.º a 215.º do C.C., art. 9 .º, n.ºs 3, 4 e 5 e art. 10 nº 1 do Decreto-Lei 2/79 de 09/01.

  6. A cortiça, considerada como fruto pendente faz parte do capital de exploração, art. 1.º, n.º 2, da Lei 2/79 de 09/01.

  7. É paga em numerário, art. 3.º nº 2, c), do D.L. 199/88, na redacção do D.L. 38/95 de 14/02.

  8. A cortiça, quando considerada como fruto pendente é sempre paga em espécie, ou no caso de não ser possível pelo valor de substituição, art. 11 nº 4 do D.L. 199/88 na redacção do D.L. 38/95 o qual remete para o art. 13 nº 1 do D.L. 2/79.

  9. O pagamento do valor de substituição implica o pagamento pelo valor real e corrente da data do pagamento da indemnização.

  10. A portaria 197-A/95 de 17/03, no seu art. 3, alínea c) determina que a indemnização da cortiça, considerada como fruto pendente ou produto armazenado, é calculada pelos valores de 94/95, constantes das publicações oficiais.

  11. A cortiça extraída em 84, 85 e 86 é indemnizada como perda do rendimento florestal.

  12. A Portaria 197-A/95 de 17/03, que actualizou os componentes indemnizatórios para valores de 94/95, é omissa quanto à actualização do valor da cortiça, quando considerado como perda do rendimento florestal.

  13. Para integração dessa lacuna, dever-se-à recorrer por analogia ao art.º 3.º, alínea c) da Portaria 197-A/95, que determina a actualização de todos os componentes indemnizatórios para valores de 94/95, segundo os valores das publicações oficiais.

  14. A cortiça considerada como perda do rendimento florestal c paga pelo valor da data do pagamento da indemnização (valor de substituição), por força do art. 13.º nº 1 do Decreto-Lei 2/79.

  15. Em alternativa, por valores e preços de 94/95, tendo por base as publicações oficiais de 94/95, por aplicação analógica dos arts. 2 nº 1 e 3 c) da Portaria 197-A/95 de 17/03.

  16. Existe uma autêntica lacuna na legislação especial das indemnizações da Reforma Agrária conforme referem os Ac.s do Pleno do S.T.A. de 17/05/01 (rec. 44.114) e de 03/07/02, rec. 45.608, onde se refere nomeadamente a omissão de um critério de actualização das rendas, preconizando ambos os Ac.s, para colmatar essa lacuna recorrer se necessário ao legislador.

  17. A cortiça extraída e comercializada em 84, 85, e 86 paga à recorrente por valores históricos do ano da sua extracção, deverá ser indemnizada por valores de 94/95, como acontece com os demais bens indemnizáveis no âmbito da Reforma Agrária, art. 2 nº 1 e art. 3 a), b) e c) da Portaria 197-A/95, de 17/03.

  18. Trata-se de um rendimento que o proprietário deixou de auferir, o qual deve ser colocado na mesma situação, caso não se tivesse verificado a ocupação e expropriação do prédio, Ac.s do Pleno do S.T.A. de 18/02/00, rec.s. 43.044 e de 05/06/00, rec. 44.146.

  19. Esta indemnização está subtraída ao princípio nominalista, devendo ser reconstituída a situação que existiria se não tivesse ocorrido a expropriação e ocupação do prédio, art. 562 do C.P.C. e, Rec. 44.146.

  20. A indemnização em causa corresponde ao princípio de que o valor do bem expropriado deve ser calculado, em momento tão próximo quanto possível da data em que a indemnização vem a ser fixada e paga, Rec. 44.146.

  21. Não seria justo que o expropriado além do prejuízo sofrido pela privação do bem, viesse ainda a suportar os prejuízos emergentes do atraso da fixação e pagamento da indemnização.

  22. Seria profundamente injusto fixar uma indemnização sem atender à actualização do rendimento florestal do prédio, quando são decorridos mais de 27 anos da privação desse rendimento.

  23. Não existe proximidade temporal entre a privação do rendimento florestal e o pagamento da sua indemnização, tendo decorridos mais de 27 anos da data da sua extracção, comercialização e arrecadação por parte do Estado.

  24. As indemnizações da Reforma Agrária "serão fixadas com base no valor real e corrente desses bens e direitos..." de modo a assegurar uma justa compensação pela privação dos mesmos bens e direitos, art. 7 nº 1 do Decreto-Lei 199/88 de 31/05.

    1. indemnização para ser justa tem de garantir ao expropriado o valor real do bem no momento do pagamento.

  25. Todos os bens e direitos objecto de indemnização da Reforma Agrária, foram actualizados para preços correntes ou valores de 94/95, art. 11 nº 4, 5 e 6 do D.L. 199/88 na redacção do Decreto-Lei 38/95 de 14/02, art. 2 nº 1 e art. 3 a), b) e c) da Portaria 197-A./95 de 17/03.

  26. A Lei 80/77 e o Decreto-Lei 213/79 só são aplicáveis as indemnizações pela perda de património.

  27. A Lei 80/77 não previa, nem podia prever a indemnização pela privação do uso e fruição dos prédios rústicos, que só veio a ser concedida pelo Decreto-Lei 199/88.

  28. Os juros previstos no art. 24 da Lei 80/77 apenas são aplicáveis às indemnizações pela perda de património, art. 1 nº 2 da Portaria 197-A/95 e não à indemnização pela privação temporária do uso e fruição que é o caso dos presentes autos, art. 1 nº 2 da Portaria 197-A/95.

  29. Mesmo que fosse aplicável à indemnização pela privação do uso e fruição o disposto no art. 24 da Lei 80/77, o acréscimo decorrente dessa aplicação ao valor da cortiça reportada a 1985, nunca atingiria o valor real e corrente por forma a alcançar a justa indemnização, como é imposto pelo art. 7.º nº 1 do Decreto-Lei 199/88.

  30. Os juros a que se reporta o art. 24 da Lei 80/77 são remuneratórios, não se destinando a atender a qualquer actualização da moeda, Ac. do Pleno da Secção do S.T.A. de 05/06/2002 Rec. 44.146.

  31. Os juros previstos no art. 24 da Lei 80/77, são igualmente aplicáveis aos demais componentes indemnizatórios actualizados para valores de 94/95, Ac. da Secção do S.T.A.. de 13/03/01, rec. 46.298.

  32. É a própria entidade recorrida que expressamente o reconhece, na DECLARAÇÃO junta aos autos, a não aplicação da lei 80/77 às indemnizações pela privação temporária do uso e fruição dos prédios expropriados.

  33. As normas de direito internacional sobre indemnizações por expropriação, acolhidas no direito constitucional, art. 8 e no direito interno, preâmbulo do Decreto-Lei 199/88 e bem assim as normas do ordenamento jurídico português sobre indemnizações, impõem a actualização dos danos à data da respectiva liquidação e pagamento.

  34. O art. 62 nº 2 da Constituição da República é aplicável às indemnizações da Reforma Agrária como entendeu o Acórdão do Pleno da Secção do STA de 17/05/2000, Recurso 44.144 e o Acórdão da Secção do STA de 13/03/2001, Rec. 46.298 37.

    A redacção do art. 62 resultante da 4ª revisão constitucional ao eliminar a expressão "fora dos casos previstos na Constituição", determina a aplicação desta disposição constitucional às indemnização pela expropriação no âmbito da Reforma Agrária.

  35. As expropriações e nacionalizações no âmbito da Reforma Agrária, foram todas anteriores à Constituição de 76 e já tem definidos os critérios indemnizatórios pela Portaria 197-A/95 de 17/03, conforme era determinado pelo art. 61 da Lei 77/77 de 67/09 e art. 16...

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