Acórdão nº 9996/21.8YIPRT.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-04-07

Data de Julgamento07 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão9996/21.8YIPRT.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:


I.Relatório:


N… intentou requerimento de injunção, que passou a tramitar como acção comum ao abrigo do art.º 10º do Decreto-Lei n.º 63/2013 de 10/5, contra C…, peticionando a condenação desta a pagar à autora a quantia de €17.662,34 a título de capital, acrescida dos juros de mora no valor de €1.394,31, de €600,00 pelos custos administrativos e internos da cobrança da divida, bem como, de €229,50 relativos a taxa de justiça paga, tudo no valor total de €19.886,15.

Alega, para tanto, que, no âmbito do contrato celebrado entre A. e R., a Requerente obrigou-se a prestar o serviço/equipamentos, no plano tarifário escolhido pela R. e esta obrigou-se a efetuar o pagamento tempestivo das faturas e manter o serviço pelo período fixado no contrato sob pena de, não o fazendo, ser responsável pelo pagamento à A., a título de cláusula penal e nos termos das condições contratuais, do valor relativo à quebra do vínculo contratual, valor que inclui os encargos decorrentes da cessação antecipada do contrato.

A A. ativou os serviços, tendo emitido as faturas correspondentes.
Das faturas emitidas e vencidas permanecem em dívida a seguinte, relativa à cláusula penal contratual reclamada pela A.: Fatura n.º FT 202003/5453, no valor de €17662.34, emitida em 08.01.2020 e vencida em 07.02.2020.

Tal fatura foi enviada à R. logo após a data de emissão, para a morada por esta indicada para o efeito.

Pelo facto de não a ter pago, apesar das diligências da Requerente, constituiu-se a R. em mora e devedora de juros legais desde o vencimento, calculados à taxa de juro comercial, sucessivamente, em vigor - a qual é de 8,00% à presente data -, juros vencidos que totalizam o valor supra indicado.

É a R., também, devedora do montante peticionado em "outras quantias", a título de indemnização pelos encargos associados à cobrança.
*

A R. foi notificada e deduziu oposição, alegando, em primeiro lugar, que a factura ora reclamada não é devida, na medida em que o contrato que vinculava Requerente e Requerida foi por esta resolvido em 30/04/2019, resolução que foi comunicada através de comunicação escrita registada com aviso de recepção, por si enviada em 12/04/2019 e recebida pela Requerente em 15/04/2019.

Sem prejuízo, invoca a prescrição da obrigação.
*

Ordenou-se a notificação da A. para responder à matéria da excepção por escrito, o que esta fez.
*

Por se considerar conterem os autos todos os elementos necessários que permitiam conhecer do objecto do processo, o Tribunal proferiu decisão, julgando a excepção de prescrição procedente e, em consequência, julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo a R. C… da totalidade do pedido formulado pela autora N….
*

Não se conformando com a decisão proferida, dela recorre a A. formulando as seguintes Conclusões:
1.–A sentença recorrida considerou prescritos os juros de mora, as outras quantias e a cláusula penal, considerando-os como “acessórios” do preço do serviço prestado.
2.–Porém, não só a fatura peticionada, porque titula uma cláusula penal contratual, não está prescrita, não decorre da lei civil - muito pelo contrário - disposição que estabeleça que os créditos resultantes do mesmo contrato prescrevam em igual prazo. Antes se estabelecem prazos de prescrição distintos.
3.–A teoria da acessoriedade não confere fundamento à sentença, nem a cláusula penal peticionada é acessória da obrigação de pagamento do preço
4.–Em relação aos juros de mora, dispõe o art.º 310º, alínea d) do Código Civil que “Prescrevem no prazo de cinco anos os juros convencionais ou legais…”.
5.–Mais, consagra o art.º 561º do mesmo diploma a autonomia do crédito de juros: “Desde que se constitui, o crédito de juros não fica necessariamente dependente do crédito principal, podendo qualquer deles ser cedido ou extinguir-se sem o outro.”.
6.–Uma vez constituído o crédito de juros, este autonomiza-se da obrigação de capital.
7.–À data da injunção não se encontrava ultrapassado o prazo de prescrição estabelecido no art.º 310, alínea d) do CC para os juros de mora.
8.–Em relação à cláusula penal, confundiu a sentença recorrida a natureza da cláusula penal com o critério de fixação do seu valor, porquanto:
9.–Reconheceu o tribunal a quo a Recorrente peticionou uma cláusula penal, estabelecida com a celebração do contrato para o incumprimento do seu período de permanência.
10.–Ainda assim, decidiu-se pela aplicação do prazo de prescrição o prazo de prescrição previsto no art.º 10º da Lei 23/96.
11.–No entanto, “preço dos serviços” e “cláusula penal” são questões distintas na sua essência.
12.–Não se aplicam à cláusula penal os motivos que determinaram a estipulação do prazo de prescrição previsto na Lei 23/96, uma vez que (i) o utente dispõe, desde a celebração do contrato, de todas as condições para saber exactamente, qual é o montante que terá de suportar caso incumpra o período de fidelização, (ii) a obrigação constitui-se num momento único e por efeito de um comportamento único, pelo que evitá-la não é evitar um acumular de dívidas, é impedir a sua constituição.
13.–Não existindo, relativamente à prescrição, disposição legal prevista para a cláusula penal, se o Legislador não a excecionou do regime geral do art.º 309º do CC, não poderá tal regime deixar de lhe ser aplicável.
14.–A aplicação, à cláusula penal, do prazo ordinário de prescrição e 20 anos constitui jurisprudência dominante nos Tribunais superiores – cfr, nomeadamente, processo 2360/06.0YXLSB.L1-7: - “O crédito ao recebimento do preço, é uma coisa; o vínculo de fidelização, outra diferente. Quer uma, quer outra, retratam prestações debitórias emergentes do contrato. (…) - “Ao abrigo da autonomia da vontade é permitido às partes estipularem, por acordo, uma cláusula penal prevenindo a hipótese do incumprimento do vínculo de fidelização firmado (artigo 810º, nº 1, do Código Civil); O direito ao recebimento dessa indemnização (da quantia estipulada como cláusula penal) não está sujeita à prescrição de seis meses… mas antes ao prazo ordinário de prescrição de vinte anos (artigo 309º do Código Civil).”
De tudo quanto ficou exposto, resulta que, a decisão proferida nos presentes autos violou os art.ºs 309, 310º alínea d) e 561º, todos do CC,
Deverá, pois, a decisão proferida ser declarada nula e substituída por outra que julgue tempestivamente reclamada a dívida da Recorrente em relação aos juros de mora, cláusula penal e outras quantias peticionadas.”
*

A R. contra-alegou concluindo como se segue:
1.ª-A factura cujo pagamento a Recorrente peticiona a “título de cláusula penal e nos termos das condições contratuais, do valor relativo à quebra do vínculo contratual, valor que inclui os encargos decorrentes da cessação antecipada do contrato” foi emitida em 08/01/2020 e vencida em 07/02/2020.
2.ª-A factura ora reclamada não é devida, na medida em que o contrato que vinculava Recorrente e Recorrida foi por esta resolvido em 30/04/2019, através de comunicação escrita registada com aviso de recepção, por si enviada em 12/04/2019 e recebida pela Recorrente em 15/04/2019, resolução à qual a Requerente não se opôs, encontrando-se assim extinta a obrigação principal desde 30/04/2019.
3.ª-Por outro lado, além da extinção da obrigação principal acarretar a extinção de todas as obrigações que lhe são acessórias, neste caso, trata-se ainda de uma factura emitida em 08/01/2020, mais de 11 meses decorridos desde a data de resolução do contrato, que ocorreu em 30/04/2019.
4.ª-Ou seja, não pode ser judicialmente exigido o seu pagamento não só porque a mesma não é devida em virtude da extinção da obrigação principal operada por via da cessação do contrato com efeitos em 30/04/2019, através de comunicação de
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT