Acórdão nº 8325/17.0T8VNG.P1-A de Tribunal da Relação do Porto, 2022-04-21

Data de Julgamento21 Abril 2022
Ano2022
Número Acordão8325/17.0T8VNG.P1-A
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
recurso de Apelação
ECLI:PT:TRP:2022:8325.17.0T8VNG.P1.A
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Sumário:
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Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:
AA, titular do cartão de cidadão n.º ..., contribuinte fiscal n.º ..., residente em ..., Matosinhos, instaurou acção judicial contra C..., S.A., pessoa colectiva n.º ..., com sede em Vila Nova de Gaia, formulando contra esta os seguintes pedidos: a) resolvido o contrato de compra e venda do veículo ..-MZ-.., com a devolução do veículo à ré e restituição à autora do valor pago pela compra; b) a ré condenada a pagar à autora 172.333,22€ a título de danos patrimoniais, acrescida do valor que vier a ser apurado, pela privação de uso do veículo nos períodos em que a mesma esteve nas oficinas da ré, e dos valores que se vencerão ainda a título de privação de uso; e c) a ré condenada a pagar à autora 2.500,00€ a título de danos não patrimoniais.
Alegou para o efeito que no dia 4 de Setembro de 2015, adquiriu à ré o veículo automóvel BMW ... com a matrícula ..-MZ-.., pelo valor de 73.950,00€ que a autora pagou nos termos acordados, veículo que veio a apresentar defeitos tempestivamente reclamados pela autora e que a ré não resolveu porque a sua reparação é impossível e torna o bem inaproveitável; em resultado a autora sofreu danos de diversa ordem dos quais pretende ser ressarcida.
A ré contestou a acção, por excepção e por impugnação, arguindo além do mais a excepção da caducidade do direito da autora por terem decorrido mais de seis meses sobre a denúncia dos defeitos e até à instauração da acção.
Após julgamento, foi proferida sentença, julgando procedente a excepção de caducidade da acção e absolvendo-se a ré dos pedidos formulados.
Do assim decidido, a autora interpôs recurso de apelação, tendo esta Relação proferido Acórdão no qual concluiu dever confirmar a decisão que julgou caducado o direito da autora e julgou o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Transitado em julgado o Acórdão desta Relação, veio a autora, cerca de dois anos depois, dele interpor recurso extraordinário de revisão, deduzindo as seguintes conclusões:
1. O presente recurso funda-se no facto da recorrente ter tido agora acesso a um documento capaz de alterar a decisão proferida.
2. A acção foi julgada improcedente por ter procedido a excepção de caducidade invocada pela recorrida.
3. Para esse efeito, a decisão sob recurso considerou que na data da propositura da acção, Outubro de 2017, já havia decorrido o prazo legal de seis meses para a intentar. Para isso, entendeu o Meritíssimo Juiz "a quo" que tal prazo ocorreu em Junho de 2017 pelo facto de as negociações entre recorrente e recorrido terem cessado em 31-12-2016.
4. Essa factualidade resultou do facto provado nº 32 e do facto não provado nº 31, sendo que a resposta positiva ao primeiro assentou fundamentalmente no depoimento da testemunha Dr. BB.
5. Esse Venerando Tribunal não alterou a decisão sobre a matéria de facto nessa parte, entendendo também que em 16/10/2017, data da propositura da acção estavam decorridos bem mais que seis meses sobre a data em que a recorrida comunicara a sua decisão final em relação à pretensão da recorrente. Mais sustentou que com tal comunicação as negociações entre as partes ficaram encerradas na medida em que a posição da recorrente manifestada por carta era de mera insistência na proposta cuja rejeição já lhe havia sido transmitida e não constar dos autos qualquer facto que permitisse presumir que a recorrida manteve as negociações em aberto e/ou manifestou qualquer disposição para rever de novo a sua posição.
6. Sucede que a recorrente tomou conhecimento em 17/04/2021, através de seu pai CC, de uma sms enviada a este pelo referido Dr. BB (supratranscrita) que infirma tal conclusão e que comprova que as negociações em Maio de 201 7 ainda não estavam encerradas.
7. A aludida mensagem foi enviada do telemóvel do Dr. BB com o nº ... em 26/05/2017 para o telemóvel de CC com o nº ....
8. Mensagem a que a recorrente só teve acesso em 17/04/2021, ou seja, no dia em que seu pai se preparava para efectuar uma "limpeza" ao seu telemóvel, eliminando registos para libertar memória.
9. E de o pai da recorrente não se recordava por só ter trocado esta e mais duas sms com o Dr. BB no reduzido espaço de dez dias e porque todos os contactos entre eles eram feitos através de mail e chamada de telemóvel.
10. Do teor dessa mensagem resulta que, pelo menos, em 26 de Maio de 2017 ainda decorriam as negociações extrajudiciais entre recorrente e recorrida com vista à celebração de um acordo.
11. A documentação mencionada na mensagem era o livro junto aos autos e produzido pela BMW Portugal, com base no qual foi dado como provado o facto 43, objecto de ligeira alteração por parte desse Venerando Tribunal.
12. Como resulta desse livro, a utilização do kit causou maior desgaste nos componentes do veiculo.
13. Daí que o Dr. BB, adquirindo maior consciência da legitima reivindicação da recorrente, tivesse mantido as negociações, colocando á reapreciação superior a proposta anteriormente apresentada.
14. Razão pela qual o prazo de caducidade da propositura da acção apenas terminava, no mínimo, em 26 Novembro de 2017, isto é, depois da data da sua apresentação em juízo.
15. A recorrente não tinha conhecimento desse documento que não estava na sua posse e que não pode utilizar anteriormente.
16. Documento que determina necessariamente a modificação da matéria de facto dada como provada e não provada nos já supra-referidos pontos, e consequente improcedência da excepção da caducidade e procedência da acção.
17. A procedência do presente recurso tem como consequência a revogação da sentença recorrida e aplicação do disposto na alínea a), do nº 1 do artigo 701 ° do Código de Processo Civil.
Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Exas doutamente suprirão, deve o presente recurso ser considerado procedente e, por via disso, revogada a sentença recorrida e proferida nova sentença, nos termos previstos na alínea a), do nº 1 do artigo 701 º do Código de Processo Civil.
Dado que a não junção do documento seria fundamento para a imediata rejeição do recurso, foram de seguida realizadas diversas e demoradas diligências com vista à junção aos autos de certidão da transcrição do documento para suporte material escrito e bem assim para identificação do titular do número de telefone através do qual o documento electrónico foi enviado ao destinatário.
No decurso dessas diligências e sem prejuízo do que caberia decidir se o documento não fosse junto, foi entendido passar a exercer o contraditório também em relação a essas diligências, tendo a recorrida sido notificada pessoalmente para responder ao recurso, querendo, no prazo de 20 dias (artigo 699.º, n.º 2, do Código de Processo Civil) e para se pronunciar, querendo, na resposta ao recurso, sobre os requerimentos já apresentados pela recorrente e os despachos proferidos sobre os mesmos.
O recorrido respondeu às alegações de recurso defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado, oferecendo as seguintes conclusões:
A) A aqui recorrente interpôs recurso extraordinário de revisão ao abrigo do disposto na alínea c) do artigo 696º do Código de Processo Civil.
B) O documento que serviu de base ao presente recurso extraordinário de revisão é um alegado sms (serviço de mensagens curtas) enviada para o Sr. CC.
C) A V..., SA notificada para o efeito, veio aos autos informar que não lhe é possível certificar a veracidade e autenticidade do sms em apreço.
D) Razão pela qual a aqui recorrida impugna desde já a admissibilidade de tal documento uma vez que não é possível aferir da sua proveniência, veracidade e autenticidade.
E) Face ao exposto e à inadmissibilidade do sms como documento, deve o presente recurso extraordinário de revisão improceder.
F) Se assim não se entender, ainda que por mero dever de patrocínio, sempre se argumenta e remete para a falta de fundamento legal do presente recurso extraordinário de revisão.
G) Na medida em que os fundamentos que justificam a interposição de recurso extraordinário de revisão encontram-se previstos de forma taxativa no artigo 696º do Código de Processo Civil.
H) Nomeada mente, no que ao caso sub judice importa, o disposto na alínea c) quanto aos critérios de "novidade" e "suficiência" que devem revestir de forma inerente os respectivos documentos que são objecto de apreciação.
I) A Jurisprudência tem sido clara e concreta quanto a necessidade de se verificarem estes dois critérios de forma cumulativa.
J) No que concerne ao alegado sms que se pretende fazer uso, este não apresenta nenhum dos critérios mencionados.
K) O sms esteve sempre disponível no telemóvel do Sr. CC, que é pai da recorrente e mantém um contacto muito próximo com a mesma.
L) Tendo, inclusive, sido o próprio Sr. CC o intermediário entre a aqui recorrida e recorrente durante todo o processo, sendo mesmo uma parte "de facto" nos presentes autos e que se encontra explanado na douta sentença proferida em 1ª Instância
M) Pelo que não se vislumbra nenhum impedimento objectivo ou subjectivo que obste o fácil acesso por parte da recorrente ao sms em questão.
N) Mesmo que, hipoteticamente, a aqui recorrente não tivesse tido conhecimento do alegado sms, o mesmo não se pode dizer quanto ao Sr. CC.
O) E uma vez que era o próprio a estabelecer as comunicações entre as partes, a aqui recorrente teve todas as condições, meios e oportunidade para fazer uso desse alegado documento em tempo útil e adequado processualmente.
P) Se assim não ocorreu, apenas se pode imputar essa responsabilidade à aqui recorrente por não ter diligenciado de forma natural e correcta na busca e utilização dos meios probatórios que tinha ao dispor.
Q) Neste sentido, não pode vir agora a aqui recorrente tentar
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