Acórdão n.º 406/2003, de 24 de Outubro de 2003

Acórdão n.º 406/2003 Processo n.º 470/2001 Acordam no Tribunal Constitucional: 1.1 - O Procurador-Geral da República, com a legitimidade que lhe é conferida pelos artigos 281.º, n.º 2, alínea e), da Constituição e 12.º, n.º 1, alínea c), do Estatuto do Ministério Público, requereu a este Tribunal a declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade das normas dos n.os 1 e 2 do artigo 21.º dos Estatutos do Instituto Nacional da Aviação Civil (INAC), aprovados pelo Decreto-Lei n.º 133/98, de 15 de Maio, conjugadas com o preceituado nas alíneas c) e d) do n.º 3 do artigo 2.º e nas alíneas j) e l) do n.º 2 do artigo 13.º dos mesmos Estatutos, bem como do regulamento de carreiras, do regulamento disciplinar e do regime retributivo aprovados pelo despacho conjunto n.º 38/2000, dos Secretários de Estado dos Transportes e do Orçamento de 28 de Outubro de 1999 (publicado no Diário da República, 2.' série, de 14 de Janeiro de 2000).

As normas em causa, constantes dos mencionados Estatutos, dispõem o seguinte: 'Artigo 21.º Regime contratual 1 - O pessoal do INAC está sujeito ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, com as especialidades previstas nos presentes Estatutos e seus regulamentos.

2 - As condições de prestações e de disciplina do trabalho são definidas em regulamento próprio do INAC, em observância das disposições legais imperativas do regime do contrato individual de trabalho.

3 - ....................................................................................................................

4 - ....................................................................................................................

Artigo 2.º Tutela 1 - ....................................................................................................................

2 - ....................................................................................................................

3 - Sem prejuízo de outros poderes de controlo estabelecidos na lei, estão sujeitos à aprovação dos Ministro da tutela e das Finanças: a) .....................................................................................................................

b) .....................................................................................................................

c) O regulamento de carreiras e o regulamento disciplinar; d) O regime retributivo.

Artigo 13.º Conselho de administração 1 - ....................................................................................................................

2 - Compete ao conselho de administração: .........................................................................................................................

j) Definir o estatuto remuneratório, os regulamentos de carreiras e disciplinar do pessoal do INAC e respectivos mapas de pessoal a submeter às tutelas nos termos do artigo 2.º; l) Decidir sobre a admissão e afectação dos trabalhadores do INAC e praticar os demais actos relativos à gestão do pessoal e ao desenvolvimento da sua carreira; .........................................................................................................................' Em resumo, a linha argumentativa do requerente é a seguinte: A norma constante do n.º 1 do artigo 21.º dos Estatutos do INAC dispõe que o pessoal ao serviço deste instituto público está sujeito ao regime jurídico do contrato individual de trabalho, com as especialidades previstas em tais Estatutos e seus regulamentos; Por sua vez, o n.º 2 deste artigo 21.º delega a definição das condições de prestação e de disciplina do trabalho em regulamento próprio do INAC, cometendo o artigo 13.º, n.º 2, alíneas j) e l), ao conselho de administração a definição do estatuto remuneratório, dos regulamentos de carreiras e disciplinar e respectivos mapas de pessoal, bem como a decisão sobre a admissão e afectação dos trabalhadores e a prática dos demais actos relativos à gestão de pessoal e ao desenvolvimento da respectiva carreira, devendo tal espécie de regulamento de empresa ser submetido a aprovação ministerial, nos termos do artigo 2.º, n.º 3, alíneas c) e d), dos mesmos Estatutos; Tais regulamentos foram aprovados pelo despacho conjunto n.º 38/2000, dos Secretários de Estado dos Transportes e do Orçamento; Por força do preceituado no artigo 165.º, n.º 1, alínea t), da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República - salvo autorização legislativa outorgada ao Governo - legislar sobre a matéria referente às 'bases do regime e âmbito da função pública'; Os princípios fundamentais do regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública são definidos pelo Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, e pelo Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, que se configuram, em conjunto, como verdadeira lei quadro nesta matéria, abrangendo a disciplina básica neles estabelecida grande parte da Administração - mesmo descentralizada - integrada pelos institutos públicos, nas modalidades de serviços personalizados do Estado e de fundações públicas (cf. Acórdãos n.os 36/96 e 129/99 do Tribunal Constitucional); Na verdade, os referidos diplomas estabelecem, taxativamente, o modo de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública, apenas admitindo as formas de contratação de pessoal, nas modalidades de contrato administrativo de provimento e de contrato de trabalho a termo certo, este último só admissível nos casos especialmente previstos na lei; Tal tipificação taxativa das formas de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública tem o seu âmbito institucional definido em torno dos serviços e organismos da Administração Pública, incluindo os institutos públicos nas modalidades de 'serviços personalizados do Estado' e de 'fundos públicos' (artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 184/89), sendo vedada a tais serviços ou organismos a constituição de relações de emprego com carácter subordinado por forma diferente da prevista nos referidos diplomas legais; O INAC é - por força das disposições conjugadas dos artigos 1.º dos respectivos Estatutos e 1.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 133/98, de 15 de Maio uma pessoa colectiva de direito público, um instituto público dotado de personalidade jurídica e de autonomia administrativa, financeira e patrimonial, tendo por atribuições a supervisão, a regulamentação e a inspecção do sector da aviação civil; Tal instituto público rege-se prioritariamente pelas normas legais e regulamentares aplicáveis aos institutos públicos (artigo 1.º, n.º 2, dos Estatutos), que exerce 'poderes de autoridade do Estado' (artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 133/98 e artigo 25.º dos Estatutos); Configurando-se - atentas as suas atribuições e estrutura orgânica e funcional - como um instituto público, na modalidade de serviço personalizado do Estado, estando-lhe cometidas funções de manifesto interesse público na fiscalização da aviação civil e exercendo os respectivos poderes de autoridade, situa-se, por isso, no 'âmbito institucional' definido pelo artigo 2.º do citado Decreto-Lei n.º 184/89; Ora, assim sendo, a admissibilidade de celebração de contratos de trabalho por tempo indeterminado - sujeitos ao regime legal genericamente vigente em direito laboral - colide frontalmente com o princípio da taxatividade das formas de constituição de relação de emprego na Administração Pública e com a proscrição da figura do contrato de trabalho por tempo indeterminado; Pelo que, integrando-se as normas legais questionadas em diploma editado pelo Governo nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, sem precedência de autorização legislativa, padecem as mesmas de inconstitucionalidade orgânica, por violação do disposto no artigo 165.º, n.º 1, alínea t), da Constituição; Por outro lado, as normas a que se reporta o presente pedido, ao preverem a possibilidade de constituição de uma relação jurídica de emprego na Administração Pública sem instituírem um procedimento justo de recrutamento e selecção dos candidatos à contratação definitiva, fazendo-a assentar em mero e discricionário despacho ministerial não precedido de adequada selecção e concurso dos interessados, colidem ainda com o n.º 2 do artigo 47.º da Constituição, enfermando de inconstitucionalidade material; Aliás, a recente jurisprudência do Tribunal Constitucional - expressa, nomeadamente, nos Acórdãos n.os 68/99 e 368/2000 - acentuou a relevância atribuível à regra constitucional do concurso como forma privilegiada de acesso à função pública; São consequencialmente inconstitucionais as normas legais que atribuem ao conselho de administração a incumbência de elaborar um regulamento de carreiras, disciplinar e do regime retributivo dos funcionários ao serviço do INAC - bem como o regulamento, aprovado pela tutela, que contém a disciplina de tais matérias - e que consta do referido despacho conjunto n.º 38/2000; Na verdade - acrescenta por fim -, assente que a disciplina de tais matérias é imperativamente a que decorre do regime básico instituído pela lei quadro da função pública (constante dos Decretos-Leis n.os 184/89 e 427/89), estará inexoravelmente excluída a possibilidade de edição de uma espécie de regulamento de empresa, contendo o regime jurídico aplicável em tal sede aos trabalhadores ao serviço do INAC.

1.2 - Notificado do pedido, o Primeiro-Ministro respondeu, argumentando, em síntese, o seguinte: Os n.os 1 e 2 do artigo 21.º dos Estatutos do INAC não se subordinam ao regime legal do Decreto-Lei n.º 427/89, já que este não reveste a natureza de uma lei de bases nem assume qualquer valor paramétrico sobre outras leis, à luz dos n.os 2 e 3 do artigo 112.º da CRP; O regime de contrato individual de trabalho estipulado pelas normas sindicadas para o pessoal do INAC encontra-se devidamente habilitado, na qualidade de disciplina estatutária especial de um instituto público, pelo disposto no n.º 4 do artigo 41.º do Decreto-Lei n.º...

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