Acórdão nº 867/21.9T8ETR-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-10-10

Data de Julgamento10 Outubro 2022
Ano2022
Número Acordão867/21.9T8ETR-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação 867/21.9T8ETR-A.P1
Processo da 5ª secção do Tribunal da Relação do Porto (3ª Secção cível)
Tribunal de origem do recurso: Juízo de Competência Genérica de Estarreja - Juiz 2
Relatora: Eugénia Maria de Moura Marinho da Cunha
1º Adjunto: Maria Fernanda Fernandes de Almeida
2º Adjunto: Teresa Fonseca


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto

Sumário (cfr nº 7, do art.º 663º, do CPC):
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I. RELATÓRIO

Recorrentes: AA e BB
Recorridos: CC e DD

AA e BB, Autores na ação declarativa de simples apreciação negativa, com forma de processo comum, que propuseram contra CC e DD, pedindo que se declare que os Réus não são donos/proprietários do prédio rústico composto de terreno, situado no lugar de ..., da freguesia ..., terreno esse que confina a Sul com o prédio dos Autores, e não possuem qualquer título que legitime a sua posse ou mesmo mera detenção, e alegando que os Réus abriram valas para alicerces, indicando que vão proceder à construção de um muro na extrema a Sul do prédio, confinante com o prédio dos autores, e assim a englobar nesse prédio a sua faixa de terreno, que referem, apossando-se dela, vieram interpor recurso do despacho que indeferiu a ampliação do pedido, que deduziram (tendo-o feito na sequência da notificação da contestação apresentada pelos Réus, a invocar serem titulares do prédio por o terem adquirido por usucapião e terem outorgado, em 16/8/2021, escritura de justificação notarial, que juntam, levada tal aquisição ao registo pela ap. ... de 2021/11/12 e pedindo sejam declarados seus donos e legítimos possuidores), por a mesma não ser legalmente admissível.
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Pugnam os Autores por que, na procedência do recurso, seja admitida a ampliação do pedido por si deduzido, formulando as seguintes
CONCLUSÕES:
a) I. Os autores intentaram uma ação de apreciação negativa tendente a que os réus fossem condenados a reconhecer que não eram donos do prédio confinante com o prédio dos autores.
II. Na contestação os réus vieram juntar como título demonstrativo do seu alegado direito de propriedade sobre o prédio confinante com o prédio dos autores uma escritura de justificação de posse do aludido prédio.
III. Desconhecendo os autores a existência de tal escritura, assiste-lhes o direito de ampliar o pedido nos termos do disposto no artigo 265.º-2 do CPC peticionando a ineficácia de tal título.
b) A ampliação requerida do pedido insere-se no pedido inicial sendo o seu desenvolvimento que se mostrou necessário em função da junção dum documento que se desconhecia.
c) “Nada impede que em acção declarativa se cumulem vários pedidos, nomeadamente de apreciação (positiva ou negativa) e de condenação, desde que a cumulação seja lícita à luz do critério estabelecido no artigo 555º e 36º do Código de Processo Civil.” E neste caso a cumulação é possível atenta a superveniência do documento junto pelos réus.
d) Invocando-se a nulidade do título: escritura de justificação também a nulidade do registo de propriedade desse imóvel na conservatória do registo predial tem de ser requerida no pedido, como o foi na ampliação, uma vez que nos termos do disposto no artigo 17.º-1 do Código do Registo Predial tal nulidade tem de ser invocada em ação judicial.
e) Atento o modo de como os réus se vieram defender, já não estamos apenas perante uma questão de demarcação entre os prédios, mas de reivindicação, uma vez que os réus alegam ser donos até da faixa do prédio dos autores que se situa junto à parede da casa dos autores, alegando ainda que os autores aí nada possuem, pelo que os autores têm legitimo interesse em ver ser reconhecida a nulidade do título invocado pelos réus.
f) Acresce que os autores têm legitimo interesse em não ter como vizinhos pessoas que se apoderam de bens alheios e não respeitam os prédios confinantes, perturbando o sossego e tranquilidade do lar dos autores, pelo que também por tal têm legitimidade em peticionar a nulidade do título que os réus invocam para legitimar terem invadido o prédio dos autores.
g) O douto despacho recorrido violou o disposto nos artigos 25.º, 26.º, 64.º e 66.º da CRP, 70.º-2 do CC, 30.º e 265.º-2 do CPC.
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Não foram apresentadas contra alegações.
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Após os vistos, cumpre apreciar e decidir o mérito do recurso interposto.
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II. FUNDAMENTOS
- OBJETO DO RECURSO
Apontemos as questões objeto do presente recurso, tendo presente que o mesmo é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, estando vedado ao tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do ato recorrido – cfr. arts 635º, nº4, 637º, nº2 e 639º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.

Assim, a questão a decidir é, apenas, a seguinte:
- Se, pedindo os Autores:
se declare que os Réus não são donos/proprietários do prédio rústico composto de terreno, situado no lugar de ..., da freguesia ..., terreno esse que confina a Sul com o prédio dos Autores, e não possuem qualquer título que legitime a sua posse ou mesmo mera detenção, a ampliação do pedido, por forma a passar a abranger, também, o de:
se declare a ineficácia da escritura de justificação e, consequentemente, se ordene o cancelamento do registo efetuado com base na mesma, é admissível.
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II.A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
Os factos provados, com relevância, para a decisão, vicissitudes processuais, constam já do relatório que antecede, estando juntas aos autos a petição e a contestação e tendo o despacho recorrido o seguinte teor:
“AA e BB instauraram a presente acção de simples apreciação negativa contra CC e DD, pedindo se declare que estes não são proprietários de prédio rústico que identificam.
Para tanto e em síntese, alegam que o referido prédio rústico confina a Sul com um prédio de sua propriedade, o qual, apesar de não pertencer aos réus vem sendo ocupado por eles, ali tendo começado a erigir um muro na delimitação a norte, com os autores, assim impedindo que estes possam exigir dos legítimos proprietários a demarcação dos prédios e tudo indicando que vão ocupar parte de terreno que pertence aos autores.
Devidamente citados, vieram os réus apresentar contestação, para além do mais, invocando a propriedade sobre o prédio rústico em causa, a qual adquiriram por usucapião, declarada por escritura de justificação notarial outorgada a 16 de Agosto de 2021.
Vieram os autores, na sequência da contestação apresentada, requerer fosse admitida a ampliação do pedido formulado, peticionando fosse declarada a ineficácia da referida escritura de justificação notarial.
Determina o artigo 265º, nº2 do CPC que: “O autor pode, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1.ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo.”
Ora, para que se considere que estamos perante desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo e tal como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 06.02.2020, “ponto é que tal pedido e o pedido primitivo tenham essencialmente causas de pedir, senão totalmente idênticas, pelo menos integradas no mesmo complexo de factos: a) quando a ampliação do pedido nos termos da 2.ª parte do n.º 2 do art.º 265.º do CPC não implique a alegação de factos novos (como acontece no caso de pedido de juros ou de atualização monetária) pode ser formulada em simples requerimento apresentado até ao encerramento da discussão da causa, mesmo verbalmente em audiência de julgamento; b) quando a ampliação importe a alegação de factos novos, só pode ter lugar se estes forem supervenientes segundo o conceito dado pelo n.º 2 do art.º 588º do CPCN, e forem alegados nos termos e prazos previstos no n.º 3 do mesmo preceito.”
Ora, no caso, não se pode considerar que a impugnação de escritura de justificação notarial esteja integrada naquele complexo de factos que serviu de fundamento à acção, estando antes em causa uma verdadeira alteração da causa de pedir não decorrente de confissão feita pelos réus.
Para além do que, os autores não têm, sequer, legitimidade para a dedução do presente pedido, na medida em que não invocam qualquer direito incompatível com aquele declarado na escritura de justificação notarial. Com efeito, aquela escritura justifica a propriedade sobre o imóvel, sendo que os autores não se arrogam titulares de qualquer direito que contenda com a propriedade daquele prédio. O direito de demarcação não fica beliscado por qualquer dos factos alegados.
Assim sendo, há que concluir que é de indeferir a ampliação do pedido formulada, o que se decide, por ser a mesma inadmissível.
Notifique, sendo as partes para, querendo, se pronunciarem sobre o mérito da acção, sendo que o tribunal considera que os autos permitem já a prolação de decisão que põe termo à causa, sem necessidade de produção de outra prova”.
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II.B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
- Da admissibilidade de
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