Acórdão nº 97P1189 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Janeiro de 1998 (caso NULL)
Magistrado Responsável | VIRGILIO DE OLIVEIRA |
Data da Resolução | 21 de Janeiro de 1998 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. - No Tribunal Judicial de Ponte da Barca, perante o tribunal Colectivo, foi submetido a julgamento o arguido A, solteiro, sem profissão, nascido a 29 de Março de 1953, por, segundo acusação do Ministério Público, haver praticado um crime de homicídio previsto e punido pelo artigo 131 do Código Penal e a contravenção ao disposto no artigo 66 do Decreto-Lei n. 37313, de 21 de Fevereiro de 1949. 2. - B e C formularam contra o arguido pedido de indemnização civil, no montante de 20000000 escudos, referente a danos não patrimoniais decorrentes da morte de sua filha, acrescidos de juros de mora. 3. - O arguido foi condenado, como autor material de um crime de homicídio voluntário, previsto e punido pelos artigos 131, 33, n. 1 e 73 do Código Penal, na pena de cinco (5) anos de prisão, e como autor material de uma contravenção ao disposto no artigo 66 do Decreto-Lei n. 37313, de 21 de Abril de 1949, na multa de três mil escudos (actualizada nos termos do Decreto-Lei n. 131/82, de 23 de Abril). Julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização, foi o arguido condenado a pagar aos demandantes a quantia global de 3600000 escudos, acrescida de juros de mora, à taxa de 10%, a partir da data do acórdão até efectivo pagamento. 4. - Inconformado, recorreu o arguido para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo na sua motivação: 4.1. - Da atenta análise dos factos dados como provados, conjugados com a inspecção ao local, resulta claramente ter agido o arguido em legítima defesa, causa de exclusão da ilicitude do facto praticado, nos termos dos ns. 1 e 2, alínea a) do artigo 31 do Código Penal; 4.2. - É consensual, entre o recorrente e o acórdão recorrido, estarem preenchidos dois dos requisitos da legítima defesa - a existência de uma agressão a quaisquer interesses pessoais ou patrimoniais do defendente ou de terceiro e o animus deffendendi; 4.3. - O tribunal a quo aferiu ter existido manifesta desproporção entre a conduta do agressor e a reacção do recorrente; 4.4. - Na óptica do acórdão, o recorrente responde meio inadequado e excessivo para garantir a sua defesa, pelo que existiu excesso de legítima defesa, nos termos do prescrito no n. 1 do artigo 433 do Código Penal; 4.5. - A ser considerado excessivo o meio utilizado pelo recorrente para impedir a agressão iminente, tal excesso deverá ser entendido à luz do prescrito no n. 2 do artigo 33 do Código Penal; 4.6. - A vítima e os seus guarda-costas entraram uma primeira vez em casa do recorrente, contra a sua vontade, e aí o agrediram e lhe danificaram objectos enquanto vasculhavam a sua residência à procura da brasileira; 4.7. - A vítima e seus acompanhantes voltaram à casa do recorrente, na ânsia de alcançarem a mesma brasileira, e nesta só não entraram dado o recorrente os ter tentado deter junto ao portão da casa, onde lhe foi revistado o carro, e dois soldados da GNR terem acudido prontamente ao local, após telefonema do recorrente; 4.8. - Após a retirada dos soldados da GNR, a vítima e guarda-costas saltaram o muro da residência do recorrente e dirigiram-se pela terceira vez à porta de entrada, pretendendo, mesmo que à força, introduzir-se no interior daquela casa para, se necessário do mesmo modo, convencer o recorrente a entregar a brasileira; 4.9. - O recorrente estava convencido de que a vítima e acompanhantes estavam armados e o recorrente estava nervoso e incomodado quando desferiu o disparo; 4.10. - Esta factualidade justifica plenamente um estado de perturbação e medo por parte do recorrente, junto de um fundado receio pela sua própria vida, da companheira e, inclusivamente, da brasileira a quem dava guarida; 4.11. - Atento o disposto nos artigos 33, n. 1, 32 e 31, ns. 1 e 2, alínea a), todos do Código Penal, o recorrente não deverá ser punido criminalmente pelo facto de que vem acusado. 4.12. O recorrente, a ser condenado, deverá sê-lo pelo crime previsto e punido pelo artigo 133 do Código Penal; 4.13. O homicídio privilegiado abrange os casos em que o agente é levado a matar outrém dominado por compreensível emoção violenta, compaixão, desespero ou motivo de relevante valor social ou moral que diminuam sensivelmente a sua culpa; 4.14. - É necessário que tal emoção tenha cariz violenta, seja aceitável e exista um nexo de causalidade entre a emoção e a conduta que levou à morte; 4.15. - Face à matéria fáctica dada por provada, o recorrente agiu dominado e no decurso de uma emoção violenta, emoção que foi a causa determinante do crime e que é compreensível; 4.16. - O recorrente foi agredido e ameaçado e a vítima e os seus acompanhantes ansiavam "recuperar" a brasileira, fosse a que título fosse, tendo por vezes, digo, por três vezes invadido a residência do recorrente; 4.17. - As autoridades policiais, com a sua atitude desleixada, não asseguraram ao recorrente quaisquer garantias de segurança; 4.18. O recorrente temia pela sua própria vida e pela vida da companheira pois estava convencido de que a vítima e acompanhantes se encontravam armados; 4.19. - O recorrente apenas utilizou a arma, quando, após a inócua e inoperante intervenção dos soldados da G.N.R., a vítima e acompanhantes invadiram pela terceira vez; 4.20. - O recorrente nunca teve qualquer real e efectiva intenção de matar; 4.21. - Não só a emoção violenta, mas também o desespero dominava o recorrente aquando da prática dos factos pelos quais vem acusado; 4.22. - O recorrente não agiu de forma inteiramente livre e responsável, antes o tendo feito sob o domínio do circunstancialismo em que se achava envolvido; 4.23. Encontra-se preenchido o tipo legal que caracteriza o crime de homicídio privilegiado, cuja punição não ultrapassa os cinco anos de prisão, pena essa que, no caso, não esperado, de se entender a conduta do recorrente como integradora de um excesso de legítima defesa - nos termos do n. 1 do artigo 33 do Código Penal - deverá, de acordo com o preceituado na alínea a) do n. 1, do artigo 73 do Código Penal, ser reduzida em um terço no seu limite máximo; 4.24. - Atribuída ao recorrente pena não superior a três anos de prisão, justifica-se, nos termos gerais e tendo em linha de conta o prescrito no n. 2 do artigo 73 do Código Penal, a suspensão da execução da pena; 4.25. O recorrente possui antecedentes criminais e tem bom comportamento anterior e posterior à prática dos factos que lhe são imputados; 4.26. - Não resulta dos autos tendência ou personalidade criminosa do recorrente, mas antes que a sua conduta foi consequência de circunstâncias ocasionais; 4.27. - Tendo em conta o carácter estigmatizante e os efeitos criminógenos que normalmente andam associados à pena de prisão, a suspensão de execução da pena constitui uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico que, em última instância, não poderá deixar de ser aplicada ao caso vertente; 4.28. - O acórdão recorrido viola as disposições constantes dos artigos 31, ns. 1 e 2, alínea a); 32, 33, n. 2, 133, todos do Código Penal e artigo 410, n. 2, alíneas b) e c) do Código de Processo Penal. 5. - Na resposta, o Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público na 1. instância pronuncia-se pela improcedência do recurso. No Supremo Tribunal de Justiça, o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto promoveu a designação de dia para a realização da audiência. 6. - Com os vistos legais e audiência de julgamento, cumpre decidir, começando por enunciar a matéria de facto que vem dada como demonstrada pela 1. instância: 6.1. - Nos passados dias 14 para 15 e 15 para 16 de Março do ano corrente (1977), a companheira do arguido, D...
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