Acórdão nº 900/20.1T8AVR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-10-24

Ano2022
Número Acordão900/20.1T8AVR.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 900/20.1T8AVR.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Juízo do Trabalho de Aveiro

Recorrente: AA
Recorrida: BB
_______
Nélson Fernandes (relator)
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes



Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – Relatório
1. BB intentou a presente ação comum contra Herança Indivisa Aberta por óbito de CC e AA, pedindo que seja julgado ilícito o despedimento da autora e que os réus sejam condenados, em substituição da reintegração, a pagar-lhe, a titulo de indemnização, por via da ilicitude do despedimento, quantia nunca inferior a €4.800,00(Quatro mil e oitocentos euros); a titulo de créditos vencidos (referente a horas suplementares/extras) a quantia de €57.868.61,( cinquenta e sete mil oitocentos e sessenta e oito mil e sessenta e um cêntimos); a titulo de danos patrimoniais, devido aos salários não pagos a quantia de €2.133,00( dois mil cento e trinta e três euros ); e a titulo de danos não patrimoniais e morais a quantia nunca inferior a €5.000,00 (cinco mil euros), tudo no valor total €69.801,61 (sessenta e nove mil oitocentos e um euros e sessenta e um cêntimos), acrescido das quantias devidas até trânsito em julgado da sentença, de juros vincendos desde a citação até efetivo e integral pagamento, e do que demais impuser a lei. Pede, ainda, a condenação da ré a fazer os descontos para a segurança social desde agosto de 2019 até fevereiro de 2020.
Para tanto alegou, em síntese: que foi admitida por CC a 1 de agosto de 2019, tendo nessa data assinado contrato de trabalho e que, posteriormente, a 25 de Agosto de 2019, assinou contrato de trabalho com a filha AA, para, sob as ordens, fiscalização e direção de ambos, exercer as funções de terapeuta ocupacional, mediante a retribuição de €1.600,00; para além das funções de terapeuta ocupacional no sentido de habilitar CC de aptidões para realizar a sua atividade do dia a dia, tanto fisicamente, como intelectualmente, tinha ainda as funções de zelar pela limpeza da casa, cuidar da roupa de CC, fazer compras de géneros alimentares, roupas e medicamentos para este e acompanhá-lo nas várias consultas e tratamentos a que o mesmo estava sujeito; exerceu as funções descritas de forma ininterrupta desde o dia 1 de Agosto de 2019 até ao dia 20 de janeiro de 2020, data em que, com o consentimento de CC e de AA, foi gozar os proporcionais de dias de férias, atendendo aos meses de trabalho que prestou, tendo deixado uma pessoa da sua confiança a cuidar daquele, assim como o filho deste que também estaria com ele uma vez que estaria de férias em Portugal; durante o período de férias, no dia seguinte, recebeu um e-mail do filho do Sr. CC a informar que estava despedida, que não necessitava mais dos seus serviços e a dar conta de não podia mais entrar na habitação e que os seus objetos pessoais haviam sido colocados em caixas que se encontravam na garagem; posteriormente, a 2 de fevereiro de 2020, a ré AA enviou-lhe carta a informar que estava despedida, não tendo respeitado o aviso prévio e tão pouco apresentando um motivo para a verificação do despedimento; tal despedimento é ilícito, por inexistência de motivo e não ter sido respeitado o aviso prévio, sendo devida a sua reintegração ou, em sua substituição, o pagamento de uma indemnização, em montante não inferior a €4.800,00; por carta de 3 de fevereiro de 2020, a ré AA informou que o seu pai havia falecido; não lhe foram pagos o salário referente ao mês de janeiro de 2020, no valor de €1.600,00, nem o valor proporcional até ao dia 10 de fevereiro de 2020, no valor de €533,00; prestou trabalho suplementar, quer diurno, quer noturno, quer ainda em dia de descanso semanal obrigatório e/ou compensatório, sendo-lhe devido o montante global de €57.868,61; com esta situação a autora ficou ansiosa e nervosa, não conseguindo dormir, sentindo que estavam a colocar em causa o seu bom nome e sentiu-se humilhada, razão pela qual entende que deve ser indemnizada, a titulo de danos morais, com a quantia de €5.000,00.
Concluiu pela procedência da ação.

Por despacho proferido a 1.07.2020 foi determinado que a ação prosseguisse apenas contra a Ré AA, tendo-se ali considerado que a Autora, com o requerimento que apresentou a 29.06.2020, desistiu do pedido relativamente à herança do falecido CC

Realizada sem êxito a audiência de partes, apresentou a Ré contestação: por exceção, invocou a ineptidão da petição inicial, por ali se cumularem pedidos substancialmente incompatíveis, bem assim a sua ilegitimidade, por não ter celebrado com a Autora qualquer contrato de trabalho, contrato esse que foi celebrado com CC, tendo sido este que pagou as remunerações e os subsídios de Natal e de ferias, como ainda o pagamento das contribuições devidas à Segurança Social, relativas aos meses de agosto, setembro, outubro, novembro e dezembro de 2019, bem como os relativos aos subsídios de natal, no valor mensal de €278,00, por transferência bancária, valores estes de que a Autora se apossou e não entregou à Segurança Social, assim como não pagou o valor correspondente às suas quotizações; mais invocou que o contrato de trabalho celebrado entre a Autora e CC nunca foi revogado pela Ré e pelo seu irmão e sempre se manteria válido até à sua morte, ocorrida a 26 de Janeiro de 2019; no que respeita ao despedimento, alega que não o fez, nem tinha legitimidade para o fazer, pois não era a sua entidade patronal, assim como o irmão não a tinha; a autora foi gozar doze dias de férias no dia 20 de janeiro de 2020, encontrando-se gravemente doente o seu patrão, pois sofria de pneumonia e foi internado no Hospital ... no dia 21 de Janeiro de 2020, por falta de cuidados da Autora; tendo CC falecido a .../.../2020, o contrato cessou por caducidade nessa data, de imediato, não tendo ocorrido qualquer despedimento ilícito e, como tal, não tem a Autora direito a ser reintegrada no seu posto de trabalho, nem a receber quaisquer salários até à data da reintegração, que obviamente não poderá existir; quanto ao valor do salário do mês de janeiro de 2020 e ao valor proporcional até ao dia 10 de fevereiro de 2020, desconhece se a Autora recebeu esses valores; o valor de €1.600,00 foi estabelecido para que a Autora cuidasse a tempo inteiro do Sr. CC, o que se percebe, porque uma cuidadora no horário normal, apenas aufere normalmente um salário máximo de €700,00, quando muito €800,00; ignora as alegadas horas de trabalho suplementar, sendo que a Autora não informa qual o seu verdadeiro horário de trabalho, pois se limita a indicar as horas de trabalho, ao longo dos meses de agosto de 2019 a janeiro de 2020 e não se sabe em cada dia de trabalho quando iniciava e terminava; veio a tomar conhecimento de que a Autora maltratava o seu pai, sob diversas formas, morrendo esse de pneumonia no Hospital devido a desleixo da autora, segundo informações prestadas, tendo ido gozar ferias com o seu pai já gravemente doente; não tem a Autora direito a receber o valor por si peticionado, a titulo de danos morais, pois nada sofreu.
Conclui pela procedência das exceções e improcedência da ação.

Respondeu a Autora à matéria das exceções.

Fixado o valor da ação em €69.801,61, foi de seguida proferido despacho saneador, no qual se julgaram improcedentes as exceções invocadas da ineptidão da petição inicial e da ilegitimidade da Ré, dispensando-se, de seguida, a realização da audiência prévia e a enunciação dos temas de prova.

Prosseguindo os autos os seus termos subsequentes, realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta:
“Nestes termos, e em face do exposto, decido julgar a ação parcialmente procedente, e consequentemente condenar a ré AA a pagar à autora BB a quantia global de €1.760,00 (mil setecentos e sessenta euros), correspondente à retribuição de Janeiro e a 3 dias da de Fevereiro de 2020, bem assim a proceder aos descontos para a segurança social, relativos a tal quantia, absolvendo-a do demais peticionado.
Custas da ação pela autora e pela ré, na proporção do decaimento, sem prejuízo do beneficio de apoio judiciário, de que goza a autora (artigo 527.º do Código de Processo Civil ex vi artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho).
Valor da acção: o estabelecido aquando da elaboração do despacho saneador (folhas 102)- €69.801.61.
Registe e notifique.”

2. Não se conformando com o decidido apresentou a Ré requerimento de interposição de recurso, fazendo constar, no final das suas alegações, as conclusões que seguidamente se transcrevem:
“1. A recorrente entende que a Meritíssima Juiz a quo na douta sentença, tendo na generalidade julgado bem tudo o que foi colocado à apreciação do Tribunal, a verdade é que não analisou adequadamente, quer em termos de facto quer em termos de direito, a questão do pagamento à Autora da retribuição de Janeiro de 2020 e a 3 dias de retribuição de Fevereiro de 2020, assim como a questão dos descontos para a segurança social, relativos a tal quantia.
2. Considera a Recorrente que, no caso vertente, não foi adequadamente cumprida a obrigação que lhe cabia de, analisando criticamente as provas produzidas e especificando as razões que foram decisivas para a sua convicção, fundamentar e explicar de forma convincente e clara o motivo ou motivos que a levaram a dar como provados o que consta do ponto 1.1.15; do ponto 1.1.16; do ponto 1.1.18 e do ponto 1.1.20 da relação de factos provados.
3. Não se demonstra desde logo, na aludida fundamentação a razão pela qual não se considerou provado que a Recorrente tenha efectuado o pagamento da quantia de €1.000,00 no dia 02 de Janeiro de 2020 (conforme decorre do doc. 15 da contestação), assim como não se demonstra a razão pela qual não se considerou efectuado o pagamento da quantia de €600,00 no dia 02 de Janeiro de 2020 (conforme decorre do doc. 16 da contestação), num total
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