Acórdão nº 8247/22.2T8SNT-A.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-04-18

Ano2023
Número Acordão8247/22.2T8SNT-A.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam as Juízas na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
A e B, residentes na Rua ..., n.º, 1º A, Agualva-Cacém intentaram contra C, pessoa colectiva número 514 ..., com sede na Av. ..., n.º …, Agualva-Cacém a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, formulando os seguintes pedidos (cf. Ref. Elect. 21032143 dos autos principais):
a) A declaração de resolução do contrato de empreitada;
b) A condenação da ré no pagamento de uma indemnização aos autores no valor de 15 782,80 € (quinze mil setecentos e oitenta e dois euros e oitenta cêntimos), acrescida de juros moratórios calculados à taxa supletiva legal desde a data de citação até integral pagamento;
c) A condenação da ré no pagamento de sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso no pagamento da indemnização.
Alegaram, muito em síntese, ter o autor marido contratado com a ré, em 28 de Janeiro de 2022, a realização das obras necessárias à remodelação e adaptação da fracção autónoma cuja nua propriedade adquiriram, cuja lista de trabalhos consta em anexo ao contrato, mediante o preço de 21 500,00 €; desde o início da obra que o autor se foi apercebendo que esta não era acompanhada pelo responsável de obra, ficava parada por diversos dias e, bem assim, que apresentava diversos defeitos, que a ré reconheceu numa reunião realizada em Março de 2022, mas que não corrigiu, vindo a abandonar a obra, causando prejuízos aos autores, que tiveram de contratar uma nova empresa de construção civil para corrigir os defeitos e concluir os trabalhos.
Em 13 de Maio de 2022 foi expedida carta registada com aviso de recepção para citação da sociedade ré, dirigida para o seguinte endereço: “ C., Av. ..., n.º … Agualva-Cacém”, sob o registo n.º RE948252762PT (cf. Ref. Elect. 137523050 dos autos principais).
Por requerimento electrónico de 17 de Maio de 2022, a ilustre advogada Dr.ª P... juntou aos autos a procuração forense, com data de 20 de Março de 2022, emitida a seu favor e da Dr.ª D..., estagiária, por C (cf. Ref. Elect. 21077747 dos autos principais).
O aviso de recepção atinente à citação da ré mostra-se assinado por S... ….., com data de 19 de Maio de 2022, tendo sido junto aos autos a 24 de Maio de 2022 (cf. Ref. Elect. 21126764 dos autos principais).
Em 20 de Junho de 2022, a ré apresentou nos autos contestação pugnando pela improcedência da acção e deduzindo reconvenção, pedindo a condenação dos autores/reconvindos no pagamento à ré/reconvinte da quantia de 10 000,00 € relativa ao valor em falta referente ao acordado no contrato de empreitada e o valor atinente aos «trabalhos a mais» e 2 000,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais, e ainda no pagamento de juros, indemnização respeitante a 42 dias de atraso entre a conclusão da obra e a desistência dos autores e em sanção pecuniária compulsória (cf. Ref. Elect. 21292889 dos autos principais).
Em 1 de Agosto de 2022, a autora apresentou réplica em que, como questão prévia, suscitou a extemporaneidade da contestação, referindo que o prazo para dedução da contestação se iniciou em 18 de Maio de 2022, porquanto em 17 de Maio de 2022 os CTT tentaram entregar a carta de citação à ré, o que foi infrutífero, assim como no dia 18, entrega que ocorreu apenas a 19 de Maio de 2022, sendo que em 17 de Maio de 2022 a ré juntou aos autos procuração forense, pelo que nessa data teve conhecimento dos elementos da acção, podendo exercer o seu direito de defesa; mais argumenta que a jurisprudência mais recente sustenta que a junção de procuração forense antes do acto de citação sobrepõe-se a este formalismo legal, considerando-se o réu citado nesse acto processual; o prazo contado desde 18 de Maio de 2022 terminou a 17 de Junho de 2022, e a contestação/reconvenção apenas foi apresentada em 20 de Junho de 2022, sem que tenha sido invocado justo impedimento ou paga a multa a que alude o art.º 139º, n.º 5 do Código de Processo Civil[1], pelo que a sua apresentação é extemporânea (cf. Ref. Elect. 21553229 dos autos principais).
Concedida à ré a oportunidade para se pronunciar quanto à suscitada extemporaneidade, veio fazê-lo, por requerimento de 19 de Outubro de 2022, onde explica que apenas foi citada na data em que recebeu a citação, ou seja, no dia 19 de Maio de 2022, pelo que o prazo de trinta dias terminou apenas a 20 de Junho de 2022; a ré não suscitou qualquer nulidade de citação, porque foi regularmente citada; mais sustenta que, estando em causa um processo com tramitação electrónica, a junção de procuração é pressuposto de qualquer intervenção nos autos, pelo que tal junção não equivale à sua citação (cf. Ref. Elect. 21994414 dos autos principais).
Em 14 de Dezembro de 2022 foi proferida a seguinte decisão (cf. Ref. Elect. 140744595 dos autos principais):
“Da extemporaneidade da apresentação da Contestação:
Vieram os AA. invocar a extemporaneidade da apresentação de contestação por parte da Ré, alegando que a contagem do prazo se iniciou em 18.05.2022, terminando em 17.06.2022 (porque dia 16.06.2022 foi feriado nacional). Isto porque, as ilustres Mandatárias da Ré, em 17.05.2022 juntaram nos autos procuração forense conferida a seu favor pela Ré, datada de 20.03.2022. Ou seja, no dia 17.05.2022 a Ré, através das suas ilustres Mandatárias, teve cabal conhecimento dos elementos objectivos e subjectivos da acção, pois nessa data aquelas passaram a ter acesso à presente acção através do sistema CITIUS.
A R. devidamente notificada de tal articulado, pugnou pelo seu indeferimento.
Cumpre apreciar e decidir.
No caso de pessoas colectivas, que é o que releva para os presentes autos, a citação é sempre tentada na morada que resultar do Registo Nacional de Pessoas Coletivas (nº 2 do artigo 246º do CPC), ou seja, antes de se tentar a citação por via postal, terá que, obrigatoriamente, se confirmar a morada no RNCP.
Se houver recusa na receção do expediente, cabe ao distribuidor do serviço postal lavrar nota postal, lavra incidente antes de o devolver e a citação considera-se “efetuada face à certificação da ocorrência”, nada mais havendo a cumprir por parte da secretaria ou do agente de execução (nº 3, do 246º do citado diploma legal).
Caso o expediente seja devolvido com qualquer outro motivo, então é remetida nova carta registada (nº 4, do 246º do citado diploma legal), sendo que neste caso é por carta em depósito (nº 5, do 229º do citado diploma legal) e com a cominação prevista no nº 2 do 230º, ou seja: “a citação considera-se efetuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado o aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o destinatário teve oportuno conhecimento dos elementos que lhe foram deixados”.
Ora, vertendo tais considerações para os presentes autos temos que, em 13.05.2022, foi enviada a carta de citação para a sede da Ré. Em 17.05.2022, os serviços postais dos CTT tentaram entregar a carta de citação à Ré na morada indicada pela Autora, correspondente à sua sede. Em 19.05.2022, os serviços postais dos CTT lograram conseguir entregar a carta de citação à Ré, tendo a mesma sido recebida por S..., conforme consta do aviso de recepção por si assinado e junto nos autos.
Porém, em 17.05.2022, as ilustres Mandatárias da R. juntaram procuração, defendendo assim os AA. que o prazo para contestar se iniciou nesta data.
Vejamos.
Ora, conforme decidido no Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães, datado de 23-01-2020, disponível no site www.dgsi.pt, com cuja argumentação se concorda, “O acesso à tramitação electrónica dos processos implica a junção de uma procuração forense, que constitui, em si mesma, o pressuposto de qualquer intervenção nos autos”, mas “Encontrando-se o processo sujeito a tramitação electrónica, não pode considerar-se que a mera junção de procuração forense a mandatário judicial é suficiente para fazer pressupor o conhecimento do processo, nos termos e para os efeitos do disposto pelo art. 189º do Código de Processo Civil.
Aliás, o artigo 227.º do CPC, no seu n.º 1 dispõe que o ato de citação implica a remessa ou entrega ao citando do duplicado da petição inicial e da cópia dos documentos que a acompanhem, comunicando-se-lhe que fica citado para a ação a que o duplicado se refere, e indicando-se o tribunal, juízo e secção por onde corre o processo, se já tiver havido distribuição.
Tais exigências são compreensíveis pois a citação é o ato pelo qual se dá conhecimento a uma pessoa (réu, requerido, executado) de que foi proposta contra ela uma ação. Serve para chamá-la ao processo pela primeira vez para se defender.
Desta forma, e atendendo ao disposto nos artigos 246.º e 230.º, n.º 1, ambos do CPC, temos que a R. foi citada no dia 19.05.2022, dispondo do prazo de 30 dias para apresentação de contestação (artigo 569.º, n.º 1 do CPC). Ora, procedendo aos respectivos cálculos verifica-se que o aludido prazo findava no dia 18.06.2022. Porém, atendendo a que era Sábado, transferiu-se o seu termo para o dia 20.06.2022 (artigo 138.º, n.º 2 do CPC).
Ora, tendo a R. apresentado a sua contestação no dia referido dia 20.06.2022, e sem necessidade de maiores considerações, porque desnecessárias, temos que concluir que a contestação foi apresentada tempestivamente.
Custas do incidente pelos AA., fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.
Not. […]”
Inconformados com esta decisão, dela vieram os autores interpor o presente recurso, concluindo a respectiva motivação nos seguintes termos (cf. Ref. Elect. 142742928):
A. O presente Recurso é admissível porquanto o despacho não é nem um despacho de mero expediente, nem um despacho proferido no uso legal de um poder discricionário, sendo um despacho que admite um articulado e que, por isso, tem consequências processuais.
B. O Tribunal a quo andou mal e violou regras e princípios básicos do Direito, em geral, e do Direito
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