Decreto-Lei n.º 349/86, de 17 de Outubro de 1986

Decreto-Lei n.º 349/86 de 17 de Outubro O contrato de transporte de passageiros por mar despontou, numa perspectiva normativa, em meados do século XIX; sobre ele por completo silencia o Código Comercial francês de 1808, ainda na esteira da Ordenança de 1681. Veio a ser o Código Comercial brasileiro de 1850 o primeiro que dele se ocupou; entre ele e o português de 1888 poucos se intercalaram. Entretanto, ao apogeu dos grandes paquetes de linhas regulares sucedeu, com o definitivo advento do transporte aéreo, um rápido declínio. Abriu-se então a época dos cruzeiros marítimos.

O presente diploma não se afasta substancialmente, nalgumas soluções, das acolhidas no Código Comercial; trata-se de uma área em que as mutações entretanto operadas no direito marítimo não foram drásticas. Em aspectos pontuais tomaram-se em conta, designadamente, o mais adequado tratamento dado pelo Código da Navegação italiano de 1942, pelo Código de Direito Marítimo Privado grego de 1958 e pela legislação francesa de 1966 (Lei n.º 66-420 e Decreto n.º 66-1078).

Remete-se o artigo 2.º para os tratados e convenções internacionais vigentes em Portugal. O certo, porém, é que, até ao momento, nenhuma das principais convenções foi ratificada; assim, as de Bruxelas de 1961 e de 1967, respeitantes, respectivamente, ao transporte de passageiros por mar e ao transporte de bagagens de passageiros por mar. Para essa omissão terá contribuído o escasso acolhimento por elas alcançado. Daí a sua substituição pela Convenção de Atenas de 13 de Dezembro de 1974, relativa ao transporte por mar de passageiros e suas bagagens, já preparada sob a égide da IMO.

  1. No artigo 18.º, ao contrário do que acontece no Código Civil, em que o regime do transporte gratuito é unitário, distingue-se entre o transporte sem retribuição pecuniária efectuado em navio explorado com carácter comercial e o transporte efectuado em navio não utilizado para fins comerciais. A opção tem como base a do aludido Código italiano, que trata de forma diversa o 'trasporto gratuito' e o 'trasporto amichevole o a titolo do cortesia' (artigos 413.º e 414.º). Na segunda hipótese, a responsabilidade do transportador assume sempre natureza extracontratual.

    Tem a ver a principal inovação do diploma com o tratamento normativo dos cruzeiros marítimos. Propendeu-se, nesta primeira abordagem legislativa, para um regime intencionalizadamente pouco gravoso para os organizadores desses cruzeiros, embora salvaguardando interesses dos passageiros até agora não tutelados. O sistema francês de 1966 é, aqui, declaradamente mais severo para os organizadores; como salienta Rodière, a inspiração social do sistema faz com que estes sejam responsabilizáveis pelo menos como os própriostransportadores.

    Teve-se em linha de conta a realidade portuguesa, na qual esse tipo de actividade económica deve ser incentivado; daí o supor-se que não se deverá, desde já, estabelecer um sistema de responsabilidade demasiado gravoso para os organizadores de cruzeiros marítimos que não sejam os próprios armadores. Aliás, o Decreto-Lei n.º 264/86, de 3 de Setembro, prevê já um esquema actualizado de ordenação da actividade das agências de viagens e turismo, que, obviamente, se aplicará na que agora está em causa.

    Entendeu-se, de qualquer modo, de encarar, ex professo, a questão. E isto até porque um começo de regulamentação constituirá, sem dúvida, um passo significativo no sentido de se obter um melhor equilíbrio contratual. Realmente, e como salientam os autores italianos (por exemplo, Spasiano, Ferrarini, Righetti, etc.), não é de esquecer que constitui uma prática generalizadamente seguida nos países em...

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