Resolução n.º 4/2001, de 09 de Janeiro de 2001

Resolução do Conselho de Ministros n.º 4/2001 No cumprimento do imperativo constitucional (artigos 67.º, 69.º e 70.º da Constituição), o Governo tem vindo desde Dezembro de 1995 a desenvolver um conjunto de medidas que tem especialmente em atenção as crianças e jovens em risco e designadamente aquelas que se encontram num processo de início ou desenvolvimento de uma carreira de prática de factos, que a lei penal qualifica como crime. No desenvolvimento dessas medidas, o Governo, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 108/2000, de 19 de Agosto, criou o Programa de Acção para a Entrada em Vigor do Direito de Menores e mandatou a Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens em Risco para entregar, no prazo de 30 dias, o que foi feito, um programa de prevenção da criminalidade e inserção dos jovens dos bairros mais vulneráveis dos distritos de Lisboa, Porto e Setúbal. Como se refere nessa resolução, 'a entrada em vigor da legislação de menores é também um incentivo a que se continuem a desenvolver, em simultâneo, programas de prevenção da criminalidade juvenil, tornando-os mais eficazes, do conhecimento de todas as entidades interessadas e assegurando que chegam aos jovens seus destinatários, em especial os que vivem nos bairros urbanos dos centros envelhecidos e nas periferias das grandes cidades, de modo a evitar, por um lado, a sua progressiva 'desfiliação' e fuga da família, da escola e de outras instituições públicas e privadas de socialização, o início de práticas de crime e, por outro lado, a promover a sua inserção na vida em sociedade'.

A relação entre as crianças e jovens que praticam crimes e a sociedade foi sempre objecto de múltiplos olhares, que através do(s) tempo(s) e do(s) espaço(s) assumiram formas de diabolização, moralização, ressocialização ou mesmo de desculpabilização. Essa relação encontra-se, actualmente, em Portugal, impregnada pelo discurso de que as crianças e os jovens que estão tendencialmente na rua constituem uma das principais causas de 'insegurança dos cidadãos'. Apesar da interpretação das estatísticas e da 'cifras negras' não ser pacífica, é hoje inquestionável que se generalizou a ideia de que os jovens, designadamente urbanos, estão a praticar eventualmente mais crimes que no passado.

Ao Estado cabe, assim, perante este problema social dar uma dupla resposta.

Por um lado, uma resposta reactiva de oferecer à sociedade segurança e aplicar aos jovens que praticam crimes medidas tutelares, se necessário detentivas. Por outro lado, é necessário uma resposta proactiva de prevenção da delinquência juvenil e inserção dos jovens que potencialmente se encontram a caminho da marginalidade e exclusão. Assim, mais do que novos programas de inserção para jovens urbanos é necessário, designadamente, que a polícia, a justiça, a segurança social, a saúde, a educação, as autarquias e as entidades da sociedade civil consigam chegar a esses jovens e oferecer-lhes as respostas escolares, de formação pessoal e profissional e lúdicas de modo a evitar que eles venham a dedicar-se à prática de crimes.

Mas esta intervenção transversal implica uma associação do que responsabilize e sustente o envolvimento e o comprometimento real e efectivo de todos os intervenientes, eventualmente formalizado em contrato escrito entre as diversas organizações aderentes, contrato onde se estabeleça as estruturas que vão desenvolver as acções, a coordenação e a direcção, os diversos papéis e as responsabilidades de cada actor/instituição, a formação, o financiamento e os recursos e finalmente o acompanhamento e a avaliação.

No conjunto de factores que propiciam percursos tendentes à prática de factos, que a lei penal tipifica como crime, figuram, entre muitos outros, a urbanização acelerada e as migrações de nacionais e estrangeiros para as periferias das grandes cidades, as diferenças culturais, a precariedade do espaço público e da habitação, os níveis baixos de escolaridade, os insuficientes cuidados de saúde, as disfunções familiares e as intervenções parentais negligentes e desadequadas.

A prevenção da criminalidade visa, assim, a intervenção junto das crianças e dos jovens e das suas famílias, os quais, vivendo em contextos sócio-económicos desfavoráveis, associados a características pessoais negativas, resultantes de um processo de crescimento desajustado, são identificados como potenciais marginais. É hoje património comum do conhecimento que as crianças e jovens expostos, durante um período longo, a riscos de natureza e causalidade múltipla são mais susceptíveis e estão mais vulneráveis a entrar ou aprofundar processos de exclusão. E que esses processos, com frequência, são prévios a percursos de marginalidade e delinquência juvenil. Esta probabilidade é tanto mais forte quanto mais precocemente aqueles riscos, designadamente de desinserção social, ocorrem e se instalam, interferindo negativamente nos seus processos de socialização e desenvolvimento. Trata-se de crianças e jovens com capitais sócio-familiares e culturais muito desadequados que, em virtude de encontrarem poucas afinidades com aquilo que o sistema escolar formal lhes oferece e na ausência de uma intervenção firme e pedagogicamente adequada dos pais, vão construindo identidades próprias na busca de alguma forma de valorização social, particularmente entre o grupo de pares. No contexto da construção de tais identidades, afastam-se da escola e estabelecem com esta relações de recusa e abandono.

Este afastamento associa-se a percursos e trajectórias desviantes, marginais, que exprimem as identidades alternativas construídas por estes jovens. Assim, é necessário compensar os referidos riscos sociais com assunção de políticas universais e selectivas inclusivas, que qualifiquem a nível pessoal, escolar e profissional e reforcem a capacidade destas crianças e jovens resistirem ao apelo dos percursos associais e criminais. O presente programa não cuida das políticas universais que tem desenvolvido, como as de combate à exclusão (exemplo: rendimento mínimo garantido) ou de equidade e de igualdade de oportunidades no acesso à educação (diversificação curricular, apoio específico a grupos carenciados), mas sim, em articulação com as medidas de política social global e as medidas universais, de formular medidas políticas selectivas para jovens que vivem em...

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