Parecer (extrato) n.º 29/2020

Data de publicação20 Outubro 2021
Gazette Issue204
SectionSerie II
ÓrgãoMinistério Público - Procuradoria-Geral da República
N.º 204 20 de outubro de 2021 Pág. 128
Diário da República, 2.ª série
PARTE D
MINISTÉRIO PÚBLICO
Procuradoria-Geral da República
Parecer (extrato) n.º 29/2020
Sumário: Perda de coisas perigosas no direito de mera ordenação social.
Conclusões
1.ª O confisco já era conhecido na Grécia e em Roma, foi utilizado durante toda a Idade Média
e abusado pelos monarcas do Estado absoluto, que o converteram num agressivo instrumento de
política económica;
2.ª Devido a estes abusos, na sequência do pensamento iluminista, a generalidade das Consti-
tuições do início do século XIX proibiu o confisco de bens, assim garantindo o direito de propriedade
da burguesia emergente;
3.ª A partir dos anos 80, do século passado, o confisco renasceu no contexto da «guerra contra
as drogas», incorporou novas valências (confisco alargado, confisco do património incongruente) e
ganhou consagração internacional (v.g . Convenções das Nações Unidas, do Conselho da Europa,
direito da União Europeia), tornando -se, rapidamente, num dos pilares da atual política criminal
(art. 19.º, n.º 1, da Lei n.º 55/2020, de 27 de agosto);
4.ª O confisco dos instrumentos, produtos e vantagens do crime é uma medida de geometria
variável, que poderá constituir uma pena acessória [art. 8.º, al.ª a), do Decreto -Lei n.º 28/84, de
20 de janeiro], uma medida análoga à medida de segurança (art. 109.º, n.º 2, do Código Penal) ou
uma medida de mera redução do património do condenado à situação patrimonial anterior à prática
do crime (art. 110.º, n.º 5, do Código Penal);
5.ª Compreende -se, por isso mesmo, que, quando não tem natureza penal, o confisco tanto
possa ser baseado numa condenação (v.g. arts. 109.º, n.º 1 e 110.º, n.º 1, do Código Penal), como
não baseado numa condenação (arts. 109.º, n.º 2, e 110.º, n.º 5, do mesmo diploma legal);
6.ª O direito de mera ordenação social surgiu no direito nacional, em finais da década de
setenta, do século passado, sendo as suas soluções, muitas vezes, similares, às do Código Penal
que é, subsidiariamente, aplicável (art. 32.º do Decreto -Lei n.º 433/82, de 27 de outubro);
7.ª O confisco no regime geral de mera ordenação social restringe -se aos instrumentos e
aos produtos de uma contraordenação [arts. 21.º, n.º 1, al.ª a), 21.º -A, n.º 1, 22.º, n.º 1, e 25.º do
Decreto -Lei n.º 433/82, de 27 de outubro), não incluindo as suas vantagens, que apenas relevam
para a determinação da medida da coima (art. 18.º, n.os 1 e 2, do mesmo Decreto -Lei), sendo, por
isso mesmo, muito menos ambicioso do que no direito penal;
8.ª À semelhança do direito penal, a perda dos instrumentos e dos produtos de uma contraor-
denação pode ser baseada numa condenação [arts. 21.º, n.º 1, al.ª a), e 21.º -A, n.º 1, do Decreto-
-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro] ou independente dessa mesma condenação (arts. 22.º, n.º 1, e
25.º do mesmo diploma legal);
9.ª Com efeito, a perda de objetos que, pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso,
representem grave perigo para a comunidade ou risco de serem utilizados para a prática de um
crime ou de outra contraordenação (art. 22.º, n.º 1, do Decreto -Lei n.º 433/82, de 27 de outubro)
pode ter lugar, ainda que não possa haver procedimento contra o agente ou a este não seja aplicada
uma coima (art. 25.º do mesmo diploma legal);
10.º A prescrição do procedimento contraordenacional (tal como outras causas como a morte,
a amnistia ou o mero desconhecimento da autoria dos factos) não obsta, assim, à perda de objetos
perigosos que serviram ou estavam destinados a servir para a prática de uma contraordenação ou
que por esta foram produzidos;
11.ª A correta utilização dos institutos da perda sanção acessória [arts. 21.º, n.º 1, al.ª a) e
21.º -A, n.º 1, do Decreto -Lei n.º 433/82, de 27 de outubro] e da perda independente de coima, de

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