Acórdão nº 8808/20.4T8SNT-A.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-01-12

Ano2022
Número Acordão8808/20.4T8SNT-A.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:


Relatório


AAA, intentou contra:
BBB com sede no (…) Lisboa;
CCC, com sede no …Lisboa,
DDD, sócia gerente da 1.ª Ré, com domicílio profissional no … Lisboa; e
EEE, sócio gerente da 1.ª Ré … e da 2.ª … com domicílio profissional no … Lisboa, acção declarativa emergente de contrato individual de trabalho pedindo que a acção seja julgada procedente e que, em consequência, seja reconhecida a existência de um contrato de trabalho entre a Autora e a 1.ª Ré; seja declarada a ilicitude do despedimento da Autora e, nessa sequência, sejam os Réus condenados solidariamente no pagamento das retribuições que a Autora deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que vier a declarar a ilicitude do mesmo, liquidando, desde logo, o valor de 850,00€; sejam os Réus condenados solidariamente no pagamento de indemnização pela antiguidade, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, correspondente a 45 dias de retribuição base e que nesta data perfaz o total de 11.475,00€; sejam os Réus condenados solidariamente no pagamento dos créditos laborais vencidos no valor total de 1.508,64€; sejam os Réus condenados solidariamente a pagar à trabalhadora a quantia de 17.000,00€ a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos; sejam os Réus condenados solidariamente no pagamento de juros à taxa legal, vencidos e vincendos desde a citação e até integral pagamento; e que os Réus sejam condenados numa sanção pecuniária compulsória, em caso de incumprimento das obrigações a que vierem a ser condenados, de valor não inferior a 300,00 €.

A 3 de Fevereiro de 2021 a Autora requereu a junção aos autos dos documentos que protestou juntar nos artigos, 36.º, 43.º, 49.º, 51.º, 57.º, 58.º, 79.º, 82.º e 83.º da Petição Inicial, bem como a junção dos seguintes documentos: Declaração de acompanhamento psicológico e Declaração Médica Psiquiatra (11 documentos e um ficheiro áudio).

Os ilustres mandatários dos Réus foram notificados do mencionado requerimento nos termos do artigo 221.º do CPC.

A Ré, CCC, opôs-se à junção dos documentos e do ficheiro áudio, invocando, para tanto e no essencial, que nos termos do artigo 63º nº 1 do CPT, as provas, em processo laboral, devem ser apresentadas com os articulados, o que não sucedeu no caso, além de que não teve oportunidade de se pronunciar sobre eles, pelo que devem ser desentranhados e que a gravação áudio foi presumidamente gravada no telemóvel da Autora sendo ilícita, tratando-se, pois, de prova proibida e nula, pelo que não pode ser atendida devendo ser desentranhada.

Em 20.09.2021 foi proferido o seguinte despacho:
“Dos documentos (03.02.2021):
É certo o que dispõe o artigo 63.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho.
Porém, salvo o devido respeito pela posição das rés, entende-se ser ainda aplicável ao caso o disposto no artigo 423.º do Código de Processo Civil, por permitido à luz do disposto no artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho (cf., a título exemplo, o acórdão da Relação de Évora de 20.04.2017, relatado pelo senhor juiz desembargador João Nunes, em www.dgsi.pt).
E, diga-se ainda, as rés haviam sido alertadas para a possibilidade de junção ulterior desses documentos (excepto dois deles), a alegação do respectivo facto probando mostra-se na petição e aquelas puderam exercer o seu direito de resposta, pelo que o contraditório foi assegurado.
Dito isto, está cumprido o requisito de tempo estabelecido no n.º 2 do artigo 423.º
Porém, a autora não justificou a apresentação tardia de tais documentos, na petição ou agora.
E, como é dito no acórdão Relação de Lisboa de 21.05.2020, relatado pelo senhor juiz desembargador Carlos Castelo Branco, em www.dgsi.pt, «o protestar juntar documento não tem qualquer consequência, pois, a intenção de praticar um acto processual não equivale à sua prática, não podendo advir daí consequências jurídicas, como se o acto que não foi praticado, o tivesse sido».
Logo, a junção desta documentação está sujeita a multa processual (única), a que não obsta o benefício do apoio judiciário (cf., por exemplo, o decidido pelo Tribunal da Relação de Évora em 20.03.2018, acórdão relatado pelo senhor juiz desembargador Sérgio Corvacho, em www.dgsi.pt).
Cumpre, por último, indagar da legalidade da junção aos autos da gravação áudio.
Esta corresponde à alegação em 51.º da petição e a uma mensagem de voz alegadamente remetida por uma das rés (ainda que se desconheça em concreto qual, o que poderá inquinar a sua concreta valia probatória).
Esta mensagem (gravada, o que não poderia ser desconhecido pelo remetente) de voz teve por destinatário a autora, pelo que, com base nestes exactos e concretos pressupostos, não houve qualquer intromissão ilícita nas telecomunicações ou intimidade.
Em conclusão, é de admitir a junção destes documentos, mas sujeitando a autora ao pagamento de uma multa processual única, pelo mínimo legal, o que se determina.”

Inconformada com o despacho, a Ré recorreu e sintetizou as conclusões nas seguintes alegações:
1.A 03 de fevereiro 2021 a Autora juntou aos autos documentos e um áudio que teria protestado juntar na sua petição inicial entregue a 01 de julho de 2020.
2.O despacho saneador dos presentes autos foi proferido e notificado às partes a 22 de fevereiro de 2021.
3.As Rés apesar de não terem sido notificadas para o efeito, a 15 de abril de 2021 (10 dias com a suspensão de prazos Covid 19) impugnaram aquela junção por considerem extemporânea por um lado e por outro lado por considerarem o áudio / gravação junta, ilícita e consequentemente nula.
4.A 20 de Setembro de 2021, foi à Ré notificada do despacho, que ora se recorre, com a decisão que recaiu sobre a junção de 03 de fevereiro 2021 aos autos pela Autora de documentos e áudio.
5.Resulta daquele despacho, em síntese, que as Rés já deveriam estar a “contar” com a junção tardia desses documentos e áudio, por na sua petição inicial, a Autora, já os ter protestado juntar e por os factos probandos de que aqueles documentos e áudio teriam por base estariam devidamente explanados naquela peça, não estando em momento algum a defesa das Rés posta em causa.
6.Acrescenta que o áudio é uma mensagem de voz e que mesmo estando à partida inquinada a sua validade como prova, aquela mensagem não podia ser desconhecida do seu remetente!
7.Não pode a Apelante aceitar este entendimento.
8.O artigo 63º no seu nº1 do Código Processo de Trabalho determina claramente que as provas, em processo laboral, devem ser apresentadas com os articulados.
9Os documentos não são a exceção e, portanto, devem ser apresentados com o articulado respetivo.
10.Em momento algum a Autora alega os motivos pelos quais não junta imediatamente aquelas provas com o seu articulado.
11.À Apelante não lhe foi facultada a possibilidade de analise daquelas provas a fim de as poder impugnar ou não!
12.Logo, não foi facultada a Apelante a possibilidade de um pleno contraditório!
13.A acrescer que a Autora nem justifica a junção tardia daquelas provas.
14.Já quanto ao deferimento da junção da prova áudio, o Tribunal A QUO refere em síntese que é uma mensagem de voz alegadamente enviada por uma das Rés e que sendo remetente não poderia deixar de saber que se destinava à Autora e que por assim ser não é “não houve qualquer intromissão ilícita nas telecomunicações ou intimidade.”
15.Tal entendimento não poderá acolher, até porque se por um lado não se consegue distinguir uma gravação áudio de uma mensagem de áudio, quem quer que seja o seu remetente ao envia-la (mensagem) ou a grava-la (Gravação áudio) apenas o faz para o destinatário em causa e não para o “publico em geral.”
16.Mais, como se pode concluir se é realmente uma mensagem gravada como a Autora diz e não é uma gravação áudio?
17.Não pode o Tribunal A QUO socorrer-se deste argumento sem base probatória!
18.O áudio junto foi-o sem qualquer declaração de consentimento de gravação pelos intervenientes da gravação.
19.Pelo art. 26º nº 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP) estabelece que a todos é reconhecido o direito à reserva da intimidade da vida privada apesar de não se identificar quem é o autor de tal áudio!
20.Por intimidade da vida privada entende-se o
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