Acórdão nº 981/19.0GCALM.L1-5 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-06-14

Ano2022
Número Acordão981/19.0GCALM.L1-5
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção Criminal (5ª) do Tribunal da Relação de Lisboa:

I – Relatório
No Juiz 2 do Juízo Local Criminal de Almada, Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, foi proferida sentença a condenar a arguida AA pela prática de um crime de violação de domicílio previsto e punido pelo artigo 190.º, n.º 1 do Código Penal na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa, à taxa diária de € 6 (seis euros), o que perfaz o montante € 840.00 (oitocentos e quarenta euros) a que correspondem, nos termos do artigo 49.º do Código Penal, 93 (noventa e três) dias de prisão subsidiária, caso a multa não seja substituída por trabalho, nem o seu cumprimento obtido voluntária ou coercivamente.
*
Inconformada, a arguida interpôs recurso, oferecendo as seguintes conclusões:
“A. AA, arguida nos autos à margem referenciado, ora recorrente, foi condenada pela prática de um crime de violação de domicílio previsto e punido pelo artigo 190º nº 1 do Código Penal, na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa à taxa diária de € 6 (seis euros), o que perfaz o montante de €840.00(oitocentos e quarenta euros) e no pagamento da quantia de € 1500 a título de danos não patrimoniais.
B. A arguida discorda quanto à matéria dada como provada, e não provada, e do exercício intelecto-jurídico efetuado pelo tribunal a quo que decidiu pela sua condenação penal e concomitantemente na condenação a título de indeminização cível no montante de € 1500 (mil e quinhentos euros), por danos não patrimoniais.
C. A sentença proferida pelo Tribunal a quo padece de erro notório na apreciação da prova e contradição insanável entre a fundamentação e a decisão proferida.
D. Dos dados como provados seria forçoso alcançar decisão diversa, a qual passaria pela absolvição da arguida.
E. O tribunal a quo deu como provados os fatos 4,5 e 7 erroneamente, pois que da prova produzida em audiência de discussão e julgamento decorre que em todo o percurso “criminoso“ da arguida/recorrente, esteve esta sempre acompanhada da Guarda Nacional Republicana – GNR .
F. A arguida antes de mudar a fechadura da sua residência foi se aconselhar com os militares do posto da GNR da …, tendo aí sido informada nesta guarda Nacional que não estaria a cometer qualquer crime pois a casa era sua propriedade.
G. Perante o tribunal a quo os srs. militares da GNR da … BB e CC, disseram que acompanharam a arguida mas que ficaram junto á porta de entrada da habitação, nunca entraram na casa e que viram apenas a entrada da casa, onde estava uma mesa, após o que se retiraram – depoimentos prestados em 15/11/2021 inicio: 12:13:47horas a 12:25:08horas e 12:25:11 horas a 12:34:22 horas respetivamente.
H. Em sede de depoimento perante o tribunal a quo, afirmaram os Srs. Militares da GNR BB e CC que o fato de estarem a acompanhar a arguida se devia ao medo desta, que temia pela sua integridade física, depoimento prestado em 15/11/2021 início: 12:13:47horas a 12:25:08horas e 12:25:11 horas a 12:34:22 horas respetivamente.
I. É do conhecimento geral e decorre das regras da experiência comum exigíveis ao homem médio, que se a arguida se socorreu dos Srs. Militares porque temia pela sua integridade física, então os srs. Militares tinham por dever funcional da profissão ter entrado na habitação por forma a remover tal perigo, o que não ocorreu.
J. Os srs. Militares da GNR não entraram na habitação.
K. Os srs. Militares da GNR acompanham a arguida pelo perigo que a mesma diz existir na habitação, contudo não entram na habitação para verificar a situação.
L. Os srs. Militares da GNR não cumpriram com o seu dever funcional que era o de fazer cessar a atividade criminosa da arguida, fazer com que não prosseguisse na sua intenção criminosa.
M. Do relatório de fls.120, cujo teor serviu para alicerçar a convicção do tribunal a quo, “Relatório de Polícia Criminal”, elaborado pela testemunha ocular e com conhecimento direto dos fatos, Sr. Militar da GNR BB decorre que os próprios srs militares enquadraram a factualidade apurada no tipo de ocorrência, como “Outros factos não crime”. (bold e sublinhado nosso).
N. A arguida nas suas declarações prestadas em 17/12/2021 e gravadas no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal ficheiro … aos 19:51 a 22:50 refere: ”se eu soubesse que estava a cometer um crime não tinha feito, eu fui à GNR por várias vezes e eles aconselharam-me que se a casa é sua , não está a cometer qualquer crime. Eu fui-me aconselhar com a GNR.” (bold e sublinhados nossos).
O. E questiona no imediato e bem a MM Juiz: “mas a GNR não é um advogado, sabe?”
P. É certo e verdade que a arguida não se socorreu de um causídico.
Q. A arguida vive em zona ainda considerada rural e é nos srs, militares da GNR que os cidadãos se apoiam, e a quem recorrem, como símbolo do estado, da ordem e do agir conforme o direito.
R. A arguida, quiçá soubesse e tivesse sido alertada pela GNR para o fato de que, caso entrasse em sua casa, tal como o fez, estava a cometer o crime de violação de domicílio estando ainda bens visíveis na habitação, não teria prosseguido com os seus intentos.
S. A arguida é uma pessoa simples e sem conhecimentos acima do exigível ao homem comum, que acreditou não estar a cometer qualquer crime, até porque estava acompanhada de uma força de autoridade que em momento algum fez cessar a atividade criminosa desta.
T. Da conjugação das declarações da arguida, da testemunha DD, dos depoimentos dos srs Militares da GNR e do relatório de serviço elaborado por esta força militar resulta que não se encontra preenchido o elemento subjetivo do ilícito pelo qual foi a arguida acusada, crime de violação de domicílio.
U. A arguida não estava ciente que ao proceder como o fez, cometia um crime, não tinha o conhecimento ou consciência do carácter ilícito, imoral ou anti-social da sua conduta, pelo que
V. A conduta da arguida não lhe pode ser censurável pois que, atuou com o cuidado que uma pessoa portadora duma recta consciência ético-jurídica teria, informando-se e esclarecendo-se convenientemente sobre a proibição legal junto dos militares da GNR da ….
W. O erro em que a arguida fundou a sua ação não lhe é censurável.
X. O Tribunal a quo ao não dar como provado nos pontos 4, 5 e 7 da decisão que os militares da GNR acompanharam a arguida a casa desta, estiveram no dia hora e local referidos na acusação, dia 16/08/2019 e que presenciaram os fatos, não podia fundamentar a decisão alegando no mais que a arguida fez “um uso manifestamente abusivo da autoridade pública para levar a bom termo e justificar em vão a sua conduta, tendo actuado ciente que cometia um crime.”
Y. Existe insuficiência para a decisão da matéria de facto provada no que tange aos pontos 4,5 e 7 da matéria dada por provada, o que levaria seguramente a uma outra decisão que não de condenação.
Z. A arguida agiu em erro sobre a ilicitude da sua conduta.
AA. O tribunal a quo violou o disposto no art.17, 190º nº 1 ambos do CPenal e art. 410nº2 a) e art. 379 nº 1c) do CPP.
BB. Não tendo dado por provado que os srs. Militares acompanharam a arguida e que estiveram presentes, não poderia o Tribunal a quo na determinação da medida concreta da pena a aplicar, vir a considerar que a ilicitude é elevada, tendo a arguida “instrumentalizado a autoridade policial para atingir um fim que sabia ser contrário ao direito”. (bold e sublinhados nossos).
CC. O Tribunal a quo procede a uma agravante da medida da pena que aplica à arguida, em função de um fato que não consta nem dá como provado.
DD. O tribunal a quo violou assim os artigos 410 nº 2b) CPP, artigo 190 nº 1 e artigos 71º e 40º do CPenal.
EE. Entende a Arguida/recorrente que é de elementar justiça, que V. Ex.ªs procedam à revogação da decisão do Tribunal a quo e que a arguida seja absolvida do crime de violação de
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