Decreto-Lei n.º 72/2023

Data de publicação23 Agosto 2023
ELIhttps://data.dre.pt/eli/dec-lei/72/2023/08/23/p/dre/pt/html
Número da edição163
SeçãoSerie I
ÓrgãoPresidência do Conselho de Ministros
N.º 163 23 de agosto de 2023 Pág. 2
Diário da República, 1.ª série
PRESIDÊNCIA DO CONSELHO DE MINISTROS
Decreto-Lei n.º 72/2023
de 23 de agosto
Sumário: Aprova o regime jurídico do cadastro predial e estabelece o Sistema Nacional de Infor-
mação Cadastral e a carta cadastral.
O cadastro predial é um instrumento indispensável para o conhecimento do território, para o
desenvolvimento de políticas públicas de valorização territorial e para a tomada de decisão sobre
o uso, ocupação e utilização do solo por parte de entidades públicas, empresas e cidadãos.
Em Portugal subsiste um elevado grau de desconhecimento da geometria e da titularidade
dos prédios existentes no território nacional, não só por parte da administração do território,
mas, também de um grande número de proprietários afastados do aproveitamento ativo da terra,
tornando -se cada vez mais difícil realizar o cadastro predial, sobretudo dos prédios rústicos, com
consequências gravosas para o planeamento e gestão do território e para a atuação preventiva e
defensiva das populações face a riscos.
Os objetivos de desenvolvimento do País e as mudanças críticas que os diversos territórios
enfrentam, associadas às alterações climáticas e a fatores de vulnerabilidade e de risco territorial
agravados, determinam necessidades inadiáveis de intervir no território, visando a valorização do
capital natural, a gestão da paisagem e o reforço da resiliência, a promoção da economia local e
a geração de rendimentos nos territórios em perda.
O conhecimento da geometria e da titularidade da propriedade é um requisito essencial para
o desenvolvimento de políticas públicas adequadas, bem como para assegurar o cumprimento da
lei, o exercício legítimo dos direitos e deveres dos cidadãos e das empresas e a boa comunicação
entre a administração e os administrados. A existência de um cadastro predial completo e atualizado
é uma condição de desenvolvimento territorial, pela importância que a informação cadastral detém
na definição e execução de instrumentos de planeamento e gestão do território e de prevenção
de riscos, na política fiscal de base territorial, nas políticas de incentivos e de financiamento, nas
decisões de localização da atividade económica e no exercício da cidadania.
O Cadastro Geométrico da Propriedade Rústica, instituído pelo Decreto n.º 11 859, de 2 de
julho de 1926, encontra -se desfasado dos requisitos e necessidades atuais, tendo deixado de
assegurar uma resposta adequada às necessidades de cadastro dos prédios nele abrangidos, sem
prejuízo da validade da informação cadastral produzida ao abrigo desse regime, a qual importa,
agora, desmaterializar, vetorizar e atualizar, possibilitando a sua conversão em cadastro predial e
a sua atualização gradual.
O Regulamento do Cadastro Predial, aprovado pelo Decreto -Lei n.º 172/95, de 18 de julho,
garantindo o carácter multifuncional do cadastro, pretendeu estabelecer um Sistema Nacional de
Informação Cadastral (SNIC), preenchendo uma necessidade de modernização da Administração
Pública e possibilitando retratar, de forma fidedigna, a realidade administrativa e jurídica da proprie-
dade imobiliária, que representaria a aquisição de uma infraestrutura essencial ao desenvolvimento
do País.
Porém, esse regime jurídico não conheceu a aplicação esperada, em face das dificuldades
decorrentes da excessiva fragmentação da propriedade. Isto, apesar da especial necessidade de
cadastro dos prédios rústicos, particularmente urgente nos espaços florestais de minifúndio, onde
a ausência de cadastro prejudica a execução de medidas de ordenamento e de gestão do território
que contribuam para prevenir incêndios florestais de crescente gravidade.
Mais, o Decreto -Lei n.º 172/95, de 18 de julho, acabou por ficar desatualizado pela significativa
evolução tecnológica que se verificou desde a sua aprovação, sobretudo, no domínio da desmate-
rialização dos processos e da informação geográfica e cadastral. Essas dificuldades foram, aliás,
reconhecidas pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 45/2006, de 4 de maio, que aprovou as
linhas orientadoras para a execução, manutenção e exploração de informação cadastral, através
da criação do Sistema Nacional de Exploração e Gestão de Informação Cadastral (SINERGIC), de
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natureza simplificada, no seguimento da qual foi aprovado o Decreto -Lei n.º 224/2007, de 31 de
maio, que estabeleceu o regime experimental da execução, exploração e acesso à informação
cadastral (SINERGIC). Ao abrigo deste regime experimental, foram testadas diferentes metodolo-
gias e procedimentos de trabalho, no âmbito de operações de execução de cadastro realizadas em
sete concelhos com elevado risco de incêndio, entretanto concluídas. Todavia, este regime possuiu
um âmbito territorial limitado e exigiu a realização sistemática do cadastro predial em toda a área
abrangida, em termos que dificilmente podem ser replicados na totalidade do território nacional.
Por outro lado, a Lei n.º 31/2014, de 30 de maio, que aprovou as bases gerais da política
pública de solos, de ordenamento do território e de urbanismo (LBPPSOTU), veio determinar a
criação de um SNIC que permita identificar as unidades prediais, estabelecendo que estão sujeitos
a registo predial, a inscrição matricial, bem como a georreferenciação e a inscrição no cadastro
predial, os factos que afetem direitos reais relativos a um determinado imóvel ou lhe imponham
um ónus, nos termos da lei.
O Decreto -Lei n.º 80/2015, de 14 de maio, que procedeu ao desenvolvimento legislativo
da LBPPSOTU, determina que, de entre as peças escritas e desenhadas do conteúdo documental
dos planos de pormenor, incluindo os que tenham efeitos registais, constam as que suportam as
operações de transformação fundiária previstas, nomeadamente para efeitos de registo predial e de
elaboração ou conservação do cadastro geométrico da propriedade rústica ou do cadastro predial,
estabelecendo que as parcelas de terreno cedidas ao município se integram no domínio municipal
no ato de individualização no registo predial dos lotes respetivos e estão sujeitas a cadastro predial.
A Lei n.º 3/2015, de 9 de janeiro, veio regular o acesso e exercício da atividade profissional
de cadastro predial, estando já operacionalizados o modelo de formação e de reconhecimento,
bem como o sistema de inscrição dos técnicos de cadastro predial, que constituem as bases para,
num quadro de responsabilização profissional, cometer aos particulares a responsabilidade pela
conservação do cadastro predial e a possibilidade de execução.
A Lei n.º 78/2017, de 17 de agosto, criou o sistema de informação cadastral simplificada e o
Balcão Único do Prédio (BUPi), aplicável, como projeto -piloto, à área dos municípios de Pedrógão
Grande, Castanheira de Pêra, Figueiró dos Vinhos, Góis, Pampilhosa da Serra, Penela, Sertã,
Caminha, Alfândega da Fé e Proença -a -Nova, com vista à imediata identificação da estrutura fun-
diária e da titularidade dos prédios rústicos e mistos.
A Lei n.º 65/2019, de 23 de agosto, veio estender, a partir de 1 de novembro de 2018, o
regime do sistema de informação cadastral simplificada a todo o território nacional, e promovendo
a universalização do BUPi enquanto plataforma nacional de registo e cadastro do território, abran-
gendo os prédios urbanos, rústicos e mistos de todo o território nacional. O regime do sistema de
informação cadastral simplificada, que resulta da aplicação conjugada destes dois diplomas, nas
situações em que a informação resultante da representação gráfica georreferenciada dos prédios
rústicos e mistos assuma a natureza de cadastro predial, concorre para a elaboração do cadastro
predial, viabilizando a interoperabilidade de dados cadastrais recolhidos relativos à geometria e à
titularidade dos prédios.
O Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território, aprovado pela Lei n.º 99/2019,
de 5 de setembro, consagra a promoção da informação geográfica, o incremento do conhecimento
sobre a propriedade do solo e o aumento da percentagem do território coberto com cadastro predial.
No conjunto de medidas que reforçam e complementam as ações já em curso, sobretudo na
prevenção e combate a riscos naturais, na adaptação às alterações climáticas e na valorização
e ordenamento do território, enunciados no âmbito do 1.º Desafio Estratégico do Programa do
XXIII Governo Constitucional «Alterações Climáticas Transição Climática», o Governo assumiu o
compromisso de alargar a informação cadastral simplificada a todo o território nacional, associando -a
ao cadastro predial, e de criar condições para a aprovação da revisão do regime jurídico do cadastro
predial.
No mesmo sentido, já haviam sido anteriormente definidas medidas prioritárias para a valori-
zação do território florestal e incentivo à gestão florestal ativa e racional considerando as disfuncio-
nalidades existentes no território nacional associadas à fragmentação da propriedade rústica, ao
excesso de situações de compropriedade e ao desconhecimento da localização, limites e titularidade
dos prédios, aos problemas demográficos de diminuição da população ativa, à edificação dispersa,
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à menor presença humana nos territórios rurais e ao agravamento dos custos de produção que
levaram ao abandono da floresta e à acumulação de combustível, propiciadora da ocorrência de
incêndios rurais.
Neste contexto, através da Resolução de Conselho de Ministros n.º 45 -A/2020, de 16 de junho,
foi aprovado o Plano Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais, o qual estabelece, entre outros,
o objetivo de concretização de programas que visam o conhecimento sobre a localização, limites
e titularidade dos prédios rústicos e mistos, e sobre os prédios sem dono conhecido, no âmbito da
informação cadastral simplificada e do cadastro predial. E em concretização deste, o Programa
Nacional de Ação, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 71 -A/2021, de 8 de
junho, engloba medidas concretas como a aprovação do novo regime jurídico do cadastro predial,
articulado com o regime jurídico do sistema da informação cadastral simplificada, desenvolvendo-
-se o sistema nacional de cadastro predial.
Também o regime jurídico da reconversão da paisagem estabelecido pelo Decreto -Lei
n.º 28 -A/2020, de 26 de junho, na sua redação atual prevê a execução de ações de cadastro
necessárias à obtenção da configuração geométrica dos prédios que integram as Áreas Integra-
das de Gestão da Paisagem, devendo a identificação da titularidade dos prédios ter como suporte
o sistema de informação cadastral simplificado e o cadastro geométrico da propriedade rústica e
cadastro predial em vigor.
Paralelamente, o Plano de Recuperação e Resiliência prevê a Reforma «Reorganização do
sistema de cadastro da propriedade rústica e do Sistema de Monitorização de Ocupação do Solo
(SMOS)», inscrita na componente «C8 — Florestas», que estabelece o quadro jurídico necessá-
rio para operacionalizar o investimento «RE -C08 -i02: Cadastro da propriedade rústica e sistema
de Monitorização da Ocupação do Solo», contemplando, entre outros diplomas, a publicação de
diploma que aprova o novo Regime Jurídico do Cadastro Predial (RJCP). Veja -se, neste âmbito,
que a reforma em apreço visa, entre outros aspetos, consolidar uma visão coerente, atualizada e
holística do território, permitindo que o Estado desenvolva políticas públicas concretas e sustentá-
veis, bem como facilitar a interação dos cidadãos com a Administração Pública.
O cadastro predial é o instrumento que possibilita a representação geográfica e georreferenciada
das unidades prediais que constituem o território nacional, permitindo conhecer a forma como a
terra se divide em prédios, a respetiva localização, configuração geométrica e delimitação. Com este
instrumento, os cidadãos e organizações podem conhecer a exata e rigorosa localização geográfica
dos seus prédios e como tal confirmar oficialmente, e com segurança acrescida, os seus direitos
sobre os mesmos, podendo assim melhor proteger os seus interesses e defender o que é seu.
Urge, por isso, criar um regime jurídico do cadastro predial novo e estabelecer um SNIC que
assegure a integração de toda a informação relativa à propriedade fundiária com base no cadastro
predial, permitindo a disponibilização dos dados de identificação, de caracterização dos prédios, em
articulação com o registo predial e com a inscrição matricial. Promovendo -se, assim, a cobertura
do território nacional com cadastro predial e incrementando o conhecimento sobre os prédios e a
propriedade do solo na definição e execução de políticas públicas territoriais.
A carta cadastral constituirá, pois, o acervo dinâmico dessa informação, de âmbito nacional e de
acesso universal, na qual se procede à gestão e conservação do cadastro predial e à harmonização
com a descrição e inscrição no registo predial e com a matriz predial. Deste modo, consagra -se a
carta cadastral como o mapa cartográfico nacional oficial dos prédios em cadastro predial.
Deste modo, no novo RJCP, aprovado através do presente decreto -lei, estabelece -se um
modelo de integração de informação, de articulação de dados de entidades da Administração Pública
e de comunicação com o cidadão, com vista ao conhecimento do território, suas características
e seus titulares, bem como à promoção da segurança jurídica e à coerência entre a informação
constante do cadastro predial, do registo predial e da matriz predial a respeito de cada prédio neles
identificado.
O presente regime jurídico mantém e consolida o papel da Direção -Geral do Território (DGT)
enquanto Autoridade Nacional de Cadastro Predial, responsável pela elaboração, gestão e dis-
ponibilização da carta cadastral e assumindo funções de regulação, supervisão e fiscalização da
atividade de cadastro predial.

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