Acórdão nº 854/08.2TTBRG.2.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15-12-2022

Data de Julgamento15 Dezembro 2022
Ano2022
Número Acordão854/08.2TTBRG.2.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

AA, sinistrado nos autos, em que é responsável A... - COMPANHIA DE SEGUROS, SA., veio requerer a revisão da sua incapacidade por agravamento, invocando:

- Foi vitima de um acidente a 25 de setembro de 2007, esmagamento do pé direito.
- O acidente acima descrito provocou-lhe lesões com um grau de incapacidade permanente para o trabalho, concluindo de forma unânime, os Srs. Peritos médicos, que o sinistrado se encontra afetado de uma I.P.P. de 12,50%
- Houve evolução do seu estado clinico, mantendo infeção permanente desde o dia do acidente.
- Com o tempo a infeção evoluiu e atingiu a circulação venosa profunda tornando-se uma infeção séptica que se disseminou pelo sistema vascular ao longo da perna provocando lesões necróticas.
- Em 2010, foi internado no Hospital ... ao cuidado da Cirurgia Plástica, com aparecimento de úlceras na perna, que se foram alastrando, tendo sido posteriormente transferido para o Hospital ... para tratamento por Cirurgia Plástica e Psiquiatria, operado várias vezes (5-6), inclusivamente com retalho fasciocutâneo, e múltiplas recidivas.
- Acresce ainda, que por apresentar úlceras não cicatrizantes com 2 anos de evolução, foi submetido a amputação transfemoral direita para controlo de infeção com acometimento de todo membro inferior direito.
- A doença levou à amputação acima do joelho pelo terço médio da coxa, em 2012, tendo também sido realizadas várias cirurgias de reconstrução e enxertos para modelar o coto e tornar a pele viável.
- Pelo que, existe, nexo de causalidade, entre o sinistro de 2007 e a amputação da perna, pela localização anatómica e evolução desfavorável de área com possível acometimento da biologia local.
- Mantém tratamentos e medicação.
A requerida em resposta veio referir que O sinistrado foi vitima de um acidente de trabalho em 25-09-2007, de que resultou fratura do tarso e metatarso do pé direito, tendo lhe sido fixada a devida incapacidade e atribuída alta em 25-08-2008.
Ora, ultrapassados mais de 10 anos desde a data da alta nunca o sinistrado se queixou ou recorreu aos seus serviços clínicos por agravamento das lesões. Assim, de acordo com o disposto no regime aplicável ao acidente em concreto, art.º 25.º n.º 2 da Lei 100/1997, o direito do sinistrado em requerer o agravamento das suas lesões caducou, uma vez que já decorreram mais de 10 anos desde a data da alta e fixação da pensão.
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Por despacho de 28.2.22 foi declarada a caducidade do direito do sinistrado a requerer a revisão da incapacidade.
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Inconformada o requerente interpôs o presente recurso apresentando as seguintes conclusões:

I. Ao acidente em causa é aplicável o regime dos acidentes de trabalho constante da Lei nº 100/97 de 13 de setembro.
II. Nos termos do art.º 25º nº 2 deste diploma legal, a revisão da incapacidade apenas pode ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão, estando em causa um prazo de caducidade que implica a extinção do direito a requerer a revisão da incapacidade ou pensão.
III. Acontece que, em 2009, o legislador eliminou o limite de dez anos que então valia para a revisão de pensões por acidente de trabalho (n.º 2 da Base XXII da Lei 2127), estabelecendo a regra da revisão a todo o tempo das prestações (n.º 3 do artigo 70.º da Lei 98/2009).
IV. Restringiu, porém, a aplicação desta regra aos acidentes de trabalho ocorridos após 1 de janeiro de 2010 (artigos 187.º, n.º 1, e 188.º da Lei 98/2009).
V. E ao fazê-lo diferenciou os sinistrados em função da data de ocorrência do acidente de trabalho: para acidente de trabalho ocorrido antes de 1 de janeiro de 2010 continua a valer o limite de dez anos estabelecido no n.º 2 da Base XXII da Lei 98/2009; para acidente ocorrido depois desta data vale a regra da revisão a todo o tempo.
VI. Aliás, a alteração do limite temporal até então vigente ter-se-á fundado no entendimento de que não é de presumir a consolidação do juízo sobre o grau de desvalorização funcional do sinistrado se, decorridos dez anos sobre a data da fixação da pensão não se tiver registado qualquer evolução justificadora de um pedido de revisão – ao invés do decidido pelo tribunal a quo no despacho recorrido.
VII. Desta forma, o legislador criou um tratamento desigual para situações iguais, sem fundamento, o que acarreta o juízo de inconstitucionalidade da norma apreciada, por violação do princípio da igualdade e do direito à pensão por acidente de trabalho.
VIII. Mais se diga que, não parece que essa diferença de tratamento de situações idênticas - quanto ao modo de exercício do direito de revisão das prestações - encontre justificação suficiente e razoável no princípio da não retroatividade da lei. Ou seja, tal princípio, consagrado no artigo 187.º, n.º 1 da Lei 98/2009, não é suficiente para afastar o princípio da igualdade.
IX. Além disso, o lesado por acidente de trabalho é também tratado mais desfavoravelmente do que qualquer lesado, no que se refere à indemnização por danos futuros, pois que o lesado “comum”, mesmo depois de decorrido o prazo de três anos consagrado no artigo 498º, n.º 1, do Código Civil, e enquanto a prescrição ordinária se não tiver consumado, pode requerer a indemnização correspondente a qualquer novo dano de que só tenha tido conhecimento dentro dos três anos anteriores. E estabelecendo o artigo 59º, n.º 1, alínea f), da CRP o direito fundamental dos trabalhadores à assistência e justa reparação, quando vítimas de acidente de trabalho ou de doença profissional, não pode o direito infraconstitucional fragilizar a posição do sinistrado em acidente laboral.
X. Nestes termos, o facto de haver um prazo para o pedido de revisão da pensão que se aplica a acidentes ocorridos antes da entrada em vigor da Lei 98/2009, que veio revogar esse prazo, por si só, viola o direito à pensão por acidente de trabalho, por ofender o direito de justa reparação consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f) da Constituição da República Portuguesa e o princípio da igualdade.
Sem prescindir, caso assim não se entenda,
XI. A jurisprudência, que já é vasta sobre este tema, tem feito juízos de inconstitucionalidade quando a situação se reporta a situações em que, a certo momento do...

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