Decreto-Lei n.º 281/2007, de 07 de Agosto de 2007
Decreto-Lei n. 281/2007
de 7 de Agosto
A Cruz Vermelha Portuguesa iniciou a sua actividade a 11 de Fevereiro de 1865 sob a designaçáo «Comissáo Provisória para Socorros a Feridos Doentes em Tempo de Guerra» e foi oficialmente reconhecida por Decreto de 26 de Maio de 1868 sob o novo nome de «Comissáo Portuguesa de Socorros a Feridos e Doentes Militares em Tempo de Guerra» e, posteriormente, também reconhecida pelo Comité Internacional da Cruz Vermelha em 13 de Julho de 1887, sob a designaçáo oficial «Sociedade Portuguesa da Cruz Vermelha», vindo a ser admitida em 28 de Maio de 1919 no seio da Liga Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e Crescente Vermelho.
Os importantes desenvolvimentos ao nível estrutural verificados desde a data da entrada em vigor do Decreto-Lei n. 164/91, de 7 de Maio, náo obstante a estabilidade dos princípios orientadores da actividade da Cruz Vermelha Portuguesa permanecerem inalterados, exigem a aprovaçáo de um novo regime jurídico regulador da instituiçáo.
Em causa está a necessidade de, por um lado, se proceder a reajustamentos com o objectivo de optimizar o respectivo funcionamento e, por outro, dar resposta aos novos desafios impostos pela realidade actual, no respeito pelos princípios e orientaçóes definidas pelas convençóes internacionais da Cruz Vermelha.
Com plena consciência dos altos e humanitários fins que à instituiçáo compete atingir e no sentido de estimular e favorecer a prossecuçáo das suas tarefas, mantém -se o reconhecimento das razóes determinantes do apoio devido à Cruz Vermelha Portuguesa, continuando esta a gozar dos benefícios inerentes às instituiçóes particulares de solidariedade social e consagrando -se legalmente um conjunto de regras e princípios que iráo regular as relaçóes entre o Estado
e a instituiçáo, de molde a que esta possa prestar, cada vez mais e melhor, serviços de reconhecida relevância e utilidade pública, como instituiçáo humanitária nacional.
Consagra -se num único diploma legal o quadro regulador que sistematiza e disciplina o funcionamento dos órgáos da instituiçáo, fornecendo um conjunto de regras elementares de actuaçáo, definindo competências e objectivos, bem como determinando a sua estrutura associativa e a composiçáo dos respectivos órgáos sociais.
As alteraçóes agora introduzidas pretendem, simultaneamente, compatibilizar as orientaçóes da Federaçáo e do Comité Internacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho com as condiçóes necessárias à escolha das pessoas mais capazes para titulares dos órgáos da instituiçáo, como forma de garantir a continuidade e o adequado desenvolvimento da mesma.
O novo regime considera definitivamente a verdadeira génese da Cruz Vermelha Portuguesa enquanto organizaçáo náo governamental e pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública administrativa, embora tendo em consideraçáo que o apoio estatal constitui uma condiçáo fundamental para a prossecuçáo dos seus objectivos.
As principais alteraçóes introduzidas no regime da instituiçáo obedecem a quatro grandes objectivos.
Em primeiro lugar, e náo obstante a natureza associativa da instituiçáo, pretende -se ver igualmente espelhadas na respectiva estrutura orgânica as características que a aproximam do carácter fundacional.
Por essa razáo, a par de órgáos tipicamente associativos como a assembleia geral e as assembleias das delegaçóes locais, assume -se de forma clara a existência de outros órgáos que garantam a nível local a representatividade externa que já hoje existe no conselho supremo, o que é feito através da consagraçáo da figura dos membros zeladores e pela consagraçáo dos conselhos locais de curadores.
Em segundo lugar aposta -se na racionalizaçáo das estruturas locais que passam a ser exclusivamente constituídas por delegaçóes locais, introduzindo -se, porém, a figura do delegado regional com o objectivo de apoiar as estruturas locais na sua actividade e representar a direcçáo nacional junto das mesmas.
Em terceiro lugar, de acordo com as orientaçóes da Federaçáo e do Comité Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, permite -se a profissionalizaçáo das funçóes executivas de gestáo da instituiçáo, tendo em conta a sua capacidade financeira e o princípio da complementaridade entre os órgáos de governo e de gestáo.
Em quarto lugar pretende -se potenciar uma escolha consensual, quer do presidente nacional, quer dos presidentes das delegaçóes locais, de forma a garantir -lhes todas as condiçóes para o desempenho das respectivas funçóes.
Assim:
Nos termos da alínea a) do n. 1 do artigo 198. da Constituiçáo, o Governo decreta seguinte:
CAPÍTULO I
Disposiçóes gerais
Artigo 1.
Objecto
O presente decreto -lei aprova o regime jurídico da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) e os respectivos estatutos, os quais fazem parte integrante do presente decreto -lei.Artigo 2.
Regime jurídico
1 - A CVP está subordinada às convençóes internacionais de Genebra, subscritas e ratificadas por Portugal, no âmbito das suas finalidades, ao presente decreto -lei e demais legislaçáo aplicável.
2 - A CVP tem duraçáo ilimitada e goza dos benefícios inerentes às instituiçóes de utilidade pública e instituiçóes particulares de solidariedade social.
Artigo 3.
Natureza
1 - A Cruz Vermelha Portuguesa, adiante designada por CVP, é uma instituiçáo humanitária náo governamental, de carácter voluntário e de interesse público, que desenvolve a sua actividade devidamente apoiada pelo Estado, no respeito pelo Direito Internacional Humanitário, pelos Estatutos do Movimento Internacional e pela Constituiçáo da Federaçáo da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.
2 - A CVP é uma pessoa colectiva de direito privado e de utilidade pública administrativa, sem fins lucrativos, com plena capacidade jurídica para a prossecuçáo dos seus fins.
Artigo 4.
Princípios fundamentais
1 - A CVP desenvolve a sua actividade com autonomia face ao Estado e em obediência aos princípios fundamentais e recomendaçóes do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, estabelecidos em Conferência Internacional.
2 - Os princípios fundamentais da Cruz Vermelha sáo:
-
Humanidade - a Cruz Vermelha nasce da preocupaçáo de prestar auxílio a todos os feridos, dentro e fora dos campos de batalha; de prevenir e aliviar, em todas as circunstâncias, o sofrimento humano; de proteger a vida e a saúde; de promover o respeito pela pessoa humana; de favorecer a compreensáo, a cooperaçáo e a paz duradoura entre os povos;
-
Imparcialidade - a Cruz Vermelha náo distingue nacionalidades, raças, condiçóes sociais, credos religiosos ou políticos, empenhando -se exclusivamente em socorrer todos os indivíduos na medida dos seus sofrimentos e da urgência das suas necessidades, sem qualquer espécie de discriminaçáo;
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Neutralidade - a Cruz Vermelha, a fim de conservar a confiança de todos, abstém -se de tomar parte em hostilidades ou em controvérsias de ordem política, racial, filosófica ou religiosa;
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Independência - a Cruz Vermelha é independente e, no exercício das suas actividades como auxiliar dos poderes públicos, conserva autonomia que lhe permite agir sempre segundo os princípios do Movimento Internacional da Cruz Vermelha;
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Voluntariado - a Cruz Vermelha é uma instituiçáo de socorro voluntária e desinteressada;
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Unidade - a Cruz Vermelha é só uma. Em cada país só pode existir uma sociedade que está aberta a todos e estende a sua acçáo a todo o território nacional;
-
Universalidade - a Cruz Vermelha é uma instituiçáo universal, no seio da qual todas as sociedades nacionais têm direitos iguais e o dever de entreajuda.
Artigo 5.
Missáo
1 - Constitui missáo da CVP prestar assistência humanitária e social, em especial aos mais vulneráveis, prevenindo e reparando o sofrimento e contribuindo para a defesa da vida, da saúde e da dignidade humana.
2 - Para a concretizaçáo do seu objecto a CVP:
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Fomenta e organiza a colaboraçáo voluntária e desinteressada das pessoas singulares e colectivas, públicas e privadas, nas actividades da instituiçáo, ao serviço do bem comum e em especial em situaçóes de acidente grave ou catástrofe;
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Colabora com outras entidades e organismos que actuem nas áreas de protecçáo e socorro e da assistência humanitária e social, sendo também, neste âmbito, auxiliar ou complementar dos poderes públicos, sem prejuízo da sua independência e autonomia e assegurando o respeito pelos símbolos, distintivos e emblemas da Cruz, Crescente e Cristal Vermelhos, nos termos das Convençóes de Genebra e seus Protocolos Adicionais;
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Colabora com as autoridades de protecçáo civil em articulaçáo com o sistema integrado de operaçóes de protecçáo e socorro, de acordo com os princípios e as normas a que se encontra submetida e sem prejuízo da sua independência e autonomia;
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Colabora com os serviços de saúde militar, no âmbito da protecçáo aos militares feridos, doentes, náufragos, prisioneiros de guerra, às vítimas civis dos conflitos nacionais e internacionais e noutras situaçóes decorrentes de estados de excepçáo, no quadro da acçáo do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e de acordo com as disposiçóes das Convençóes de Genebra e seus protocolos adicionais;
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Colabora com o Movimento Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho na promoçáo dos direitos humanos, na difusáo e ensino do direito internacional humanitário, bem como na difusáo e aplicaçáo das suas orientaçóes.
Artigo 6.
Âmbito de acçáo e organizaçáo territorial
1 - A CVP exerce a sua actividade em todo o território nacional como a única sociedade nacional da Cruz Vermelha e, fora do território nacional, no quadro de acçáo do Movimento Internacional da Cruz Vermelha e em qualquer local onde a sua participaçáo seja relevante.
2 - A CVP assenta a organizaçáo territorial em serviços centrais e autónomos, delegaçóes locais e extensóes de delegaçóes locais.
3 - Para melhor prosseguir as suas tarefas, a CVP pode promover a criaçáo de organismos diferenciados, dotando -os dos meios necessários e de...
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