Decreto-Lei n.º 52/2006, de 15 de Março de 2006

Decreto-Lei n.º 52/2006 de 15 de Março O presente decreto-lei transpõe para o ordenamento jurídico interno a Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, relativa ao abuso de informação privilegiada e à manipulação de mercado, e a Directiva n.º 2003/71/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro, relativa ao prospecto a publicar em caso de oferta pública de valores mobiliários ou da sua admissão à negociação, e que altera a Directiva n.º 2001/34/CE.

A transposição da Directiva n.º 2003/6/CE implica, igualmente, a transposição das Directivas n.os 2003/124/CE, da Comissão, de 22 de Dezembro, que estabelece as modalidades de aplicação da Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, no que diz respeito à definição e divulgação pública de informação privilegiada e à definição de manipulação de mercado, 2003/125/CE, da Comissão, de 22 de Dezembro, que estabelece as modalidades de aplicação da Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, no que diz respeito à apresentação imparcial de recomendações de investimento e à divulgação de conflitos de interesses, e 2004/72/CE, da Comissão, de 29 de Abril, relativa às modalidades de aplicação da Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, no que diz respeito às práticas de mercado aceites, à definição da informação privilegiada em relação aos instrumentos derivados sobre mercadorias, à elaboração de listas de iniciados, à notificação das operações efectuadas por pessoas com responsabilidades directivas e à notificação das operações suspeitas.

A Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, vem regular o abuso da informação privilegiada, revogando nesta matéria a anterior Directiva n.º 89/592/CEE, do Conselho, de 13 de Novembro, relativa à coordenação das regulamentações respeitantes às operações de iniciados, e a manipulação de mercado, sob a designação de abuso de mercado, inserindo ainda normas relativas a deveres de informação, alguns dos quais constavam dos agora revogados artigos 68.º e 81.º da Directiva n.º 2001/34/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Maio, relativa à admissão de valores mobiliários à cotação oficial de uma bolsa de valores e à informação a publicar sobre esses valores.

As três directivas da Comissão contêm normas de execução do regime constante da Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, emitidas de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 17.º daqueladirectiva.

Do conjunto de diplomas comunitários de concretização da Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, consta ainda o Regulamento (CE) n.º 2273/2003, da Comissão, de 22 de Dezembro, que estabelece as modalidades de aplicação da Directiva n.º 2003/6/CE no que diz respeito às derrogações para os programas de recompra e para as operações de estabilização de instrumentos financeiros. Da entrada em vigor desse regulamento resultou uma incompatibilidade material com algumas normas do Código de Valores Mobiliários que, por razões de clareza e segurança jurídica, se incluem agora no elenco das normas revogadas pelo presentedecreto-lei.

As principais alterações decorrentes da transposição destas directivas prendem-se com os deveres de informação, uma vez que a definição de abuso de informação e de manipulação do mercado não se distanciam, no essencial, do regime já previsto no Código de Valores Mobiliários.

A Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, contém igualmente um regime que visa reforçar a cooperação entre as entidades de supervisão do mercado de valores mobiliários dos vários Estados membros, de forma a tornar mais eficaz a investigação e a repressão destas infracções, e que é transposto no novo artigo 377.º do Código dos Valores Mobiliários. Este objectivo de eficácia é também o que preside à exigência contida no artigo 11.º da Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, quanto à designação de uma única autoridade administrativa competente que garanta a aplicação do regime contido na directiva, visando-se, identicamente, conforme exposto no respectivo considerando 36, a independência dessa autoridade. Esta exigência de uma autoridade administrativa independente que garanta a aplicação do regime relativo ao abuso de mercado resulta já do regime vigente relativamente à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), não havendo quanto a esse aspecto necessidade de elaborar normas específicas de transposição.

No que respeita aos deveres de informação a cargo dos emitentes, a directiva faz derivar do conceito de informação privilegiada não apenas as proibições de abuso de informação (proibição de transmissão da informação e de realização de transacções por quem detenha informação privilegiada) como também o dever de divulgação, por parte do emitente, da informação privilegiada que directamente lhe diga respeito. Este enquadramento implica uma alteração no regime anteriormente previsto para os factos relevantes, uma vez que os emitentes terão, doravante, nos termos da nova redacção do artigo 248.º do Código dos Valores Mobiliários, de passar a divulgar imediatamente os factos que possam ser enquadrados na definição de informação privilegiada e não apenas aqueles que preenchem as condições anteriormente previstas no referido artigo 248.º Em sintonia com as exigências da directiva, no âmbito dos factos a divulgar, inclui-se já a existência de negociações, desde que, caso fossem divulgadas, tais negociações sejam idóneas a influenciar de maneira sensível a formação dos preços dos valores mobiliários com que se relacionam. De forma a evitar que este regime implique um sacrifício dos legítimos interesses dos emitentes, designadamente pondo em causa o curso normal desses processos negociais, a directiva prevê, no n.º 2 do seu artigo 6.º, a possibilidade de diferimento dessa divulgação, verificadas as condições que se transpõem no artigo 248.º-A a introduzir no Código. A Directiva n.º 2003/124/CE, da Comissão, de 22 de Dezembro, aponta precisamente, como exemplo da possibilidade de diferimento de divulgação da informação, a existência de negociações, matéria que é transposta no n.º 2 do novo artigo 248.º-A.

A Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, regula a matéria da informação apenas na medida em que os deveres de informação estejam relacionados com a protecção da integridade do mercado, constituindo assim medidas preventivas do abuso de mercado.

Nesta medida, a directiva ora transposta não exaura a totalidade dos deveres de informação a cargo dos agentes do mercado, abrangendo apenas aqueles que sejam relevantes para o cumprimento do objectivo que a directiva se propõe atingir. Neste âmbito, a regulação da matéria da informação introduzida por esta directiva, para além do dever de divulgação de informação privilegiada a cargo dos emitentes, implica ainda, em sede de transposição, a introdução de novos deveres, a saber: i) O dever, a cargo dos emitentes e das pessoas que actuem em seu nome ou por sua conta, de elaboração de listas de pessoas que têm acesso a informação privilegiada, matéria transposta através nos n.os 6 e 7 do artigo 248.º; ii) Um conjunto extenso de regras relativas à elaboração e divulgação de informação contendo recomendações de investimento, com destaque para as regras que obrigam à divulgação de conflitos de interesses, matéria transposta nos novos artigos 12.º-A a 12.º-E; iii) O dever de denúncia à autoridade competente de transacções suspeitas de constituir abuso de informação ou manipulação de mercado, a cargo dos intermediários financeiros, matéria transposta através da nova redacção dada ao artigo 382.º As alterações ao nível sancionatório são aquelas estritamente necessárias para transpor as directivas acima referidas. O essencial dos tipos incriminadores de abuso de informação (artigo 378.º) e de manipulação e mercado (artigo 379.º) mantém-se, quer quanto ao seu âmbito de aplicação, quer quanto aos pressupostos da responsabilidade. As normas prevêem apenas factos dolosos praticados por pessoas singulares. O elenco de factos tipicamente relevantes foi alargado, por exigência comunitária, a situações de informação privilegiada que se relacionam com o conhecimento da prática de actos ilícitos e que procuram abranger em especial a prática de actos terroristas pelo seu conhecido efeito nos mercados financeiros. Fora este aspecto, as novas exigências de tutela decorrentes da Directiva n.º 2003/6/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de Janeiro, não foram projectadas nas normas penais incriminadoras, mas sim no sistema de contra-ordenações contido no Código, como forma de conciliar o princípio da mínima intervenção em matéria penal com as exigências de eficácia sancionatória traçadas pela directiva nesta matéria.

Neste plano, o novo regime da informação privilegiada relativa a emitentes contempla expressamente uma proibição de transmissão e do uso de tal informação fora do âmbito normal de funções que, quando violada por pessoas colectivas, com dolo ou negligência, ou por pessoas singulares, com mera negligência, dá origem a responsabilidade contra-ordenacional [artigos 248.º, n.º 4, e 394.º, n.º 1, alínea i)]. O facto penalmente proibido cometido por uma pessoa singular com dolo tem apenas relevância criminal se o respectivo tipo incriminador estiver realizado [artigos 248.º, n.º 4, 394.º, n.º 1, alínea i), in fine, e 420.º, n.º 2, na sua nova redacção], preservando-se deste modo a integral continuidade entre os ilícitos penais anteriores e posteriores a esta reforma.

Apenas se admite agora expressamente a possibilidade de as pessoas colectivas serem, nos termos gerais já consagrados entre nós, demandadas civilmente no processo criminal, para efeitos da apreensão das...

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