Acórdão nº 0205/03 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Janeiro de 2004

Magistrado ResponsávelSANTOS BOTELHO
Data da Resolução15 de Janeiro de 2004
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1- A..., residente na Av. ..., Buraca, Amadora, recorre do despacho, de 22-10-02, do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde, que homologou as listas elaboradas pelo Conselho Ético e Profissional de Odontologia dos profissionais acreditados e não acreditados no âmbito do processo de regularização dos odontologistas, determinado pela Lei nº 4/99, de 27-1, com a redacção da Lei 16/2002, de 22-2.

alegações formula as seguintes conclusões: "I - O acto impugnado é inválido por incompetência do seu autor, devendo ser anulado nos termos do disposto no Artº 135º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que não resulta de qualquer disposição da Lei nº 4/99 de 27 de Janeiro a atribuição desse poder ao Senhor Ministro das Saúde (não se encontrando abrangido por qualquer delegação), nem tal resulta da aplicação de princípios gerais relativos ao exercício da competência administrativa.

II - O acto, objecto de recurso, é inválido por ter procedido a uma restrição ilegal dos meios probatórios admitidos no procedimento administrativo, aflorado no nº 1 do Artº 87º do Código do Procedimento Administrativo e nos termos do qual os factos, que carecem de prova podem sê-lo por recurso a todos os meios de prova admitidos em direito. Ora, o Conselho Ético e Profissional de Odontologia decidiu restringir o principio geral do valor probatório no procedimento administrativo de todos os meios em direito admitidos, sem habilitação legal e, sobretudo, através de formas insusceptíveis de derrogar disposições de valor legal.

Nestes termos, o acto impugnado é inválido por violação directa do princípio da hierarquia dos actos normativos e, em particular, do nº 6 do Art. 112º da Constituição, devendo, como tal ser declarado nulo.

III - O despacho recorrido sempre seria inválido por violação de Lei, dado desrespeitar a directiva legal, relativa à descoberta da verdade material, subjacente ao princípio do inquisitório, estabelecido no Art. 56º do Código do Procedimento Administrativo, devendo, consequentemente, ser anulado nos termos do Art. 135º mesmo Diploma Legal.

IV - O acto contestado é também inválido, por violação de Lei, a que equivale a violação do princípio da proporcionalidade constante do nº 2 do Art. 266º da nossa Lei Fundamental e no Art. 5º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que procede a uma restrição administrativa dos meios com valor probatório no procedimento de acreditação dos odontologistas, sem que exista qualquer racionalidade que a suporte, evidenciando-se a sua desnecessidade, desadequação e aleatoriedade.

V - O acto «sub juditio» viola o princípio da igualdade, previsto no nº 2 do Art. 266º da Constituição e no nº 1 do Art. 5º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que o Conselho Ético e Profissional de Odontologia valorou como prova admissível em relação a determinados odontologistas, documentos (declarações) cujo valor probatório foi desconsiderado em relação à recorrente.

Deste modo, deve o acto em causa ser declarado nulo, nos termos da alínea d) do nº 2 do Art. 133º do Código do Procedimento Administrativo.

VI - A homologação, objecto do presente recurso, é também inválida por violação do principio da boa-fé e da tutela da confiança, previsto no nº 2 do Art. 266º da Constituição e no Art. 6º-A do Código do Procedimento Administrativo, a que corresponde o «venire contra factum proprium» administrativo, consubstanciado na desconsideração de reconhecimentos anteriores, uma vez que a recorrente se encontra inscrita como odontologista no Departamento de Modernização e Recursos da Saúde ao abrigo do Despacho Normativo nº 1/90 de 23 de Janeiro da Senhora Ministra da Saúde, tendo o Ministério da Saúde reconhecido desde então, expressamente, o exercício desta profissão bem como a sua qualificação.

VII - O acto impugnado é ainda inválido por erro sobre os pressupostos de facto, uma vez que a recorrente reúne todos os requisitos necessários para a acreditação como odontologista: antiguidade relevante e formação profissional.

Deste modo, o acto administrativo em questão, dever ser anulado de acordo com o disposto no Art. 135º do Código do Procedimento Administrativo.

VIII - Finalmente, o Art. 2º da Lei 4/99 de 27 de Janeiro, ao condicionar retroactivamente a liberdade de acesso à profissão de odontologista, conforme garantia pelo Art. 47º da Constituição, viola a regra da retroactividade das restrições de direitos, liberdades e garantias, estabelecida no nº 3 do Art. 18º da nossa lei Fundamental, bem como o princípio da confiança subjacente ao princípio do Estado de Direito Democrático.

Consequentemente, o acto recorrido, enquanto acto administrativo de aplicação de disposições inconstitucionais, é um acto inválido, devendo ser declarado nulo.

Termos em que, (...), deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser declarado nulo ou anulado o acto impugnado..." - cfr. fls. 96-114.

1.2 Nas suas alegações a Entidade Recorrida sustenta o não provimento do recurso contencioso, atenta a improcedência dos vícios arguidos pelo Recorrente.

Para o efeito, refere, em resumo, o seguinte: - A competência para a prática do acto impugnado decorre do disposto na parte final do art. 4º da Lei 4/99 e do exercício da uma competência conjunta, traduzida na reunião necessária de duas vontades de órgãos distintos (Conselho Ético e Profissional de Odontologia e Ministro da Saúde); - Por outro lado, a Entidade Recorrida actuou no exercício de poderes que lhe foram delegados; - No que se refere à invocada restrição probatória, o que se tratou foi de proceder à especificação dos documentos admitidos para comprovar o requisito temporal consignado no art. 2º da Lei 4/99, tendo vista assegurar a transparência e objectividade do processo; - Não existe qualquer ilegalidade ao nível da fixação das condições para o exercício da profissão de odontologistas; - Finalmente, não se verifica a arguida violação dos princípios da igualdade, proporcionalidade e boa fé.

1.3 No seu Parecer de fls. 122-124, o Magistrado do M. Público pronuncia-se pelo não provimento do recurso contencioso, já que tem por inverificados os vícios arguidos pelo Recorrente.

1.4 Colhidos os vistos cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO 2 - A MATÉRIA DE FACTO Com relevância para a decisão dá-se como provado o seguinte: a) A Recorrente encontra-se inscrita como odontologista no Departamento de Recursos Humanos do Ministério da Saúde, nos termos e para os efeitos do Despacho Normativo nº 1/90, de 3-1 (cfr. o doc. de fls. 36-49); b) A Recorrente inscreveu-se no processo de acreditação e regularização dos odontologistas aberto através de Aviso publicado no DR, II Série, de 9-8-00, ao abrigo da Lei nº 4/99, de 27-1; c) Na sequência do dito processo a Recorrente foi integrada na "Lista nº 1 - Candidatos não acreditados", anexa ao aviso nº 12418/2002, publicado no DR, II Série, de 22-11-02 - cfr. o doc. de fls. 24.

  1. Por despacho, de 22-10-02, o Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde, homologou as listas definitivas, elaboradas pelo Conselho Ético e Profissional de Odontologia, dos profissionais acreditados e não acreditados no âmbito do aludido processo de regularização dos odontologistas; e) A não acreditação da Recorrente foi justificada nos seguintes termos: "Não faz prova suficiente do exercício profissional nos termos do artigo 2º da Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro, alterada pela Lei nº 16/2002, de 22 de Fevereiro, de acordo com os critérios definidos pelo Conselho Ético e Profissional de Odontologia constantes das actas VII, XIII e XIX" - cfr. o doc. de fls. 24.

  2. Da acta VII (doc. de fls. 51, que aqui se dá por reproduzido), referente à reunião realizada em 24-11-00, pelo Conselho Ético e Profissional de Odontologia (CEPO), consta ter sido aprovada a metodologia de apreciação dos processos, tendo sido definida a grelha com os parâmetros da apreciação, conforme o Anexo documentado a fls. 52-53 e que é do seguinte teor: "Metodologia da apreciação dos processos de acreditação dos odontologistas ao abrigo da Lei nº 4/99,. De 27 de Janeiro: 1 - Verificar se os requerentes reúnem os requisitos previstos na Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro; 1.1 Nos termos do nº 1 do artigo 2º da Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro: 1.1.1 Inscrição no Departamento de Recurso Humanos da Saúde do Ministério da Saúde, ao abrigo do Despacho de 28 de Janeiro de 1977 do Secretário de Estado da Saúde (Diário da República, 2ª Série, de 14 de Fevereiro de 1977); 1.1.2 Inscritos ao abrigo do Despacho de 30 de Julho de 1982 do Ministério dos Assuntos Sociais (Diário da República, 2ª Série, de 25 de Agosto de 1982); 1.1.3 Constam da Lista Nominativa entrada no Ministério da Saúde em 1981; 1.1.4 Exercício público da actividade de odontologia há pelo menos 20 anos, contados a partir da data da entrada em vigor da Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro.

    Nos termos do nº 2 do artigo 2º da Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro: 1.2.1 Inscritos ao abrigo do Despacho de 1/90, de 3 de Janeiro, da Ministra da Saúde (Diário da República, 2ª Série, de 23 de Janeiro de 1990); 1.2.2 Exercício público da actividade de odontologia há pelo menos 18 anos, contados a partir da data da entrada em vigor da Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro.

    1.3 Nos termos do nº 3 do artigo 2º da Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro: 1.3.1 Exercício público da actividade de odontologia à pelo menos 18 anos, contados a partir da data de entrada em vigor da Lei nº 4/99, de 27 de Janeiro.

    2 - Grelha dos documentos...

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