Acórdão nº 9796/19.5T8LRS.L2-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-02-08

Ano2024
Número Acordão9796/19.5T8LRS.L2-8
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam as Juízes da 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório
A, B., C, intentaram contra «D-Companhia de seguros, S.A.» e contra «E - Companhia de Seguros, S.A.», acção declarativa de condenação a seguir a forma de processo comum, pedindo a condenação destas no pagamento de € 840.000,00 a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescido dos respectivos juros.
Alegaram, em síntese, que no dia 28 de Abril de 2010, pelas 21.20 horas, na AI, junto ao Km 3,250, em …, ocorreu um acidente de viação, envolvendo o veiculo QN, no qual eram transportadas como passageiras, e o veiculo OH, do qual resultaram danos para cada uma delas pelos quais pretendem ser ressarcidas.
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Devidamente citadas, as RR apresentaram contestação, impugnando os factos alegados, colocando em causa a dinâmica e causas do acidente e os danos, e mais arguindo a exceção da prescrição pedindo, a final, a improcedência da acção.
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A 30 de Setembro de 2020 foi proferida decisão julgando procedente a exceção de prescrição invocada por ambas as RR. e, em consequência, absolvendo as RR. dos pedidos formulados pelas AA..
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Não se conformando com tal decisão, interpuseram as AA. recurso com fundamento na sua nulidade por ter conhecido da excepção da prescrição sem prévia convocação da audiência prévia ou assim não se entendendo, defendendo não ter decorrido o prazo de prescrição.
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Por acórdão de 22.06.2021, decidiu este Tribunal da Relação de Lisboa anular a sentença recorrida, determinando a realização de audiência prévia ou a prolacção de despacho fundamentado, dispensando-a.
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Em conformidade, no dia 15.02.2022, realizou-se audiência prévia no decurso da qual foi dado a conhecer pela mandatária das AA. que, relativamente à A. B, teria sido proferida por Tribunal Belga, sentença de maior acompanhado, ou equivalente, podendo estar em causa a capacidade desta para intervir por si só em juízo.
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Nessa sequência e por tal motivo, o tribunal adiou a realização da diligência, até que se mostrasse sanada tal irregularidade, notificando para tanto as restantes AA., para que viessem juntar aos autos a respectiva sentença estrangeira, devidamente traduzida.
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As AA. deram cumprimento ao decidido, requerendo a junção aos autos da sentença e respectiva tradução, por requerimento de 09.06.2022.
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Tal sentença mostra-se junta aos autos, devidamente traduzida, da mesma constando que a A. B foi declarada «incompetente» para, entre outros actos, actuar em juízo como autora ou ré, devendo ser representada pela administradora da pessoa e bens aí nomeada e, com as restrições aí constantes. Ref. citius.12142900
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Nessa sequência, em 30.06.2022 foi prolatada a seguinte decisão:
«Das sentenças cuja tradução foi junta pela Ilustre Advogada verifica-se que B (que tudo indica ser a A. B) foi declarada incapaz, entre outros actos, para actuar em juízo como autor ou como réu, tendo sido nomeada administradora da sua pessoa e bens a Srª Drª …, advogada com escritório em …, sendo que esta deve solicitar autorização especial ao Juiz de Paz (que no país onde reside a protegida B, é o órgão competente) para representação legal da pessoa protegida como demandante em processos e acções judiciais (cfr. págs. 6 e 7 do doc. 2 junto com o requerimento refª 12142900).
Em face disso haverá que concluir pela caducidade do mandato conferido pela A. B à Sra Dra … (que mantém o mandato das restantes AA.).
Por outro lado, e tendo em vista que as AA. A e C são familiares da A. B e que as mesmas têm interesse processual no prosseguimento da causa, determina-se a notificação das mesmas para, ao abrigo do princípio da cooperação, diligenciarem junto da nomeada administradora da pessoa e bens de B no sentido de a mesma manifestar a sua posição quanto ao interesse (ou não) da sua representada na manutenção desta lide e, em caso afirmativo, para realizar as diligências necessárias no âmbito do direito belga que viabilizem o prosseguimento da acção por parte da A. B, designadamente constituindo mandatário forense nesta acção, a qual nos termos legais carece de patrocínio por parte de advogado.
Notifique.»
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Devidamente notificadas daquele despacho, na pessoa do seu mandatário e por notificação com certificação do CITIUS de 07.06.2022, as AA. nada disseram.
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Em face da tal conduta, em 24.10.2022, foi proferido o seguinte despacho, devidamente notificado às partes:
«Aguardem os autos nos termos do artigo 281º do Código de Processo Civil
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Nada sendo junto ou requerido, com data de 20.06.2023 foi decidido:
« Encontrando-se os autos a aguardar impulso processual há mais de seis meses (cf. despacho de 36.06.2022 e notificação do mesmo), considero deserta a instância, nos termos do disposto no artigo 281.º n.ºs 1 e 4 do CPC.
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Nos presentes autos em que são autores A, B e C e réus, D Companhia de Seguros e E Companhia de Seguros, declaro extinta a presente instância por deserção, ao abrigo do disposto no artigo 277.º, al. c), do CPC.
Custas pelos autores – artigo 527.º, n.º 1, do CPC.
Valor da acção: €840.000,00 - artigos 306º, nºs 1 e 2, 296º, nº1, e 297º, nºs 1 e 2, do CPC.
Registe e notifique.»
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Com esta decisão não se conformando, as AA. A e C, do mesmo interpuseram recurso, concluindo como segue:
«CONCLUSÕES
1.Vem o presente recurso interposto da sentença que decidiu julgar deserta a instância, nos termos do disposto no artigo 281.º n.ºs 1 e 4 do CPC.
2.No referido despacho que ora se impugna, vem referido:
“Encontrando-se os autos a aguardar impulso processual há mais de seis meses (cf. despacho de 06.06.2022 e notificação do mesmo), considero deserta a instância, nos termos do disposto no artigo 281.º n.ºs 1 e 4 do CPC”
3.Referindo ainda o referido despacho de seguida:
“Nos presentes autos em que são autores A, B e C e réus D Portugal, Companhia de Seguros e E Companhia de Seguros, declaro extinta a presente instância por deserção, ao abrigo do disposto no artigo 277.º, al. c), do CPC.”
4.As AA, foram efetivamente notificadas com o seguinte despacho datado de 28-10-2022 “aguardem os autos nos termos do artigo 281º do Código de Processo Civil”.
5.Como claramente resulta do preceito do artº 281º, nº 1 do CPC, a deserção da instância nela cominada, para que opere ope legis depende:
c) Em primeiro lugar, do decurso de um prazo de seis meses sem impulso processual da parte sobre a qual impende o respetivo ónus;
d) Que a falta desse impulso seja imputável a negligência ativa ou omissiva da parte assim onerada, em termos de poder concluir-se que a falta de tramitação processual seja imputável a um comportamento da parte dependente da sua vontade.
6.A “negligência das partes”, segundo a citada previsão legal, pressupõe, quanto a nós, uma efetiva omissão da diligência normal em face das circunstâncias do caso concreto, não podendo, assim, vingar uma qualquer responsabilidade automática/objetiva suscetível de abranger a mera paralisação.
7.Temos para nós, na esteira do entendimento consagrado nos Acs. R.L. de 09.09.2014 (Pº 211/09.3TBLNH-J.L1-7) e R.G. de 02.02.2015 (Pº 4178/12.1TBGDM.P1), que o tribunal, antes de exarar o despacho a julgar extinta a instância por deserção, deverá, num juízo prudencial, ouvir as partes de forma a melhor avaliar se a falta de impulso processual é imputável ao comportamento negligente de alguma delas, ou de ambas.
8.Salvo melhor opinião entendem as AA. que no despacho que julga deserta a instância, o julgador tem de apreciar se a falta de impulso processual se ficou a dever à negligência das partes, tendo, por isso, de valorar o comportamento processual das partes, por forma a poder concluir se a falta de impulso resulta, efetivamente, da negligência destas.
9.Para tanto, o julgador deverá ouvir as partes por forma a avaliar se a falta de impulso processual é imputável ao comportamento negligente das partes, bem como, e por força do princípio da cooperação, reforçado no novo CPC, alertar as partes para as consequências gravosas que possam advir da sua inércia em impulsionar o processo decorrido que seja o prazo fixado na lei.
10.Na opinião das AA. na data em que foi proferida a Sentença recorrida, o processo não estava parado nem suspenso, nem a aguardar qualquer impulso processual por parte das aqui Recorrentes.
11.Faltava sim o Douto Tribunal dar cumprimento à realização da audiência prévia, o que aliás, tinha sido determinado em decisão de Tribunal Superior na sequência de recurso interposto mas que ainda não aconteceu.
12.Pedindo desculpas pela eventual repetição, é entendimento que as AA. corroboram constituem pressupostos da deserção da instância, não só
que o processo esteja parado há mais de seis meses a aguardar o impulso processual da parte com ele onerada (pressuposto objetivo), mas também que a omissão desta
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